30 dezembro 2015

Uns mil milhões...

Falarem-me em distâncias entre estrelas com 15 zeros ou 20, para mim é igual. Está muito para lá do que as minhas referências podem comparar. Com os mil milhões de euros também era assim, até há pouco.

No entanto e apenas nesta quadra natalícia vimos o buraco do Banif, aí de uns 2 mil milhões na conta dos contribuintes e uma migração do Novobanco para o BES de outros 2 mil milhões, de dinheiro de investidores que deixou de estar garantido e que passará a ser certamente calote. Curiosamente, os 3 grandes do futebol anunciaram contratos de venda de direitos, tudo somado a ultrapassar também os mil milhões de euros.

Num trabalho recentemente apresentado no “Expresso” estima-se que os calotes na banca portuguesa, as imparidades, basicamente haveres que não se haverá por o devedor não poder pagar, chegarão aos 40 mil milhões. Sendo o PIB nacional de cerca de 170 mil milhões, isto significa que para o equivalente a quase 25% da riqueza gerada anualmente no país, alguém vai ficar arder!

Não há fogo que não escalde. Ou os contribuintes como no BPN e agora no Banif, ou os investidores, grandes e pequenos. Sobre o cenário contribuinte, não vale a pena comentar ou acrescentar o que quer que seja, dado o estado atual das contas públicas e todas as limitações e restrições que este governo lá vai reconhecendo, lentamente (excluindo os funcionários públicos, a página está a virar, mas muito poucochinho). Se são os pequenos investidores, lá os temos a protestar na televisão e a insultar o governo (se calhar alguns até achavam a esmola um pouco grande, mas resolveram não desconfiar). Sendo queimados os grandes credores, como agora no BES retardado, podemos dizer para já ser justo a maldita finança e os asquerosos mercados terem a sua conta (desde que não afete o fundo de pensões de ninguém)?

Para lá dos casos de polícia diretos, há os casos de polícia indiretos como fazer duas autoestradas paralelas, separadas por algumas centenas de metros… que alguém há-de de pagar, ou não. Tanto as vigarices claras e diretas, como as obras inúteis, os brincados caros, o clientelismo e incompetência na administração pública, como… a lista é interminável, tudo isto tem um custo… que não se paga. Obviamente que uma parte da economia real, pouco atendida e em contexto adverso, também colapsou e ajudou ao buraco… não são tudo escândalos financeiros.

Como irá o país em geral e o nosso sistema financeiro em particular digerir estes 25% do PIB mal parados, quando a dívida pública está nos 130% do PIB? Vamos imaginar até que a “Europa” vai ser generosa, que os financiadores institucionais internacionais vão continuar a acreditar na nossa banca, mesmo depois de levarem um calote, e que recomeçamos a zero, com as contas limpas!

Quando vemos a “agenda política” atual, os temas destacados, as polémicas ardentes, fico com a noção clara de não termos aprendido nada. Mesmo com uma improvável prenda de Natal, daqui a uns anos estaremos iguais, se não mudarmos OS VALORES E A CULTURA!

29 dezembro 2015

O pior do Nazismo

Num destes fins-de-semana, a RTP2 passou um filme sobre Anne Frank. Não acrescentando nada de muito relevante em termos de informação, acrescenta sempre algo como reflexão…

Uma coisa é o Nazismo no palácio, no quartel-general, onde os líderes mais ou menos alienados tomam decisões que provocam a morte de muitas pessoas, mais ou menos atroz, mas sem lhes sentirem o cheiro, vistas apenas quase como uma estatística, enquadradas num objetivo macro qualquer. Convém recordar que a morte deliberada de civis não foi um exclusivo dos “maus”. Massivos bombardeamentos foram realizados pelos aliados a várias cidades alemãs, assumidamente, com a intenção de quebrar o moral às populações.

Outra coisa é no dia-a-dia, entre pessoas que se conhecem, que se cheiram, aceitar e jogar este jogo assassino e a denúncia pouco menos do que gratuita… Como é possível, pessoas que se fitam nos olhos se consigam “dessolidarizar” a ponto de enviar um semelhante inocente e indefeso para a degradação e morte?

Não, o pior do Nazismo não foi Hitler. O pior foi a aceitação do sistema e a participação ativa no mesmo de largas franjas da população e não apenas na Alemanha. Pode-se invocar aqui a tal imagem da “banalização do mal”, apresentada por Hannah Arendt? Eichmann, participando e promovendo ativa e conscientemente a morte de muitos milhares, invocou uma espécie de alienação passiva. Tudo aquilo era “normal”, argumentando constituir uma simples peça acrítica de uma engrenagem complexa. No entanto, os cidadãos básicos que aderiram ao processo não podem invocar assim tão facilmente o fator hierárquico para justificar a perseguição daqueles que até há pouco eram seus vizinhos, colegas e amigos.

Num momento em que a Europa mostra sinais de fadiga em vários campos, com alguns paralelos com a situação antecedente a esse período negro, nunca é demais rever o sorriso de uma Anne Frank, mesmo que seja simplesmente o rosto de uma atriz num filme.

28 dezembro 2015

Porto e Lisboa

O Metro do Porto funciona concessionado desde a primeira hora e poucos se queixam. O Metro de Lisboa não pode deixar de ser empresa pública, de greve em greve, e tem raiva de quem não o seja. Tanto assim é que uns senhores de Lisboa já decidiram que o Metro do Porto não deve ser mais concessionado.

O Porto de Leixões funciona bastante bem. O de Lisboa anda de greve em greve, a ponto de importantes armadores de lá saírem. Os postos de trabalho diretos e indiretos ameaçados e o investimento potencialmente enterrado não parecem ser um problema significativo.

O serviço de prevenção de neurocirurgia ao fim de semana funcionava no Porto (e em Coimbra). Em Lisboa não era possível e foi possível alguém morrer por isso…

A capital será Lisboa mas os bons exemplos não parecem vir dali.

27 dezembro 2015

Sobre salvar os bancos

O Sr. José depositou as suas poupanças no banco, que prometeu devolvê-las passado 6 meses, acrescidas com alguns juros. O banco emprestou o dinheiro ao Sr. António que prometeu devolvê-lo passado 6 meses, com mais uns juros.

Ao fim dos 6 meses, o Sr. António está falido e não consegue devolver o dinheiro ao banco, que assim fica atrapalhado para cumprir o seu compromisso com o Sr. José. Este é um problema sério, porque o capital de um banco é bastante inferior à totalidade dos fundos que movimenta.

Assim, quando um banco é “salvo”, não se trata propriamente de salvar os seus donos, mas sim os “Josés” que não gostariam nada de perder as suas poupanças. Se um banco, como agora o Banif, chega a esse ponto, fundamentalmente uma de três coisas terá ocorrido:

1) Foi fruto da sua atividade “normal”. Ter um cliente que não paga, acontece em qualquer sítio e a situação recessiva atual proporciona muitos “Antónios” falidos.

2) Foi incompetência da gestão do banco, que não teve prudência suficiente na gestão dos seus produtos e clientes

3) Foi algo de doloso, como o exemplo do BPN, em que o banco fez circular dinheiro por um círculo de amigos/influência, sem a mínima preocupação de solvabilidade nem garantias. Lembram-se do senhor Oliveira e Costa a vender e a recomprar ações da SLN, com valorização completamente arbitrária?

Assim, antes de se barafustar histrionicamente contra o “salvar os banqueiros”, à custa dos contribuintes, antes de criticar a inação do governo anterior, a precipitação do atual ou a inépcia da supervisão, eu queria mesmo era saber se foi apenas azar do negócio, incompetência dos gestores ou aldrabice descarada…

A diferença entre os vários cenários é muito grande e é fundamental continuar a haver “Josés” a acreditar e a colocar poupanças nos bancos, para eles emprestarem a “Antónios” (sérios), que assim investem e criam riqueza.

25 dezembro 2015

Natal fora da igreja


Neste mundo das questões, interrogações e polémicas, o Natal não há exceção.

A Igreja contesta a sua dessacralização e o consumismo associado. Confesso não apreciar muito aquela coisa do pessoal enfiar um barrete vermelho na cabeça, como quem enrola um cachecol no pescoço em dia do jogo da seleção.

Por outro lado, nalguns lugares, a sua matriz original religiosa incomoda outras comunidades de outros credos, sobretudo quando se manifesta fortemente na vertente social.

Desculpem-me os religiosos puros, o pessoal dos barretes e os outros incomodados. Bem ou mal, certo ou errado, o Natal tem uma força que vai para lá dessas polémicas todas. Se tem a marca de um começar, é também um momento inquestionável e insubstituível de reencontro. Nenhuma outra data do calendário arrasta uma emoção tão forte, de calor e de família. Venha o próximo e com todos cá.

23 dezembro 2015

Como foi …?

Com a consciência de que estou a comentar algo que conheço mal e me possam escapar alguns factos e detalhes relevantes, agravado ainda por estarem em causa vidas humanas, sob o jovem que morreu no fim-de-semana em Lisboa, não consigo deixar de expressar alguns pensamentos:

- Como é possível que na capital do país não existe um mecanismo de prevenção ativo para estas situações?

- Como é possível assumir calmamente a mensagem: desculpem, mas estamos fechados para isso, aguentem até à próxima 2ª feira?

- Como é possível agora todos estes pedidos de demissão evocando os “cortes”. Se esses “cortes” são realmente a causa e como não foram introduzidos “ontem”, a gravidade do problema não deveria ter forçado uma tomada de posição firme há mais tempo?

- Como se sentirão os médicos que deixaram uma pessoa morrer, por não responderem à prevenção, por uma reivindicação salarial?

21 dezembro 2015

Colocando chumbo na asa

Continuo sem perceber esta embirração contra a privatização da TAP. Se fosse com a ANA, ainda podia tentar entender. Não é nada prático ir apanhar um voo a Badajoz ou a Vigo…

Aqueles que defendem o caráter estratégico da companhia para a diáspora e a ligação aos PALOP/CPLP deveriam atentar no que se passa com o grande avião da Royal Air Maroc que todos os dias voa entre Lisboa e Casablanca. Leva muita gente e uma grande parte dos passageiros segue depois viagem para destinos também servidos pela TAP, muito especialmente Angola. Aqueles que fazem contas à vida não se restringem os voos diretos e, se se justificar, farão escala em Casablanca, Madrid, Paris, etc.

O Estado já provou não saber gerir a empresa. É difícil imaginar que, depois de a retomar, ela passará a ser rentável, sendo que, ao reverter o contrato, são já mais custos que se acrescentam.

Um primeiro-ministro de um Estado de Direito anunciar que vai recuperar a empresa com ou sem acordo, é algo estranho. Vai expropriar? Vai montar um assédio fiscal e legal dissuasor? Além de estranho é também assustador. Mais do que nunca precisamos de quem invista, de quem acredite no país. Ter um governo com estes tiques autoritários e ameaçadores, invocando um poder discricionário terceiro-mundista não ajuda mesmo nada. Com o estado da banca que vemos, precisamos mesmo que algum investimento venha exterior e, aí, as exigências de credibilidade são acrescidas.

15 dezembro 2015

Medo sim, mas de quê


O último número da “Economist” destacava o aumento da extrema-direita populista, supostamente jogando com o medo e incluindo agora (?) a vertente da segurança. Foto de capa com D. Trump, M. Le Pen e V. Orban, aqui copiada.

De acordo com o artigo, um cenário economicamente recessivo cria insegurança, medos, xenofobia e é campo fértil para um perigoso populismo radical. Propunha a sua receita habitual: abrir fronteiras, globalizar, livre circulação de bens e pessoas. Isso cria riqueza. A prosperidade matará então os medos, secando o populismo xenófobo.

Da Hungria não conheço nada, mas julgo existir por aqueles lados xenofobismo a sério. Dos USA também sei pouco, mas reconheço ser assustador ver um Trump a presidir uma superpotência, especialmente se tiver conselheiros do calibre dos de G.W. Bush.

Sobre França, que conheço bastante melhor, afirmo. Sim, existe xenofobismo puro; sim, durante a II Guerra o colaboracionismo foi muito relevante; sim, as ideias na fundação da FN são preocupantes. No entanto, claramente, não é o xenofobismo primário fruto da falta de prosperidade, que o tal reforço de globalização supostamente resolveria, que levou 30% dos eleitores para a extrema-direita.

Na causa está certamente a incompetência e hipocrisia dos políticos tradicionais, mas não só. Quando, e é apenas um exemplo adequado à época, a população se choca por a autarquia suspender as iluminações de Natal nas ruas, em nome de uma laicidade politicamente correta, isto não é xenofobia, mas pode ser capitalizado nesse sentido.

A vitória da direita tradicional na segunda volta das regionais francesas é uma vitória de Pirro. Atribuir um carácter “pestífero” aos radicais, decretando que devem ser cirurgicamente isolados de qualquer exercício de poder é algo desrespeitoso, sobretudo quando representam 30% dos eleitores e ineficaz a prazo, dado estarem a subir consistentemente, com fundamentos para continuar…

O “Economist” que me desculpe, mas para lá das questões económicas, na Europa, também contam as culturais.

09 dezembro 2015

Salário pelo mínimo

Começo por confessar o meu recente desconhecimento. Quando há uns bons meses atrás se começou a discutir com intensidade a atualização do salário mínimo, eu julgava que o impacto maior da sua alteração seria do lado das prestações sociais a ele indexadas e não tanto diretamente no recibo de vencimento de muita gente. De uma pequena investigação que na altura procurei fazer, cheirou-me que a realidade não seria bem assim.

Hoje leio que a proposta de alteração atualmente em discussão, irá colocar um terço dos trabalhadores por conta de outrem nesse patamar. Confesso que isto me choca. O salário é uma retribuição pela contribuição do trabalhador. Não é muito fácil avaliar a real contribuição individual de cada um. Ela será maior ou menor em função de muitos fatores, tais como a formação de cada um, o ambiente de trabalho na empresa e o mercado em que ela se insere. Por outro lado, existe também um mercado do lado da oferta que influencia os salários praticados e fazem, por exemplo, que um bom técnico com formação básica possa ganhar mais do que muitos doutorados.

Se simplificarmos e pensarmos numa empresa em que o valor criado, distribuído pelos trabalhadores dá 200 Eur em média a cada um e o salário mínimo for 500 Eur, essa empresa não sobrevive e estará, portanto, desenquadrada do quadro social do país.

Com todas estas considerações, onde pretendo chegar é que, para mim, o salário mínimo deveria ser um limite e não uma norma. Voltando ao ponto de partida, o salário deveria ser, com maior ou menor rigor, uma retribuição justa para o contributo de cada um. A organização e estrutura, o modelo de negócio e a gestão de cada empresa deveriam permitir que esse valor fosse “digno” e, naturalmente, por norma, acima do tal patamar mínimo.

Quando ouço falar em 1/3 dos salariados em salário mínimo, assusta-me. Das duas uma: ou as empresas estão a gerar um valor muito reduzido e realmente não dá para mais; ou aplica-se o mínimo porque é obrigatório e, se fosse metade do atual, seria (quase) igual. Sem entender exatamente qual das duas hipóteses está em questão, aumentar salários por decreto pode ser positivo ou negativo.

08 dezembro 2015

A França syrizou?

Não, não se pode dizer isso. Syrizar é uma radicalização do eleitorado para a esquerda e em França ele está a ir para a direita. Para muitos, não é comparável. A subida sustentada da FN em França não é uma surpresa, nem recente. Já em 2002 Jean Marie Le Pen disputou a segunda volta das presidenciais. Da mesma forma como o Syriza de hoje é muito diferente, na prática, da sua teoria de há um ano atrás, a FN de hoje também é bastante diferente, na teoria, da de 2002. Quando cheira a poder, há uma certa pragmatização destas organizações.

Segundo a teoria dos jovens turcos do nosso PS, que defendem um “seguimento” do eleitorado, afastando o partido do centro, para não desaparecer, a direita tradicional francesa deveria estar agora a cair para o extremo, indo para “onde a bola bate!”. 

É algo curioso que na suposta terra da liberdade, igualdade e fraternidade, a extrema-direita cresça desta forma e a outra pouco se note. Nos filmes e nas ficções, viam-se mais resistentes à ocupação do que colaboracionistas e, talvez, a realidade não fosse assim.

Julgo ser guerra perdida, a prazo, criar estes cordões sanitários: “todos contra eles”. No polémico e provocador romance “Submissão”, Michel Houllebecq especula que em 2022 essa aliança já não tem mais alternativa do que apoiar para a Presidência da República o candidato da Irmandade Muçulmana.

Em resumo, os partidos tradicionais do poder estão desgastados fundamentalmente pela sua prática. Ou entendem isso e encontram forças internas para realmente mudarem, ou serão mudados. O que serão estes extremistas na prática, uma vez chegados ao poder, não sabemos. Pode não ser bonito nem positivo. Que por este caminho irão lá chegar, não tenho a menor dúvida.

06 dezembro 2015

Nós é que sabemos

Um amigo pediu-me para ler e criticar um livro que lhe tocava assunto próximo e cuja produção tinha um pouco acompanhado. Debaixo do título enfático e pomposo, não gostei da estética das frases (e gostos talvez não se discutam) nem da forma indefinida da escrita. Não tinha desenvolvimento de personagens suficiente para ser romance (estas eram quase e apenas cabides de citações) e também não tinha foco para ser uma tese. De facto, ficava a ideia de se estar fundamentalmente a percorrer uma lista solta de citações muito literalmente transcritas e insuficientemente tratadas.

No fim, no fim, tentando expurgar o que declaradamente não tinha relação com mais nada e alguns pontos óbvios como apontar deficiências da classe política em geral, as 300 e tal páginas pretendiam dizer que todo o mal do mundo, próximo ou remoto, é devido aos demoníacos mercados, secretas conspirações capitalistas e alguns visíveis truões neoliberais.

E o que me ficou mesmo a impressionar, e de certa forma a justificar o investimento de tempo, foi ver com mais proximidade aquele tipo de postura (esqueçamos quadrantes e bandeiras especificas) para quem o mundo é amarelo. Assim sendo, apontam e destacam tudo o que vêm amarelo e ignoram o que não o seja. Leem e citam os que realçam o amarelo do mundo. Se algum inimigo ou mero tonto tiver o desplante de apontar um ponto verde, é tratado como uma melga intrusa, que higienicamente deve, de uma forma ou de outra, desaparecer. Sai um palavrão e uma etiqueta de “qualquer coisa feia”, como se presumivelmente ser “uma coisa feia”, fosse suficiente para destruir qualquer fio de razão ou anular a mais simples frase pronunciada. Um mundo ideal é um mundo com melgas silenciadas, para não dizer exterminadas.

A riqueza e o conhecimento passam por falar e ouvir, aceitar provocar e ser provocado. As tribos que se autoalimentam exclusivamente das suas razões empobrecem. Aqueles que do alto do seu discurso e postura altiva julgam ser os donos de todo o saber do mundo, mais do que me revoltar, entristecem-me.

30 novembro 2015

Exames e legislações

A minha “fornada escolar” estreou o chamado “curso unificado”. Antes havia o ciclo preparatório, seguido do liceu ou das escolas comerciais e industriais. Nos calores revolucionários foi decidido que não devia haver burgueses para o liceu e proletários para as escolas técnicas e unificou-se tudo. Basicamente, ficou tudo “liceu”.

Assim, eu frequentei o primeiro 7º ano, o primeiro 8º e por aí fora até ao 12º. Com algumas coisas curiosas. Por exemplo, no 7º ano, não havia História nem Geografia, substituídas por uma coisa muito mais importante chamada “Ciências Sociais”. A seguir, no 8º, demos a História e Geografia dos dois anos. Recordo-me bem de começar o 9º sem saber se haveria ou não exames e em que moldes. Algures a meio do ano, lá foi decretado o exame e obrigatório, sem dispensa!

Lembrei-me disto a propósito da recente aprovação na Assembleia da República de uma lei que anula os exames previstos para o 4º ano. Se não arrisco aqui comentar ou opinar sobre os prós e contras do tal exame, uma coisa parece-me clara. Isto não devia ser objeto de um voto avulso. Acho óbvio e inquestionável que o programa do ensino deve ter uma coerência e um horizonte temporal de estabilidade, que não se compadece com estas investidas legislativas pontuais. Está bem que o Parlamento tem o poder de legislar, está certo que vontade não lhe falta, mas deveria funcionar a um nível mais estratégico e não cair nesta micro legislação que esvazia e acaba por desresponsabilizar quem realmente deve implementar uma política coerente, concretamente o governo.

A seguir, irão legislar sobre a frequência dos transportes públicos de Lisboa? Ou sobre as horas das intervenções cirúrgicas nos hospitais? Ou sobre a pressão da água para a rega dos jardins públicos? Ou sobre a forma de arquivar os processos nos tribunais…?

25 novembro 2015

25 de Novembro



Há quem considere o 25 de Novembro de 1975 um golpe da direita contra os valores de Abril e etc. No entanto, para mim e para muitos, os valores de Abril não são os da legitimidade revolucionária das ruas em ebulição.


Vejamos a palavra do povo, que se manifestou logo a seguir nas presidenciais de 1976. O líder do 25 de Novembro, Ramalho Eanes, é eleito à primeira volta com 61% dos votos. Se somarmos o outro “pró 25 de Novembro”, Pinheiro de Azevedo, ficamos com quase 76%. Três em cada quatro eleitores legitimaram o 25 de Novembro. Não me parece que 76% sejam “direita retrógrada”, mas, e se fossem, ignora-se o facto e suspende-se a democracia? Em nome de quê?

20 novembro 2015

Olhar para os americanos

França adota medidas de segurança reforçadas nos comboios – “Vamos colocar um americano em cada carruagem!”.

Esta imagem foi publicada num jornal argelino, após a tentativa de atentado num TGV em França, em 21 de agosto passado, onde o terrorista foi neutralizado por três americanos e um inglês sexagenário. Para lá desta suposta diferença de atitude do lado dos americanos, há um aspeto mais objetivo e significativo que tem a ver com elaboração e adoção de legislação para lidar com esta ameaça e particularmente o registo centralizado dos passageiros aéreos. Os Estados Unidos realizaram-no e exigiram da Europa os dados pessoais de quem para lá vai. Como é habitual, a Europa protestou mas lá teve que aceder.

Do lado Europeu, a criação de um registo comum, o PNR, “Passanger Name Record”, avança, mas muito travado pelo Parlamento Europeu. A celeridade é tal que em julho deste ano, a comissão respetiva do PE aprovou um projeto da Comissão Europeia, inicialmente apresentado em 2011. Os novos atentados voltam a trazer o assunto para o topo da agenda. Qual a frequência necessária para garantir que o PNR se conclui e que haverá coordenação e circulação de informação franca entre os vários países europeus: um atentado cada dois meses?

Curiosamente, do lado das vozes críticas, o bizarro novo líder do Partido Trabalhista Britânico, o Sr Corbyn, conseguiu dizer, e ainda a quente, não concordar muito com as instruções dadas à polícia de atirar a matar contra os terroristas. Neste caso, aparentemente, a chave não estará na frequência, mas sim na proximidade. Dirá o mesmo se acontecer algo no seu quintal?

Se a Europa não necessita de colocar um americano determinado em cada esquina, não lhe faria mal inspirar-se da capacidade de tomar e implementar decisões rapidamente, em vez de ficar eternamente a discutir subtilezas, enquanto o polvo maligno cresce e vai chacinando inocentes.

19 novembro 2015

Empresas, donos e histórias

Passou há pouco tempo na RTP2 uma série sobre a família Krupp, fundadora da empresa alemã com o mesmo nome, um dos maiores impérios industriais do século XX. A ação decorre fundamentalmente nos palácios da família, em torno dos seus conflitos, dramas e estoicidades, sem abordar as dificílimas condições de trabalho nas fábricas e referindo apenas muito ao de leve os registos esclavagistas e criminosos da fase do III Reich.

Manter uma dinastia viva e pujante não é tarefa fácil e uma boa parte do enredo estava construído precisamente em torno da forma(ta)ção muito exigente e tensa do herdeiro designado.

No final, há um acontecimento assinalável. A propriedade da empresa é transferida da família para uma fundação, um processo que merece alguma reflexão. Se tudo nasce, cresce e morre ou se transforma, a transformação de um grande património familiar numa fundação (falamos, obviamente, de fundações a sério) é admirável em significado e em potencial. Para lá do prescindir da propriedade de um bem, está em causa abandonar o objetivo básico de criar riqueza para si e colocar o património numa instituição sem fins lucrativos, incorporando uma função social relevante. Isto possibilita um campo de intervenção infinitamente mais amplo e potencialmente gerador de outras riquezas, noutros campos, que uma lógica de gestão de acionista/investidor dificilmente permitiria.

Voltando à série e aos Krupp, há uma conclusão muito clara. Uma empresa de corpo inteiro é uma entidade viva, gerida, liderada e sentida, não um simples título que voa de mão em mão, conforme o vento. Há donos das empresas que as vêm como algo criado, construído e com um valor para lá do contabilístico; há outros, para quem elas são apenas um ativo transacionável, que pode entrar ou sair a qualquer momento dos seus livros, conforme a oportunidade.

As primeiras fazem a história, as segundas vagueiam de estória em estória.

18 novembro 2015

Atentado no “Stade de France”


Na passada sexta-feira, 3 bombistas, supostos suicidas, fizeram-se explodir junto ao “Stade de France”, provocando apenas um morto, para lá deles próprios. Alguma coisa deve ter corrido diferente do previsto.

Olhemos para as horas, apenas. Às 21h horas começou o jogo, às 21h20 o primeiro rebenta-se e dez minutos mais tarde os outros dois. Se o primeiro estivesse no interior do estádio às 21h20, tudo faria muito sentido. Os outros dois apanhariam, em segunda vaga, os espectadores na saída. Só que, por um motivo qualquer, o primeiro não conseguiu entrar.

Sendo assim, porque explodiram os outros dois, sem provocarem uma única vítima? Vou especular: explodiram porque não eram mesmo, mesmo, suicidas. Ou por programação ou por controlo remoto, eles iriam sempre explodir às 21h30, independentemente de onde estivessem. Especulação pura, mas plausível.

17 novembro 2015

Hipocrisia e culpa?

Como não é fácil encontrar algum tipo de atenuantes ou pseudo-justificações para o que aconteceu em Paris no passado dia 13, os habituais “contrários/do contra”, lá tiveram que vir dizer qualquer coisa contra a solidariedade manifestada cá na Europa, pelo que aconteceu na Europa.

Porque no dia anterior ocorreu algo idêntico no Líbano, com pouco destaque, quase que ignoramos as situações recorrentes na Nigéria, etc… esta solidariedade tem algo errado… Sinto-me à vontade para contestar, até porque não são poucas as vezes que tenho recordado por aqui as enormes tragédias pouco mediatizadas. De facto, nenhum homem é uma ilha e, continuando com a imagem de John Donne, os sinos quando dobram é por todos nós.

No entanto, é óbvio e inevitável sentirmos muito mais a morte de um familiar do que a de alguém desconhecido do outro lado da planeta. Em Beirute raros já lá estiveram e poucos terão uma ideia de onde fica exatamente. Por Paris, muitos já lá passaram e não falta quem aí tenha amigos e família. O choque é certamente maior. Que esse choque não faça esquecer os outros dramas do mundo, é uma coisa; que se invoque a esse propósito “hipocrisia”, condenando e até culpabilizando uma reação solidária genuína é que… valha-nos a razão!

14 novembro 2015

Se eu hoje estivesse em Paris


Se eu hoje estivesse em Paris, teria ido jantar a uma esplanada. Em seguida iria ouvir música ao vivo, ou numa sala formal, ou num pequeno bar da “cité bergere”, como o Limonaire, onde no fim circula o chapéu e cada qual paga o que entender.


Faria isso em homenagem aos mortos de ontem. Para deixar claro aos energúmenos que os assassinaram que eles não podem nem irão mudar a nossa forma de viver. Essa seria a maior derrota.

Ao mesmo tempo, gostaria que secassem aquela gente, que realmente os isolassem, que os interesses geostratégicos no Médio Oriente deixassem de permitir qualquer contemporização com isto. Gostaria que não fosse tão fácil ir da Turquia para a Síria e voltar. Gostaria de ter a certeza de que o dinheiro que pagou esta aventura assassina não é o mesmo que paga as grandes encomendas à indústria militar francesa. Não sei se é, mas gostava de ter a certeza.

Também gostaria de ver uma mão firme e implacável contra todos os lugares reais e virtuais onde se apela ao ódio, onde se cultiva o radicalismo e se criam estes alucinados.

Se eu estivesse hoje em Paris, estaria, de uma certa forma, a celebrar.

13 novembro 2015

Convergência

As imagens ao lado são o registo oficial do momento histórico da formalização da convergência da esquerda. Para lá das especulações e reflexões sobre o fundo e o futuro desta novidade, que muitos rios de tinta fizeram e farão correr, confirma-se não parecer ser possível ter os líderes dos vários partidos sentados lado a lado à mesma mesa, anunciando a sua convergência.

Convergiram para a esquina de uma mesa e assinaram documentos bilaterais, de pé, alguns deles sem sequer arrumarem as cadeiras. Jerónimo de Sousa está todo torcido, incomodado pela carteira vazia e a senhora dos verdes vai ao ponto de assinar debruçada com o peito pousado sobre as costas da dita. Aparentemente Catarina Martins conseguiu ultrapassar o obstáculo de uma forma mais elegante.

O que é que isto importa? Pouco. Uma pessoa importante que conheci dizia várias vezes que nunca assinava nada de pé “entre duas portas”. A assinatura é um comprometimento que exige um mínimo de concentração, atenção e postura.

Repito que não será pela interferência da cadeira vazia que isto vai correr melhor ou pior, mas o ambiente de improviso e de ligeireza que transpira deste suposto momento histórico, não me parece bom augúrio.

11 novembro 2015

Ai Portugal


Digo e repito: não tenho simpatia nem afeto e muito menos interesse associado a qualquer partido político. Tenho alergia a inúmeros políticos, de todos os quadrantes. No entanto, governar o meu país e construir aquele que será o dos meus filhos, é demasiado sério para ficarmos entretidos e satisfeitos a atirar pedras e a fazer piadas brejeiras sobre quem nos governa. Usem esse registo para quando falarem dos treinadores de futebol. Pode não ser elegante, mas os efeitos são limitados.

Há 4 anos o Estado estava a escassos passos de não ter dinheiro para pagar salários e reformas. A culpa não foi todo do PS, mas ele estava ao leme. O primeiro-ministro da altura apareceu entretanto com largas manadas de cabritos, sem se lhe conhecerem as cabras. O acordo com quem na altura nos emprestou o dinheiro, que desesperadamente necessitávamos, foi negociado e acordado em primeira linha com o próprio PS. A fatura veio depois, para quem a merecia e para quem não a merecia.

Acreditei eu que tal etapa constituiria uma vacina e uma aprendizagem. Infelizmente, o PS de hoje destrui essa oportunidade. Este discurso do “vamos acabar com a austeridade”, como se esta tivesse sido uma opção da direita à qual eles foram alheios, não é sério. Reverter nacionalizações e concessões para permitir continuar a haver uma greve todos os meses, choca quem sua o seu trabalho.

Digo e repito: a minha preocupação principal não é eu trabalhar mais 4 ou 5 anos ou perder 10 ou 20% da minha reforma. A minha preocupação principal é o país que irão encontrar os meus filhos e a restante geração dos 20 anos. O seu futuro depende pouco da reposição das pensões, dos salários da função pública e muito menos das greves nos transportes. Depende de haver gente empreendedora, que acredita no país e que nele investe. É com profunda tristeza que vejo alguns esfregando as mãos de contentamento, porque os empresários “agora vão vê-las!”. Nem todos serão gente boa, é certo, mas com este clima, é muito provável que os meus filhos e muitos outros fiquem a ver navios…!

10 novembro 2015

Males que vêm por bem

Ou, dito doutra forma: há bens que chegam por acaso. Quis o azar que há uns dias atrás, ao fazer as malas um pouco à pressa, deixei para trás o material de leitura… Bom, o aeroporto de Lisboa até tem uma loja da Fnac…

Na dita loja, o material exposto em destaque, basicamente da categoria das “novidades”, não entusiasmava muito. A escolha era entre títulos bombásticos em capas de cores fortes e títulos pindéricos sobre capas pirosas…

Felizmente, lá ao fundo, estava uma estante com edições de bolso e uma coleção muito mais afastada da chamada espuma dos dias… Recordou-me os tempos em que eu ia juntando os trocos para os trocar por edições baratas de capa mole. Hoje eles ainda lá estão vivos na estante, apesar de não muito vistosos e com o papel já muito amarelado.

A escolha recaiu sobre um autor até agora virgem para mim: Machado de Assis e o seu “Dom Casmurro”. A sua função “biblo” na estante não será grande coisa, mas também não foi caro. No fundamental, ufa…! Que bela surpresa e que excelente história tão bem escrita. Uma das coisas boas deste mundo é haver sempre algo extraordinariamente bom, pronto a nos surpreender (desde que não nos baralhemos com o aspeto das capas).

05 novembro 2015

“O que a noite nos fez em muitos anos“

A passadeira mediática é bastante estreita. Não comporta um único tema de cada vez, mas pouco menos. Esse tema pode ser um cataclismo algures, um escândalo qualquer ou simplesmente um ministro visto com as meias rotas. O certo é que, num dado momento, há um tema quente em destaque, sobre o qual muito se fala e comenta, até ser substituído pelo seguinte. Há quem fale na espuma dos dias, mas, reconheçamos, muitas vezes é mais uma lama revolta que nos turva a visão e distrai, impedindo-nos de apreciar outros valores mais perenes.


E, por vezes, há uma morte, em geral não planeada, que brevemente faz subir à ribalta uma pessoa e uma obra meritosa, até aí obscurecida por essa lama dos dias. Recentemente, foi o caso de Fonseca e Costa, que me fez recordar o filme “Sem sombra de pecado” e o argumento do mesmo de David Mourão Ferreira.

Há muitos anos, ao cheirar livros numa livraria, abri uma antologia poética dele e fui atingido por uma frase: "Olhar de frente o Sol. Assim se aprendem as letras iniciais da Solidão”. Não o larguei mais e trouxe-o para casa, para me deliciar com aquela escrita tão bonita. “Desejei-te pinheiro à beira-mar, para fixar o teu perfil exacto”.

Talvez muitos o tenham apreciado, sem saber, cantado, mas respirar lentamente a sua obra escrita em papel é um exercício de elevação, como “ ... por vezes fingimos que lembramos, e por vezes lembramos que por vezes, ao tomarmos o gosto aos oceanos, só o sarro das noites, não dos meses , lá no fundo dos copos encontramos”.

04 novembro 2015

Esta quarta via…

Entre a saída da cena mediática de Varoufakis e a entrada fulgurante de A. Costa, poucos deram atenção à chegada do Sr. Corbyn à liderança do Partido Trabalhista Britânico, apesar de este anunciar a intenção de taxar pesadamente os bancos, renacionalizar os caminhos-de-ferro, sair da NATO e outras excentricidades. De realçar que isto não ocorre num país mediterrânico de calores e fulgores.

Quem alimenta e acredita mesmo nesta esquerda neomarxista, uma espécie de “quarta via”, que mais parece um baralhar e tornar a dar uma das antigas, já expirada? Estarão as classes trabalhadoras a pedir um ataque cerrado ao capital e renacionalizações? Não me parece. Uma boa parte sabe que o capital é necessário para criar riqueza e emprego e terão até mais aversão a políticos corruptos e incompetentes do que a patrões.

Afincadamente e assumidamente neste registo, vejo aqueles teóricos, que, do alto das suas torres de marfim, especulam sobre as dinâmicas sociais, sem nunca terem pisado as pedras da calçada. Pretendem tudo entender e assumem uma missão superior de mostrar o caminho ao povo, mas sem este chegar muito perto, pode cheirar mal…

Algum apoio de base irão busca-lo aos desiludidos, indignados, chocados com a falta de perspetivas e as enormes injustiças no mundo. É perfeitamente legítima e justificada essa vontade, pedindo-se novos políticos, mais do que novas políticas. No entanto, não é necessário, nem eficaz que os novos políticos (ou os antigos recauchutados) se queiram diferenciar pela radicalização. Faz-me lembrar aqueles que, quando são sabem bem o que fazer, desatam à patada. Este discurso não passa, pois, de uma perigosa deriva populista. A metamorfose do Syriza já veio provar os limites dessa suposta quarta via. As patadas deixam marcas e pobres daqueles que as acham virtuosas.

02 novembro 2015

E aos costumes disse nada

Em memória de José Fonseca e Costa, evoco o filme “Sem sombra de pecado”, que tive a oportunidade de ver na altura do lançamento em sala. Um belo filme que nem parecia cinema português, pelo menos dentro dos padrões da altura. Imaginem que até se ouvia e entendia perfeitamente o que os atores diziam, contrariamente à “tradição”, que tornava quase necessário utilizar legendas.

Um bom filme que se via agradavelmente, numa altura em que um filme português ser bom equivalia a ser denso, a mais não poder. Se o povo não achasse chato, era comercial e não prestava.

Este filme, “comercial”, tecnicamente cuidado e bem feito, tinha um enredo em cima de um belo conto de David Mourão Ferreira, que não escrevia nada mal: “E aos costumes disse nada”. O elenco incluía Mário Viegas, sobre quem nem vale a pena procurar muitas palavras para o adjetivar: brilhante e genial.

Na altura, não tinha visto o “Kilas”, anterior, eventualmente mais representativo. Para mim, foi com este e com José Fonseca Costa que entendi ser possível fazer cinema de qualidade em Portugal, sem aquele peso elitista e a poder ser visto e apreciado por um público alargado.


Nota adicional em 4/11/2015. Após este texto ter saído no Público de 3/11/2015, recebi uma mensagem do amigo Fernando Rodrigues, assinalando-me a injustiça de não ter mencionado também Vitória Abril, que tem uma interpretação magnífica. Ele tem toda a razão e aqui fica a referência que faltava.

01 novembro 2015

Arcozelo à lupa

O processo começa em 1985, quando no âmbito do FACA se realizou e expôs um levantamento fotográfico da freguesia. Findo o evento, as fotografias foram colocadas dentro de um grande e sólido saco plástico e aí hibernaram.

Reencontradas mais tarde, pediam o desafio de comparar o Arcozelo de 1985 com o de hoje. O primeiro objetivo era repassar os mesmos locais, 30 anos depois. A leitura das fotos de 85, nessa perspetiva, levantou algumas questões. Para locais que mudaram de função, manter o local ou a função; para quem já não está, recordar a obra ou procurar novos saberes?

O passo seguinte foi ler as fotos e agrega-las por temas. O mar, a terra (agricultura), a fé, os ambientes, o emprego, as coletividades, as infraestruturas e os saberes. A partir daqui, tornou-se mais fácil definir a nova leitura desses temas.

A freguesia foi dividida em 14 zonas e, durante 41 horas, palmilhei ruas, esquinas, becos e campos. Todo o tipo de caminhos e até mesmo onde não os havia. Fui registando o planeado e acrescentando o que me ia falando, durante essas andanças. Ou porque estava igual ao que a minha memória sempre recordara, ou pela precaridade pressentida, ou, claramente, pela transformação, por vezes brutal, constatada. Outros olhares certamente destacariam outras coisas, diferentes.

A fase dos exteriores está concluída. Do que está feito falta analisar, classificar, retocar e repetir o que for necessário. O capítulo dos “saberes” ainda tem um bom bocado para andar...

28 outubro 2015

Cheira mal

O senhor José Sócrates cheira mal. Vamos esquecer, por agora, o enquadramento jurídico estrito, dado que ainda não foi julgado e, até lá, beneficia da presunção da inocência.

No entanto, para um ex-político, e supostamente até de esquerda, é obsceno o nível de vida por ele praticado, ainda por cima às custas de um amigo que, se empresta dinheiro assim, deveria a família solicitar a sua inabilitação imediata.

Foi o senhor testar os seus dotes oratórios e galvanizadores de audiência a Vila Velha do Rodão, fazendo-se prazenteiramente acompanhar pelo diretor de um dos principais jornais nacionais, concretamente Afonso Camões do JN, e queixou-se da existência de um “poder oculto”, envolvendo alguns jornalistas. Certamente Afonso Camões, o tal que, quando ainda estava na Lusa, teve o cuidado de o avisar de que estava a ser investigado não faz parte desse grupo.

A sua defesa conseguiu rapidamente proibir o grupo Cofina de publicar notícias (explosivas) recorrendo a elementos do processo. Formalmente está certo, mas há aqui um detalhe a evidenciar. De acordo com o discurso anterior do “não há nada”, seria mais previsível uma acusação de difamação.

Tudo isto cheira tão mal, que nem dá vontade de chegar perto. Não tenho nenhuma simpatia pelo Correio da Manhã, mas o país tem o direito de conhecer os detalhes do modo de vida de um seu ex-primeiro ministro, sobretudo quando eles parecem tão desproporcionados face aos rendimentos previsíveis.

Seria bom e muito higiénico que todos os socialistas sérios tivessem a dignidade de fugirem à abordagem clubística desta vergonha e privilegiassem a primazia dos princípios.

25 outubro 2015

Uma ficção

O PS apresentou-se às eleições em coligação com a CDU e o BE. Foram os mais votados mas sem maioria absoluta. A PAF ficou em segundo lugar e o PNR teve um resultado surpreendente. Passos Coelho diz ao PR que tem um acordo com o PNR para um governo com maioria parlamentar.


O PR, que é Manuel Alegre, não considera esta alternativa e indigita António Costa, como sempre se fez em 40 anos do regime atual. Aproveita para assinalar que dificilmente aceitará um governo onde existam partidos incompatíveis com os seus princípios.

É certo que Manuel Alegre tem uma voz mais bonita do que Cavaco Silva, mas, centrando-nos nos princípios, aqueles que hoje apedrejam Cavaco Silva, que diriam neste cenário hipotético? Criticariam também a atitude de Manuel Alegre, ou aplaudiriam (os meus radicais são mais fofinhos do que os teus)? Neste caso, estão a agir não por princípio, mas por interesse. Não são coerentes, pois não!

PS: Relativamente a este acordo de esquerda, até agora só ouvimos medidas de aumento da despesa pública. Logo que possível, por favor expliquem as parcelas previstas para o outro lado do livro contabilístico.


Imagem do DN

22 outubro 2015

Um novo cartapaço?

Uma das imagens que me ficou gravada da recente campanha foi, durante o debate com P. Coelho, A. Costa ter aberto a pasta e sacado um grande caderno de folhas A3, onde, supostamente, estava tudo rigorosa e completamente demonstrado! Questionado sobre a credibilidade do seu modelo, A. Costa afirmava grave e sentencioso que estava tudo naquele cartapaço, bem calculado e bem justificado por um punhado de sábios.

Quando ouço as concessões feitas para viabilizar o tal governo da esquerda, incluindo a questão da TSU que, independentemente do seu real efeito, era a pedra de toque e a originalidade principal do tal tratado, fico com a ideia de que uma boa parte daquelas folhas sagradas devem estar boas é para ir para o lixo.

Após aceitar tudo o que aceitou, este PS ainda consegue fazer um novo cartapaço científico, ou é: vamos para o governo e logo se verá!


Imagem do JN

19 outubro 2015

Por uma vez

O cenário atual na Síria é extraordinariamente confuso. Temos 4 fações principais no terreno (regime, Estado Islâmico, Curdos e outros rebeldes) e 5 frentes de influência externa (Turquia, Rússia, Irão, Monarquias do Golfo e Ocidente), sem estes atores estarem até agora claramente agregados (por simplificação, até nem separo Ocidente em EUA e Europa…).

A intervenção direta musculada da Rússia veio trazer mais bombas e mais mortes, certamente. Veio também baralhar a visão do conflito para aqueles que gostam de ver as coisas simplificadas, perdoando ou condenando os USA ou a Rússia, conforme a sua simpatia, mas acaba por forçar uma clarificação do que cada um quer mesmo ver no final, resultando dois blocos.

A Rússia e o Irão querem o regime atual e combatem o Estado Islâmico e os outros rebeldes; o Ocidente, Golfo e Turquia querem os outros rebeldes e combatem o Estado Islâmico e o regime.

Independentemente do vencedor final, provavelmente o Estado Islâmico recuará até ao Iraque, que continuará o caos que conhecemos desde há 12 anos, e os curdos poderão ter o mesmo destino de outros levantamentos. Vêm à luta com empenho e valor e, no fim, recuam escorraçados…

Como os outros rebeldes são Al-Qaedas e afins, tenho muitas dúvidas se uma Síria por eles “governada” venha a ser muito diferente da atual Líbia. Com todos os defeitos do regime de Bashar Al Assad é preferível deixá-lo a governar e ir pressionando a mudança do que desestruturar o/outro país.

16 outubro 2015

O país não é um chupa-chupa!

Não têm faltado, por estes dias, excitantes reuniões e surpreendentes evoluções. Só para dar dois exemplos: o PC deixou de ser contra a NATO (o CPPC já desmarcou as manifestações de protesto contra os imperialistas sanguinários?) e o BE deixou de exigir a revisão unilateral da dívida. Para lá de uma tentativa egoísta para salvar a pele de Antónimo de Simesmo Costa, esta “pan-esquerda” pouco mais tem em comum do que a vontade de impedir a direita de governar. Poderá funcionar, mas apenas a curto prazo. Não é cola suficiente para governar o país, que precisa mesmo de ser governado, com rumo, competência e seriedade.

Gostaria de realçar que estou nos 50 anos e a minha principal inquietação não é o risco de a minha futura reforma reduzir 10 ou 20%, ou de vir a trabalhar mais 3 ou 5 anos. Estou preocupado, isso sim, com os meus filhos e todos os demais dos 20 anos, para quem o cenário é assustadoramente negro. Convém recordar que criar empregos e riqueza leva tempo e precisa de empreendedores num ambiente político, fiscal e social estável.

Senhores políticos excitados e sedentos de poder: já chega! Os portugueses que trabalham, querem e precisam de trabalhar exigem que se concentrem no fundamental! Portugal não é um simples chupa-chupa, sobre o qual os senhores disputam o direito de chupar.

15 outubro 2015

Memórias de um violeiro


“A primeira sensação é incómoda: a marcha inexorável do tempo tudo separa da vida e aquela quase é uma quase ruína total e memória perdendo-se. Ausentes as pessoas, as pedras e as madeiras rendem-se ao desabamento tão iminente como inevitável. Adivinhando-o, não há gato ou lagartixa que se atreva a percorrer o que foi outrora um soalho...

13 outubro 2015

Boa viagem na Air France

No passado dia 5, foi notícia a imagem dos dirigentes da Air France em fuga com as camisas rasgadas, depois de serem atacados por empregados furiosos, após estes terem conhecimento de um “plano social”, que incluía a supressão de quase 3000 postos de trabalho.

Os sindicatos lamentam, mas compreendem; ao fim e ao cabo a supressão de postos de trabalho é também uma violência; quem semeia ventos, colhe tempestades, etc.. Consideram a interpelação posteriormente feita pela polícia aos agressores como uma intimidação ao movimento sindical e até fizeram um sketch cómico sobre o assunto que a imagem acima documenta.

Ora bem, eu viajo regularmente, muitas vezes em rotas operadas também pela Air France, e já não me recordo da última vez que entrei num avião deles. Por uma razão simples: escolho a opção viável mais barata e a Air France está sempre fora de preço. Entretanto, a empresa perde dinheiro e afunda-se. Este mundo está a mudar e esta intransigência social não augura nada de bom. Uma parte do último prejuízo foi devido à greve dos pilotos, em contestação contra o desenvolvimento da filial low cost do grupo.

Portanto, podem continuar a ficar chocados, a ironizar e a compreender tudo e mais alguma coisa, mas, se nada mudar, o mais provável é acabarem todos sem camisa.

O bloco que ganhou as eleições?


Atualizei o quadro anterior, que estava com a base numa leitura pré-eleitoral. Nestes dias de grandes evoluções impõe-se uma atualização. Há mais cores. Aparecem por ali uns amarelos, com toda a pinta de temporários. Para já está bem, o fundamental é impedir a direita de governar; no futuro logo se verá.

Esta agregação da tal esquerda, exigindo tantas demãos de pintura, tem efetivamente uma motivação principal: impedir o PSD / CDS de governarem. Com todo o respeito pela democracia representativa, este alinhamento da tal esquerda parece-me colado com cuspo. Se o PC anda há décadas a barafustar contra a NATO, é agora em duas semanas que muda a sua posição? E logo o PC, que não tem muitos genes de evolução no seu ADN!

Nem de propósito, no mesmo dia em que A. Costa garante ao PR que a CDU aceita a manutenção na NATO, o CPPC, seu satélite, anuncia uma manifestação contra as manobras desses imperialistas sanguinários no nosso território. Afinal como é?

O ódio nunca foi conselheiro e esta nova coligação, agregada no ódio à direita é negativa demais para ser séria. Sem esquecer que uma parte significativa do eleitorado do PS não se revê certamente neste aventura. Por favor parem esse senhor antes que ele parta o partido de vez.

Há uma expressão em inglês: “King Maker”, de que desconheço a tradução. Num cenário com duas forças importantes mas não maioritárias, é o apoio do terceiro que vai determinar quem passa – o tal “king maker”. A. Costa ainda não entendeu que está a fazer apenas figura de “king maker”?

12 outubro 2015

Justino Ferreira Couto




Um violeiro da minha terra.

Justino Ferreira Couto
Arcozelo, Vila Nova de Gaia
25/09/1909 - 10/08/2002


O “pai” do meu cavaquinho, um da sua última série de trabalhos em 1985.


Com um agradecimento ao Joaquim Fernandes (V2), quem na altura proporcionou, acompanhou e acarinhou esta sua última empreitada.

Fotos de Alberto Afonso, no âmbito do levantamento fotográfico da freguesia realizado pa
ra o FACA85 pela Rusga de Arcozelo.



E continua para aqui

09 outubro 2015

Para lá da Pasokização

Leio que alguns responsáveis do PS estão preocupados com o cenário da “Pasokização” do partido: o seu quase desaparecimento eleitoral por transferência para a extrema-esquerda. Para evitar este cenário grego, há uns jovens turcos a defender um posicionamento do partido mais vincado à esquerda, acompanhando/antecipando a evolução do eleitorado.

Eu acho que aqui há um erro de leitura. Na Europa, a transferência de votos dos partidos tradicionais para os extremos têm como razão principal a prática dos partidos no poder e não a sua ideologia. Por isso, o PS e os outros deveriam olhar prioritariamente para a sua prática: rigor, competência e seriedade, antes de questionarem a cartilha.

Ao subir à tribuna e ao apresentar um discurso próximo do Bloco de Esquerda, o PS acabou por caucionar o extremismo e o populismo do “não à austeridade” sem uma visão responsável das contas públicas. Entre o PS e o BE aparentemente próximos (e esta proximidade é na tribuna, não no programa concreto), uma boa parte do eleitorado escolheu o segundo, até agora não contaminado por más práticas.

Temos, portanto, um fenómeno novo a que chamo “pesseguização”. Consiste em perder eleitorado, mesmo estando numa fácil oposição. Ao tentar, publicamente, ir a jogo em todos os tabuleiros, A. Costa continua a “pesseguizar”…!

07 outubro 2015

The Musical Box

E não é que me faltava este :


Para acrescentar a estes: 


E de certa forma também a estes


Para a caixa de música ficar completa !!

05 outubro 2015

Tudo isto é esquerda…

Possivelmente alguém irá chamar-me besta, estúpido ou ignorante. Irei tentar não insultar ninguém e fugir das etiquetas, até porque, para mim, há muito tempo que os partidos não são campo de afetos ou simpatias. Acho curiosa esta constatação de a “Esquerda” ter ganho. É relativamente habitual que, traçando uma linha de separação entre o PS e o PSD, fiquem mais votos do lado da tal esquerda. Mas qual a coincidência política entre PS, CDU e BE? Menos do que entre o PS e o PSD, sem dúvida. Basta pensar na Europa para verificar que essa “Esquerda” inclui divergências fundamentais significativas.

Para governar, todas as coligações são boas? Que se diria se o PNR tivesse alguns deputados e a PAF os fosse buscar para viabilizar o orçamento ou participarem no governo?! Este aparte serve também para saudar a resistência que o eleitorado tem mostrado à penetração da extrema-direita.

Podemos dizer que o traço comum dessa grande esquerda é a “recusa da austeridade”? Como a aventura Syriza demonstrou, não basta ser contra, é também preciso dinheiro para pagar as contas, os reformados e os funcionários públicos. O PS acha que esse dinheiro chega com uns pozinhos de perlimpimpim no consumo, um modelo que nunca vimos funcionar, a CDU pede nacionalizações e parece que ainda não se conseguiu bem redefinir depois da falência do modelo soviético, o BE começa com a renegociação da dívida e a eventual saída do Euro. Tudo isto é esquerda, tudo isto é fado! E podem chamar-me de direita, mas não é verdade!

01 outubro 2015

Já se terá visto uma guerra assim?

Segundo alguns especialistas, o que agora se chama “Estado Islâmico” tem na sua génese a resistência iraquiana à invasão americana e ao regime posteriormente instalado de influência xiita, que sempre foi ignorado e não reconhecido pelos sunitas. Se bem nos recordamos, os atentados suicidas e outras barbaridades nunca desapareceram do Iraque. A novidade estará agora na “imagem”, na forma cuidada e provocatória como eles divulgam e promovem as suas ações, supostamente com o objetivo de chamar os infleis ao terreno e os derrotarem como os talibãs fizeram no Afeganistão. A pobre Síria foi apanhada como um campo de batalha adicional, na sequência da contestação nascida na sua “primavera”, prontamente confiscada pelas potências regionais. Não faltam inimigos declarados ao EI, mas esta oposição é um pouco desalinhada.

A imagem acima, se bem que não atualizada, a situação é dinâmica, dá uma ideia de como o país está dividido e é disputado entre: o regime de Bashal Al Assad a vermelho; o EI, a preto; os “rebeldes” (principalmente o Al Qaeda local), a verde e os curdos a amarelo. As monarquias sunitas do golfo, mais de que contra o EI etsão contra o regime.

A Turquia é contra o regime e intervém militarmente, um pouco contra o EI e muito contra os curdos. O ocidente é moderadamente contra o regime, intervém principalmente contra o EI e até tenta/tentou ajudar uns “bons rebeldes”. O Irão apoia o regime e intervém contra o EI e um pouco contra os outros rebeldes. A Rússia é a favor do regime e, entrando agora na guerra, diz atacar o EI mas na prática está a atacar os rebeldes geograficamente mais próximos de Damasco (aquela ilha verde em Homs, entre Damasco e a costa).

Para o Irão e a Rússia, o futuro passa pela manutenção do regime, para as monarquias do golfo e a Turquia, passa pela sua deposição, o Ocidente não tem ideias claras… Dá para entender que isto não se resolverá amanhã e, entretanto, as bombas continuam a cair
.

Costa afasta-se de Sócrates


Leio com destaque e realce na crónica da campanha que A. Costa anunciou romper de vez com o PS de J. Sócrates. Não 4 meses nem 4 semanas antes das eleições, mas 4 dias… Terá encontrado um momento de reflexão no bulício desta ponta final para refletir no assunto e tomar tal decisão? Penso que não. Apenas achou que isso lhe trazia votos e, vai daí, “Estamos nessa!”.

Se alguém o convencer que dar duas voltinhas de joelhos ao Santuário de Fátima lhe dará os 10% que faltam… ele já vai a caminho da Cova da Iria!

E aqui está o problema deste A. Costa. Tem uma coluna vertebral pouco definida…

Outra curiosidade: não tenho nenhuma simpatia por Paulo Portas, muito pelo contrário, até tenho bastante antipatia, mas, para isso, pouco me conta a opinião sobre ele dos seus progenitores. Este mundo está mesmo do avesso. No meu tempo, era betinho quem não discordava dos pais; agora temos malta de esquerda a zurzir num político de direita, usando o argumento de este não ter o apoio dos papás…!?


Foto retirada do site do Expresso

29 setembro 2015

Em jeito de prognóstico


Depois de 4 anos duríssimos, plenos de medidas impopulares, era previsível o poder cair no colo do PS, quase sem esforço. Aparentemente não será assim e parece claro que António Costa perderá as eleições.

Pode ser uma lição e um sinal de maturidade acrescida dos eleitores. Aqueles excitados que criticavam A.J. Seguro, talvez entendam agora que há uma diferença entre o que aparelho adora e o que o eleitorado aprecia. A. Costa foi dizendo e ajustando o que dizia, conforme achava necessário para ganhar as eleições e não convenceu.

Se tivesse dito: “não queremos castigar mais os contribuintes e pensionistas, vamos reduzir a despesa pública”, enunciando medidas concretas e sérias de reforma do aparelho do estado, teria tido o benefício da dúvida. “Não vamos tirar nada a ninguém e o dinheiro há-de aparecer, está tudo aqui neste cartapaço de folhas A3, que espeto no nariz de quem não acredita…“ não convence… Eu, por exemplo, não entendo como reduzir as contribuições para a segurança social, e deixar mais dinheiro no bolso do pessoal, é virtuoso quando proposto pelo PS, porque gera crescimento e, ao mesmo tempo, pernicioso quando é proposto pela PaF, porque irá promover a especulação financeira.

Lamento que a coligação vá assim ganhar, sem precisar de grande esforço de correção, nem da humildade associada. Limita-se a anunciar meia dúzia de medidas simpáticas e a apontar as areias movediças por onde o PS resolveu caminhar.


Nota: imagem retirada de uma reportagem de campanha, com uma sequência de pulos de A. Costa... ele bem tenta subir, mas o efeito não é o ideal !

27 setembro 2015

Para lá da Síria


Quando se ouve falar na questão dos refugiados Sírios, parece que apenas existe guerra nesse país, mas não é o caso. Olhando unicamente para as proximidades da bacia mediterrânica, há guerra mais ou menos convencional na Síria, Iraque, Iémen, Sudão Norte x Sul, Israel x Palestina. Há golpes de estado violentos não estabilizados na República Centro Africana e Burkina Fasso (por agora). Há guerrilhas muito ativas e violentas na Somália, já passando ao Quénia, na Nigéria, já passando aos Camarões e ao Chad, na Líbia, no Sinai, no Mali, no Niger, Afeganistão e Paquistão. Regimes particularmente violentos e desrespeitadores dos direitos humanos na Eritreia, Burundi… e fico por aqui, dado que já estou a sair do mapa. Será mais curto, e mais difícil, enumerar os países em que existe segurança e um mínimo de condições de vida para a generalidade da população.

Vamos trazer os habitantes destes países problemáticos para a Europa? Só na Nigéria são 170 milhões. Sem desenvolver a ironia de serem necessários muitos monovolumes para ir buscar essa gente toda, é obvio que não!

23 setembro 2015

Ambiente de negócios

Quando em 1976 o Concorde iniciou os seus voos comerciais, foi proibido de aterrar nos EUA por questões ambientais. Curiosa a sensibilidade para o tema neste país, que, por coincidência, não tinha conseguido pôr a operar o Boeing SST, o seu avião comercial supersónico.

Na Europa, bastante sensível ao custo dos combustíveis, cerca de metade dos automóveis são “diesel”, um tipo de motorização praticamente ignorado pelos construtores americanos. Por coincidência, os limites de emissões permitidas para estes motores são muito mais apertadas nos EUA do que na Europa.

Se alguns construtores europeus conseguiram cumprir essa norma, a VW resolveu aldrabar. Instalou um sistema que detetava a situação de laboratório para alterar a gestão do motor e reduzir as emissões, apenas nessa fase. Enganar mais de 400 000 consumidores e uma agência governamental, e logo nos EUA, foi uma temeridade que vai custar muito, muito caro.

Os condutores que acham que o seu veículo consome mais do que o anunciado pelas marcas, podem também registar que não são casos únicos e que a tendência é piorar. É curiosa a evolução desse desvio no estudo “From Laboraty to Road” do ICCT de Setembro 2014: de 8% em 2001 para 38% em 2013. Considerando que os hábitos de condução não mudaram significativamente, os valores anunciados estarão cada vez mais otimistas… e irrealistas.

O impacto ambiental do automóvel é demasiado relevante para ficar à mercê de manipulações. Este escândalo da VW é demasiado grave para morrer no castigo de meia dúzia de engenheiros. Será suficiente para abalar e modificar a cultura desonesta que o permitiu…?