26 novembro 2010

Oportunismo ?

Ontem, 25 de Novembro, assisti à primeira sessão da segunda série dos “Encontros com a Ciência”, organizados pela Universidade do Porto, sob o tema “Sociedade e Valores”, com dois eminentes convidados, Dom José Policarpo e António Barreto.

O cardeal-patriarca fez uma comunicação brilhante e incisiva, que não quero nem consigo resumir. Um dos pontos referidos foi a relação/interdependência/ identificação do individuo com a comunidade através dos valores, e, por muito que se diga e conteste, a Igreja tem uma marca fortíssima nesse capítulo.

No período das interpelações resolvi questioná-lo sobre a forma como a igreja encarava e assumia a influência dos seus valores, sob a comunidade em geral, não crente. Apontei concretamente o Natal aí a chegar, que constitui uma marca social fortíssima, e como a Igreja via e assumia essa universalidade versus aquelas posturas de restringir o Natal à sua componente religiosa básica e criticar todas visões mais abertas do acontecimento. Como introdução referi que eu próprio me definia simplesmente como agnóstico até ter uma experiência de vida noutra cultura, após a qual me passei a considerar agnóstico de matriz cultural cristã.

O microfone funcionava mal e o cardeal também não estava a ouvir muito bem. Não me pediu para repetir o que tinha perguntado. Apenas pegou no “agnóstico de matriz cultural cristã” para dizer que:
  • Eu era um dos muitos que sem esforço e sem compromisso se aproveitavam do trabalho de poucos
  • Se eu sabia o que era ser agnóstico que, ao contrário do ateu que nega, não se manifesta declaradamente num sentido ou noutro e ...
  • Com o tempo o agnóstico, indeciso, tende a “cair” para um lado ou para outro
De facto, não respondeu directamente à questão colocada, mas acabei por ter a resposta de forma indirecta. Curiosamente surpreendeu-me o seu esforço de considerar um agnóstico um “ser menor”, incompleto, indefinido. Como se um crente aceitasse mais facilmente um “crente negativo” e lidasse mal com quem não ache importante tomar partido. Nunca tive grande simpatia por aquelas posturas anarco-carbonárias-sindicalistas que rosnam às sotainas mas ontem mudei um pouco essa leitura. Creio que Jesus Cristo tal como foi descrito veria as coisas doutra forma.

25 novembro 2010

Redundâncias

Um evento recente, Congresso das Comunicações, contou com a distinta presença dos respectivos secretário de estado na abertura e ministro no encerramento. O curioso é que das 23 páginas do discurso inicial o ministro repetiu 18. Inquirido sobre o assunto, declarou achar normal, só provava a existência de alinhamento e sintonia dentro do ministério. A mim, a palavra que me ocorre não é bem sintonia, é mais redundância. Se um deles não tivesse participado não se perderia muito, Aliás quando olho para alguns ministros actuais sou assaltado pelo mesmo sentimento: se aquele/ se aquela não existisse naquela função, notar-se-ia muito a sua falta?

Recentemente tive a oportunidade de ouvir ao vivo um discurso de um secretário de estado e pela postura, pela mensagem, pela forma e pelo conteúdo, não consegui pensar noutra coisa que não fosse: este indivíduo é supérfluo !

Em conclusão, penso que podemos dispensar uma boa parte dos ministros e secretários de estado e não se notaria muito a sua falta. Se as contas públicas melhorariam com isso, já não estou tão seguro. Os ministros dispensados passariam a administradores de empresas públicas e até a ganhar mais; os secretários de estado passariam a assessores de qualquer coisa, como aquele jovem ex- funcionário do PS de Lisboa que ao mesmo tempo que vigarizava o Instituto de Emprego, tinha um belo vencimento, 3000 e tal euros, como assessor de uma vereadora da Câmara de Lisboa que assegura tratar-se de um cargo de confiança política ! Por coincidência, ou não, é a mesma autarquia que ainda não parece saber ao certo o tamanho do seu buraco financeiro, nem como fazer para o controlar e sanear...

17 novembro 2010

Os Outonos do nosso descontentamento

Acto 1 – Outono de 2008. Por irresponsabilidade na gestão corrente da sua actividade, uma grande parte da banca europeia e ocidental ameaça entrar em colapso. É grave. Não pode acontecer. Seria catastrófico para toda a economia e os governos lá saem em socorro com empréstimos, garantias e até mesmo nacionalizações para tapar buracos. Nota: Em Portugal é diferente. A banca portuguesa é bastante mais conservadora e os BPN e BPP são simplesmente complexos casos de polícia. Aliás, ainda não entendi porque os depositantes de um foram protegidos e os do outro não.

Acto 2 – Outono de 2009 – A crise bancária/financeira, respectiva confusão e incerteza contaminam toda a actividade económica. Os governos, fortes do sucesso da sua missão anterior de salvamento da banca, acham que a solução passa por eles, chamando investir a tudo o que seja gastar e, pior, gastando o que não têm.

Acto 3 – Outono de 2010 – Na ressaca da overdose de “investimento” e com o alarme disparado por uma Grécia especialmente indisciplinada e de contas assaz opacas, os governos descobrem que há limites para o endividamento. Os “mercados” geridos pelos mesmos génios que provocaram a crise de 2008 aproveitam o mole da Grécia e começam a apalpar e a carregar aqui e acolá, com sucesso. A imagem actual é a de um predador correndo atrás de um rebanho em fuga, agarrando-os um a um, começando pelos mais fracos. Os mesmos governos que há dois anos eram os salvadores e há um ano acreditavam ter ascendência sobre as finanças mundiais, passaram humildemente a simples coelhos assustados, em fuga.

Este histórico parece-me uma farsa com uma enorme ignorância, ou distracção ou incompetência dos governos. Não é possível nacionalizar esse capital que anda por aí à espera de e criando as melhores oportunidades, mas a Europa no seu todo deveria ter força e coesão suficiente para não se limitar ao salve-se quem puder. Faz sentido que eu pague menos juros pelo empréstimo da minha casa do que o governo português paga pela sua divida soberana!?

O FMI foi criado para estabilizar, emprestando a países em dificuldades, mas mais importante do que o valor emprestado, é ficarem com o controlo do livro de cheques público e assim credibilizaram o cliente para os outros credores. Tipicamente para economias muito frágeis, mal geridas, em resumo, para um terceiro-mundo formal ou informal. Que vem este FMI fazer a um país europeu integrado no euro: tomar conta do livro de cheques? É preciso chamar o lobo mau para se gastar apenas o que se pode ?!

A Europa parece ignorar que pode ter política monetária. O Euro descer não é necessariamente mau, se calhar deve mesmo descer e a sério para permitir uma rectificação rápida e sã. Os EUA não têm a mínima dúvida nem hesitação quanto a esse cenário quando se trata da sua moeda. Tentar aguentar o insustentável nunca dá bom resultado. As presas que correm mais lá à frente estão preocupadas apenas em acalmar a fera, entregando-lhe os mais fracos. Esquecem-se de que por definição, enquanto tiver força, este predador nunca se sacia. Como pequena anedota, muita gente que invectiva veementemente os mercados financeiros na praça pública parece ignorar que são os seus PPR’s que estão lá a dar músculo ao animal maldito.

15 novembro 2010

E não se pode isolá-los mesmo ?

Ainda não começou o evento e também ainda não temos completa a lista dos custos, complicações e incomodidades gerados pela próxima cimeira da Nato em Lisboa,.

Para lá dos custos directos como o do enorme aparelho de segurança montado, não serão menores os indirectos devidos às restrições no aeroportos, na circulação em Lisboa e até mesmo da tolerância de ponto, que é mesmo aquilo de que precisamos no momento actual do país. Vamos ainda esperar para ver que confusões e estragos as manifestações tradicionais irão provocar.

Questão: se a segurança dessas pessoas é mesmo crítica, a ponto de elas terem que andar escondidos e afastados de toda a gente, qual o sentido de realizar uma cimeira no centro de uma grande cidade, gerando tantos constrangimentos ? Ou será que é assim tão importante e valorizador que B. Obama tenha passado por Lisboa ? Porque não realizar o encontro num local mais pequeno e mais controlável, como uma base militar ou até mesmo uma ilha ? Eu sei que nas Lages houve uma vez uma de má memória, mas acho que estaríamos todos muito melhor se mantivessem essa opção (até porque para uma organização que se nomeia do Atlântico Norte, não há melhor localização possível).

11 novembro 2010

Privatizar pode não ser bom

No afã de discutir princípios, por vezes esquecemo-nos que a diferença entre o certo e o errado pode estar não no princípio em si mas na respectiva aplicação. Agora discute-se a possível privatização de algumas linhas da CP e lá temos as previsíveis e infinitas opiniões e argumentações. Como referência, o Reino Unido deve ter praticamente toda e rede privatizada e parece ser uma experiência positiva, apesar de alguns problemas inicias.

Privatizar uma fábrica de cervejas não exige precauções especiais. É só vender os activos, de preferência bem vendidos, e o mercado se encarregará do resto. Privatizar ou concessionar um serviço que não é possível, ou socialmente justo, ser regulado pelo mercado livre obriga a contratos bem feitos e bem acompanhados. Exige competência e seriedade.

Não será necessariamente o caso de algumas das nossas PPP’s (parcerias – público – privadas) em com a tinta do contrato ainda fresca e o investimento inicial sem sequer arrancar, já estão a serem renegociadas em beneficio de quem ganhou o “concurso”. Veja-se os casos recentes das estradas.
Uma coisa é certa. Privatizar pode não ser bom para um sucateiro que pede a um ministro que substitua o presidente da empresa pública que o anda a incomodar, ministro esse que, ao que parece, até passa o recado à secretária de estado da tutela.

06 novembro 2010

O pior verbo

Não gosto de superlativos. Nunca sabemos o suficiente para poder afirmar que algo é o melhor ou o pior absoluto. Mesmo dentro de um universo restrito, o factor tempo pode facilmente pôr em causa os máximos e os mínimos.

Costumo dizer que “tudo”, “nada”, “sempre” e “nunca” são palavras a usar com muita parcimónia e, a bem do rigor, a tentar evitar de todo.

Um destes dias passou-me à frente um verbo a que me apeteceu chamar-lhe “o pior” de todos : o verbo safar!

Safar é apagar algo realizado, é livrar-se de algum problema ou ameaça, mas às escondidas, pela calada, jogando na distracção dos demais. Na sua criativa e expressiva particularização da língua os brasileiros não hesitaram em chamar safado e safadeza ao malandro e à malandreza impune e esquiva .

Os erros devem ser assumidos e corrigidos; os problemas devem ser enfrentados e resolvidos. Safar, não gosto...!