29 novembro 2023

Habituem-se ?


França é um país que preza muito a laicidade do Estado. Desde há uns tempos para cá que existe larga polémica sobre onde e como se podem montar presépios de Natal em espaços públicos e, seja por opção voluntária de autarcas, seja por decisão de tribunal, a probabilidade de nos cruzarmos com um presépio exposto em zona pública é cada vez mais remota.

As iluminações ditas de Natal parecem ser os próximos alvos. Na progressista cidade de Nantes, este ano houve inovação. As decorações chamam-se “Voyage en Hiver” (Viagem no Inverno), fugindo à palavra polémica, e em vez das habituais e festivas iluminações sobre ruas e praças, há umas coisas coloridas agarradas a algumas fachadas…

Será que um não crente se sente chocado por ver um presépio ou sobre a sua cabeça iluminações ditas de Natal? Será isso suficiente para desinfetar a quadra de toda referência religiosa, mesmo quando isso constitui uma fortíssima tradição cultural no sentido amplo da palavra? Vamos evoluir para um quadro social em que estas referências devem ser completamente apagadas de um espaço público asséptico? Certo que a sociedade e os costumes evoluem e o futuro, o futuro o dirá. Agora, pelo menos neste momento, parece-me bastante forçado… e muito menos bonito!



28 novembro 2023

Justiça à flor da pele

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Porque é que cada vez que há notícia de uma suspeita ou investigação em torno de um detentor de cargo público, há tanta agitação e nervosismo? Porque é que se parte imediatamente para uma proliferação de sentenças de opinião, quanto ao poder e métodos e até questionamento do Ministério Público, insinuando que investigação sem posterior condenação é sinónimo de abuso e falha.

Falha de outro tipo seria se todos os processos vissem os crimes investigados sistematicamente condenados. Numa situação saudável, havendo uma suspeita desta natureza, o visado só tem que não atrapalhar e ajudar a que se esclareça rapidamente. Num contexto salutar beneficiaria de uma presunção de inocência efetiva.

A prática não é assim.  Se pensarmos na grande quantidade destes casos com fundamentos inequívocos, mesmo se ainda não transitados em julgado, cada nova suspeita não é entendida como uma situação pontual a esclarecer, mas sim como mais uma, da mesma série. Se acrescentarmos a gincana processual que os investigados/acusados montam, José Sócrates como exemplo eloquente, para atrasar o normal desenrolar e desfecho dos processos, há uma percepção, justa ou injusta, de que casos com eleitos são frequentes e que estes não ajudam a um esclarecimento rápido das suspeitas, pelo contrário. Muitas vezes até nos tomam por atrasados mentais.

Há nervos à flor da pele e, à falta das outras, muita sentença de opinião num ou noutro sentido. A solução não passa por opinar, mas por … ser sério. Difícil?

 

27 novembro 2023

Alguma coisa acontece


 Eu, e como eu, acho eu, qualquer publicador, não resisto à tentação de espreitar estatísticas. Quantas vistas, de que origem, etc..

No passado era mais giro porque se podia mesmo ver a questão colocada ao Mr Google que tinha dado origem a um feliz ou infeliz ter aterrado no Glosa Crua. Por vezes era hilariante mesmo ver as perguntas colocadas.

Dentro da regularidade geral, por vezes há episódios … amazing… believe me. Um destes dias aconteceu-me isto, que a imagem acima demonstra, para um período de 24  horas. Uns milhares de vistas naqueles países todos, sobrando ainda mais 75 no fim da lista.

Não se pode dizer que não seja simpático, mas gostava de saber a receita. Mais do que eu, certamente aqueles que “monetizam” as vistas do seu quintal !

24 novembro 2023

Os resultados da TAP


Tem havido algum entusiamo com os 200 milhões de resultados positivos da TAP, como prova da sua vitalidade e da bondade da respetiva nacionalização. Os ventos vão de favor para todo o sector, uma boa parte das suas concorrentes até já reembolsaram as ajudas recebidas, mas há um pormenor aqui a ter em conta.

A TAP está a operar com um brutal reforço de fundos de 3,2 mil milhões de euros a custo zero. Vamos supor que era uma empresa normal e tinha de ir ao mercado buscá-los, sem participação nem garantias públicas. Considerando que o conseguia, em que que condições seria e quanto estaria a pagar de juros? Quanto desses 200 milhões restaria, caso a empresa tivesse que pagar os custos do financiamento da sua operação? É só fazer as contas…

23 novembro 2023

Portas e porteiros

Pondo de lado os detalhes e particularidades da crise atual, como se a não prisão preventiva é uma espécie de absolvição ou apenas uma decisão razoável para o contexto atualmente conhecido (o julgamento ainda está para vir e indícios fortes de crime há); pondo de lado a politiquice e o “spin” (desenvolvimento de narrativas), vale a pena questionar se/como os investidores podem ou não se relacionar com os decisores políticos.

Para quem pretende investir, há procedimentos e regras, cujo conhecimento e cumprimento são fundamentais. Haverá eventualmente dúvidas de interpretação e de enquadramento. É normal e salutar haver necessidade de discutir e esclarecer junto de quem de direito. Até se poderá aceitar que, sem colocar em causa os princípios fundamentais, a igualdade de tratamento e o interesse geral, nalguns casos possa fazer sentido uma evolução regulamentar, dentro do bom-senso, razoabilidade e transparência.

As entidades que decidem devem ter portas abertas, reais ou virtuais, grandes ou pequenas, conforme a natureza e dimensão dos processos em causa. Convém é que não haja porteiros informais, mas bem reais, a condicionar o acesso.

Nos países do terceiro mundo, as pessoas importantes são aquelas que têm capacidade de criar problemas e obstáculos. O seu poder vem dessa capacidade de atrapalhar e poderem depois discricionariamente solucionar e, de uma forma ou de outra, cobrar a solução. Os resultados estão à vista.

No país em que gostaríamos de viver, abram-se as portas e retirem-se os porteiros.

22 novembro 2023

Liberdade, direitos e democracia

Por estes tempos já toda a gente sabe, ou deveria saber, o que foi o Gulag. Podem dizer que não vale a pena chover no molhado, que é passado, mas eu discordo e já explico.

Diz-se que as condenações ao Gulag eram extramente discricionárias e muito arbitrárias. Não era bem assim. Segundo imagem acima, extraída do famoso livro de Alexander Soljenítsin, havia efetivamente algum enquadramento e classificação. Nela estão elencados os “crimes” que poderiam levar um individuo a passar umas dezenas de anos preso em condições não humanas e com elevada possibilidade de não regressar.

Há cerca de 4 anos o Parlamento Europeu votou e aprovou uma resolução que coloca nazismo e comunismo em pé de igualdade. Sendo que nestes casos, as contabilidades e a verificação de empate são algo subjetivas, a barbaridade estalinista não fica atrás, nem em números nem em princípio da nazi. Votação unanime? Não. Da parte que nos diz respeito, o BE e o PCP votaram contra. A declaração publicada pelo PCP na altura (aqui) é um monumento de hipocrisia e desonestidade. 

Se inicialmente Hitler e Estaline começaram aliados e a repartir a Polónia, quando até os partidos comunistas ocidentais tinham alguma simpatia pelos inimigos do capitalismo liberal, se no final a URSS foi determinante para o resultado da Guerra e a derrota da Alemanha, isto não constitui carta branca para menorizar os milhões assassinados por Estaline.  Diz o PCP no final do comunicado que não permitirá “o branqueamento do fascismo e a criminalização do ideal e projecto comunista”. Portanto… equiparar o fascismo ao estalinismo é branquear o primeiro e atacar o belo ideal do segundo?! Não têm vergonha?

A Alemanha fez o luto do nazismo e algo equivalente ou próximo é impossível de acontecer, pelo menos a curto-médio prazo, na Europa Ocidental liberal e democrática. Para a Rússia, cada vez mais autoritária e implacável, e seus simpatizantes, há tolerância e mesmo alguma nostalgia desses tempos assassinos e nunca é demais dizer que

“Gulag nunca mais”

Destes estamos muito menos protegidos. 

12 novembro 2023

A ver se eu entendo


Há um esturricado enorme em torno do atual executivo. Ministros e chefe de gabinete do PM arguidos, suspeitas sobre o próprio PM, de tal forma que este entende não ter condições para se manter no cargo e demite-se. O PR aceita e convoca eleições para daqui a 4 (quatro) meses.

Não conseguindo avaliar as limitações técnicas, 4 meses mais a organização e a tomada de posse do novo governo são uma eternidade. Que governo vamos ter até lá? O atual com o mesmo PM e alguns retoques mínimos e obrigatórios? Mas, se A. Costa entendia e declarou não ter condições para continuar, com que autoridade e energia vai poder dirigir o governo e o país durante este tempo. Se o período foi alargado pela necessidade de não se parar uma série de dossiers críticos, quem vai liderar esses processos tão relevantes? Um governo ferido e recauchutado com um PM fragilizado?

09 novembro 2023

A pequena corrupção


Do que se sabe deste turbilhão que arrastou o PM e abriu esta crise, saltam-me à vista dois pontos. Um é que mesmo que A. Costa esteja limpo e inocente, ele paga o preço das más companhias… diz-me com quem andas… e andar na companhia das antigas companhias de José Sócrates foi uma imprudência, no mínimo.

O segundo ponto é a pequenez terceiro-mundista das ações em causa. Não se terá tratado de transações de milhões com umas percentagens a passarem e a ficarem em paraísos fiscais. Aparentemente estava em causa simplesmente obter autorizações, aprovar projetos, acelerar processos. Num país do primeiro mundo, onde queremos estar, uma boa parte destas intervenções não deveriam ser sequer passiveis de corrupção. Deveria existir regulamentação clara, entidades decisórias claras, independentes e eficazes e as coisas avançarem (ou não) por razões transparentes e não por cunhas ou favores, grátis ou pagos.

Para lá do que soubermos como resultado da investigação e respetivas conclusões, bom mesmo seria que o poder decisório sobre estes processos ficasse limpo e livre de discricionariedades de ministros e de acimas ou abaixos.