29 janeiro 2022

Política, razão ou emoção

A opção que cada eleitor irá tomar este fim de semana deveria ser fundamentalmente racional. Estamos a falar de governar o país, administrar bens comuns, criar riqueza e bem-estar.

Para muitos, porém, é impossível subordinar a emoção à razão. Muitas vezes prima um histórico emotivo associado a uma experiência, um velho sonho ou (des)ilusão, que pela positiva ou pela negativa se impõe às evidencias objetivas. É certo ser impossível e, digamos mesmo, desumano que todas as nossas opções sejam conduzidas sempre e apenas pela mais pura e fria racionalidade. A própria ciência o diz.

Mas, uma coisa é uma opção, um impulso, que apenas impacta o próprio, outra coisa é um voto que determina a forma como a sociedade vai evoluir ou regredir; a responsabilidade é maior e exige um esforço acrescido de racionalismo e maturidade.

27 janeiro 2022

O terror dos ditadores


Por estes dias, Alexei Navalny, um político crítico e opositor a Vladmir Putin foi classificado terrorista, como se dirigisse uma organização daquelas que colocam bombas nos caixotes do lixo das estações de caminho de ferro.

Por estes dias, a Rússia monta um teatro onde ameaça invadir a Ucrânia, ao que parece para inviabilizar a entrada desta na Nato. Provavelmente terá sucesso. A Europa da Nato defende a liberdade e a autodeterminação dos povos, mas será muito impopular assumir a obrigação de enviar os seus cidadãos combater numa guerra por lá, quando os confinamentos da pandemia já são considerados pelas suas juventudes como um dramático e traumatizante enorme problema.

É legitimo esperar que neste mundo onde vivemos e queremos viver, as ambições e as tensões se resolvam por outras formas que não com balas nas carnes. E é também obrigatório chamar os bois pelos nomes. Ditador quando é ditador, terrorista quando é terrorista. Gostava que todos os partidos em campanha fossem claros quanto a estes nomes e estes bois. É o modelo de sociedade que está em causa.

23 janeiro 2022

Teremos sempre geringonça?


Parece dizer A. Costa que “Geringonça nunca mais”. Este afastamento tem alguma lógica tática nesta fase. Ao fim e ao cabo há muito eleitorado do PS que não se revê nessa constelação. Agora, se contados os votos, forem necessários os deputados do BE e/ou do PC para ancorar o PS ao poder, acham que este irá hesitar mais do que 30 minutos?

Diz também que se fizerem a injustiça de não lhe dar a vitória se vai embora. Haverá por acaso um lugar livre a curto prazo pelo Conselho Europeu? Bom, isto de apanhar um avião, Ryanair ou outro, e deixar na paróquia um delfim, tem um precedente, que não acabou bem para ninguém. Neste caso, até me tremem as pernas só de pensar nisso.

20 janeiro 2022

Pessoa e Salazar


No meu cabaz de Natal, ou no sapatinho, ou na meia… chegou este livro, acima ilustrado.

Pessoa era genial, mas não tão louco como muitos grandes criativos, que têm alguma dificuldade em conseguir uma vista equilibrada e racional sobre a política e a sociedade em geral. Este excerto já de 1925 é representativo

Tio Mussolini e Abade Lenine

Seguimos o princípio contrário ao do tio Mussolini e ao do abade Lenine. Desoprimir. Tornar os outros diferentes do que nós queremos! Ensinar cada homem a pensar pela sua cabeça e a existir com a sua existência – só com a sua existência.

É muito interessante a evolução da visão de Pessoa sobre Salazar, inicialmente como alguém que sabia o que queria em termos das desgraçadas contas públicas, que o comunica e implementa, depois como alguém que reduz o governo do país a um exercício de contabilidade e finalmente alguém que pretende secar e anular tudo o que for desalinhado com a sua visão (estreita) e objetivos.

1935

Inteligente sem flexibilidade, religioso sem espiritualidade, ascético sem misticismo, este homem é produto de uma fusão de pobrezas: alma campestre sórdida do camponês de Santa Comba, que apenas se alargou na pequenez pela educação no seminário, por todo o inumanismo  sórdido de Coimbra, pela especialização rígida e pesada do seu destino desejado de professor de finanças. É um materialista católico (e há muito assim), um ateu nato que respeita a virgem. […]

Em Salazar, há sempre materialismo, há sempre o pequeno contabilista. Não podemos sonhar porque o sonho não é remunerável.

Tudo esta evolução ocorre em apenas 7 anos e pensarmos que Salazar sobreviveu no poder ainda mais 33 anos ao poeta e filósofo é assustador. E pensarmos que o regime ainda durou mais 6 anos após a saída do seu criador…

Podemos entender que a seguir à catastrófica e anárquica primeira República, houvesse forte predisposição a aceitar quem viesse pôr ordem na casa.  Agora que isso tenha continuado tanto tempo, quando já em 1935 era claro a todos que quisessem ver ao que o homem vinha, assusta-me. Porque, obviamente, não basta diabolizar Salazar. Se o regime tanto aguentou foi por ele e não só.

Hoje, quando vemos as trapalhices em que a nossa governação se afunda, sem parecer ter capacidade de se auto regenerar…

 

19 janeiro 2022

Discursos de miss mundo


Há bastantes. Não necessariamente quanto ao desejo de haver paz no mundo; esse é antigo e algo gasto, mas muitos sobre a transição energética. É um desejo bonito e fica bem em todos os programas eleitorais pedir o fim da produção de energia elétrica geradora de CO2. Obviamente que também é bonito haver rios livres sem barragens, montes limpos de eólicas e por aí fora. O nuclear também não devia estar bem, mas a Europa decretou recentemente que podia ser usada na transição para a transição. A França, atrapalhada por várias manutenções no seu parque nuclear, mantém o carvão. Nós por cá já fechamos as duas últimas que restavam.

Há também muitos discursos sobre a importância de a paisagem continuar bonita, exatamente como nos tempos pobres e tristes em que não havia eletricidade nas aldeias nem atividade económica no interior, para lá da dura subsistência. Tudo o que seja uma utilização economicamente racional e sustentável da terra é logo um abuso intensivo a limitar. Seja oliveiras, eucaliptos, pinheiros, abacates, morangos ou mirtilos. Aparentemente apenas o trigo do Alentejo e o milho no Norte são aceitáveis aos olhos dos citadinos que gostam de disfrutar da paisagem ao fim de semana.

Acho curiosas estas visões de futuro apenas compatíveis com o passado dos romances neorrealistas, independentemente da qualidade literária dos mesmos. Não, não defendo um vale tudo, mas um pouco de realismo nunca fica mal.

15 janeiro 2022

Muito mais é o que os une…?


“Fechem os olhos e ponham lá a cruzinha”. Consta que esta terá sido a expressão usada por Álvaro Cunhal para instruir aos seus camaradas o voto útil em Soares na segunda volta das Presidenciais de 1986. Certo que os comunistas preferiam este último a Freitas do Amaral e quem nunca votou contrariado num mal menor, que atire a primeira pedra. Foi um sapo que tiveram que engolir e não se viu Soares e Cunhal de mãos dadas em devaneios românticos de um “muito mais é o que nos une do que aquilo que nos separa”: - Olhe que não, olhe que não…!

Compreende-se que o PC e o BE tenham preferido recentemente um governo do PS a um do PSD. O que não se entende é o sapo ser apresentado transfigurado em delicioso leitão. O modelo de sociedade historicamente defendido pelo PS não tem nada em comum com o dos regimes comunistas totalitários cujas aplicações ao longo de um século apenas provocaram decadência e ruínas de várias naturezas. Apresentar esses projetos e o PS irmanados num manto de uma esquerda virtuosa é um embuste, ou então o PS mudou muito e com ele não vamos longe.

Não sabemos o que sairá das próximas eleições. Esperemos não acabar em novo casamento ambíguo com dote excessivamente elevado. Para lá da improvável repetição de algo na escala dos 3200 milhões da nacionalização da TAP, o atraso e o marcar passo do país com cedências a conceções económicas e sociais que já demonstraram cabalmente a sua falência tem um custo muito alto.

08 janeiro 2022

Carta a um eleitor desiludido


 Sim, é natural haver por aí muitos eleitores desiludidos, desencantados e mesmo revoltados com a falta de competência, rigor e de honestidade de quem tem assumido a responsabilidade de nos representar e dirigir este belo jardim à beira-mar plantado.

Sim, não deve faltar quem não tenha mais paciência para ouvir discursos excitados sobre virtudes e máculas, da direita e da esquerda, do centralismo e de regionalismo, de todos os ismos e doutrinas e de tantas causas menores que são detalhes no meio dos sérios problemas que tantos encaram no dia a dia. A saturação e a frustração têm por consequência a vontade de mudar, de correr riscos e aceitar experiências.

Sim, mudar sim, mas se as atitudes radicais podem dar belas dissertações, nunca deram boas governações.

06 janeiro 2022

Não, a Europa não é uma página em branco


O cartaz acima representado, patrocinado pela União Europeia, Conselho Europeu, vem defender e valorizar o uso do véu islâmico, em nome do respeito pela diversidade e invocando a liberdade. Gerou polémica suficiente para a campanha ser suspensa.

De facto, se poderá haver quem o use por gosto, muitas o usarão por pressão social e/ou para não serem assediadas e dificilmente se pode associar este monástico esconder o cabelo e a beleza que o mesmo transmite a… beleza.

A Europa tem tradição, parcialmente justificada, de ser terra de acolhimento. Depois há aquele trauma cristão do “mea culpa”, curiosamente até mais assumido pela esquerda, segundo o qual os pecados do nosso passado e os males feitos por esse mundo fora, devem ser expiados recebendo e ajudando todos os pobres do mundo.

Quem achar que deve haver limites para o que pode chegar e mudar é imediatamente desclassificado e carimbado como xenófobo. A Europa não é uma folha de papel em branco onde tudo pode ser escrito, nem uma Torre de Babel multicultural. Tem a sua cultura e o seu quadro social, no qual os europeus se reconhecem. O véu islâmico e os princípios que impõem a sua utilização não estão conforme com os princípios sociais em que a Europa foi construída e teve sucesso, nomeadamente com o papel da mulher na mesma.

Que uma instituição europeia venha promover e valorizar isto, sobe a capa da tolerância, demonstra até que ponto os poderes em vigor estão divorciados dos sentimentos da população. Na campanha presidencial francesa, assiste-se a uma subida fulgurante de Eric Zemmour e simplesmente apontar a componente xenófoba do que ele diz ou uma vez disse é insuficiente para o desacreditar face aos eleitores chocados com a desfiguração do seu país. Pelo contrário…

03 janeiro 2022

As reparações históricas


Poucos são os crimes que jamais prescrevem. Entende-se que ao fim de algum tempo, é desnecessário, impossível ou inconveniente instaurar um processo ou aplicar uma pena. Para um acontecimento com vários séculos já decorridos pareceria obvio não ser possível nem razoável tentar ajustar contas. Vamos reclamar à França os estragos das invasões napoleónicas, vem o Brasil pedir-nos contas pelo ouro que de lá saiu (embalar e despachar Mafra em contentores daria um excelente romance!)? Pode o mundo inteiro listar todos os saques e invasões sofridas e pedir compensação a quem entender? Obviamente que não faz sentido, até porque as entidades envolvidas muitas vezes já não existem ou pelo menos serão hoje muito diferentes do que eram na altura do “crime”?

De uns tempos para cá, no entanto, passou a estar na moda a reivindicação das reparações históricas, como se para algo efetivamente isso servisse…

Dentro desse espírito, Portugal e Espanha decidiram compensar os descendentes dos judeus expulsos no século XV da Península Ibérica e nada mais do que com a nacionalidade plena. Sendo consensual que esse episódio não constitui motivo de orgulho, também é verdade que estabelecer a ligação de alguém hoje com um antepassado partido há cinco séculos e respetivo prejuízo é tudo menos óbvio.

Este gesto simpático, e por muita simpatia que possamos ter pela causa, peca infelizmente por excesso de generosidade e carência de rigor. A vergonhosa naturalização relâmpago de alguém de perfil tão duvidoso como Roman Abramovich prova que algo está mal no processo em particular. Quanto ao princípio em geral…

01 janeiro 2022

Novo ano


Porque é que marcamos um novo ano, cada ano? Face à linearidade do tempo, necessitamos de marcar ciclos, fazer balanços e projetar objetivos? Talvez.

Um momento de nos miramos num espelho, imperfeito, e avançarmos em direção à luz? Mesmo com passos são frágeis e o terreno não muito claro.

Entre refletir, considerar e valorizar, avançar.

É só mais um ano, mas sendo apenas um, é suficientemente grande. Deixando os balanços, venham os objetivos.

Bom Ano 2022