30 janeiro 2023

Quem não tem dinheiro…


… não tem vícios, sendo também verdade que quem tem vícios facilmente fica sem dinheiro. Aqui, na paróquia nacional, temos um vicio. Quando se trata de obra para “inglês ver”, no quadro de algum evento com projeção internacional, não se olha a custos nem à forma de gastar, o importante é deslumbrar os visitantes.

Foi assim com o CCB em 92, foi assim com a EXPO 98, com o Euro 2004 e é agora com as JMJ, alguns exemplos de que me recordo no imediato. Um evento importante é justificação para gastar sem contar e sem ser importante muito controlar. O fundamental é embasbacar. Não vamos arriscar fazer má figura para poupar uns tostões (ou milhões). Quando são questionados os milhões, vemos manifestações de surpresa da parte de (i)responsáveis, como que intempestivamente acordados de um sono tranquilo.

Acho curioso o argumento da valorização do “retorno”. Se ele existe, maior será com custos reduzidos, bem fiscalizados e tudo preparado a tempo e horas. Não é por se torrar dinheiro que as receitas aumentam.

Enfim, um vicio que não enriquece.

Adicional: tendo sabido que o famoso palco vai requerer grandes fundações onde antes estava um aterro sanitário, entre biogás e lixiviados, mais complicação promete...

27 janeiro 2023

Condenações e omissões


Um destes dias, um excitado queimou um exemplar do Corão em frente da Embaixada turca na Suécia e o assunto tornou-se planetário, gerando protestos na rua árabe e mesmo tomada de posição do secretário-Geral da ONU.

Certo ser condenável, mas tratou-se de um ato individual que não matou nem feriu ninguém e se o SG da ONU tem que se manifestar cada vez que um excitado insulta os princípios ou convicções de um vizinho… não lhe sobrará muito tempo.

Depois, há a curiosidade da fácil mobilização da rua árabe por um ato isolado, quando, ao mesmo tempo, ignora as barbaridades diárias e institucionais que estão a acontecer com os Uigures e a sua religião. Difícil de entender que um debate proposto na ONU sobre a situação desta minoria tenha sido chumbado, contando, entre outros, com os votos contra do Paquistão, onde tão facilmente a rua se inflama, Qatar, Emiratos Árabes, Indonésia e outros países de maioria muçulmana. Difícil ainda de entender a falta de reação popular quando por muito menos nascem incontroladas manifestações e motins violentos.

O quadro com o resultado global da votação, 19 contra, 17 a favor e 11 abstenções, é um monumento à hipocrisia reinante. É alarmante quanto à saúde dos direitos humanos no planeta e à forma como eles são institucionalmente tratados neste fórum da ONU, que se mostra assim assustadoramente atacado por uma mui maligna doença.

- abaixo, versão publicada no Público, que lhe retirou o último parágrafo.



25 janeiro 2023

Valha-nos um outro deus, qualquer


Há quanto tempo sabemos que a capital do império vai receber a Jornada Mundial da Juventude? Também sabe, quem quiser saber, que o evento foi adiado um ano por causa da pandemia.

Portanto, conclusão provisória, tempo atempado para tudo preparar em conformidade com as regras não terá faltado, certo? Não, errado! Há uma urgência em ter tudo pronto a tempo e daí os famosos ajustes diretos, que já vão em 13 milhões de euros e ainda procissão vai no adro. Os tais diretos que frequentemente dão direito, diretamente, a intervenção do Ministério Público. A rotina, pois!

Dentro desses ajustes diretos está o famoso palco, ajustado diretamente por 4,2 milhões de euros, arredondados com mais outro milhão para as fundações. Mas, enfim, alegremo-nos porque a coisa ainda pode servir para outras coisas. Quais, logo se verá! Obviamente que era impossível fazer a coisa por menos…

Encerro, já que agora só me saem palavrões. Não, não somos ricos, porque, mesmo que o fossemos, a riqueza não aguentaria muito tempo com tamanha irresponsabilidade e ligeireza. Ao fim e ao cabo, o que é milhão a mais ou a menos para quem nunca se preocupou em criar riqueza, nem um cêntimo.

18 janeiro 2023

Perguntar não ofende


É sempre bom existir uma abordagem sistemática e estruturada a questões complexas e delicadas. Daí que o famoso questionário de 36 perguntas aos potenciais (candidatos?!) ministros e secretários de Estado é, por princípio, positivo. Indo aos detalhes. Antes deste questionário não havia escrutínio a nenhuma destas questões, começamos assim do zero? Por exemplo:” Tem a situação fiscal regularizada junto da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)?”

A seguir, faltam certamente muitas questões para validar a idoneidade do individuo, esta não se esgota em questionário e mesmo a pergunta genérica final, 36, é simplesmente respondida pelo próprio na sua melhor boa intenção e critério. Sobre o escrutínio das respostas, a tentativa, negada, de envolver a PGR e o TC é bem representativa da tática. Chutar a bola para o lado e corresponsabilizar terceiros. Triste e covarde.

Ao mesmo tempo em que este questionário era cozinhado, ouvimos Ana Catarina Mendes, figura de proa do partido e do governo, dizer sobre uma das figuras que o provocou: "Gratidão por todo o trabalho que ao longo dos anos o Miguel Alves fez nesta federação. Ser socialista é isto mesmo: é sermos solidários, é não nos esquecermos daquilo que cada um de nós consegue dar, de si, à causa pública. O Miguel deu muito de si à causa pública". Enfim, tudo muitíssimo credível!

Posso sugerir a questão 37? “Esteve envolvido ou tem conhecimento de alguma ação de financiamento ilegal de partido político?” … Perguntar não ofende!

17 janeiro 2023

Em volta dos rios

Os rios nascem na foz. A definição de um rio começa no ponto onde ele acaba no mar. Daí para montante há uma sucessão de entroncamentos onde se decide qual é o troço do próprio rio e qual é o afluente. Por exemplo, na Régua é muito claro que o Douro é o curso que continua a “subir” para o Pinhão e as linhas de água que chegam da direita e da esquerda são dois afluentes, o Varosa e o Corgo.

Noutras situações pode ser menos óbvio, se deve predominar o curso com mais caudal ou que se projeta mais longe. É o caso do Pisuerga nas proximidades de Vallodolid, onde segundo dizem os locais é ele que traz a água e é o Douro quem leva a fama…

A belíssima imagem acima Robert Szucs é muito interessante e demonstra claramente que mais do que um curso de água, um rio é uma bacia. Se olharmos para o ponto mais afastado do Douro (amarelo) relativamente à foz, considerando ser por ali a nascente, que percentagem da água que chega ao Porto saiu daquele local? Muito pouca…

Se olharmos para o Guadalquivir (roxo) é talvez menos óbvia a definição do tal ponto simbolicamente original da nascente do rio.

Este mapa das bacias pode também ser cruzado com o mapa dos reinos ibéricos. É curiosa a boa correspondência entre a bacia do Ebro (vermelho) e os antigos reinos de Aragão e de Navarra. Não será certamente por acaso. Relativamente a Portugal pode encontrar-se a fronteira do Minho e do Guadiana e a limitação interior do Mondego (laranja) e do Soraia (laranja claro), mas o Douro e o Tejo são duas grandes bacias parcialmente atravessadas no território.

O mapa das bacias é um mapa topográfico. É o relevo que faz os caminhos da água, mas também as maiores ou menores dificuldades nas deslocações das gentes. A capilaridade é a mesma. Os rios tanto podem gerar bacias agregadoras como limites e fronteiras. Podem unir ou dividir, formal ou informalmente. Gosto de ler rios…


15 janeiro 2023

Ética sem mais


Da mesma forma como alguns se apresentam em cerimónias públicas com as lapelas pejadas de medalhas que de objetivo dizem pouco, mas que darão uma suposta imagem de honorabilidade, também há quem adjetive expressões para aumentar o impacto percecionado, quando na prática…

Uma delas é a da ética dita republicana. De que serve, nos dias de hoje, acrescentar este qualificativo? Serve para dizer que há uma ética “boa” e “nossa”, que “nós”, os tais “republicanos”, superiormente conhecemos e definimos? Portanto, o Reino Unido, coitado, tem uma séria e inultrapassável carência nesse campo.

Por vezes ainda se invoca o “laico” a seguir ao “republicano”. No contexto em que vivemos presumir que uma conceção laica da sociedade e da política é uma especificidade, nem ao Menino Jesus lembraria!

Recuando um século, aos tempos da primeira República, aí podemos efetivamente reconhecer que “republicano e laico” era um “santo e senha” com um significado muito claro e concreto, distintivo, exclusivo… e abusivo. Esses tempos tiveram aspetos positivos, mas a instabilidade, sectarismo e violência foram demasiados para se poder sentir nostalgia e alguma simpatia romântica por um período revolucionário, incompetente e brutal, muito especialmente se se acrescentar a palavra “ética” à invocação.

Portanto, preocupem-se e assumam a ética, aquela que toda a gente sabe o que é, sem particularização nem senhorios. Já, agora, estamos prestes a ver um século da instauração do Estado Novo, que não foi simplesmente uns malvados terem-se aproveitado de um povo distraído, foram também ajudados por muito povo estar farto dessas “éticas” diferenciadas. Seria bom que a história não se repetisse…

12 janeiro 2023

Degradação do regime


O que vimos acontecer no passado domingo em Brasília é indiscutivelmente inaceitável num regime democrático. Acho que podemos dizer com segurança que o tempo das revoluções e pronunciamentos é definitivamente passado no Brasil.

Podemos ver semelhanças com o ataque ao Capitólio de 2021, assim como entre Trump e Bolsonaro, apesar de este não ter, pelos menos assumidamente, apelado à sublevação. Também parece haver em comum que as instituições do Brasil foram/serão suficientemente sólidas para controlar a situação e retomar a normalidade.

Há uma diferença importante que, sem desculpar nem relativizar a gravidades dos fatos, convém referir. Lula não é Biden. Biden não chamou genocida a Trump, não tem o passado judiciário do brasileiro, recordando que este, se se “safou”, foi pela forma e não pelo fundo.

Lula foi eleito, democraticamente, dentro da legalidade, tem toda a legitimidade, mas isso não apaga a repulsa que devem sentir muitos brasileiros. Imaginem, num paralelo, que Sócrates se safava judicialmente e voltava ao poder. A reação, e certamente que a solução, não passaria por invadir o Parlamento, mas o respeito pelas instituições não seria o mesmo. Não é tão cedo que o Brasil se irá pacificar, nem a atual responsabilidade é principalmente de Bolsnaro, apesar de todos os seus defeitos. Por muito tempo haverá brasileiros que não reconhecerão Lula como um presidente que merece o cargo. Se isso justifica e desculpa partir assim a louça, é claro que não.

08 janeiro 2023

Finalmente uma boa notícia


Dentro do negativo dos casos com as recentes nomeações governamentais, a demissão relâmpago de Carla Alves é uma boa notícia. É boa porque primou o princípio de que a um governante não basta ter (ainda) o registo criminal virgem. Não vingou o famoso “À justiça o que é da justiça”, como no caso de Miguel Alves, que se arrastou penosamente durante quase dois meses, quando era claro que ele não era sério e/ou competente.

Pode ser que constitua um bom precedente e que os princípios éticos de quem nos representa e gere o que é de nós todos, independentemente das cores e das ideologias, passem a ser uma exigência prática e não citações vãs.

No dia em que para as autarquias se aplicar um escrutínio semelhante (não vale rir…), muita coisa mudaria e o país melhoraria. Infelizmente não será amanhã, mas sejamos otimistas… e exigentes.

06 janeiro 2023

A importância de passar a secretário de Estado


A nova secretária de Estado da Agricultura, Carla Alves, tem contas bancárias conjuntas dela e do marido arrestadas por, ao longo de vários anos, declararam receber menos euros do que os que entraram no banco. No seu CV também há “colaborações” com a câmara de Vinhais, presidida pelo marido, de enquadramento no mínimo duvidoso. Assim, já lá vão três casos muito recentes de figuras que promovidas a secretários de Estado vêm um escrutínio acrescido e a coisa acaba mal. Quase apetece dizer: criem mais secretarias para conhecermos melhor quem por maus caminhos anda….

O fato de Carla Alves ser nomeada com essas manchas na reputação, na ressaca dos casos ainda frescos de Miguel Alves e Alexandra Reis, quando os cuidados deviam ser máximos, representa uma de duas coisas: ou não se fez averiguação prévia e isso é de uma displicência inconcebível, ou sabia-se e achou-se aceitável. Em ambos os casos, desgoverno completo e desrespeito pelo Estado, que somos todos nós.

Aparentemente estará cada vez mais difícil encontrar governantes que não sejam família de quem já lá está, que não tenham embolsado ou queimado uns milhares dos contribuintes, que não sejam ou estejam para ser arguidos … Ao fim e ao cabo quem de decente estará disposto a aparecer no meio de tão bizarras companhias!

05 janeiro 2023

Quando um homem quiser


O Natal já lá vai, o Ano Novo também, já só falta o Baltazar, o Gaspar e o Melchior para fecharmos a quadra, bem recheada de votos e de boas intenções.

Como se diz por vezes, Natal é quando se quiser, ou assim deveria ser. Por isso, fora do dia, mas dentro da quadra, que afinal é suposto ser todo o ano, que 2023 seja para cada qual e cada um melhor do que 2022, que esse melhor seja para aquilo que realmente conta e perdura e que o solstício dos dias que recomeçam a crescer em luz, possa ser um renascer luminoso.

Vamos em frente !