31 janeiro 2013

Esperança volátil

Ouço estupefacto que vai ser apresentado um plano nacional de prevenção de suicídio, em que, aparentemente, a principal medida consiste em aumentar o preço das bebidas alcoólicas. E lá ouvi a explicação da sequência fatal: dificuldades, depressão, bebida e suicídio. Assim, se o preço da bebida subir, o suicídio baixa! Desde já recomendo que caso não funcione se passe a proibir as bebidas alcoólicas e certamente se anulará o problema. Que o dinheiro dos meus impostos seja desperdiçado a fazer planos destes, incomoda-me porque isto é estúpido, e muito, e passo a explicar.

Em primeiro lugar, uma muito grande parte do consumo de bebidas alcoólicas não entra nessa sequência e para essa larga maioria será “apenas” mais um aumento de impostos. Em segundo lugar, não me parece que pagar mais 20% ou 30% ou beber menos 20 ou 30% tenha algum impacto relevante. Acho mesmo que isto é insultuoso para quem desesperado entrou nesse caminho.

Não sou especialista no assunto, mas é óbvio que quem chega a esse ponto o fez por perder a esperança e essa, esperança não se consegue recuperar por decreto, nem muito menos por imposto. Há uma batalha neste campo que este governo está a perder e que é fazer as pessoas acreditar. E, para começar, é fundamental acreditarmos que somos governados por gente séria, honesta e íntegra. Não resisto a sugerir, e apenas a título de exemplo, que tirem da televisão Miguel Relvas a falar dos sacrifícios que todos os portugueses suportaram, depois de ele ter feito uma passagem de ano de luxo num hotel chique do Rio de Janeiro. Desculpem-me a ironia mas isto é mais simples, mais eficaz e mais barato do que engendrar estes planos delirantes.

30 janeiro 2013

Questão sobre In Amenas

Por acaso eu estava em Argel no dia da tomada de reféns nas instalações de produção de gás natural de In Amenas. Por acaso é no mesmo país, mas poderia não ser dada a distância de 1500 km e o mundo de diferença entre os dois lugares. No entanto, e apesar disso, segui o assunto com bastante atenção e agora a frio cá ficam-me umas dúvidas e interrogações.

Parece que o objectivo inicial do ataque era tomar o autocarro que saia da base e fazer reféns. Houve tiros, houve mortos, mas este seguiu viagem. Um comando tão fortemente armado que depois resistiu durante dias a um exército que actuou sem cerimónias não conseguiu bloquear um autocarro, se bem que este estivesse devidamente escoltado. O comando dirigiu-se em seguida para a base de vida, provavelmente para ir buscar outros reféns e lá ficou. Aparentemente não tentou sair imediatamente com alguns reféns enquanto havia confusão.

A partir de altura em que o exército cerca o local, o fim estava marcado. A missão torna-se suicida. Quando várias horas depois saem do aldeamento veículos com terroristas e reféns, o exército já em posição não tem contemplações e faz em pedaços os veículos e todos os ocupantes, podendo-se “entender” a brutalidade apenas pela enorme ameaça que seria essa presença nas instalações industriais, separadas da base de vida de algumas centenas de metros.

Mas, afinal, no fim havia terroristas e reféns nas instalações industriais. Não sei se lá entraram na primeira hora ou se se transferiram durante o cerco. Claramente derrotados executaram esses reféns e nada explodiu…! A fábrica que até representa quase 20% das exportações de gás do país, retomará a produção sem problemas de maior. Apesar da cobertura mediática e dos ocidentais mortos a acção não se salda por um grande sucesso para os terroristas. Como aquilo não explodiu é para mim um mistério …


PS em 4/2/2013 após mais informação recebida/lida - Afinal parece que eles queriam mesmo fazer explodir o complexo industrial e uma parte do grupo instalou-se logo lá na primeira hora, mas com o alarme dado a produção parou e isso foi suficiente para limitar os estragos potenciais. Eu não sabia, e pelos vistos eles também não, que não é assim tão fácil incendiar um complexo de produção de gás desligado!

28 janeiro 2013

Inconveniente

Já falei aí atrás de sociedades secretas em geral e do Opus Dei em particular e não vou repetir o que já disse. Acrescento apenas que soube hoje existir uma base de dados oficial da dita organização com os livros não recomendados, muito bem organizada, com a classificação do nível de inconveniente de cada obra. Pesquisei Eça de Queirós e encontrei o seguinte:

L-A1: Sin inconvenientes
As minas de Salomão   

L-A2: Sin inconvenientes, aunque puede no resultar adecuado para lectores más jóvenes
Alves e Cia         

L-B1: Algunos inconvenientes morales
Cartas de Inglaterra , Cartas de Lisboa, Cartas familiares, Crónicas de Londres, A cidade e as serras, A ilustre casa de Ramires, Ecos de Paris, O Conde de Abranhos, O Egipto,  O mistério da estrada de Sintra, La Nourrice, Prosas Bárbaras , Os contos

L-B2: Presenta pasajes de cierta entidad contrarios a la fe o la moral
Notas contemporâneas, O Mandarim, O primo Basílio, Singularidades de uma rapariga loura   

L-C1: Presenta pasajes escabrosos o un fondo ideológico general que puede confundir a personas con una escasa formación cristiana
Os Maias, Uma campanha alegre, A Capital, A correspondência de Fradique Mendes  

L-C3: Por sus contenidos explícitos, la obra contraría la fe o la moral católica o se dirige contra la Iglesia y sus instituciones
A relíquia, O crime do Padre Amaro,

Sendo que este exemplo é unicamente para Eça, fica para mim a questão: deixar de ler (poder ler) obras magníficas por este tipo de suposta inconveniência é assustadoramente empobrecedor e pode certamente provocar escassa formação humana.

23 janeiro 2013

Ignorar ou destestar?

Não sou muito adepto de sentimentos fortes negativos como odiar ou detestar. Desgastam e não acrescentam nada. O que não presta e não nos afecta deve ser simplesmente ignorado; contra aquilo que nos pode prejudicar efectivamente, devemos argumentar e actuar com discernimento, pragmatismo e firmeza.

Vem isto a propósito da visão dos “nossos irmãos” sobre o nosso país. Dentro da empresa estrangeira que “folheio” electronicamente com alguma regularidade está o El País, e uma coisa é certa: notícias de destaque sobre Portugal apenas as negativas ou caricatas. Ainda esta semana apareceu bem destacada na página principal a história do tal falso perito da ONU, com direito a foto e tudo. Não se pode dizer que seja muito actual, já passou um mês, mas entenderam que o ridículo merecia sempre divulgação em forma.

Hoje Portugal “regressou aos mercados”, tentando colar-se à Irlanda e ensaiando uma saída da tutela financeira externa. É um assunto sem dúvida de interesse e com forte correlação com a situação espanhola, que nos fundamentos não é tão diferente da nossa como eles gostariam. Não é notícia na página principal. Intrigado lancei uma pesquisa para averiguar se eles teriam realmente ignorado o tema. Encontrei-o algures numa página de economia. A ilustrar a noticia uma fotografia de 2 moedas de 1 euro: uma portuguesa e a outra não era irlandesa nem espanhola, mas sim …. grega! Que lata! 

22 janeiro 2013

Coisas de comboios

Ao ver as imagens do acidente de ontem, lembrei-me da Índia – aí é habitual haver acidentes assim. E lembrei-me do acidente de Alcafache em que uma simples descoordenação provoca umas largas dezenas de mortas. Mas isto foi há 28 anos e ao que parece a existência de um simples meio de comunicação permanente com os maquinistas teria evitado a tragédia.

Desta vez não houve tragédia mas, para mim, é absolutamente incrível que na linha principal do país, em que tantos milhões foram gastos e enterrados, ainda possa acontecer um choque frontal assim!

16 janeiro 2013

Para que serve uma bandeira?

É num atalho que costumo usar no acesso ao hotel habitual a oeste de Argel. Poupa-me uma volta maior e duas barreiras de polícia. É, no entanto, um local em que passo com a atenção desperta e a celeridade possível. Nunca me aconteceu ali, mas é um daqueles sítios em que é provável que, por desfastio, alguém atire uma pedra aos carros que passam. Isolada na berma está uma barraca, loja de conveniência, para tabacos e afins. Ontem estava lá, pendurada não sei como nem porquê a bandeira verde e rubra. Não me pareceu ser um representante da diáspora tuga. Lembrei-me que um dos clubes principais de Argel partilha essas cores nas suas camisolas. Numa altura de uma visita oficial portuguesa coincidente com um jogo importante do Mouloudia, várias bandeiras das quinas que decoravam a cidade acabaram no estádio a encorajar o onze da terra.

Hoje de manhã tomei o atalho apesar de não ser a minha direcção forçado com a máquina em punho e a janela aberta mas era demasiado cedo para a loja estar aberta. Ao fim do dia, já com a luz do dia a morrer, forcei de novo uma passagem desnecessária e aí sim. Parei para disparar uma vez, o tempo de eles darem conta e desatarem a barafustar. Umas centenas de metros à frente fiz inversão de marcha, com a esperança de, apesar de eu ficar do lado desfavorável, tentar outra foto. Não deu nem para afrouxar. O das calças brancas viu-me e correu para a estrada berrando e fiquei a saber que pelo menos não é realmente parte da diáspora tuga.

10 janeiro 2013

Patetices

Naquela postura de que os impostos são um direito de saque inquestionável e ilimitado sobre os cidadãos, o governo francês pôs a hipótese de cobrar uma taxa especial de 75% sobre os grandes rendimentos. Gérard Depardieu potencialmente lesado reagiu e manifestou vontade de sair de França e de se instalar na Bélgica. O primeiro-ministro Francês classificou a atitude de “assez minable”, que significa “bastante patético”. Um deputado chegou mesmo a propor que se retire a nacionalidade francesa a estes exilados fiscais, subentendendo que essa excomunhão da pátria de Moliére seria um pesadelo inconcebível para qualquer pessoa de bem.

Depardieu considera-se insultado e recordando que trabalha desde os 14 anos e os milhões em impostos que entregou ao Estado ao longo da sua vida, devolve o passaporte francês por sua iniciativa e coloca a França em estado de choque! Na cultura daquele país, que alguém queira deixar de ser francês é no, mínimo, uma insanidade.

Na confusão Putin oferece um passaporte russo ao actor, este aceita e agradece com públicos e lautos elogios ao seu novo chefe de Estado! Se calhar não havia necessidade de ser tão efusivo, mas não esqueçamos que ele é actor. O escândalo em França sobe de nível e o homem é atacado de todas as formas e feitios. De realçar que uma boa parte das grandes fortunas francesas, incluindo vários grandes patrões muito respeitáveis, já têm residência fiscal fora de França e até hoje ninguém lhes chamou patéticos. E, só para acabar, sabe-se que o ministro das Finanças, o tal que teve a ideia dos 75%, está a ser investigado pelo fisco francês por supostamente ter possuído uma conta secreta na Suíça, entretanto transferida para Singapura via offshores. Afinal, quem é o minable/patético?

06 janeiro 2013

Os salteadores das empresas perdidas

Não será caso único, já vi passar alguns semelhantes, mas este é recente e claro. A Prisa, detentora de jornal espanhol de referência “El Pais” resolveu crescer. Investiu fortemente e correu mal. A crise financeira e a evolução do contexto dos média não ajudaram, mas entrar numa estrada de montanha a 200 Km/h e despistar-se na primeira curva não permite concluir que a culpa é da curva. Insustentavelmente endividada abriu o capital a “investidores financeiros”, aquela coisa dos fundos. Esse remédio não foi suficiente e tiveram que transformar dívida a bancos em capital. O que era uma empresa familiar passou a ser gerida por “frios financeiros” e no final do ano passado foram despedidos 129 jornalistas, cerca de um terço do total. Pode parecer brutal, pode desfigurar o jornal, mas, independentemente da origem do problema, é provavelmente melhor isso do que fechar a empresa. 

Cereja em cima do bolo. O director executivo principal da Prisa, o senhor Juan Luis Cebrián que nem é um “financeiro frio” recém-chegado, mas sim um histórico do ofício, distinto membro do grupo Bilderberg e arquitecto da estratégia seguida, recebeu da Prisa em 2011 cerca de 13 milhões de euros, grosso modo equivalente ao custo anual dos 129 jornalistas que ele despediu. É certo que se trata de uma empresa privada e que diferentes responsabilidades e competências devem ver-se reflectivas na retribuição, mas esta diferença é certamente excessiva. E se numa empresa saudável é obsceno, numa empresa em dificuldades é imoral.

Não sei se há ou pode haver legislação que resolva isto. O que deveria existir era um sistema de valores um pouco mais são que se auto-regulasse. Não sendo o caso e, se por um motivo qualquer, as empresas estão à mercê destes salteadores, não admira que mais tarde ou mais cedo se despistem numa curva da estrada. E quando as empresas se despistam assim a sociedade fica mais pobre.

03 janeiro 2013

Ora bem

Lá completamos mais uma voltinha no ciclo do Sol e para não entrar nessa coisa dos balanços, que já há muito quem o faça, falo de duas coisas. 

Que é feito das montanhas de postais de Natal em papel, mais ou menos bonitos, mais ou menos modernos, mas assinados à mão e que se alinhavam ao alto em cima do armário ao lado ou nas nossas costas? Aqueles bonequinhos que agora vêm agarrados em emails são mais práticos, mais baratos, se calhar mais ecológicos, mas enfim, não têm graça nenhuma! 

E a definição de Bom Ano para 2013 não é que seja melhor que 2012, por muito ou pouco mau que este possa ter sido. É que não seja pior…