28 maio 2010

O Mourinho e os Merdinhos

Pode-se não se apreciar o estilo de José Mourinho, pode-se não se simpatizar nada com o homem, mas criticá-lo destrutivamente só pode ser obra invejosa de um Merdinho qualquer. Um Merdinho divide as pessoas em dois grupos. Há aqueles que quando falham são crucificados e quando fazem bem apenas cumprem a sua obrigação. Depois, há o outro grupo, dos “nossos”, dos que quando falham foi azar nítido e que quando acertam são uns craques. Os primeiros são frontais e assumidos; os segundos são esquivos e espertos. E não vale a pena entrar em considerações e conclusões sobre o efeito que a primazia de um grupo ou do outro traz em termos de resultados.

Mourinho aceita ser crucificado quando falha e assume riscos com frontalidade. Por isso quando tem sucesso não há nada a dizer a não ser “bravo!”. Não me consta que use técnicas baixas. Se ganhou foi por mérito próprio, daí que os Merdinhos deveriam discretamente permanecer calados.

Mesmo agora, ele podia ter ficado endeusado no Inter, gozando de um tranquilo estado de graça e com muito mais peso para poder chamar “prostituídos intelectuais” a certos “jornalistas” italianos. Mas não. Parte para o Real onde o mínimo que lhe é exigido é ganhar tudo. Caso contrário será alegremente crucificado por todos os Merdinhos deste mundo. É certo que vai ganhar uma pipa de massa, isso faz parte do jogo, mas nenhum Merdinho alguma vez trocaria uma situação pela outra. Daí as críticas.

27 maio 2010

Refém

Por azar ou desatenção fiquei ontem preso, e pela segunda vez, num “protesto” pela introdução das portagens nas scuts. Se ficar preso num engarrafamento é desesperante, quando se sabe que é voluntariamente provocado, a raiva dispara. Não está em causa o nível de pertinência do protesto. Também não está em análise a sua eficácia. Se bem que imagino que, confortavelmente instalado num gabinete de Lisboa ou num hotel de Nova Iorque, quem tem poder decisão sobre o assunto não terá ficado muito impressionado ou sensibilizado com o espectáculo.

O que está em causa é com que direito num estado de direito, uma iniciativa destas pode fazer refém uma multidão provocando prejuízos de vária ordem. Não seria possível fazer um protesto visível, fundamentado e não primário como este? Aliás, é semelhante às greves de alguns sectores públicos, cuja “força” reside precisamente na capacidade de incomodar vulgares cidadãos.

Não, decididamente não. Um estado de direito não deve funcionar assim. Quem pretender pode protestar da forma como entender mais adequada mas sem tomada de reféns. Isso é próprio de terroristas.

26 maio 2010

Numa cidade perto de si

Ele tinha 33 anos e queria casar com ela. Ela tinha 15 anos e não queria. Então, um dia, sob ameaça de arma branca, ele forçou-a a entrar num prédio abandonado e a subir a um terceiro andar onde a tentou violar.

Ela fugiu precipitadamente pela janela do terceiro andar, partindo vários ossos na queda, mas mantendo-se consciente. Ele aproveitou então para a trazer de novo para cima e para durante várias horas concluir o que se tinha proposto fazer inicialmente.

Quando o estado de saúde dela se complicou ele abandonou-a à porta de um hospital sem sequer avisar os serviços.

Aconteceu numa cidade próxima de si... ou não. Não importa. Para certas coisas não há distâncias.

24 maio 2010

Ouviram as minhas preces!




Aqui há uns meses atrás queixava-me eu das minhas desventuras ao procurar uma sucessora para a minha máquina fotográfica Sony R1 e em como eu achava ser possível e lógico ter uma máquina com sensor actual de tamanho decente, com objectivas intermutáveis (e monitor articulado...) sem precisar do anacronismo do espelho. Não encontrei.

Bom... parece que a Sony me ouviu ou antecipou os meus desejos. Ou então eu não serei assim tão raro. Aí estão fresquinhas acabadas de sair as Sony Nex-5/Nex-3 que parecem ser mesmo, mesmo, aquilo que eu queria: umas dignas sucessoras da minha R1 que sempre foi precursora de qualquer coisa. Talvez tivesse é saído demasiado cedo para os preconceitos culturais do meio fotográfico.

Eu já devia ter imaginado que a Sony não me deixaria ficar mal.

23 maio 2010

Baratas e estilos

Quando se entra num compartimento que pode ter baratas daquelas que se passeiam apenas no escuro e se escondem da luz, há uma opção a tomar entre três atitudes:
  • Ou acender a luz já preparado para atacar rapidamente, antes que elas tenham tempo de fugirem da luz e desaparecerem da vista...
  • Ou acender a luz e olhar para o tecto, assobiando ou não, dando tempo às ditas cujas de se esconderem e quem não vê pode fazer de conta que não sabe...
  • Ou acender a luz e ficar parado na soleira vendo-as fugirem sem ter tempo e oportunidade de as liquidar, ficando a saber que elas lá estão e que quando se apagar a luz regressarão à arena principal.
E, a cada um o seu estilo, naturalmente...

19 maio 2010

Obrigado Grécia

Para quem não sabia ou não imaginava, a crise vem mesmo aí. Até aqui andávamos a brincar com ela, atirando generosamente dinheiro aos problemas, dinheiro esse que por acaso nem era nosso. Agora, graças à Grécia e aos “mercados”, a expressão recém consagrada para designar quem tem para emprestar, descobrimos que se calhar essa não terá sido a melhor opção... e vai doer.

Devemos agradecer à Grécia, apesar de a situação deles ter algumas especificidades não comuns com a nossa, por ter feito disparar o alarme. Se tivéssemos continuado alegremente a cavar o défice por mais um ano, a ressaca seria certamente pior.

Não somos caso único. A Espanha está quase igual e veremos quanto à França que surpresa nos reserva. Para lá deste agradecimento fica o espanto. Os governantes europeus não sabiam que existem “mercados” financeiros sobre os quais não exercem soberania, como exercem, por exemplo, sobre os impostos dos seus súbditos, e que “beber para esquecer a dor de fígado” não é necessariamente uma brilhante ideia?

Se não sabiam é gravíssimo, se sabiam e assobiaram para o lado por populismo é muito mau e deixa-me muito preocupado com a qualidade de quem nos governa e/ou com as regras da sobrevivência democrática que nos levam ao desgoverno.

A Europa é um barco entrado numa tempestade. Quando as ondas começaram a varrer a coberta os seus “funcionários” reagiram com reuniões, declarações e muita credulidade. Agora que descobriram que há perigo real desatam a procurar os baldes e a improvisar. Sem timoneiros capazes de definirem um rumo, de o aplicarem e de sobreviverem politicamente à sua aplicação não naufragaremos necessariamente, mas ficamos com um barco mal remendado que vai ficando para trás na corrida. Ou seja, ficaremos mais pobres.

12 maio 2010

Investir ou gastar?

Faz-me confusão ouvir dizer que os grandes projectos públicos deverão ser/serão cancelados devido à situação financeira actual, por não haver dinheiro. É certo que quem não tem dinheiro deve reduzir os seus gastos. Mas gastar é diferente de investir. Posso não ter dinheiro para gastar mas posso ter um excelente projecto rendível para o qual não terei dificuldades em obter financiamento.

Obviamente que quando o financiamento do projecto é feito em condições de mercado adversas ou frágeis do investidor, a fasquia da rendibilidade tem que ser colocada num nível mais elevado, mas a decisão de investir ou não será sempre função da retorno expectável para o projecto.

Curiosamente em todas as discussões a que assisto sobre a oportunidade ou a falta de oportunidade destes chamados “investimentos” públicos, fala-se de investir como se se falasse de gastar. E isso preocupa-me. Mesmo a referência aos efeitos positivos na dinamização da economia ao nível da realização da empreitada são temporários e nunca podem por si só justificar a despesa. Faz lembrar a política de contratar funcionários públicos para preencher e carimbar formulários apenas com o objectivo de reduzir o desemprego.

Em resumo fica a questão: os “investimentos” públicos são planeados na perspectiva do investimento e seu retorno ou do “gastar” em que, havendo dinheiro, gasta-se, não havendo não se gasta?

PS: Escrevi a palavra “rendível” em vez do consagrado “rentável”, apesar do dicionário do editor não a reconhecer, porque se descobriu agora que em português se diz rendimento e não “rente” como em francês. No entanto, penso que o “renting” anglo-saxónico continua e continuará a ser bem recebido quando se quiser alugar qualquer coisa. Pauvres mecs !

11 maio 2010

Baltazar Garzón no TPI ?

Baltazar Garzón pediu transferência temporária para o Tribunal Penal Internacional...
Já há quem lhe chame o último exilado do franquismo!
Será que leu o meu post anterior?
"Seria engraçado se Baltazar Garzón fosse interditado em Espanha e reabrisse os processos em Haia..."
Promete...

06 maio 2010

Compulsos (14)

Começou em
Bem-vindos! Bem-vindos a este círculo dos compulsivos. Todos temos pulsões e compulsões, apenas a sua natureza e ponderação muda. Se as misturarmos e distribuímos na boa medida, seremos todos normais.
E um dia disseram: E se fossemos ao círculo? Não explicarem porquê. Talvez por nostalgia, curiosidade ou, mais perigoso, desfastio. Foram calorosamente recebidos! Nos rostos lia-se uma genuína satisfação de sentir a família completa de novo, com todas as suas valências e idiossincrasias.

Correu muito bem. Parecia que todos eles tinham algo novo a contar e que só o conseguiam dizer com aqueles dois presentes. Ou porque entendiam que eles diziam de forma diferente ou porque ...

E ela falou de novo. Séria, esticou o tronco e falou de traços, de despejos, de chamadas e de fugas. Ele também voltou ao elogio da imaginação. À saída a mão dela termia e ele imaginava o que diria à Joana se a encontrasse.
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Posfácio: E para o que lhe havia de ter dado! Imaginar uma história de um círculo que não existe e com um título que é uma palavra que também não existe, pelo menos neste contexto!
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E acabou.

05 maio 2010

Compulsos (13)

Começou em
Bem-vindos! Bem-vindos a este círculo dos compulsivos. Todos temos pulsões e compulsões, apenas a sua natureza e ponderação muda. Se as misturarmos e distribuímos na boa medida, seremos todos normais.
Não combinaram nada. Cada qual, em paralelo, foi até ao café próximo do local do círculo. Talvez por provocação para aqueles que mais uma vez esperariam por eles em vão, talvez para consumar o encontro físico dos corpos iniciado virtualmente ali umas semanas antes. Ele segurou-lhe mesmo na mão, recuperando uma sua mão perdida e ela identificou o calor indefinido que sentia por ali há uns tempos. Sorriu e abraçou-o conciliando as duas partes dela dispersadas.

Tudo se passou em calor, dos corpos, dos sorrisos, dos olhares e se alinhou todo o dentro com todo o fora.

Se dos fracos não reza a historia, as boas histórias também não rezam encantos e maravilhas. Há coisas que não se dizem: fazem-se e vivem-se. Descrever belezas de momentos, plenitudes e viagens pelos picos das emoções é sacrilégio. Cada qual no seu segredo as guardará, certamente diferentes de quando as imaginava antes de acontecerem e também diferentes de como as pintará após morrerem. A criação está na ansiedade e na saudade. No meio, no momento de cruzar os cumes, será frouxa e supérflua.
Continua para

04 maio 2010

Pulsões e Compulsões

Pois é. Começou já em Janeiro e na altura estava completamente escrito. Resolvi trazer para aqui a história às prestações, embora um pouco fora da “linha editorial” do blog, conforme me assinalaram.
Acabou por não ter o ritmo de publicação certinho, próprio de um folhetim, e perturbar, e até de certa forma poluir, o normal fluir dos posts.
Bom... vamos lá então acabar de publicar isto de vez! Para recordar na altura o homem da imaginação e a mulher do traço estavam no limiar da porta. Já tinham sido expulsos do círculo e este rapidamente os requisitava de novo; fugiam da insanidade mas não sabiam viver sem a sua proximidade. Os dois ... desses não conto nada!

Compulsos (12)

Começou em
Bem-vindos! Bem-vindos a este círculo dos compulsivos. Todos temos pulsões e compulsões, apenas a sua natureza e ponderação muda. Se as misturarmos e distribuímos na boa medida, seremos todos normais.
O moderador telefonou-lhes anunciando que os seus substitutos não se tinham integrado e havia novamente vaga para o seu regresso. A forma ansiosa como o comunicou traiu-o. Eles entenderam que o circulo precisava deles, mas não iria ser tão fácil. Concertaram posições e acordaram anunciar a sua presença, sabendo à partida que pelos menos à primeira sessão faltariam.

O grupo estava em pulgas esperando excitado a chegada dos exóticos. Até já tinham descoberto coisas novas para contar que guardavam ansiosamente. Nesse dia estavam mais animados, mais vivos... sorriam cumplicemente e já com um bocadinho de desdém antecipado: “vamos ver os disparates que ouviremos hoje!. Nem quero imaginar...”

À hora prevista, à hora em que deveriam estar no circulo, sentaram-se imóveis, cada qual no seu canto doméstico preferido. Tinha sido uma boa ideia deixar os normais pendurados, só que eles próprios também ficaram pendurados. Aliás, estavam mesmo a sentirem-se em fase, com a sensação que começavam a funcionar em paralelo para muita coisa. Parados, cada qual no seu canto, tinham a certeza de que o outro pensava no outro. Lentamente iam digerindo a noção de que ficavam mais incompletos e menos independentes.

Ele já não imaginava. Imaginar é ficar na estação e ver o comboio partir fantasiando sobre as cidades e as paisagens que ele atravessará. Ele estava no comboio. Não precisava de imaginar ou de especular. Sabia que iria ver, que iria viver, era só deixar avançar o tempo.
Ela, pouco riscava. Ou, pelo menos, quando o fazia não era compulsivamente. Tinha desaparecido a tensão e até sorria descontraída. Conseguia ter uma ideia e guardá-la algum tempo, sem necessitar de a lançar para fora no imediato, no tal jorro de vómito.
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