30 abril 2022

Marcas brancas e preços pouco claros


Não devo ser o único que, ao comparar o preço de um produto de marca branca com outro de marca consagrada, fica na dúvida quanto à razão da diferença. É mais barato porque ser intrinsecamente mais fraco, com menor qualidade, ou pela poupança na publicidade, comunicação e construção da imagem de marca?   

Notícias recentes sobre alguns processos instaurados pela Autoridade da Concorrência evidenciaram um terceiro fator. Alguns produtos de marca serão mais caros porque as mui dignas, reputadas e consagradas marcas impõem à distribuição preços mínimos a respeitar, devidamente escrutinados.

Confesso que passarei a ver as marcas brancas com outro olhar.

25 abril 2022

Por estes dias de abril


Por estes dias de abril, voltaremos a recordar uma data em que coletivamente e de uma forma muita ampla e consensual o país acreditou, abraçou e brindou a uma mudança. Por estes dias de abril, iremos voltar a ouvir um discurso sectário sobre os chamados valores de abril, por parte de quem deles costuma abusivamente se tentar apropriar.

Por estes dias há uma guerra brutal em curso na Europa, fruto de uma agressão sem a mínima justificação e alguns desses expropriadores de liberdade e democracia estão a demonstrar claramente os seus valores, o seu projeto de sociedade.

Por estes dias de abril, vamos, talvez, uma vez mais, e só seria necessário para os muito distraídos ou intelectualmente míopes, ver uma separação das águas. O verdadeiro espírito popular de abril é solidário, apoia inequivocamente o sofrimento do povo ucraniano, condena a brutalidade do regime russo, a sua invasão de um país soberano, assim como denuncia a falta de direitos e liberdade na própria Rússia. O resto são cantigas de enganar, para quem as quiser ouvir.

21 abril 2022

França, Le Pen e UE – Entre divórcio e libertinagem


A primeira vez foi em 2002 quando JM Le Pen chocou o mundo político francês ao passar à segunda volta das eleições presidenciais, contra J. Chirac. A proeza foi repetida pela filha Le Pen contra E. Macron em 2017 e agora de novo em 2022.

Num discurso amaciado face ao passado, ela diz não pretender propor a saída do país da UE, mas promete implementar uma preferência aos nacionais franceses e fazer a legislação francesa prevalecer sobre a europeia. É um pouco como o habilidoso que não quer divorciar-se, aprecia manter o conforto familiar às 2ª, 4ª e 6ªs e estar livre às 3ª, 5ª e sábados.  

Qual a razão para tanto sucesso deste discurso nacionalista? Penso que, entre outras coisas, incluindo uma alteração substancial da paisagem social de muitas cidades e subúrbios, há talvez demasiada “discriminação positiva” de algumas minorias, pelo menos em perceção. Real ou apenas sugerida, de dimensão corretamente avaliada ou pelo discurso populista amplificada, acaba num convite à discriminação positiva da maioria. Discriminações mesmo positivas podem ser remédio perigoso. Igualdade de oportunidades e recompensa objetiva e justa pelo mérito serão caminho mais são. 

No próximo domingo será a segunda volta e veremos. Termos visto JL Mélechon de uma extrema-esquerda utópica com 22% na primeira volta contra 1,7% da candidata do histórico partido socialista, sugere que alguma razoabilidade está a faltar.

14 abril 2022

Não, obrigado!


Algures pela segunda metade da década de 70 eu tinha na minha capa escolar um autocolante tipo ovo estrelado do “Energia Nuclear, Não, Obrigado”. Era um tema ainda fresco, havia alguma contaminação entre a ideia do nuclear civil e militar, este último bastante ameaçador na época. O certo é que após a crise petrolífera provocada pelo boicote árabe de 1973, muitos países abraçaram sem hesitação esta alternativa, mais controlável, especialmente do ponto de vista do risco geopolítico.

Hoje, mais de 40 anos depois, tendo-se acrescentado ao contexto a necessidade da limitação das emissões de CO2 e estando algumas centrais nucleares a chegar à reforma, o que podemos dizer quanto ao nuclear sim ou não? Por um lado, continua a haver bastante instabilidade geopolítica na área de origem dos combustíveis fosseis. Além dos tradicionais, de há umas semanas para cá, foi acrescentada a Rússia. As renováveis cresceram muito, mas ainda estão longe de assegurar a integralidade das necessidades.

Do lado da segurança das centrais, tivemos Chernobyl e Fukujima e constatamos uma coisa. Não há forma certa de controlar a besta quando ela desembesta. Não há um modo operatório definido sobre por onde e como reagir com segurança em caso de acidente grave. E as consequências potenciais são brutais.

Não há também ainda forma consensual e segura de como gerir os resíduos radioativos do combustível usado ou do desmantelamento das centrais. Quarenta anos depois ainda se especula sobre se se enterra ou não, em que condições e a que profundidade. Considerando o tempo de vida de alguns resíduos, é assustador… e irresponsável o tema ainda estar verde. Ou então será porque não há mesmo solução adequada…

Diz-se que as novas centrais são muito mais seguras, mas também são muito, muito mais caras. Entretanto, equaciona-se prolongar a vida útil das antigas. Mas se estas são mesmo seguras, a ponto de poderem aguentar mais anos, porque se constrói agora de forma diferente?

Quanto ao risco de acidente, podemos dizer que Chernobyl foi coisa soviética, um contexto que aparentemente já não existe. Será? Fukujima, Japão, aconteceu num país muito organizado e disciplinado. Centrais em países como Egito ou Paquistão terão sempre uma gestão e operação rigorosas e irrepreensíveis?

E a guerra? Vimos recentemente imagens de Chernobyl e Zaporizhia em pleno teatro de guerra e arrepiamo-nos com o que poderia provocar um “tiro ao lado”. Todos os locais nucleares do mundo estão protegidos contra serem apanhados num cenário destes? Não. E se aqueles terroristas que não se ensaiam em provocar os maiores estragos possíveis decidirem atacar um reator… já sabemos que a besta, desembestando …

Pela lógica, racionalidade, preocupação com o ambiente e sustentabilidade do planeta e da humanidade: Nuclear, não obrigado. É irrazoável conviver com estas bestas apocalíticas, confinadas em frágeis jaulas. Há alternativa, mantendo os nossos atuais padrões de vida? Não.

Imagem de versão compactada, publicada no Público.  

01 abril 2022

Pequenas histórias


Tinha lá por casa um livro de crónicas perdido, num andar superior de uma estante e que não se me mostrava facilmente. O Pai Natal trouxe-me o aqui representado e foi o momento de ler os dois, do mesmo autor, Germano Silva.

O Porto, é o Porto. Uma frase que de concreto pouco diz. O Porto não é uma cidade de monumentos vistosos e de abasbacar. É uma cidade feita da grandeza de simples e frontal gente, de pequenas e significativas histórias, que lhe traçam no granito a identidade.

As crónicas de Germano Silva são simples histórias, de pequenos episódios, de perdidos recantos, de discretas passagens, mas de onde se constrói um belo quadro da chamada antiga, mui nobre, sempre leal e Invicta.

São pequenas histórias, mas muitas e diversas, ricas precisamente por essa diversidade e por um fio condutor que nos desvela o ser da urbe. Há quem diga que “a vida é feita de pequenos nadas”; uma cidade é feita, e muito, de pequenas histórias. Obrigado Germano Silva. Não voltamos a olhar para as ruelas e calçadas da mesma forma depois de o ler.