17 julho 2021

Mau ambiente


Escassas semanas após o atropelamento mortal de um trabalhador numa autoestrada pela viatura de um ministro, em circunstâncias ainda objeto de inquérito (que demora a ver se esquece?), mas onde a velocidade parece ter sido tudo menos razoável…

Escassas semanas depois, outro ministro é apanhado a circular alegremente a 160 km/h em estrada nacional e a 200 km/h em autoestrada.

Inquirido sobre o fato, o ministro afirma não ter “qualquer memória de os factos relatados terem sucedido”. É preciso ter muita insensibilidade/amnésia para não se aperceber/recordar de circular a 160 km/h numa estrada nacional. E, se isso aconteceu, não lhe ocorreu ir inquirir o motorista? Não lhe ocorreu esclarecer se havia motivos válidos para a pressa? Não lhe ocorreu que em termos de impacto ambiental, o seu pelouro, não é bom exemplo?  Apenas lhe ocorreu dizer que vai “estar mais atento”. Nós continuamos calmos e serenos e eles continuam a queixarem-se do crescimento dos populismos.

14 julho 2021

A Cresap, escolher ou não escolher


No que seria digno da mais bananeira das repúblicas, leio que numa enorme maioria dos processos de seleção para cargos superiores na função pública é escolhido o previamente escolhido, que ocupava já o lugar provisoriamente, em regime de substituição, sem concurso, sendo que a experiência acumulada nesse período é determinante para ficar em primeiro lugar na avaliação. A sério, não há um mínimo de vergonha nem de decência?

Tenho uma sugestão. Porque não impedir a candidatura a quem ocupou o cargo interinamente, por nomeação, sem escrutínio nem avaliação aberta? Parece-me uma eficaz forma de cortar o mal pela raiz. Haja vontade! Há vontade? O crescimento dos populismos é um problema?

13 julho 2021

Florentino Ariza


Quis o azar ou a sorte que um destes dias me tenha passado à frente dos olhos uma versão cinematográfica do “Amor nos tempos de cólera” do imortal Garcia Marquez, um dos destaques da minha biblioteca, um daqueles autores que cabe nos dedos de uma mão do topo das minhas preferências.

O filme, entendo que bem feito e agradável de ver, não transmite a intensidade, a exuberância e o génio narrativo de Gabo, mas isso seria provavelmente missão impossível. O enredo está lá e no final reencontramos algo de único e de todos na figura de Florentino Ariza, que espera determinado mais de 50 anos para atingir o seu sonho, neste caso o amor de Fermina.

Acho que um bom livro se pode ler de trás para a frente e também, por vezes, para o lado. E esta determinação em atingir algo, custe o que custar, demore o que tive que demorar é um desígnio que pode não ser exclusivo do amor. Recordo-me, por exemplo, do Quixotesco “sonhar o sonho impossível” de Jacques Brel, não desconsiderando obviamente o original cavaleiro da triste figura.

Será patético e absurdo passar a vida na esperança de um improvável que apenas parece viável ao próprio? Será um desperdício? Talvez sim, talvez não. A ânsia e a busca da beleza, da verdade, da perfeição são uma excelente melodia para o despertador matinal.

Se para a persistência resultar e se atingir o supremo desígnio, é necessário declarar uma situação de cólera e colocar um pequeno mundo em quarentena é outra questão. Há doenças e doenças.

11 julho 2021

Que grande surpresa, quem diria!?


O futebol profissional, tendo como base uma modalidade desportiva, é hoje um espetáculo que faz mover muitos milhões de fundos de forma pouco transparente, para lá do deprimente nível dos debates que proporciona. Para quem estiver minimamente atento, não faltam indícios de falta de higiene no meio, em diversas latitudes e várias cores de camisola.

Dificilmente os problemas de Luis Filipe Vieira com a justiça podem ser uma grande surpresa, atendendo ao meio em geral e ao personagem em particular. Até um marciano com escassas semanas de permanência no planeta não se espantaria. Infelizmente a tentação de aparecer na tribuna deste circo, qual imperador romano, parece levar o discernimento de alguns políticos abaixo do de um marciano recém-chegado.

Algo de novo neste processo é confirmar-se que o Novo Banco não foi assim tão novo de espírito, herdando muitos defeitos do seu progenitor, para mal da nossa saúde económica.

Para quem sabe quando a vida custa, estes milhões tresmalhados escandalizam e revoltam. Não se sai daqui com um “bola para a frente”, será necessário antes um “bola fora”. Fiscalizem eficazmente as origens e os circuitos desses milhões e depois talvez volte a haver desporto.

08 julho 2021

Essa coisa da transição energética e da energia limpa


A chamada transição energética está eleita como um grande desígnio estratégico para a sustentabilidade do planeta, entrou em inúmeras agendas e ganhou foro de título de ministério. De forma indiscutível, do lado errado da imagem está a produção de energia elétrica a partir de combustíveis fosseis, geradores de CO2, não renováveis e do lado correto estão as energias renováveis: hídricas, eólicas, solares e algo mais…

Na transposição deste contexto para Portugal, produzimos cerca de 2/3 do lado bom e 1/3 do lado mau. Será necessário reduzir de 1/3 o consumo total ou aumentar em 50% o lado bom.

Para a Europa, há uma diferença importante. Em grandes números, o lado bom é 1/3; o lado mau outro 1/3 e o 1/3 que falta … é a energia nuclear. Sendo certo que o nuclear não produz CO2, não é certamente renovável e é preciso bastante boa vontade para a considerar uma energia limpa. Haverá um cenário em que o nuclear é bom, equivalente ao português 2/3 bom – 1/3 mau e outro em que o nuclear é mau e deve sair. Neste caso a Europa está a muitas milhas (KWh) de fazer uma transição energética para energias limpas, mesmo limpas.

Curiosamente não vejo claramente assumido qual o cenário oficial em vigor, mas se pensarmos que, por exemplo, em França, o nuclear representa 70% da produção de eletricidade, está bom de ver de que lado ele vai cair…

Entretanto, conta-se ao pessoal que para salvar os ursos polares, basta comprar um SUV de potencia, peso e consumo acima do “necessário para as necessidades”, independentemente da fonte de energia que o faz mover e da forma como é utilizado. Obviamente que a sustentabilidade do planeta passa por outra atitude. 

06 julho 2021

Entre peão, cavalo e rei


Os problemas que Joe Berardo está a encontrar com a justiça, fazem suspirar um “mais vale tarde do que nunca”. Poucos terão simpatia pelo senhor, especialmente depois da arrogância que ele demonstrou.

Ele está a ser questionado, se bem entendo, pelas formas “ardilosas” com que se esquivou a responder pelos empréstimos recebidos. Aqui estará a questão penal. No entanto, esta história, desde a sua génese, é uma crónica de uns calotes anunciados, dentro de um jogo de xadrez onde ele não foi simples peão, também não foi o rei, eventualmente cavalo.

Não vale a pena reenumerar a falta de razoabilidade económica e o risco inaceitável destes empréstimos da CGD, feitos a ele e a outros cavalos, para controlo do BCP. Um empréstimo normal assenta em garantias sólidas e tem subjacente uma rentabilidade que permita o reembolso com juros. É absurdo imaginar as ações do BCP na altura a cumprirem as duas condições.

O que é certo é que este jogo de xadrez custou milhares de milhões de euros ao contribuinte, estupidamente assim queimados, em vez de terem contribuído para financiar criação de riqueza.

Este jogo de xadrez teve um rei, José Sócrates, que não resistiu politicamente ao descalabro; penalmente ainda estamos para ver. De resto, os seus bispos e torres ainda por cá andam em funções e sobre estes desmandos e desastres nada fizeram, nada viram.

Se hoje já podemos ir ao banco, seria bom que o resultado fosse diferente.

04 julho 2021

Diferenças culturais


Em março de 2017 esta imagem corria mundo, onde um deputado inglês tenta com as suas próprias mãos salvar a vida de um polícia apunhalado num atentado, num cenário não isento de perigo. Toda a gente achou muito bem.

Em junho de 2021, noutro país, noutra cultura, um ministro está envolvido num acidente mortal, com eventual responsabilidade indireta mesma, caso a velocidade tenha sido determinante e tenha sido ele a solicitá-la. Esconde-se, pede ao staff para enviar as suas condolências à família e atira a culpa para a vítima. Duas semanas depois recusa-se a precisar a velocidade a que circulava. Toda a gente achou mal?... Alto! Antes demais depende da coincidência da cor política do senhor com a de quem avalia. 

Diferenças culturais, que naturalmente se refletem noutras diferenças de desenvolvimento

02 julho 2021

Uma certa (falta de) cultura


A forma como quem nos governa está a tratar a questão do atropelamento mortal de um trabalhador na A6 pelo veículo onde seguia o ministro da Administração Interna é sintomático da falta de cultura de responsabilização que por aqui grassa.

Trata-se de uma viatura do Estado e em deslocação oficial. O mais elementar respeito pelos cidadãos em geral e pela vítima em particular obrigaria a uma imediata e completa clarificação. A que velocidade circulava, porquê eventualmente acima dos limites legais, havia ou não sinalização. Nunca deveríamos estar ainda hoje a especular sobre o que se passou, a partir de uma primeira reação telegráfica e desresponsabilizadora de que não havia sinalização de trabalhos e a culpa seria do trabalhador que se colocou à frente do carro.

Não é coisa rara ver passar uns veículos importantes, de pirilampo excitado. Os senhores VIP não conseguem organizar as suas agendas e deslocarem-se dentro dos limites legais e de segurança, como um normal cidadão é obrigado a fazer?  Precisam de circular como se fossem socorrer uma vítima urgente … ou provocá-la?

E enquanto acharmos que a avaliação de uma situação destas entra dentro de uma lógica tribal, dependendo da cor do ministro e não de Responsabilidade Cívica e Política… continuaremos subdesenvolvidos e eles continuarão a rir, independentemente da cor em causa.