27 abril 2010

Alguém sabe a sério, mesmo, o que anda a fazer ?



Durante quase uma semana mais de metade do céu da Europa em área e muitíssimo mais em tráfego ficou vazia. Dos 30 aeroportos europeus mais movimentados apenas escaparam, nas minhas contas, 10. Um vulcão apenas, de um dia para o outro, fez isto. Na minha santa ignorância, custa-me a entender que essa decisão tenha sido cientificamente sustentada. Evidentemente que a prudência é o primeiro critério a ter em conta nestes campos e quando não há certezas é sempre melhor dizer não.

Ao fim de alguns dias, desesperadas, algumas companhias aéreas fazem voos de teste através das cinzas e vêm dizer que não houve problemas. Mesmo assim os burocratas, provavelmente mais técnicos de papeis do que de engenharia, e considerando que não havia ainda papéis feitos para aquela situação, insistem na proibição.

Foto tirada no aeroporto de Roma em 15.04.2010

25 abril 2010

A digestão democrática

Comemora-se por cá o 25 de Abril, já a chegar ao entediante, não fosse uma vez mais Cavaco Silva a mostrar a sua debilidade institucional dizendo não estar surpreendido que “sejam muitos os que se mostram indignados com os prémios, salários e compensações que, segundo a comunicação social, são concedidos a gestores de empresas que beneficiam de situações vantajosas no mercado interno”.

Ora bem, o presidente da República não tem meios para esclarecer e clarificar quais são os bónus desses gestores? Deixa o ónus da afirmação na comunicação social ? Na posição dele, naquele momento, não pode citar uma afirmação da comunicação social desta natureza, sem se envolver no seu fundo: sem a caucionar nem a refutar.

E a propósito de posturas e mensagens, Aguiar Branco, confirmou que seria seguramente melhor líder do PSD do que Passos Coelho, mas isso é outra história.

No momento em que comemoramos tranquilamente o 25 de Abril e a transição para a democracia, consolidada e pacificada, a Espanha está de novo a ferro e fogo com a herança do franquismo. Em breves palavras, durante a transição democrática a Espanha decretou uma amnistia para os crimes do período quente e negro. Recentemente Baltazar Garzón entendeu que, à luz do direito internacional, esses crimes não prescrevem nem podem ser amnistiados e abriu processos. A direita espanhola que o odeia pelo caso Gurtell, que ainda não parou de causar cacos em altos círculos do PP, entende que ele está errado e à luz do direito espanhol abre-lhe um processo que o poderá suspender até à reforma...

Que se passa nesse país que não consegue olhar fria e racionalmente para um passado duas gerações atrás, sem desatar aos berros? Há mesmo duas Espanhas irreconciliáveis?

Se o direito espanhol se sobrepõe ao internacional, porquê apenas em Espanha? Para que serve então o Tribunal Penal Internacional de Haia? Que pensará, por exemplo, o presidente do Sudão, Omar Al-Bashir que recebeu, justamente é certo, um mandato de captura desse tribunal pelos crimes que cometeu no seu país? Só para o terceiro mundo é que existe aplicação da "justiça internacional" ?

Seria engraçado se Baltazar Garzón fosse interditado em Espanha e reabrisse os processos em Haia...

23 abril 2010

Pedimos...

Pedimos desculpa por esta interrupção. O Glosa Crua segue dentro de momentos...!

01 abril 2010

Compulsos (11)

Começou em

Bem-vindos! Bem-vindos a este círculo dos compulsivos. Todos temos pulsões e compulsões, apenas a sua natureza e ponderação muda. Se as misturarmos e distribuímos na boa medida, seremos todos normais.

Se o objectivo era misturar e confundir, os efeitos começavam a aparecer. Ele já não conseguia imaginar claramente a Joana. Não que a esquecesse. Somente, ao pensar nela, por vezes, sobrepunha-se a imagem da mulher do traço e ao pensar na mulher do traço punha coisas nela que eram da Joana. Ambas eram mulheres, mulheres mesmo, que não precisavam de o dizer ou esclarecer, mas pouco mais tinham em comum. Misturá-las assim era demência ou, no mínimo, falta de respeito.

Ela tinha aprendido algo. Que no passado, quando riscava, fosse para se renovar, para interrogar, ou o que quer que fosse, tinha sempre a imagem do João sobre o seu ombro. Como se ele lá estivesse espreitando, omnipresente em toda a sua actividade. E é muito complicado viver com um ausente omnipresente! Agora era diferente. Ao desenhar encontrava-se muitas vezes realmente sozinha, de ela para ela. Como se, nesses momentos e apenas nesses momentos, tivesse feito o luto. Não sabia se o queria mesmo, o luto crónico pode servir de âncora contra derivas incontroláveis.

O círculo não andava bem. Tinham esgotado a apresentação das suas compulsões e sobre os outros dois ausentes nada mais conseguiam comentar. O moderador hesitava entre decretar o objectivo atingido e encerrar o grupo em sucesso ou prolongá-lo em simples tertúlia. Tudo dependia de qual seria a forma mais simples de manter a actividade. Resolveu arriscar. Apesar de poder ter que passar algum tempo antes de formar novo grupo, achou que o fulgurante sucesso teria mais impacto ao declará-lo de imediato do que se esperasse o respectivo definhar.

O seu anúncio não foi bem recebido. Todos tinham noção de que já nada de especial se passava mas não queriam desarmar. Pediram-lhe então para chamar de novo os outros dois. Ao fim e ao cabo é sempre necessário, em qualquer ambiente, existirem excepções que por antagonismo catalizem a solidariedade entre o resto. Chamemos-lhe bobos, exóticos ou simplesmente doidos. Funcionam como a pitada de tempero na salada social. Em demasia faz mal, se faltar fica insosso.
Continua para