25 novembro 2007

Jerusalém - Árabes e Judeus




Coincidindo com o aniversário da morte de Arafat e a preparação de mais uma conferência de paz, vi um filme sobre os primeiros tempos da criação do estado judeu, “O Jerusalém” de Elie Chouraqui, e um documentário da “Arte” muito bem feito, sobre a evolução desse conflito até aos “acordos de Oslo”. É curioso comparar as duas visões: uma histórica com o testemunho dos políticos e com as evoluções militares desenhadas nos mapas e a outra, talvez menos rigorosa, mas com gente que ama e que morre.

Israel constitui indubitavelmente uma grande espinha espetada na garganta do “Mundo Árabe”. Mas, o que realmente magoa fundo não são as atrocidades cometidas nas zonas ocupadas, nem os excessos no Líbano, nem a intrusão dos colonatos. O que lacera os árabes é Israel ter resistido e, apesar da enorme tensão circundante, ter criado uma sociedade desenvolvida e democrática que, por contraste, constitui uma prova da falência do modelo dos seus vizinhos.

Se não houvesse Israel, poder-se-ia evocar que se trata de uma zona complexa, uma natureza agreste e toda uma série de argumentos para justificar a pobreza e relativizar o despotismo. No entanto, o facto de existir ali uma democracia, que tornou fértil terras inóspitas, com um nível de desenvolvimento humano e social sem paralelo na região, é uma afronta muito indigesta.

De notar que se tivesse havido uma solidariedade árabe efectiva e minimamente eficaz nunca Israel teria sobrevivido mais do que escassos meses. O que dói é que, em 1967, quando a grande coligação árabe estava teoricamente pronta a aniquilar Israel, este os tenha despachado em apenas 6 dias. Há uma parte anedótica: a Jordânia avisa o Egipto de que caças israelitas tinham descolado na sua direcção. A mensagem apanha os egípcios confundidos com uma mudança recente do código e quando é desencriptada já os seus Migs estavam todos em pedaços, sem terem praticamente sequer levantado voo.

Em tempos era moda andar por aí com aqueles lencinhos bem giros dos palestinianos vítimas da opressão sionista, apoiada pelos imperialistas americanos. Muito bem. Para lá do registo histórico dos palestinianos, bastante mais criticável do que o de Israel, que se comprova agora? A sua autonomia traduz-se em incapacidade total entre corrupção e agressões mútuas. Uma parte da diáspora palestina é provocada por eles próprios, mal comportados, que não deram outra solução ao Rei Hussein que não fosse expulsá-los da Jordânia.

E para acabar uma pergunta fatal: Se o pessoal solidário dos lenços fosse obrigado a optar a viver entre Israel ou num estado governado por palestinianos, que opção fariam ??? Resposta fácil, não?
Foto Googleada sem referência de origem.

22 novembro 2007

Um lugar à janela


Costumo pedir um lugar à janela. Prefiro viajar com um olho dentro e outro fora, a desfrutar do ilusório espaço de um corredor claustrofóbico. Gosto de acompanhar os rios e cruzar os cumes, de ler as linhas de costa e de adivinhar as cidades. Gosto de sentir as oscilações, mesmo as da tempestade, com uma referência externa e não como dentro dum submarino atingido por um torpedo.

19 novembro 2007

E também foi bem feito !


Finalmente foi confirmado o título de campeão de condutores de F1 deste ano para Raikonen ... e foi mais um “é bem feito”!

Os ingleses da Mclaren tiveram acesso a informações preciosas roubadas à Ferrari. Numa primeira fase defenderam-se dizendo que sim, que receberam essa informação, mas não a utilizaram. Como se fosse possível um engenheiro tomar conhecimento de conceitos e soluções para um problema que ele tem em mãos e, no fim, esquecer tudo e desenvolver o seu produto como se nada tivesse visto!

Numa segunda fase, já não conseguiram esconder o tráfico e a utilização descarada da informação, mesmo sobre a estratégia de corrida dos italianos. A equipa perdeu os pontos e os pilotos foram poupados. Sabendo que o campeonato de pilotos tem uma visibilidade muitíssimo superior ao das marcas, ficou um gosto amargo a injustiça face à perspectiva altamente provável de vir a ser campeão alguém da equipa batoteira.

Só gostava de ver os títulos da imprensa britânica se tivessem sido os italianos, latinos e tradicionais trapaceiros, a copiarem a sua mui séria e fleumática Mclaren...

Mas a última prova foi corrida no Brasil, terra onde, como se sabe, “Deus é grande!” (e aliás tem quase tantos deuses como a Índia) e, aí, contra todas as previsões o terceiro classificado do campeonato passou a primeiro. Do alto da sua idoneidade moral a Mclaren ainda protestou o resultado, numa coisa complicada que não vale a pena explicar aqui e ... perdeu!
A Ferrari é e será sempre diferente de tudo o resto. Aquele vermelho incendeia emoções. Terá havido festa duas vezes em Maranello. No fim do GP do Brasil e agora na confirmação.

15 novembro 2007

Grande Sarko



Quando N. Sarkosy foi eleito não faltaram vozes esclarecidas a manifestarem uma profunda preocupação pelo perigo de autoritarismo que tal personalidade prenunciava.

Não tenho nenhuma simpatia por tiranetes ou déspotas insensíveis, mas devo dizer que não partilhava essas preocupações e a acção posterior do novo presidente francês até me fez ganhar alguma admiração pelo mesmo.

Ouvindo o que ele diz, sobre a situação de África, sobre Israel ou sobre os Estados Unidos, é difícil não concordar com a generalidade das suas posições. E é de notar que tem a coragem e a frontalidade de o dizer olhos nos olhos. Só por isso, tem mais mérito do que os recentes anteriores presidentes franceses, de esquerda e de direita, infinitamente hipócritas e tortuosos.

Hoje os ferroviários estão em greve. Porquê? Porque instalados em poltronas confortáveis nos climatizados postos de condução dos TGV’s têm um regime especial de reforma, herdado do tempo em que trabalhavam à boca da fornalha das máquinas a vapor, em condições duras!!! E se esse estatuto ainda se mantém até hoje é porque ninguém teve a coragem (para não usar um termo mais forte) de corrigir o disparate. Quando os ferroviários colocam meio país refém do seu protesto, tentando manter um privilégio absurdo, onde está a faltar “solidariedade social”?

Não sei quanto tempo Sarkosy se aguentará na postura actual. Não falta quem lhe vaticine uma queda rápida. Uma coisa é certa: tem uma legião de gente de todos os quadrantes incomodada com a sua acção e frontalidade e não beneficiará da menor clemência. Nos corredores do poder um enguia como Miterrand ou Chirac tem obviamente melhores condições de sobrevivência.

Desejo-lhe boa sorte.

12 novembro 2007

Ajudas

A China colocou à disposição da República Democrática do Congo um pacote de 5 biliões de dólares para desenvolvimento de infra-estruturas. Não é caso único mas em termos percentuais é enorme. Trata-se de um valor da ordem de grandeza do PIB do país! E esta oferta surge no momento em que a RDC tenta arduamente renegociar a sua dívida com o Banco Mundial e com o FMI.

Como muitos outros países africanos, a RDC necessita desesperadamente de financiamento externo e agora tem duas opções. Ou esta opção chinesa em que muito provavelmente as obras serão realizadas por empresas chinesas e em que, para lá disso, a China ficará com um acesso prioritário aos vastíssimos recursos naturais do país, ou um financiamento ocidental.

Os financiamentos ocidentais são complicados. Pelas suas normas internas e pela pressão da opinião pública, eles querem mesmo saber como o dinheiro é gasto, interferem e dão palpites, muitas vezes críticos, quanto à governação do país e por aí fora. Parece que com os chineses não há esse tipo de “problemas”.

Além dessa opção do lado africano, há também uma opção a fazer do lado ocidental. Como jogar este jogo? É verdade que o registo dos negócios ocidentais por aqueles bandas não é assim tão transparente, mas também é verdade que é possível ver altos responsáveis da Total responderem numa barra de tribunal em Paris.

Ou o Ocidente joga jogo igual, impunemente de preferência, ou deixa o jogo ser jogado por outros, com tudo o que isso implica. Ou, então, escolhe outras armas. A estratégia de produzir bens de equipamento de tecnologia avançada simplesmente onde for mais barato e com eventual transferência de conhecimento para abrir a porta aos negócios deveria ter os seus dias contados. E essa não é uma opção económica, é política. Na dúvida, pode sempre ver-se como os americanos protegerem ciosamente a aplicação da sua tecnologia durante a guerra fria. Outros tempos? Outras ameaças?

08 novembro 2007

Uma espécie de assalto

O nível de delinquência urbana na Argélia é elevado e a possibilidade de ser assaltado é grande, devendo ser sempre encarada como bastante provável. Hoje, cerca de 14 meses depois de cá chegar, fui assaltado pela primeira vez, mas não exactamente como esperaria.

Por estes lados a condução respeita poucas regras: passadeiras, traços contínuos e indicações de prioridade são pouco mais do que meros elementos decorativos. Há, no entanto, uma coisa para a qual a polícia é implacável: o telemóvel. Não tendo “mãos livres”, costumo falar em alta voz com o aparelho discretamente agarrado numa das mãos.

Hoje, ao circular assim, ouço uma sirene atrás de mim, nunca imaginando que me fosse dirigida. Para minha surpresa, uma pick-up decrépita atravessa-se à minha frente, como nos filmes, saindo dela um agente tosco que me inquire sobre aquela criminosa utilização do telemóvel ao volante.

Respondo em tom baixo, como é recomendado, argumentando que sou português, que não conhecia bem as regras locais e peço desculpa, mas com estes a táctica não parece funcionar. Multa e, como é usual em quase qualquer infracção e ao critério da “autoridade” no momento, carta apreendida! E lá me explicam que tenho que ir aos correios pagar a multa de 1500 dinars para me devolverem a carta. Eu continuo com o choradinho que não sei onde há correios, que não sou de lá e blá, blá, blá. Não falei do Figo e do Madjer mas pouco faltou. Sugerem-me então que os siga até aos correios. E lá partimos em procissão, lentamente; ainda aproveitam para parar e barafustar com outro condutor por uma coisa qualquer e acabam por estacionar numa zona muito tranquila sem nenhum posto dos correios próximo.

Saio e vou à janela do carro deles conferenciar e insistem para eu ir pagar aos “correios”. Sugiro então que, como não sei onde é, lhes dou os 1500 Dinars (Cerca de 15 Euros), eles dão-me a carta e vão lá pagar por mim! Respondem-me prontamente que é proibido e, acto contínuo, dizem para voltar ao meu carro e discretamente embrulhar os 150. Sabendo dos problemas locais com os zeros à direita, preparo 150 num bolso e 2000 no outro, pois não tenho trocado. Ficaram-me com os 2000 e claro que não me deram troco.

Uma vez em Amsterdão, aí há uns 20 anos, comprei a minha vida por 2,5 contos. Aqui comprei a minha carta de condução por cerca de 20 Euros. Não me deu gozo nenhum o expediente. Senti-me sem pachorra para aturar os atrevidos que, no trânsito denso, constantemente apontam e investem os narizes contra as nossas portas. Pus o belo compasso quaternário da Norah Jones do “Thinking about you” bem alto e rumei a casa, deixando a visita à feira do livro para uma outra vez, ou não.

07 novembro 2007

Acidentes acontecem

Pode-se discutir como minimizar o número de acidentes pela melhoria das infra-estruturas, pelo aumento do policiamento e repressão, pela evolução das atitudes e mentalidades e tudo o mais, mas eles nunca deixarão de ocorrer. O problema é que quando acontece um acidente sério com um autocarro as consequências são quase sempre trágicas. E talvez só não ocorram mais pela prudência que, de uma forma geral, os profissionais que os conduzem manifestam.

Porque é que os acidentes de autocarro se tornam tão facilmente em tragédias? Pensemos na evolução na segurança passiva e activa nos automóveis ligeiros nos últimos anos, nas almofadas de ar, nas deformações estudadas das estruturas e tudo o que foi feito para proteger os ocupantes, traduzido nas famosas estrelas NCAP que ser tornaram um argumento comercial fundamental. Que se passa com os autocarros? Alguns terão cintos de segurança, mas até que ponto os assentos se mantêm solidários com a estrutura em caso de acidente? A carroçaria em volta dos passageiros é assustadoramente ligeira e frágil. Comparado com os ligeiros, a diferença é abismal e, no entanto, partilham a mesma estrada e os mesmos riscos.

Pelas dimensões e vocação será difícil aos autocarros atingirem um nível de segurança passiva idêntico ao dos ligeiros, ou não. Enquanto for uma questão fora da agenda pública nunca o saberemos. Questão de custo?

05 novembro 2007

Perplexidade

A história da ONG francesa “Arca de Noé” e do salvamento/rapto de uma centena de órfãos/não órfãos do Chade/Sudão é uma daquelas situações em que a realidade desafia a mais inverosímil ficção e que faz brotar questões em catadupa.

Sabendo todos os controlos e restrições existentes no espaço Shengen à entrada de cada simples indivíduo, como conseguiriam entrar assim cem de uma vez? Como seria possível legaliza-los nas famílias de adopção? Como pode alguém ter considerado isto viável? Esta ONG padece de ingenuidade ou, pelo contrário, está rendida ao contrabando e do pior que existe?

As crianças ou uma parte das crianças não seriam sudanesas nem sequer órfãs. No entanto, quantos pais conscientes na África negra aceitariam de bom grado, com mais ou menos lágrimas nos olhos, e agradeceriam que os seus filhos fossem criados e se desenvolvessem na Europa, certos de que esse futuro lhes seria bem mais favorável do que continuar no seu país de origem?

Ainda se desconhece o desfecho para os intervenientes que muito provavelmente não será nada simpático. Agora, qual a mancha que este episódio deixará, para o futuro, na imagem de todas as outras ONG sérias e abnegadas que muito fazem para paliar à desgraça quotidiana nessas paragens? Será uma oportunidade para os “G” de governos porem um pouco de ordem nestas ONG’s, em que tantas delas tantas dúvidas levantam?

Por último: é claro que os estados são soberanos e que a acção em causa tem todos os ingredientes para configurar um crime grave que terá a correspondente condenação e expiação. Agora, quando metade do terceiro mundo se põe em bicos de pés para acusar rotundamente tamanho abuso e ingerência do primeiro mundo, não seria bom que pensassem no trabalho de casa em falta e falassem mais baixinho? Apesar de todas as limitações, será que estão, com a mesma veemência, a fazer tudo o que podem para que as suas crianças não tenham pais que de bom grado as deixam partir? O mais importante neste processo são as crianças e apenas castigar os aventureiros de boa ou má fé, não vai mudar radicalmente nada.