26 fevereiro 2023

A realidade dos direitos fundamentais


Na recente discussão quanto à necessidade de agir na questão do problema da habitação, foi referido que esta constitui um direito constitucional, assim como a saúde e outros. Agora, discute-se incluir a garantia da erradicação da pobreza no chamado texto fundamental.

Está tudo muito justo e certo, mas não é certamente a simples existência do artigo 58, estipulando que todos têm direito ao trabalho, que vai acabar com o desemprego (ou ilegalizá-lo!). Não se pode tão-pouco inventar ocupações de faz de conta, que não geram valor, apenas para cumprir o dito cujo.

Já que não vivemos sobre poços de petróleo, somos obrigados a criar riqueza para permitir condições de vida dignas a toda a população. Abordar essas questões decretando ou simplesmente invocando antigos ou novos direitos é começar a casa pelo telhado.

O papel fundamental do Governo é proporcionar condições para a criação de riqueza, garantido desde logo que não esbanja a que existe. A partir daí, poderemos lá chegar, mas se não a houver, bem podem decretar tudo e mais alguma coisa, que ela não nasce com este tipo de editais.

O programa chamado “Mais habitação” é um bom exemplo no sentido inverso. Limitar, reverter, proibir, coagir são verbos que não rimam com enriquecer e, para os direitos fundamentais serem efetivamente garantidos, o enriquecimento não pode ser pecado.

22 fevereiro 2023

Não as medem


O programa “Mais habitação” recentemente apresentado é vasto, mas há um ponto que julgo importante relevar pelo que tem de significativo quanto à forma equivocada como este Governo imagina soluções. Trata-se da recuperação dos imóveis devolutos assumida pelo Estado. Antes de mais, seria um bom sinal este dar o exemplo e recuperar os seus, antes de meter a foice em seara alheia.

Quem já precisou de recuperar ou modernizar o seu próprio imóvel, sabe como o processo pode ser longo, imprevisível e variável em tempo e custos. As opções possíveis para os materiais e equipamentos, a coordenação dos diversos trabalhos e a (falta de) fiabilidade de muitos empreiteiros e instaladores pode tornar o processo num pesadelo difícil de controlar.

Imaginar que o Estado, que neste momento nem consegue completar um cabaz alimentar para distribuir a quem necessita, possa levar a cabo com um mínimo de eficácia e dimensão estas intervenções em casa alheia, é de um irrealismo atroz.

Este tique de o Estado se substituir aos intervenientes adequados e voluntariosamente assumir tudo e mais alguma coisa é uma atitude que não resolve nada a prazo e, pelo contrário, não dá confiança a quem dela precisa. Quem realmente sabe e pode investir.

21 fevereiro 2023

Eclética e religiosa


O Carnaval, o último dia antes da Quaresma, o da carne que se vai, tem uma referência claramente religiosa na sua origem e data. Mas é um pouco também uma antítese da mesma. 

Ao marcar o início de uma interdição, ele abre as portas a extraordinárias permissões, onde se poderá ser o que no resto do ano não é possível. As máscaras físicas ou de atitude são um escape, como uma última longa inalação de oxigénio antes de um grande mergulho em apneia.

Da simplicidade ancestral e algo rude de Lazarim ou Podence à sofisticação de Veneza; da exuberância tropical e deslumbrante do Rio às caricatas e provocadoras imagens, muitas vezes de gosto duvidoso, o fundo da motivação é o mesmo. Ser diferente e talvez um pouco como no fundo se gostaria de ser.

Não sou de corsos, nem de participar nem de assistir, * mas reconheço que a energia que move tantas militâncias nesta causa tem algo de regenerador e vital.

* Nota adicional em 22/2: aqui faltou acrescentar "nem de correr o farrapão".

14 fevereiro 2023

O que falha


31 meses depois da nacionalização da Efacec, que era suposto ser transitória, termina nova tentativa de reprivatização, sem se saber o que vai dar. Para uma empresa de acionista ausente e a navegar sem velas, 31 meses é uma eternidade que pode ser fatal.

O cabaz alimentar para pessoas necessitadas, que deveria incluir 25 produtos, está a ser distribuído apenas com 8, por incapacidade da máquina burocrática do Estado em realizar as necessárias compras.

Dos fundos europeus, da famosa bazuca, destinados à habitação, apenas cerca de 50 de milhões de euros, cerca de 3% foram executados e a lista continua.

Já sabíamos que o Estado tinha dificuldade em gerir e gastar bem; a novidade agora é que este Governo já nem sequer consegue agir, de todo. Será?

Não, há exceções! Aa equipa coordenadora nomeada pelo governo para as JMJ, liderada por José Sá Fernandes, a qual Carlos Moedas classifica de pretensos coordenadores que não fazem nada e que não ajudam a resolver nada, custa 530 mil euros por ano. Incluindo um coordenador, três adjuntos, três técnicos especialistas, uma secretária pessoal e um motorista. Aqui nada pode faltar e, na dúvida, fica em funções até um ano e meio após o evento terminar. Será o tempo necessário para desmontar as instalações sanitárias?

Depois, queixem-se dos populismos e divaguem com teorias quanto à medicação!

07 fevereiro 2023

Extremamente credível


Não é meu hábito repescar estes postais, mas para este não resisti.

Para lá do facto de alguns dos nossos blindados não estarem operacionais, quantos não se sabe… também não se sabia bem o que estava nos paióis de Tancos, está o espírito alinhado… a solução imaginada é brilhante.

A imagem é extremamente credível. Imaginar este governo a “kitar” um velho carocha para fazer de conta que é um tanque e assumir e vender uma solução assim tão imaginativamente engendrada, é muito no estilo daquelas tropas.

Felizmente não temos vizinhos imprevisíveis, já que não seria com blindados que os deteríamos. Para que servem umas forças armadas com este nível de equipamento e prontidão? Para que se gasta por ali dinheiro… e refiro-me ao bem gasto, já que quanto o mal gasto todos sabemos as motivações…

06 fevereiro 2023

Pode a TAP ser uma empresa normal?


Já tínhamos a polémica, muito merecida, quanto à razoabilidade da brutal injeção de dinheiros públicos na TAP. Depois, tivemos a polémica com a indeminização pelo afastamento de uma administradora, mais grave até pelas etapas seguintes.

Tivemos a polémica dos BMW, talvez mais simbólica do que efetiva. Num contrato de leasing, o valor residual da viatura conta e, contas feitas, pode um BMW ter um custo de renda mensal idêntico ao de um Peugeot.

Agora temos a polémica com o bónus, palavra maldita, da CEO, quando não é o conceito em si que pode constituir um problema. Neste nível de funções é habitual haver uma componente variável, dependente do cumprimento de objetivos, e o importante é o seguinte. A remuneração total está ou não ajustada ao mercado? As condições associadas ao bónus são efetivamente relevantes e desafiantes ou facilmente alcançáveis?

Já que a TAP, infelizmente, também me diz respeito, por princípio, prefiro que a equipa de gestão tenha uma parte da remuneração em bónus associado à criação de valor, do que tudo em valor fixo e garantido.

Com ignorância e/ou má-fé, a forma como este tema está a ser discutido é apenas prova adicional que a TAP, para funcionar, não pode ser estatal. E que o Estado, como gestor de empresas, tem sérias limitações e deficiências.

03 fevereiro 2023

E as crianças, senhores?


A greve, no seu conceito geral, é feita por trabalhadores contra o seu empregador, provocando-lhe quebra de rendimentos. As fábricas e as atividades económicas param. Tem lógica esta causa-efeito quando o prejuízo fica em quem tem o poder de atender às revindicações.

Depois, há as greves dos serviços públicos, onde os principais prejudicados não são as entidades patronais, mas sim inocentes cidadãos, tomados como reféns numa disputa que não lhes diz respeito. Podem ter grande impacto mediático, pela desordem causada, mas há aqui alguma perversidade e o bom-senso devia limitar a sua frequência e duração.

Por estes dias assistimos a prolongadas greves no setor do ensino, em que os reféns não são cidadãos que podem perder um dia de trabalho por falta de transporte. São estudantes, com um currículo já fragilizado pelos efeitos da pandemia, e que podem perder algo dificilmente recuperável.

Não me cabe aqui desenvolver considerações sobre justezas e injustiças. Apenas referir que este extremar de posições e a falta de vontade/capacidade de encontrar uma solução razoável ou, pelo menos, decretar tréguas de negociação é uma pesada irresponsabilidade.

A migração, apenas de quem pode, para o sector privado, a fim de garantir formação de qualidade aos seus filhos, é uma consequência natural e uma brutal injustiça. Põe em causa o princípio da igualdade de oportunidades, algo que deveria ser garantido na teoria e na prática.