30 julho 2013

Níveis de segurança

Não parece haver dúvidas de que o acidente ferroviário na Galiza se deveu a excesso de velocidade na curva. Parece que o maquinista assumiu logo no momento que estava a circular muito acima do que devia. Os motivos para esse facto serão analisados e podem ser desatenção, indisposição ou outra coisa qualquer, mas escala à parte não deixa de ser equivalente a um condutor de autocarro que passou um sinal vermelho e provocou um grave acidente. Por aí deve ficar a investigação e daí sairão as conclusões.

Eu não entendo nada de comboios e posso estar a dizer um grande disparate, mas arrisco. Temos uma larga recta feita a 200 km/h e no final dela uma curva que deve ser abordada a 80 km/h. O maquinista saberia certamente disso, presumo que haveria instruções e sinalizações para o informar e avisar, mas… Para o que está em causa, faz sentido que essa operação depende exclusivamente da acção do maquinista e ser tratado de igual forma como o semáforo para o autocarro? Não era mais do que justificado haver algum tipo de segurança activa que antes da curva controlasse a velocidade do comboio e o travasse independentemente da distracção ou loucura do maquinista?

Aparentemente na zona de alta velocidade existe um sistema de seguimento e controlo da velocidade do comboio. Na zona do acidente em que ele estava na via antiga e convencional, o controlo é feito apenas por baliza pontuais, e a primeira baliza estava depois da curva…!

Certamente que não deve haver responsabilização criminal para quem não se lembrou de pôr uma baliza antes da curva, mas que isso traduz uma enorme ligeireza na abordagem à segurança, é inquestionável.

25 julho 2013

Detroit, forças e fraquezas

Detroit, a capital histórica da indústria automóvel dos USA, aquela que para muitos é ainda “a Indústria”, a cidade onde foi concebido e produzido o famoso Ford T (foto da fábrica aqui), onde nasceu o conceito do automóvel tal como o conhecemos hoje, declarou-se incapaz de cumprir as suas obrigações financeiras. Por outras palavras, entrou em falência. Dizia-se em tempos que o era bom para a General Motors era bom para os USA e vice-versa. Detroit foi e é a sede da GM, assim como da Ford e da Chrysler, os 3 grandes. Significa esta quebra da cidade emblemática que a GM não está bem? A GM esteve muito mal há poucos anos, mas numa daquelas reviravoltas que infelizmente nem todo o mundo consegue realizar, recuperou e está relativamente bem. Continuam-se a fabricar automóveis nos USA mas deixaram de ser feitos em Detroit e daí este esvaziar da cidade. A indústria automóvel fugiu daquela zona e a causa tem um nome principal: UAW – United Automobile Workers – o poderosíssimo e temível sindicato da indústria automóvel. Aliás, não a totalidade mas uma boa parte dos problemas dos fabricantes históricos há 5 anos, deveu-se precisamente ao facto de a sua base industrial instalada naquela zona não ser competitiva e suportar encargos enormes, herdados dos variados direitos adquiridos pela UAW para os seus afiliados ao longo do tempo. Daí que esta zona fortemente sindicalizada foi considerada como uma peste a evitar para novos investimentos e o que lá existia ficou definhando.

Se claramente a forte tradição sindical é causa relevante, a respectiva interpretação pode variar: para uns a inflexibilidade e a intransigência dos sindicatos mataram a cidade, para outros o “dumping social” praticado noutros estados nunca deveria ser permitido. É fácil discutir longamente sobre o assunto, como é fácil constatar que a consequência é clara e está consumada.

Passando aqui para este lado do Atlântico e pensando em dois exemplos de locais históricos da indústria automóvel. Em França fecha fábrica após fábrica e a percentagem de automóveis franceses fabricados no país de origem vai diminuindo inexoravelmente. Há uma grande discussão sobre o tema mas os números são claros: os locais em França são menos competitivos. Na Alemanha onde o automóvel está no ADN do país e onde também haveria todas as condições potenciais para se assistir a uma deslocalização irreversível, encontraram-se soluções e a indústria está e lá deverá continuar. O caso alemão de diálogo pragmático e construtivo é um excelente exemplo que deveria ser interpretado e transposto para todos os locais “ricos” (ou que agem como se o fossem), no sentido de evitar “Detroits” em série. Curiosamente, ou não, na Alemanha até há sindicatos fortes, provando que o problema não está em existirem sindicatos. Tudo depende da cultura, como sempre!

19 julho 2013

Coisa de Ramadão

Entre o nascer e o pôr-do-sol, no caso concreto actual de Argel, das 3h43 da manhã às 20h09 da noite, além de outras restrições, não se come nem bebe. Portanto o pequeno-almoço está completamente fora do horário permitido. Aliás, para um muçulmano desrespeitar o Ramadão não é bem crime mas pode dar tribunal.

Nos hotéis internacionais há naturalmente pequeno-almoço para os estrangeiros, mas como eu sou poupadinho, vou para um mais barato, menos internacional e em que não há. Quando cá estou no Ramadão tenho que exigir um pequeno-almoço, só para mim, e que sai sempre algo improvisado.

Desta vez no primeiro dia correu bem: croissants, compotas, queques recheados, sumo de laranja, ovo cozido e café ! Impec! No segundo dia desapareceram os croissants e as compotas. No terceiro dia foi a razia: apenas tinha queques e café! Com um pouco de reclamação lá consegui um sumo. Felizmente era o último dia, até porque a quantidade do que sobrava também diminuía de dia para dia!

16 julho 2013

Insuportável cheiro a urina

Todos sabem que é característico dos canídeos levantar uma das patas de trás e deixar cair umas gotas de urina aqui e acolá para marcar o seu território. Não é por necessidade de urinar, é apenas questão de deixar uma marca que sinalize a sua passagem e existência aos seus pares. Como muito muitos, creio eu, decidi não acompanhar em detalhe esta chamada crise política actual. Que haja divergências e tensões é normal e correctamente gerido até pode ser salutar. Agora que isso seja tratado na praça pública da forma como foi é indecoroso e muito irresponsável.

Com tanta confusão, faz e desfaz, diz e desdiz, avanço e recuo, considero tarefa inglória e inutilmente desgastante seguir o assunto passo a passo. Espero pelo desenlace final, para ver como ficaremos e na altura farei o balanço. Até lá, o que me incomoda realmente é este insuportável cheiro a urina, que torna o país muito pouco saudável!

14 julho 2013

A História não se repete

Era uma vez um país em que após décadas de regime fechado a pressão popular o obriga a abrir-se e que realiza eleições abertas, multi-partidárias. As eleições são ganhas por islamitas mas os militares impedem-nos de governar. Será o Egipto de hoje? Pode ser, mas eu estava a pensar na Argélia de 1992 e onde o resultado dessa exclusão foi uma década negra com cerca de 200 000 mortes. Para lá da guerrilha tradicional e atentados cegos em zonas urbanas como mercados e transportes públicos, houve listas de gente das letras e das ciências eliminados um a um, houve aldeias inteiras isoladas e os seus habitantes degolados e um sem número de outras atrocidades. Irá o Egipto cair num caminho idêntico? Esperemos que não, até porque o contexto é diferente. Na Argélia a segunda volta das eleições legislativas foi suspensa pelos militares e os islamitas nunca chegaram a governar, tendo saltado para a clandestinidade com toda a força e “legitimidade”. No Egipto eles fizeram a experiência do governo e parece haver uma parte importante da população que apoia a recente acção do exército.  

Num país árabe que se abre ao multi-partidarismo, é previsível serem os islamitas a ganharem as primeiras eleições – eles conseguem apresentar uma proposta concreta e diferente com a qual uma grande parte da população se identifica: “a nossa religião, os nossos valores”. No entanto, para muitos, o objectivo principal não é a democracia em si, mas simplesmente viverem melhor. Se o novo governo não conseguir responder a esse anseio com brevidade, rapidamente se desencanta. Terá ainda que procurar um compromisso dificilmente praticável entre a facção islâmica mais conservadora para quem a Sharia pode e deve servir de Constituição e uma parte da sociedade, mais moderna, que até participou na revolução buscando um país mais moderno, e que se assusta enormemente com alguns (des)propósitos como, por exemplo, no que diz respeito à condição feminina.

O primeiro-ministro turco, islamista, Recep Erdogan, disse uma vez, distraído ou não, que a democracia é como um comboio que se apanha e donde se sai quando se chega ao destino pretendido. Morsi no Egipto estaria a tentar por em prática o mesmo princípio. Como se ironizava na Argélia na altura, democracia seria um homem, um voto… uma vez! Sendo o Egipto um país fulcral no mundo árabe pelo seu peso demográfico e localização, o que lá acontecer é de extraordinária importância para meio mundo.

Numa grande encruzilhada está também a Tunísia, que apesar de uma dimensão muito inferior ao Egipto tem um peso não negligenciável. Foi lá que tudo começou em Janeiro 2011. Esta semana iniciou-se o Ramadão. São 30 dias em que entre o nascer e o pôr-do-sol, para lá de outras restrições, não se come e não se bebe. Em 1964, há quase 50 anos, Bourgibga, o líder forte e pai da Tunísia moderna, na altura pouco democrática, bebeu um sumo de laranja em directo na Televisão, em pleno dia durante o Ramadão, argumentando que o jejum podia ser quebrado em caso de guerra e que na Tunísia estava em curso uma batalha pelo desenvolvimento. Por muito menos há hoje gente levada a tribunal, acusada do crime de muito largo espectro de “atentado ao sagrado”.

Presumir como muitos o fizeram há dois anos, que bastava registar partidos, organizar eleições e contar votos para ter um país firme no caminho do desenvolvimento é obviamente uma enorme ingenuidade. Esperemos, e se possível ajudemos, que corra bem. Por meio mundo, que é também o nosso, e muito especialmente pelos seus homens e mulheres, muito principalmente estas, que merecem viver em dignidade com paz, respeito e com oportunidades.

09 julho 2013

Onde chega a pobreza

Eu sei que os tempos não são de fausto, como também é verdade que a pobreza de espírito é das piores. Começaram a aparecer alguns cartazes para as eleições autárquicas que me surpreenderam pela riqueza da sua mensagem e respectiva originalidade. Uma pequena amostra segue. Os candidatos que ainda não tenham decido sobre o respectivo lema podem naturalmente inspirar-se … pobremente!

  • A “terra” não pode parar
  • Dedicados à “terra”
  • Dar vida à “terra”
  • Unir a “terra”
  • A “terra” é a minha casa
  • Futuro de confiança
  • A “terra” sempre
  • A “terra” pode mais
  • Confiança no futuro
  • Melhor “terra”
  • Juntos pela nossa terra
  • Por um futuro melhor
  • Todos somos “terreiros”
  • Juntos pela “terra”
  • Mais e melhor para a nossa terra
  • Liderar a “terra”
  • “Fulano” sabe
  • Para a “terra” vencer
  • Mais perto de si
  • Vencer 2013
  • Mudar a “terra”
  • A “terra” primeiro
  • Fazer bem
  • Fazer crescer
  • Nós gostamos da "terra"
  • Por todos

07 julho 2013

O problema não está nas finanças

Enquanto pensarmos que o problema está na figura do ministro das finanças e que os destinos do país estão nas suas mãos, enquanto os restantes ministros acharam que ele é/deve ser/não deve ser o homem bom ou mau que os deixa ou não gastar o que querem, estamos equivocados.

A salvação do país está na sua governação em que há vários ministros, cada qual com os seus pelouros, alinhados numa política coerente e dirigidos por um primeiro-ministro que inspira e lidera. O ministro das finanças é apenas mais um, com uma função muito específica e relevante, mas presumir que quem assina os cheques tem todo o poder é subverter o sistema.

Um governo com um primeiro-ministro para discursos, um super-ministro das finanças e os restantes membros mansa ou revoltadamente subordinados é um governo de menoridades, em que os seus membros não governam, mas são sim governados pelo tal super-ministro. Assim não vamos/nunca iremos lá e o problema não está na cara de um ministro.

03 julho 2013

Voos e sobrevoos

Vamos lá a ver. Nem sou Américas nem anti-américas. Não acho que a maior parte dos prisioneiros de Guantanamo, incorrectamente detidos, sejam uns coitadinhos vítimas de injustiça, nem acho que Snowden seja um perigoso bandido, apesar de ter infringido a lei do seu país.

Agora, que para transportar os prisioneiros para Guantanamo as nossas bases dos Açores tenham sido usadas “no problem” e que o avião presidencial da Bolívia não possa ter aterrado em Lisboa por pretensamente transportar Snowden... há aqui qualquer coisa que não bate certo!