26 dezembro 2012

O desafio da mudança

Para lá das diversas teorias da gestão empresarial sobre segmentação de negócios, eu acredito que há uma segmentação fundamental inicial e que divide as empresas em dois grupos: aquelas que no fim da cadeia de valor têm um consumidor e as outras que no final têm directa ou indirectamente um contribuinte. As primeiras têm por prioridade a competência, a excelência e a inovação, que as façam distinguir e sobreviver na selva de concorrência. As segundas têm a chave do sucesso no relacionamento, nas fidelidades e na, chamemos-lhe, gestão da informação.

Com a travagem brutal do investimento público em Portugal, a muitas empresas coloca-se um desafio duplo. Necessitam de encontrar novos negócios e, no caso provável de esse novo negócio ter um sistema de valores diferente, terão que se reestruturar em organização e em cultura para terem sucesso nesse novo contexto. Em muitos casos será muito mais difícil do que simplesmente obter encomendas.

20 dezembro 2012

Não há almoços grátis

Anda a comunidade fotográfica on-line em polvorosa com a alteração aos termos de utilização anunciados pela Instagram, site de partilha de fotografias, adquirido pela Facebook recentemente. Confesso que nem o conhecia. Uso apenas de vez em quando o Picasa que está agarrado ao Google, herdado do tempo em que era o habitual para “subir” fotos para o Blogger. Não o uso como rede social, apenas para partilhar álbuns com quem me apetecer. Ora bem, o Instagram acho que diz, se ainda não o desdisse, que a partir do momento em que um utilizador sobre para lá uma foto, adeus. Eles podem fazer o que quiserem com ela, incluindo usá-la para fins comerciais, que é como quem diz, vendê-la. Não entendo muito bem como isto funciona na prática, por exemplo em duas situações: quando alguém sobe uma foto que não é original sua e o Instagram a vende de seguida? Quem fica responsável – o utilizador? Quando um utilizador sobe a mesma foto em dois sites que as vendem em paralelo? Como estes senhores não dormem, provavelmente devem ter escrito em qualquer lado que ao subir uma foto, o utilizador acorda que é sua e despede-se legalmente dela.

Portanto, cada vez que pomos um clique naqueles quadradinhos obrigatórios de “li e aceito as condições de serviço”, se calhar nem sempre sabemos bem com o que estamos a concordar e todas as suas consequências. A não esquecer, claro, que como não há almoços grátis, alguém dalguma forma tem que pagar o serviço. E aí, por detrás duma aparente facilidade, está uma máquina terrível de gerir informação. Por exemplo nas “sugestões de amigos” que me aparecem, se nalguns casos entendo claramente onde foram buscar a relação, noutros aparecem-me pessoas que conheço mas completamente fora do contexto e fico a pensar se não há alguma exploração indevida dos meus históricos.

Se calhar era melhor pagar qualquer coisa para ter um álbum de fotos na nuvem, mas com condições de utilizações simples, claras e sem armadilhas, não?

PS: Tenho quase a certeza de que ao colocar aqui o bonequinho deles, estou a infringir qualquer coisa.

18 dezembro 2012

O operário e o seu automóvel

Quando Henry Ford revolucionou o fabrico do automóvel com o famoso modelo T, tinha como objectivo a redução do custo do produto, de modo a poder ser comprado pelo operário que o produzia. Muito ambicioso na altura, mas a indústria automóvel evolui de forma a esse objectivo ser alcançado. Quando há 20 anos atrás eu via no parque de estacionamento do pessoal da Ford Colónia veículos asiáticos questionava-me: na perspectiva do consumidor pode ser uma opção racional, mas não estarão estes operários a pôr em causa o seu próprio posto de trabalho? Isto era na altura da construção da Auto Europa e em que a indústria automóvel europeia ainda crescia. Hoje leio o anúncio do encerramento da Opel de Bochum, que não fica muito longe e a própria Ford Colónia foi poupada em detrimento da Ford Genk, na Bélgica, numa opção algo discutível. Se ambas as fábricas estivessem na Alemanha seria provavelmente a de Colónia a encerrar.

Ou seja, o operário passou a comprar o carro que ele fazia, depois passou a comprar carros que ele não fazia e agora, que não tem carros para fazer, fica sem trabalho. No fim ficará sem poder comprar carro de todo. O fim de um ciclo? O que se seguirá?

E não vale a pena pensar e falar em políticas voluntariosas de “prioridade ao crescimento económico” e “vontade de criar emprego” – o que a Europa precisa é de continuar a construir automóveis e afins.

14 dezembro 2012

Venham mais “I”s, mas dos bons!

Ouço nos átrios mediáticos da comentarite que há uma ideia nova. Em vez de insistir em carregar no IRS, no IRC e noutros impostos tradicionais, dever-se-ia passar a buscar receita a outras coisas como, por exemplo, impostos ambientais. E como é habitual, alguém atira uma ideia debilmente especificada, sem estar minimamente detalhada e toda a gente fala logo a seguir. Correndo eu o risco de estar fazer o mesmo, peço desculpa, mas no fim, no fim, quem vai pagar esses impostos ambientais “modernos” em substituição dos outros” I”s tradicionais? Não serão os mesmos contribuintes individuais e colectivos? Ou seja, trata-se apenas de uma redistribuição da carga fiscal pelos mesmos. No limite se a “classificação ambiental” for mais ou menos equitativa, vamos continuar a pagar o mesmo, apenas com o outro nome! Senão, haverá uns que aliviam e outros que sobrecarregam. É isto uma solução milagrosa para os nossos problemas orçamentais? Por favor !!!

Se a redução da despesa, selectiva e eficaz que não é cortar 20% a tudo, mas 100% ao que está a mais, não chega, vão buscar impostos mas a quem ainda não paga….!

11 dezembro 2012

O homem das botas

Que não é doutor, já sabíamos, que não parece ser ministro também é um facto. Ouvi-o na televisão comentando que António Costa não tem a reeleição garantida, que terá que gastar muita sola em campanha e aconselha-o a verificar urgentemente o estado das mesmas. Sinceramente… nem a um treinador de futebol fica bem esta cantiga, quanto mais a um ministro! 

A seguir ouço o anúncio de mais outro “modelo” de privatização da RTP e que, parece, será de vender 49% e entregar a gestão ao investidor privado. Se me permitem, quando alguém guarda 51% é para manter o controlo. Antigamente o Estado tinha as “golden shares” em que tinha mais poder do que a participação no capital. Agora terá uma dummy ?? share em que com a maioria do capital deixa de gerir. Depois de ter ouvido tantos anúncios de tantos modelos, um canal, ou o outro, a concessão e privatização parcial… não há dúvida que o homem sabe do que fala, muita sola deve ter gasto em tantas andanças. E, ainda por cima, esta última versão das misturas público-privadas é uma coisa da qual a gente aprendeu a desconfiar.

09 dezembro 2012

Reflexão sobre a desgraça

Qual a maior desgraça que se pode sofrer? Fome, miséria, doença, perda de um ente querido…? Não: a pior desgraça é perder a dignidade e não a reencontrar.

Jachinta Saldanha, indiana mas curiosamente com nomes na família como Barboza e Souza, a enfermeira enganada pelo telefonema falso a inquirir sob o estado de menina Kate, suicidou-se, não se sabe exactamente porquê. A casa real diz que não apresentou queixa, a administração do hospital louvou-a, a estação de rádio que fez e divulgou a brincadeira está chocada, mas afirma que não foi crime.

Provavelmente nunca se saberá exactamente qual foi a razão principal do suicídio mas o que parece mais provável é que Jachinta não suportou ser ridicularizada. Não é certamente o mesmo que disparar uma bala à cabeça de alguém, mas roubar a dignidade é seguramente um roubo e grave.