30 dezembro 2006

Devagar se vai ao longe




Estes ditados, como muitas afirmações e “verdades”, têm uma validade muito dependente do contexto. Fugir de um fogo lentamente não será necessariamente uma garantia de chegar longe.

Li uma vez, já não sei onde, que os obesos activos são mais ponderados nos seus movimentos por lhes ser penoso ir, errar, regressar e recomeçar. Um atleta cheio de energia pode dar-se ao luxo de correr 2 quilómetros para uma deslocação que, bem pensada e planeada, poderia ser feita em 200 metros. O obeso não e, por isso, antes de avançar, verifica bem se está mesmo a tomar o caminho mais curto.

De uma forma geral, uma limitação de recursos força uma melhor gestão. Ou, buscando outra frase feita: “ A dificuldade aguça o engenho”.

Tudo isto a propósito desta “modernice” actual e monótona do rápido/urgente/urgentíssimo. Como já ouvi dizer várias vezes: mais importante do que o que se decide, é decidir rapidamente. E a tecnologia ajuda muito, porque também rapidamente podemos corrigir. Antes de haver telemóveis éramos muito mais organizados e cuidadosos. Tendo limitações de comunicação, tínhamos o cuidado de planear e acordar previamente os programas. Agora, podemos dar-nos ao luxo de “nada combinar” e em cima do acontecimento “acertar agulhas”.

Ou seja, com extrema facilidade, fazemos frequentemente a figura tonta do atleta que corre à toa percorrendo uma distância dez vezes mais do que a necessária.

Também, sendo verdade que as solicitações não são necessariamente regulares, existem duas formas de compensar essa variação. Uma é ajustando a velocidade, reduzindo e acelerando, mas nem sempre se domina bem a inércia. Outra forma é manter a corrida e ir a direito quando a coisa aperta e ziguezaguear quando há menos para fazer. Esta última tem um efeito secundário “excelente” que é transmitir a ideia de que se tem sempre muitíssimas coisas para fazer. Pode ser é viciante!

Com os votos de um de 2007 em ritmo certo!

27 dezembro 2006

Já chega de rotundas

O Presidente da Câmara Municipal de Viseu e da Associação Nacional de Municípios dizia em entrevista recente à comunicação social que já tinha feito muitas rotundas. Com orgulho precisava que em Viseu, numa estrada de quatro quilómetros, existiam seis rotundas!

Feitas as rotundas, acrescentava que os autarcas estão disponíveis para passar a outro tipo de intervenção como a gestão directa de áreas do ensino e da saúde. Isto, em teoria, até poderia fazer sentido, mas se pensarmos um pouco nos padrões frequentes de contratação e gestão dos recursos humanos municipais, desde a pequena Câmara do interior à volta da qual tudo gira, até à mastodôntica Câmara de Lisboa, vejo com bastante preocupação os autarcas a, por exemplo, seleccionarem professores.

É que o computador pode ser cego a muitos factores mas ao menos tem critérios objectivos, bem definidos, estáveis e facilmente verificáveis.

Uma sugestão, e para não ser redutor à partida, seria submeter os municípios a uma auditoria especializada e independente da gestão dos seus recursos humanos. Como foram contratados, qual o seu enquadramento e produtividade. Só aqueles que passassem nesse exame e demonstrassem seleccionar pelo mérito e terem quadros de pessoal de dimensão ajustada é que poderiam receber mais competências. Vai uma aposta para a taxa de sucesso?

26 dezembro 2006

Todo o Natal

Já se vinha a anunciar há uns tempos, mas este ano agudizou: a polémica sobre a descristianização do Natal.

Os guardiões da fé olham atentos para as representações do Natal que contornam a componente religiosa e não hesitam em apontar e acusar publicamente quem esquece que o Natal é, antes de mais, santo. Se quiserem ser coerentes nesse fundamentalismo também deverão atacar os mui pouco santos pinheiro de Natal, assim como o próprio Pai Natal, mas creio que isso já não arriscam.

Os guardiões da laicidade controlam as intrusões abusivas da efeméride e chegam ao ponto de proibir festas de Natal nas escolas. Uma coisa é ter um crucifixo permanente na parede à frente dos olhos de todos e que é abusivo. Outra coisa é promover uma festa de Natal que, obviamente, pode ter participação facultativa.

Mas, o que é certo, é que no nosso meio cultural o Natal tem um valor profundo, ao qual a maior parte dos agnósticos não escapa. E não estou a falar da hipocrisia de quem não crê em nada daquilo mas acha giro as festas e os presentes.

Estou a falar da fortíssima ligação do dia à família e ao lar. O Natal tem uma carga afectiva que talvez seja a mais significativa marca cristã global na sociedade civil europeia. E, os crentes pró-activos, em vez de andarem redutoramente de apito na boca a marcar falta cada vez que não vêm um presépio, deveriam talvez procurar entender a riqueza e a complexidade de uma celebração que atingiu uma dimensão que os ultrapassa. Poderiam tirar partido da mesma para passar uma mensagem de universalidade e de afirmação dos seus valores. Mas não, está mais na moda o fundamentalismo.

Nesta senda, acho que a próxima campanha poderia ser a proibição das mui pagãs fogueiras nas festas dos “santos populares” de Junho. Aqui, trata-se obviamente de uma celebração genuinamente pagã associada ao solstício do Verão e que a Igreja tentou integrar mas sem pleno sucesso. Está na hora da pureza formal!

23 dezembro 2006

Feliz Natal



É em locais como o documentado na fotografia que se executam actualmente a maior parte dos condenados à morte nos USA. Substitui a famosa cadeira eléctrica que demonstrou algumas falhas e efeitos secundários.

São administrados sucessivamente três produtos: o primeiro deve anestesiar e causar inconsciência, o segundo relaxa os músculos para evitar espasmos e o terceiro, final, pára o coração. Este último é tão violento que não é admitido sequer para matar directamente animais doentes.

Estaria, talvez bem, se funcionasse. Mas nem sempre funciona, como no passado dia 13/12, com o condenado porto-riquenho Nieves Díaz. Ou por as agulhas estarem mal introduzidas nas veias, ou por deficiências no fígado, argumento das autoridades, Nieves Díaz não morreu à primeira. Demorou 34 minutos e necessitou de uma segunda dose.

O problema é que, quando não funciona, não se sabe bem o que aconteceu. Pode por exemplo estar consciente mas já com os músculos sem acção e sentir a entrada e a actuação violentíssima do último componente. Dizem as testemunhas que ele mexeu muito os olhos.

Provavelmente a impressão que isto causa será a mesma em qualquer país, mesmo que não seja num que aboliu a pena de morte de forma pioneira há mais de um século, como Portugal.

Isto passa-se menos de duas semanas antes do Natal num país em que os guardiões dos altos valores cristãos perseguem as cadeias de retalho que se atrevem a promover o Natal sem assumir plenamente o carácter cristão do mesmo.

Só se pode acrescentar: ao menos aprendam a matar bem e com dignidade!

Feliz Natal e muitas prendinhas.

20 dezembro 2006

E se fosse a refazer...

Está quase a cumprir-se um ano, dia por dia, de um acontecimento que me virou a vida. Foi-me colocada uma questão que tinha duas respostas possíveis. Uma de continuidade, materialmente cómoda e intelectualmente insuportável e outra, complementar, de ruptura. Escolhi a segunda...

Após 3 meses de discussão, negociação e transição, iniciei um período de 6 meses, durante os quais não entrou um único euro na minha conta bancária. Controlei cada cêntimo que saía; cada litro de combustível consumido, cada minuto de telemóvel e cada compra de supermercado. Um custo que nunca questionei foi a assinatura ADSL que me permitiu comunicar, ler o mundo e publicar estas Glosas. Aperfeiçoei a culinária. Escrevi, li e aprendi coisas em atraso, mas sem nunca ficar em dia. Um dia por semana viajei a cantos e esquinas, enriquecendo o meu mapa mental de caminhos e a minha biblioteca fotográfica. Tive tempo inesgotável e disciplina para o usar. Semana após semana, mantive o ritmo dos contactos, reforçando os já feitos, acrescentando outro canal ou inventando outra iniciativa. Vivi uma Primavera de floração incerta com uma ponta de ansiedade e alguma insegurança mas sempre provando cada dia.

No último mês e pico, em que já tinha data para a retoma do fluxo dos euros, comprei a Transalp. Uma excentricidade em jeito de compensação das restrições anteriores. Nesse período, entre Minho, Gerês e Douro, foram 3500 km’s de cores, ventos, calores e cheiros. E foram também uns polegares quase abertos de acelerar e travar os 53 cv.

O ano completa-se por 3 meses baseado no outro lado do Mediterrâneo de gentes e costumes tão diferentes e tão próximos. E, claramente, enriquecedor. E, como dizia o poeta, “E se fosse a refazer, eu refaria esse caminho!”.

16 dezembro 2006

Fitas em Argel



Quinta-feira, que é como quem diz “sábado”, fui ao cinema. Não tendo mais que fazer no centro comercial onde está a “cinemateca”, entrei com meia hora de avanço. Para meu espanto, a sala já estava cheia a 3/4 e principalmente de pares às turrinhas. Deve ser o local por excelência para isso. Meia hora depois do filme começar ainda entrava gente e uma hora antes de acabar já saíam. E continuaram a entrar e a sair. Ou seja, um vaivém do princípio até ao fim. Nunca vi tal. Quando as luzes se acenderem já a sala estava praticamente vazia.

O filme: “Indígenas”. Bem a jeito para um certo consumo local que se considera “ad-eternum” vítima e credor dos malefícios da colonização francesa. O tema é de arrepiar. No início da segunda guerra mundial, o bravo exército Francês tinha caído heroicamente em “dois dias”. A inexpugnável linha Maginot cumprira perfeitamente a sua função: impedir um ataque frontal dos alemães! Os malandros é que resolveram dar a volta e atacaram-na por trás. Não se faz!!!

Quando a França, ainda ocupada, quer marcar presença activa na guerra, tem que recrutar voluntários nas suas colónias e especialmente no Magreb, ali mesmo à porta de Itália, por onde os Aliados entravam no Sul da Europa.

Na frente, estes “indígenas” são usados como “carne para canhão” de fraco valor. Para os motivar são franceses, cantam a Marselhesa e vão cobrir-se de glória a libertar a pátria; na altura dos reconhecimentos, promoções e fotografias: à frente os branco-brancos!

O mais escandaloso é a França da “Liberdade/ Igualdade/ Fraternidade” ter decidido, nos anos 50, congelar as pensões dos ex-combatentes cujos países de origem tinham obtido a independência. Chamaram-lhe “cristalizar”. Uma verdadeira jóia de figura de estilo. Dá para imaginar o que significa uma pensão congelada durante 50 anos??

O filme foi apresentado em privado à Presidência Francesa e dizem que a Bernardette ficou tão emocionada, “Jacques, il faut faire quelque chose!!!”, que o Jacques resolveu corrigir. Felizmente que para o défice Francês, 60 anos após o fim das hostilidades, já devem sobrar poucos felizes contemplados. E os que sobram não devem continuar a pesar durante muito tempo mais!

14 dezembro 2006

Reconstrução no pós-guerra



Sempre me intrigou a dinâmica das reconstruções nos pós-guerra. Em situação normal, a construção de uma simples ponte, por muito óbvia que seja a sua necessidade, é longamente ponderada até ser decidida e serem afectados recursos para a sua realização. E isto com todas as condições “ideais”: tempo para planear a solução, para fazer o projecto, para consultar empreiteiros, para negociar, para construir num prazo razoável, com fiscalização adequada e tudo o mais que permitiria, em teoria, uma óptima utilização dos recursos utilizados.

Numa situação de pós-guerra, há pontes, estradas, portos, aeroportos, escolas, habitações, infra-estruturas de energia, de água e sei lá que mais a reconstruir. Numa dinâmica “normal” levaria anos e anos a realizar o equivalente a todas essas empreitadas. Num pós-guerra é muito mais rápido, apesar de, teoricamente, as condições não serem ideais. Qual a diferença? A urgência e a necessidade galvanizam as vontades ou simplesmente se injectam recursos brutalmente?

Voltei a reflectir neste tema recentemente ao ver partir o contigente de Engenharia Português que foi ajudar a reconstruir o Líbano. É verdade que há lá muitas pontes para reconstruir. No entanto, muita da destruição de infra-estruturas no Líbano não foi parte daquelas “inevitabilidades bélicas”, mas mais um capricho de Israel de demonstração de força, sem correspondente justificação militar. Evidentemente que o Líbano necessita de ajuda da comunidade internacional e tudo o que seja feito para estabilizar aquela parte do mundo é pouco, mas nós também temos cá muitas pontes para fazer e, principalmente, para consolidar. Porque raio vamos nós reconstruir aquilo que uma “birra” de Israel destruiu?


Imagem googleada de swissinfo.org

12 dezembro 2006

As três pancadas

Sou Engenheiro Electrotécnico de formação e, se calhar, até mesmo de vocação mas, por favor, não me peçam para tentar resolver problemas em PC’s!

No início da minha carreira profissional desenhei hardware e firmware para sistemas baseados em microprocessadores. Simples mas completos. E sabia com rigor o que fazia o bicho a cada passo, em que endereço, o conteúdo dos registos e o estado das flags. Configurava os endereços de interrupção, a profundidade da stack e tudo o mais. Os problemas, quando apareciam, tinham que ser perfeitamente identificados e corrigidos na origem. Não havia outra alternativa.

Mais tarde, desenhei arquitecturas complexas que corriam em sistemas operativos de outra dimensão. Tinham algumas particularidades. Por exemplo, tinham “memória” e precisavam de conhecer todos os passos anteriores. Desligar e voltar ligar deixava o sistema vivo mas amnésico e encravado. E, quando parava, fazia parar uma fábrica inteira ou uma outra instalação de peso. Todo o rigor era necessário para poder dormir tranquilamente. Não havia outra alternativa.

Os PC’s fazem, cada vez mais, coisas muito giras, mas com tanto encastelamento de funções e objectos, já ninguém sabe mesmo o que se passa dentro daquelas caixas. Pragmaticamente falando não seria dramático se funcionasse mas o drama é quando não funciona. Nessas alturas, na maior parte das vezes, já nem se tenta entender a origem do drama. Mudam-se uns parâmetros de configuração, instalam-se umas versões mais recentes dos produtos, ou até mais antigas, vai-se clicando aqui e acolá, desligando e voltando a arrancar e baralhando e tornando a dar até parecer que está resolvido. E pronto! Dá-se por concluído o trabalho.

Isto, em parte devido à minha experiência anterior, causa-me uma alergia terrível. Onde estava o problema? Voltará a ocorrer? Ninguém sabe! Só se sabe que, de momento, aparentemente, funciona.

Parece-me muito idêntico àquela técnica antiga de reparar televisores a válvulas em que se davam umas boas palmadas síncronas nos lados da caixa, completadas por uma boa pantufada no topo e... “já está!”

11 dezembro 2006

Saída de auto-estrada



Auto-estrada para Zeralda/Tipaza, direcção oeste de Argel.
Saída Bouchaoui/Club des Pins.

Acesso ao hotel Sheraton e ao Palais des Nations, centro de congressos e zona residencial para altos dignatários do estado. Todos os dias por aqui passam ministros, assim como uma boa parte dos visitantes de negócios de Argel. Há uma barreira de polícia escassas centenas de metros à frente.

Até há um mês atrás eu tomava essa saída todos os dias. Agora sigo em frente e saio na seguinte.

Ontem, ao fim da tarde, uma bomba explodiu à passagem de dos mini-autocarros que transportavam quadros de uma empresa americana. Apanhou o primeiro autocarro, propositadamente vazio, matando o condutor. Em seguida, metralharam o segundo provocando nove feridos de gravidade variada.

Fiquei parado na auto-estrada, bloqueada, enquanto procediam ao rebentamento de outras duas bombas artesanais que lá estavam ainda por explodir.

Estatisticamente falando, Londres e Madrid continuam a ser mais perigosas!

Foto do site do Jornal “Liberté”

10 dezembro 2006

Pós-peregrinação



... uma obra de homem outra coisa não é senão este longo caminhar para tornar a achar, pelos desvios da arte, as duas ou três imagens simples e grandes para as quais o coração pela primeira vez se abriu”
Albert Camus

O post anterior, com o marco, é daqueles que marca mesmo. E que não aceita facilmente uma coisa qualquer a seguir. E, então, fui buscar uma das minhas citações preferidas do mestre e trouxe-a para Tipaza, para junto daquele trio clássico de raízes do que somos : civilização romana, oliveiras e Mediterrâneo.
O que me faz acrescentar:

“A miséria impediu-me de crer que tudo está bem debaixo do sol e na história; o sol ensinou-me que a história não é tudo"
Albert Camus

08 dezembro 2006

Peregrinação



“Compreendo aqui aquilo a que se chama glória. O direito de amar sem limites.”Albert Camus

Inscrito na lápide colocada no local adorado pelo grande mestre.

E com um agradecimento ao Mohamed, funcionário reformado, a quem eu interrompi a contemplação do Mediterrâneo para me guiar na imensidão das ruínas romanas de Tipaza até ao local onde ele próprio tinha visto o mestre e que, no fim, não aceitou mais do que um aperto de mão.

07 dezembro 2006

Mediterrâneo bravo



Há quem estranhe o ruído do mar, que lhes perturba o sono. Hoje o mar passou a noite bravo. Esteve mais ruidoso do que o habitual. Mas dormi bem. Quem nasce à beira mar sabe com o que conta.

04 dezembro 2006

Ainda "Percepções e realidades"

Custou-me um pouco a digerir este livro de Santana Lopes, mas valeu a pena. É enfadonho ver desfilar a agenda de uns meses de primeiro ministro, enumerando os assuntos “abordados”, praticamente todos os do país e do planeta (?!), e a sua “opinião” célere e certeira acerca dos mesmos. Como se governar fosse ouvir uma vez e rapidamente sobre tudo opinar.

A descrição dos abraços e as fotografias com os “grandes do planeta”, como prova do “excelente relacionamento” alcançado, chega a ser confrangedora de tão provinciana. Pequeno será sempre pequeno.

Há um ditado que diz: “Os cães ladram e a caravana passa”. Para Santana Lopes cada simples latido é uma ameaça que o faz sobressaltar. Há uma atenção e uma importância dada a cada “ataque disferido”, que não é mais do que uma enorme demonstração de insegurança.

O livro é sintomático de um certo espirito do “não fui mais longe porque me cortaram as pernas”. Santana passa ao lado das trapalhadas assobiando para o lado, tentando desviar-se e sacudindo os pingos de chuva. O não assumir os erros é trocado pela conspiração e pelo “fui vítima do meu sucesso”. Típico do incompetente que se recusa a reconhecer que o problema está mesmo nele.

O mais interessante é, no entanto, a descrição das nomeações e das escolhas feitas. A par de umas breves considerações sobre as capacidades dos escolhidos, está quase sempre, e em grande relevo, a referência a “filho de..”, “casado com... “, “colega da faculdade...”, “amigo de um conhecido .... “, etc!
Meritocracia, onde andas?

03 dezembro 2006

“Percepções e realidade” por Santana Lopes

Entretanto, José Sócrates ganhava as directas para líder do Partido Socialista [....] No meu círculo havia quem atribuísse esta vitória de Sócrates também à popularidade que alcançou nos debates que tinha comigo, semanalmente, na televisão sobre temas da actualidade. Algumas opiniões referem que fui eu que “criei” José Sócrates como figura da comunicação televisiva.
[...] os debates da RTP, sempre um pouco mal amados nos dois partidos porque nos davam popularidade e porque [...] eu estava “a inventar Sócrates, ao dar-lhe tempo de antena”.


O homem, para lá dos 5 filhos, ainda é pai mediático de José Sócrates que, sem ele, não teria chegado onde chegou! Se calhar não teria chegado, pelo menos nessa altura, mas por outras razões. E é evidente que este confronto só terá trazido vantagens a Sócrates, mas antes pela fraqueza de Santana Lopes...


Governei com toda a boa-fé, cumprindo o princípio de não deixar para depois as medidas difíceis, mais exigentes, algumas que já deveriam ter sido tomadas. [...] Se soubesse que o Jorge Sampaio iria dissolver a Assembleia, antes de um ano depois da tomada de posse, obviamente não teria seguido esse cronograma de decisões, porque considerava importante para Portugal garantir uma nova maioria com princípios e valores de governação que defendo e não dar o poder a adversários com caminhos diferentes.

Estas duas frases, no mesmo parágrafo (!), são representativas da ondulação do autor. Por um lado faz uma profissão de fé na sua convicção em governar com firmeza e convicção e sem fugir às decisões difíceis e impopulares, postura que reforça em várias passagens do livro. A seguir diz que se sonhasse que existiriam eleições tão cedo, a estratégia seria outra porque ganhar as eleições, afinal, é prioritário relativamente às reformas necessárias.