31 dezembro 2023

Um Bom Espinosa Ano


 Buscando acrescentar eliv fugir um pouco aos votos clássicos…

Ouvi um destes dias uma entrevista a J Rodrigues dos Santos, de promoção do seu novo livro sobre este filósofo neerlandês de origem portuguesa. O nome sonava-me, mas a dimensão menos. Devo dizer que li 3 livros de JRS, para testar…. Lêem-se bem, são didáticos, mas falta-lhes aquela coisinha que separa um relato descritivo de um romance literário. De todas as formas, tem muito mérito por escrever, ter sucesso e pôr muita gente a folhear páginas escritas.

Resolvi, portanto, ir visitar o personagem, começando de forma um pouco mais séria e menos romanceada, através da obra acima representada. Neste momento, longe de mim a pretensão de ter absorvido o seu pensamento nalgumas centenas de páginas, lidas uma vez, e muito menos de o vir aqui tentar resumir em meia dúzia de frases, mas algumas reflexões apetece-me desenvolver.

Espinosa é extraordinariamente inteligente, corajoso e clarividente. Deduzir e avançar com as suas ideias e formulações, especialmente naquela época, foi um exercício de liberdade e de promoção da dignidade humana fantástica. Pensar sem barreiras, deduzir sem preconceitos, assumir sem condicionalismos, ser livre e criativo de espírito, sem razões a castrar as emoções e sem limitações a travar a razão… que mais se pode desejar?

29 dezembro 2023

Vem lobo, vem lobo...


Eu não queria falar disto, mas há quem o esteja a tornar tema obrigatório diário. O Chega é um partido pouco recomendável num sistema politico saudável, pela natureza de algumas propostas, pela inconsistência e irrealismo das mesmas e pela fragilidade de uma estrutura “one man show”… Se uma solução governativa para o país vier a passar por eles não são boas notícias.

Agora, na outra ponta, se é que se pode assumir alguma linearidade neste universo, partidos que têm dúvidas quanto à possibilidade de a Coreia do Norte ser uma democracia, com simpatia para regimes incompetentes e brutais como a Venezuela, condescendentes com o camarada Putin, mesmo quando ele agride brutalmente um vizinho sem um mínimo de justificação ou de humanidade, também não são gente recomendável.

Todos estes podem não ser um problema para a democracia do país no sentido restrito do conceito, mas serão um problema para o modelo de país justo e livre onde queremos viver. Estes alertas constantes do “Vem lobo, vem lobo…” são apelos a que, de um lado ou de outro, ele venha mesmo (e vejam onde anda hoje o partido socialista francês depois de Miterrand ter jogado um xadrez idêntico umas décadas atrás).

22 dezembro 2023

À espera que…


As organizações que se pretendem eficazes e competitivas têm naturalmente horror a vazios de liderança. São fatais. Quando um líder se declara ou é declarado incapaz, a substituição deve ser o mais célere possível.

O Estado não é necessariamente um exemplo de eficácia e, quanto à competitividade, o resultado da sua “gestão” costuma ser num prazo que dificulta a identificação de causa-efeito. De todas as formas, liderança é liderança e sem liderança efetiva, legitimada e plena, não há milagres.

Vem isto a propósito da data das próximas eleições legislativas, dentro de quase três meses. Disse-se na altura que era necessário dar tempo ao PS para se recompor e reconstruir após a demissão do seu líder. Apesar de isso ser um problema do partido e não do país, até já está feito. Para que servem estes longos meses até às eleições e tomada de posse de um novo governo legitimado e efetivo…?

Não sei e até receio que, mais do que discutir propostas e ideias, vamos assistir a um certo concurso de cuspidelas. Quem cospe mais longe e mais grosso.

Temos todo o tempo do mundo? Não. Tempo perdido é tempo perdido.

20 dezembro 2023

A supremacia da esquerda


A supremacia branca foi uma coisa inventada no espírito do “somos todos iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”. A supremacia da esquerda é um conceito com alguma analogia, no sentido de que estamos em democracia, sim senhor, mas a esquerda é mais virtuosa do que a direita, nomeadamente pela sua defesa da liberdade, igualdade e solidariedade, contra uma direita autoritária e protetora dos grandes capitalistas egoístas.

Começando pela liberdade, ditaduras tanto de direita como de esquerda infelizmente não faltam na história universal e digamos até que a esquerda frequentemente convive mal com a democracia, quando os eleitores não reconhecem a suposta bondade exclusiva dos seus propósitos. Recordam-se de por cá, enquanto a direita apenas pretendia ter direito a existir e a ir a votos, a “legitimidade revolucionária” da esquerda procurava condicionar os partidos, cercava e pressionava a Constituinte e todos os discordantes eram liminarmente desclassificados como fascistas?

Sobre a solidariedade há efetivamente algumas diferenças. Convém recordar que não estamos nos tempos em que um azar na vida, pode condenar a uma vida miserável toda uma família. Hoje, neste nosso mundo, se alguém tiver um azar e partir uma perna, é tratado (com mais ou menos espera) antes de se verificar a cobertura de um seguro de saúde ou um limite de cartão de crédito. Se a empresa que alimenta uma família falir, isso não deve implicar fome e privações para todos.

Agora, o que me parece é que essa solidariedade deveria ser tendencialmente temporária e não estrutural. Numa sociedade sã, cada qual deve poder encontrar os meios de viver dignamente sem necessitar de ajuda sistemática do Estado.

Os números atuais de mais de 40% da população a necessitar de ajuda do Estado, não constituem uma realidade virtuosa, nem deveriam ser uma bandeira a empenhar orgulhosamente por ninguém. Pelo contrário, representam uma falência da capacidade de gerar riqueza e de cada qual conseguir pelos seus próprios meios uma subsistência digna. A questão de base anda um pouco à volta de se o objetivo é exterminar os ricos ou acabar com os pobres.

Para lá dos princípios, na atual prática da guerrilha política, a invocação da suposta bondade e supremacia da esquerda, como ferramenta para aceder e manter o poder, sem o mínimo interesse em resolver estruturalmente a pobreza… é pobre e simples oportunismo.

Nota: Imagem da versão publicada, reduzida, para "caber"...

15 dezembro 2023

O soco da realidade


Dizia a Reuters um destes dias que neste ano de 2023 as estratégias ousadas dos fabricantes automóveis quanto a veículos elétricos (VE) levaram um soco da realidade. Aqui

E referem dois motivos que esfriaram expectativas, adiaram investimentos, reduziram os ritmos de produção e … preços. Um é obviamente o preço. Para lá dos clientes desafogados para quem 20 K Eur a mais ou a menos é um detalhe para o gosto de andar na crista da onda tecnológica e outros, também mediamente desafogados, que aceitam e lhes serve bem um VE como segundo carro… para o comum dos mortais o preço/capacidade conta muito, atendendo aos seus recursos limitados e necessidades de mobilidade.

Apesar de algumas benesses públicas, os VE ainda são caros e não sei bem se é aumentando ainda mais essas ajudas que a questão se resolve estruturalmente. Uma coisa é certa, muito sangue vai correr, muitos construtores irão sofrer (e fechar…), esperando que não cheguemos a ver um mercado basicamente achinesado e um pouquito teslizado…

O segundo ponto são as restrições do carregamento em termos de disponibilidade e tempo de espera, para quem não consegue vencer os percursos diários com uma única carga. Há uma dimensão de liberdade na utilização de um automóvel, e de prazer, que desaparece quando se passa o tempo a olhar para a evolução do nível da bateria e rezando ao santinho mais próximo para que o próximo posto de carregamento esteja ativo e disponível quando se lá chegar.

Outro ponto que ainda não está na primeira linha, mas que, já agora, acrescento eu, também vai chegar, são os custos de reparação/substituição de baterias após acidente. Substituir uma bateria amachucada por uma pancadita qualquer custa muito dinheiro e em solo ou partilhado em seguro, as faturas lá terão que ser pagas...

Atendendo ainda a todo o ciclo de produção de baterias, que de economia linear nada tem, atendendo à problemática da produção de energia elétrica que durante muito tempo não vai evitar a utilização de combustíveis fósseis… isto do acelerar a exclusividade dos VEs está um pouco coisa de bois à frente dos mesmos (com todo o respeito que merece a raça bovina).

14 dezembro 2023

Sobre o futuro

Daqui a meia dúzia de meses quem se vai lembrar desta história das gémeas luso-brasileiras? Quem ainda se lembra das trapalhadas de há uns meses no Ministério das Infraestruturas? Daqui a um ano quem se lembrará do caso de Alexandra Reis e do expedito despedimento de Christine Ourmières (para lá daqueles que considerem ser sócios ou assalariados do Estado Português)? Todos estes casos e casinhos de desgoverno, e respetiva cultura subjacente, contribuem certamente para o marcar passo em que nos enterramos, mas talvez não devessem ser o mais importante tema da atualidade.

Durante vários anos, para não dizer para toda a vida, os jovens cuja educação se degrada suportarão um passivo para si e para o país. A recente avaliação PISA veio demonstrar como estamos assustadoramente a andar para trás. Obviamente que se fosse para a frente, o mérito seria todo do Governo; como é para trás o Ministro não sabe e palpita-me que não vai chegar a querer saber. Não vale a pena olhar para tudo o que aconteceu no passado recente e tentar tirar conclusões? Especular sobre redução das exigências, abolição de exames, facilitismo de toda a ordem, falta de meios durante os longos confinamentos, longas greves e falta de docentes, sobre isso podemos especular. Mas, sobre o futuro do país, numa das suas componentes mais fundamentais, a coisa não deveria ficar pelas especulações.

08 dezembro 2023

Há livros diferentes

Há autores para os quais um ou dois livros lidos implicam a vontade de outros dois e de tudo o que deles apareça. Por vezes o que aparece, já depois dos títulos sonantes terem sido digeridos, não é necessariamente a primeira água, mas tem que ser bebido.

John Steinbeck é um desses autores para mim. Mais “A Leste do Paraíso”, e outros humanamente mais densos, do que “As Vinhas da Ira”, mas se me aparecer à frente um título desconhecido, lá ma rendo a este autor sem Deus conhecido.

Recentemente apareceu-me este “Um Dia Diferente” e lá foi comigo até à caixa. Confesso que não tinha expetativas muito elevadas, mas enganei-me. Lá estava de novo aquela densidade e simples complexidade de personagens, tão distantes e tão próximos. Há muito tempo que não dava por mim ansioso a ler e saborear, expectante sobre onde tudo aquilo ia terminar. Como acabaria a história daquela trupe tão marginal, tão tresmalhada e tão humana.

Não digo aqui como acabou, mas ainda bem que graças a um Deus qualquer que existe quem consegue ver e contar o mundo como Steinbeck.

 

07 dezembro 2023

As perspetivas da cunha


Andou mal o Presidente da República neste processo das gémeas luso-brasileiras. Para lá dos detalhes que ainda não sabemos, nomeadamente qual o nível de pressão que ele e/ou a sua equipa colocaram na comunicação da solicitação ao governo, ele esteve especialmente mal com a sua “amnésia” inicial.

Face ao pedido, o governo tinha duas opções: ignorar/recusar ou dar seguimento favorável. Se ignorou, significa que todo o processo teve uma evolução normal, como para qualquer cidadão lambda deste país. Não parece, de todo, ter sido o caso. Se resolveu atender ao pedido, recordando o paralelo com a solicitação para a TAP antecipar um voo, com o simples objetivo de agradar ao PR, aí há outra perspetiva para a cunha, que é a de quem a aceitou. A ter havido favorecimento efetivo, não foi a presidência quem deu as ordens ao hospital.

Em todos os contextos e escalas, se restringirmos o direito a condenar a quem nunca deu uma “palavrinha” a alguém para desbloquear e avançar rapidamente com algo na administração pública, ficam poucos para atirar a primeira pedra.

Estes poderes e privilégios não devem existir no país onde queremos viver e o PR e o Governo têm responsabilidades acrescidas. A relação entre dois órgãos de poder, especialmente a este nível, não pode incluir destas transações. Por muito “tradicional” que seja este “desporto nacional”, pelo princípio e pela escala, o caso precisa de ser esclarecido de A a Z.

06 dezembro 2023

Por outros dias

Por estes dias celebrou-se um aniversário da morte de Francisco Sá Carneiro. Pondo de lado a vergonhosa incapacidade das instituições em investigarem e apurarem a causa direta e a fundamental do atentado (ver aqui), pode ser um momento de reflexão sobre o legado e personalidade de uma figura ímpar e determinante numa fase critica da história do país. O livro acima representado é uma interessante e instrutiva visita à sua vida e àqueles tempos.

Na altura era atacado como potencial fascista, quando o seu combate era o de retirar a tutela dos militares sobre os partidos, extinguir o Conselho da Revolução, rever a Constituição, e o aí decretado “caminho para o socialismo", e permitir a reversão das nacionalizações brutais de 1975. Visto a esta distância, estava errado? Certamente muito mais anti ditatorial do que aqueles que disso o acusavam.

No ponto de vista pessoal a integridade e frontalidade como assumiu a sua vida pessoal e amorosa são ainda hoje motivo de admiração. O grande progressista Mário Soares não hesitou em lhe dar uma canelada quanto à sua incapacidade de “governar a sua família”. Posteriormente, como primeiro-ministro, recusou-se a fazer passar uma alteração legislativa que lhe resolveria o problema do seu divórcio pendente, para não ser simultaneamente decisor e beneficiário.

Não convém olhar para Sá Carneiro como um imaculado herói cuja morte prematura santifica. No entanto há no seu desprendimento, sinceridade, irreverencia e clareza de princípios um exemplo que é importante realçar sempre e especialmente nos tempos que correm. Recomendo o livro.

 

01 dezembro 2023

Ao eleitor o que é do eleitor


Correm preocupações e alarmes quanto ao resultado das últimas sondagens, onde o Chega tem um crescimento espetacular. Não é necessariamente uma boa notícia, mas a democracia tem destas coisas. É o eleitor que decide.

Depois de tantos anos com ouvidos moucos aos designados casos e casinhos e pretendendo que formalmente está tudo bem até eventual condenação e transito em julgado, que esperavam? Que os eleitores aceitassem a bondade dessa formal inocência?

Obviamente que o Chega não tem um projeto sério e consistente, mas ele cresce no lixo que outros criaram. Se o querem combater e contestar, vão aos fundamentos e à incoerência das suas ideias e propostas. Argumentar angelicamente de que “eles são muito diferentes de nós”, não é herbicida, é adubo!

29 novembro 2023

Habituem-se ?


França é um país que preza muito a laicidade do Estado. Desde há uns tempos para cá que existe larga polémica sobre onde e como se podem montar presépios de Natal em espaços públicos e, seja por opção voluntária de autarcas, seja por decisão de tribunal, a probabilidade de nos cruzarmos com um presépio exposto em zona pública é cada vez mais remota.

As iluminações ditas de Natal parecem ser os próximos alvos. Na progressista cidade de Nantes, este ano houve inovação. As decorações chamam-se “Voyage en Hiver” (Viagem no Inverno), fugindo à palavra polémica, e em vez das habituais e festivas iluminações sobre ruas e praças, há umas coisas coloridas agarradas a algumas fachadas…

Será que um não crente se sente chocado por ver um presépio ou sobre a sua cabeça iluminações ditas de Natal? Será isso suficiente para desinfetar a quadra de toda referência religiosa, mesmo quando isso constitui uma fortíssima tradição cultural no sentido amplo da palavra? Vamos evoluir para um quadro social em que estas referências devem ser completamente apagadas de um espaço público asséptico? Certo que a sociedade e os costumes evoluem e o futuro, o futuro o dirá. Agora, pelo menos neste momento, parece-me bastante forçado… e muito menos bonito!



28 novembro 2023

Justiça à flor da pele

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Porque é que cada vez que há notícia de uma suspeita ou investigação em torno de um detentor de cargo público, há tanta agitação e nervosismo? Porque é que se parte imediatamente para uma proliferação de sentenças de opinião, quanto ao poder e métodos e até questionamento do Ministério Público, insinuando que investigação sem posterior condenação é sinónimo de abuso e falha.

Falha de outro tipo seria se todos os processos vissem os crimes investigados sistematicamente condenados. Numa situação saudável, havendo uma suspeita desta natureza, o visado só tem que não atrapalhar e ajudar a que se esclareça rapidamente. Num contexto salutar beneficiaria de uma presunção de inocência efetiva.

A prática não é assim.  Se pensarmos na grande quantidade destes casos com fundamentos inequívocos, mesmo se ainda não transitados em julgado, cada nova suspeita não é entendida como uma situação pontual a esclarecer, mas sim como mais uma, da mesma série. Se acrescentarmos a gincana processual que os investigados/acusados montam, José Sócrates como exemplo eloquente, para atrasar o normal desenrolar e desfecho dos processos, há uma percepção, justa ou injusta, de que casos com eleitos são frequentes e que estes não ajudam a um esclarecimento rápido das suspeitas, pelo contrário. Muitas vezes até nos tomam por atrasados mentais.

Há nervos à flor da pele e, à falta das outras, muita sentença de opinião num ou noutro sentido. A solução não passa por opinar, mas por … ser sério. Difícil?

 

27 novembro 2023

Alguma coisa acontece


 Eu, e como eu, acho eu, qualquer publicador, não resisto à tentação de espreitar estatísticas. Quantas vistas, de que origem, etc..

No passado era mais giro porque se podia mesmo ver a questão colocada ao Mr Google que tinha dado origem a um feliz ou infeliz ter aterrado no Glosa Crua. Por vezes era hilariante mesmo ver as perguntas colocadas.

Dentro da regularidade geral, por vezes há episódios … amazing… believe me. Um destes dias aconteceu-me isto, que a imagem acima demonstra, para um período de 24  horas. Uns milhares de vistas naqueles países todos, sobrando ainda mais 75 no fim da lista.

Não se pode dizer que não seja simpático, mas gostava de saber a receita. Mais do que eu, certamente aqueles que “monetizam” as vistas do seu quintal !

24 novembro 2023

Os resultados da TAP


Tem havido algum entusiamo com os 200 milhões de resultados positivos da TAP, como prova da sua vitalidade e da bondade da respetiva nacionalização. Os ventos vão de favor para todo o sector, uma boa parte das suas concorrentes até já reembolsaram as ajudas recebidas, mas há um pormenor aqui a ter em conta.

A TAP está a operar com um brutal reforço de fundos de 3,2 mil milhões de euros a custo zero. Vamos supor que era uma empresa normal e tinha de ir ao mercado buscá-los, sem participação nem garantias públicas. Considerando que o conseguia, em que que condições seria e quanto estaria a pagar de juros? Quanto desses 200 milhões restaria, caso a empresa tivesse que pagar os custos do financiamento da sua operação? É só fazer as contas…

23 novembro 2023

Portas e porteiros

Pondo de lado os detalhes e particularidades da crise atual, como se a não prisão preventiva é uma espécie de absolvição ou apenas uma decisão razoável para o contexto atualmente conhecido (o julgamento ainda está para vir e indícios fortes de crime há); pondo de lado a politiquice e o “spin” (desenvolvimento de narrativas), vale a pena questionar se/como os investidores podem ou não se relacionar com os decisores políticos.

Para quem pretende investir, há procedimentos e regras, cujo conhecimento e cumprimento são fundamentais. Haverá eventualmente dúvidas de interpretação e de enquadramento. É normal e salutar haver necessidade de discutir e esclarecer junto de quem de direito. Até se poderá aceitar que, sem colocar em causa os princípios fundamentais, a igualdade de tratamento e o interesse geral, nalguns casos possa fazer sentido uma evolução regulamentar, dentro do bom-senso, razoabilidade e transparência.

As entidades que decidem devem ter portas abertas, reais ou virtuais, grandes ou pequenas, conforme a natureza e dimensão dos processos em causa. Convém é que não haja porteiros informais, mas bem reais, a condicionar o acesso.

Nos países do terceiro mundo, as pessoas importantes são aquelas que têm capacidade de criar problemas e obstáculos. O seu poder vem dessa capacidade de atrapalhar e poderem depois discricionariamente solucionar e, de uma forma ou de outra, cobrar a solução. Os resultados estão à vista.

No país em que gostaríamos de viver, abram-se as portas e retirem-se os porteiros.

22 novembro 2023

Liberdade, direitos e democracia

Por estes tempos já toda a gente sabe, ou deveria saber, o que foi o Gulag. Podem dizer que não vale a pena chover no molhado, que é passado, mas eu discordo e já explico.

Diz-se que as condenações ao Gulag eram extramente discricionárias e muito arbitrárias. Não era bem assim. Segundo imagem acima, extraída do famoso livro de Alexander Soljenítsin, havia efetivamente algum enquadramento e classificação. Nela estão elencados os “crimes” que poderiam levar um individuo a passar umas dezenas de anos preso em condições não humanas e com elevada possibilidade de não regressar.

Há cerca de 4 anos o Parlamento Europeu votou e aprovou uma resolução que coloca nazismo e comunismo em pé de igualdade. Sendo que nestes casos, as contabilidades e a verificação de empate são algo subjetivas, a barbaridade estalinista não fica atrás, nem em números nem em princípio da nazi. Votação unanime? Não. Da parte que nos diz respeito, o BE e o PCP votaram contra. A declaração publicada pelo PCP na altura (aqui) é um monumento de hipocrisia e desonestidade. 

Se inicialmente Hitler e Estaline começaram aliados e a repartir a Polónia, quando até os partidos comunistas ocidentais tinham alguma simpatia pelos inimigos do capitalismo liberal, se no final a URSS foi determinante para o resultado da Guerra e a derrota da Alemanha, isto não constitui carta branca para menorizar os milhões assassinados por Estaline.  Diz o PCP no final do comunicado que não permitirá “o branqueamento do fascismo e a criminalização do ideal e projecto comunista”. Portanto… equiparar o fascismo ao estalinismo é branquear o primeiro e atacar o belo ideal do segundo?! Não têm vergonha?

A Alemanha fez o luto do nazismo e algo equivalente ou próximo é impossível de acontecer, pelo menos a curto-médio prazo, na Europa Ocidental liberal e democrática. Para a Rússia, cada vez mais autoritária e implacável, e seus simpatizantes, há tolerância e mesmo alguma nostalgia desses tempos assassinos e nunca é demais dizer que

“Gulag nunca mais”

Destes estamos muito menos protegidos. 

12 novembro 2023

A ver se eu entendo


Há um esturricado enorme em torno do atual executivo. Ministros e chefe de gabinete do PM arguidos, suspeitas sobre o próprio PM, de tal forma que este entende não ter condições para se manter no cargo e demite-se. O PR aceita e convoca eleições para daqui a 4 (quatro) meses.

Não conseguindo avaliar as limitações técnicas, 4 meses mais a organização e a tomada de posse do novo governo são uma eternidade. Que governo vamos ter até lá? O atual com o mesmo PM e alguns retoques mínimos e obrigatórios? Mas, se A. Costa entendia e declarou não ter condições para continuar, com que autoridade e energia vai poder dirigir o governo e o país durante este tempo. Se o período foi alargado pela necessidade de não se parar uma série de dossiers críticos, quem vai liderar esses processos tão relevantes? Um governo ferido e recauchutado com um PM fragilizado?

09 novembro 2023

A pequena corrupção


Do que se sabe deste turbilhão que arrastou o PM e abriu esta crise, saltam-me à vista dois pontos. Um é que mesmo que A. Costa esteja limpo e inocente, ele paga o preço das más companhias… diz-me com quem andas… e andar na companhia das antigas companhias de José Sócrates foi uma imprudência, no mínimo.

O segundo ponto é a pequenez terceiro-mundista das ações em causa. Não se terá tratado de transações de milhões com umas percentagens a passarem e a ficarem em paraísos fiscais. Aparentemente estava em causa simplesmente obter autorizações, aprovar projetos, acelerar processos. Num país do primeiro mundo, onde queremos estar, uma boa parte destas intervenções não deveriam ser sequer passiveis de corrupção. Deveria existir regulamentação clara, entidades decisórias claras, independentes e eficazes e as coisas avançarem (ou não) por razões transparentes e não por cunhas ou favores, grátis ou pagos.

Para lá do que soubermos como resultado da investigação e respetivas conclusões, bom mesmo seria que o poder decisório sobre estes processos ficasse limpo e livre de discricionariedades de ministros e de acimas ou abaixos.

31 outubro 2023

Algures neste mundo


Algures no Médio Oriente, para dominar uma sublevação e um movimento terrorista, uma cidade é fortemente bombardeada, causando a morte de milhares de civis inocentes. Falamos de Gaza em 2023? Sim, mas não só. Poderíamos estar também a falar de Alepo, arrasada por bombardeamentos russos em 2016. A bandeira dos aviões era diferente, mas as bombas e as vítimas nem tanto.

O que foi muito diferente foi a reação e as manifestações de apoio e repúdio por este mundo fora, como se as bombas russas, para muitos, fossem toleráveis face ao mal em causa e as israelitas não. Esta flagrante diferença de critérios ajuda a explicar em parte porque este conflito não acaba e a causa palestiniana é para muitos bastante conveniente. Temos de um lado os ocidentais antiocidentais, para os quais o sistema económico e social de Nova Iorque, Londres, Roma, Lisboa ou Telavive é maléfico e, por oposição de princípio, apoiam o inimigo do inimigo. Se bem que, no fundo, não me pareçam muito motivados a irem mesmo viver para os outros sistemas alternativos de Moscovo, Teerão, Pequim ou Pyongyang.

Do outro lado estão os verdadeiramente defensores desses regimes alternativos, que odeiam (e invejam?) o ocidente e os seus valores. Estes são mais perigosos e consequentes. Não desvalorizando as desgraças em curso naquela zona do planeta, convém não misturar as causas e confundir as leituras. O primeiro passo para encontrar soluções é ler corretamente o enunciado.

27 outubro 2023

Estado palestiniano, onde se perdeu?


Dentro das reivindicações atuais de apoio ao povo palestiniano, está naturalmente a criação de um Estado autónomo. Convém descartar desde já aquela rimazinha do “From the river to the sea, Palestine will be free” porque, como é óbvio, o Estado de Israel não vai desaparecer dali, por muito que seja a vontade e atitude beligerante dos radicais.

Neste discurso aponta-se Israel (e o colonialismo, já agora) como o responsável da não existência de estado palestiniano, mas se calhar não é bem assim. Durante largos séculos aquela zona esteve integrada no Império Otomano, não sei se se pode chamar colonização, mas pelo menos não era a “maléfica”. No séc XX, entre as duas guerras, o território foi administrado pela Inglaterra, algumas décadas, mas nunca foi Estado.

Após a II Guerra a ONU decretou uma partilha entre árabes e judeus e… estes desataram imperial e arrogantemente a apropriarem-se do que não deviam? Não, ao contrário. Os palestinianos, ajudados pelos seus vizinhos egípcios, jordanos, sírios, libaneses não aceitaram o estado judeu e declaram-lhe guerra. Face à desproporção de recursos e população, parecia que os judeus acabariam mesmo atirados ao mar… mas não, Israel ganhou e ganhou algum território.

No final desta guerra os judeus instalaram-se na parte israelita da palestina e consolidaram o seu Estado. Ocorreu algo equivalente do lado árabe? Criaram e consolidaram um Estado na parte da Palestina que continuou árabe? Não. Os seus amigos jordanos ocuparam a Cisjordânia e os egípcios a faixa de Gaza, mantendo os palestinianos como uma espécie de refugiados na sua “terra”. Porquê? Para manter a pressão sobre Israel? Não sei. O que é certo é que durante duas décadas, até 1967, foram os países árabes que impediram a criação de um Estado Palestiniano e aquela parte do mundo teria sido muito diferente se a famosa solução dos dois Estados se tivesse consolidado naquele momento… !

Mais tarde, haverá outra nova tentativa de destruir Israel, em 1967. Israel ganhou, ocupou mais território e mais complicado ficou.

21 outubro 2023

Contas no ambiente


É inquestionável que estamos a viver acima das possibilidades do planeta e algo tem que ser feito para garantir a sobrevivência e sustentabilidade do mesmo. É necessário mudar!

Essa mudança tem que ser racional, sustentada cientificamente e obviamente não religiosa. Há mudanças tecnológicas, mudanças de políticas e, sobretudo, mudanças de hábitos. Enquanto pensarmos que basta passar a uma tecnologia mais limpa e exigir legislação, não chega. Enquanto as tentativas de mudança forem pintadas com cores sectárias e radicais, não serão consensuais. Enquanto as exigências forem ingénuas e incoerentes não serão tomadas como sérias. Enquanto a frugalidade e a racionalidade na utilização de recurso não forem a prioridade de todos e da cada um, não há legislação que valha.

Dentro dos equívocos neste processo, está o proposto agravamento do IUC para os automóveis antigos. Em primeiro lugar, muitos desses proprietários não estão disponíveis para comprar um belo e reluzente novo elétrico por algumas dezenas de milhares de euros e não é este castigo que os vai motivar. Depois, certo que um carro com mais 15 anos polui mais ao km, mas a contas não acabam aí. Para o tipo de utilização típico destes “clássicos”, de dar umas voltinhas, o impacto é bem menor do fazer largas centenas de kms de lazer a 140 (e+) km/h mesmo num carro novinho em folha.

E ainda, manter o mesmo veículo durante 20 anos, contra trocar por novo a cada 4 anos… é também menos desperdício de recursos, não será?

19 outubro 2023

Holodomor


Nestes tempos de bárbara agressão da Rússia à Ucrânia, refere-se por vezes o precedente da grande fome dos anos 30, imposta pela URSS stalinista, e que resultou na morte terrível de “alguns” milhões de ucranianos.

Do que me foi dado ver e ler, parece-me que este processo não foi uma repressão política, mas “simplesmente” o resultado da soma da falência do modelo de produção coletivo com a desumanidade criminosa do sistema stalinista. Começando por aqui, todos sabemos, se quisermos saber, que para Staline, matar gente era absolutamente irrelevante, face aos seus desígnios e caprichos. Hitler matou judeus porque os achava malignos, ao menos tinha um mínimo de “justificação” *; Staline matou provavelmente mais, compatriotas seus, por um sim por um não e às vezes mesmo por nada de concreto. Foi de uma barbaridade e desprezo pela vida humana sem paralelo.

Quanto ao outro fator, o da coletivização, nos amanhãs comunistas não havia propriedade privada. Todos aqueles que possuíam e cultivavam terras foram perseguidos, forçados à coletivização ou deportados. Como resultado previsível, isto não funcionou e a produção de cereais caiu a pique. Consequência muito “lógica” foi decretado ser obrigatório produzir e o pouco que a desorganização conseguia gerar era confiscado, não deixando de todo o mínimo necessário para a subsistência dos camponeses. Cada grão escondido era confiscado. Isto foi aplicado a todos as zonas agrícolas da URSS, incluindo a Ucrânia.

Este livro, acima representado, conta vários testemunhos horríveis e bárbaros de gente sem amanhã, morrendo e vendo morrer os seus de forma terrível e desesperada, vítimas de um sistema falido. O espantoso é que um século depois e sem um único caso de sucesso a registar, ainda haja quem continue a achar que o sistema na teoria está correto e o problema está apenas na implementação prática! Mudem de religião, por favor…

* nota posterior em 20/10

Para que não fiquem dúvidas possíveis de interpretação. Hitler e os nazis cometerem crimes hediondos sem justificação, objeto de julgamento no pós-guerra e cujos propósitos são ainda criminalizáveis hoje em dia. No entanto, na sua cabeça havia uma lógica e um objetivo, daí a palavra “justificação”. Para eles os judeus não eram alemães “de gema”.

Os crimes Stalinistas, se bem que alguns contra opositores ao regime e daí com alguma “lógica”, muitos foram arbitrários e gratuitos. É o caso de todos estes milhões de camponeses, seus compatriotas, condenados à morte apenas porque lhes impuseram um sistema ineficiente.

No final, um ou milhões de mortos inocentes, serão sempre mortos inocentes, mas enquanto Hitler chacina judeus por os considerar indesejáveis, Stalin impõe um regime de terror cuja autoridade passa por matar o seu próprio povo como e quando lhe apetece sem sequer precisar de “justificar”.


18 outubro 2023

Por favor


Os mesmos que acharam que os EUA “estavam a pedir” o 11/9, também entendem que Israel “proporcionou” o 6/10. Sejamos honestos, não há santos neste campeonato, mas também não há nada que justifique nem uma coisa nem outra. Ou, a haver, não é justificação racional e civilizada. Ou são os ódios incrustados aos judeus que desde 1948 acham muito bem atirá-los todos ao mar, ou são doentes, cegados primariamente contra tudo que é ocidental e americano e que, do conforto das suas esplanadas e poltronas, teorizam “revoluções” que felizmente não lhes tocam, nem afetam o seu bem-estar, que não prezam, mas apreciam.

As imagens que nos chegaram agora de Israel e que ficarão não são do palestiniano desesperado que apenas tem as pedras da rua para tentar incomodar o soldado israelita fortemente armado.  São de famílias calma e pacificamente instaladas que são chacinadas e são de jovens divertindo-se num festival de música, como em qualquer outro lugar semelhante deste nosso mundo, para quem a vida acabou estupidamente ali.

Duas sugestões. Face à penúria de bens essenciais que afeta o território de Gaza, os seus “responsáveis” podiam trocar a compra dos rockets por alimentos e medicamentos de que a sua população tanto necessita. Os financiadores do Hamas, provocadores indiretos, mas fortemente responsáveis por estas atrocidades, podiam mostrar solidariedade para lá da financeira (a tal que vai para os rockets). Abram os seus países para receberem uma boa parte dos palestinianos desesperados. Seria bonito...

E como o armamento não nasce espontaneamente em Gaza, seria também oportuno escrutinar estes circuitos e quem os alimenta.

14 outubro 2023

Suponhamos


Inquestionavelmente a Ucrânia tem inúmeras razões contra a Rússia, mesmo bastante mais do que os palestinianos contra Israel. Suponhamos que um comando ucraniano entra na Rússia, chacina aldeias inteiras e centenas de jovens despreocupados que assistem a um concerto musical. Barbaridade, sem dúvida.

Quantos políticos e comentadores ocidentais irão dizer, sim, não está bem, mas, enfim, a Rússia estava a pedi-las…! Em quantas cidades haverá manifestações de regozijo e de apoio à Ucrânia pela “justiça” feita? Claro que nem um, nem uma. Diferenças culturais que precisamos de exportar e, pelo menos, não importar. Neocolonialismo, alguém disse? Tenham juízo e respeito pelos valores e dignidade humanas.

11 outubro 2023

Atirar o Hamas ao mar ?


No rescaldo da II Guerra e com a memória fresca das atrocidades sofridas pelos judeus na Europa, foi decido dar-lhes uma pátria. Curiosamente, Angola até já tinha sido equacionada anteriormente para esse objetivo, no início do século XX.

Historicamente a Palestina era o seu berço. David, Salomão, Herodes, só para referir alguns nomes históricos ali tinham reinado e deixado o seu legado. A região, durante longo tempo integrada no império Otomano, ficara sob administração britânica depois do desmembramento daquele, no final da I Guerra, e consequente partilha do Médio Oriente.

Em 1947 a ONU decidiu a divisão da Palestina entre judeus que chegavam e árabes que já lá estavam. Obviamente que implicava um rearranjo, questionável, mas nada de enorme nem brutal comparado com o que se viu, por exemplo, na Polónia que se deslocou uns bons kms para oeste no final da II Guerra ou com outros pós-guerras.

O que se passou a seguir foi que os árabes, palestinos e dos países vizinhos, não aceitaram de todo a instalação de Israel e declararam-lhes guerra com o objetivo de “atirar os judeus ao mar”. Estes conseguiram resistir, ganharam essa guerra e ainda infligiriam uma humilhante derrota em 6 dias, em 1967. Como é das “leis e das práticas”, quem ganha a guerra, ganha e Israel foi ganhando território, Sinai, Montes Golan e Cisjordânia. Após a guerra do Yom Kippur de 1973, também ganha por Israel, mas de forma mais honrada para os árabes, veio a paz com o Egito, a grande potencia regional e líder do movimento árabe.

Saltando detalhes, as relações com os países vizinhos normalizaram-se e mesmo com a OLP/Fatah iniciou-se um diálogo, … mas nasceu um confronto entre palestinianos. A partir de 2007 há uma divisão clara entre a Cisjordânia governada pela Fatah e a faixa de Gaza controlada pelo Hamas, dois mundos muito diferentes.

As barbaridades realizadas no passado dia 6/10, foram feitas pelo Hamas e o curioso é que a Cisjordânia, mesmo tendo mais capital de queixa contra Israel pelos polémicos colonatos, não aderiu. Se esta população se tivesse levantado em massa, em solidariedade, teria sido muito, muito complicado.

Agora Israel quer atirar o Hamas ao mar e face às barbaridades feitas eles não merecem a mínima compreensão ou tolerância (só mesmo doentes cegados pelo ódio anti-ocidental/anti-americano podem evocar um rasto de justificação). O problema é que física e mentalmente uma boa parte dos 2 milhões dos habitantes de Gaza estão fundidos com esse movimento. Não é possível atirá-los todos ao mar…

Duas sugestões:

  1. Face à penúria de bens essenciais que afeta o território, os seus “responsáveis” podiam trocar a compra dos rockets por alimentos e medicamentos de que a sua população tanto necessita.

  2. Os financiadores do Hamas, provocadores indiretos, mas fortemente responsáveis por estas atrocidades, mostrarem solidariedade para lá da financeira (a tal que vai para os rockets). Abram os seus países para receberem uma boa parte dos palestinianos desesperados. Seria bonito...

10 outubro 2023

Abrão


No limite leste da velha cidade de Jerusalém está o Monte de Templo. Terá sido ali que Salomão construiu o seu templo, referencia fundamental do judaísmo. Também aí se encontra a rocha onde Abrão esteve prestes a sacrificar o seu filho a Deus, substituído à última hora pelo carneiro.

Sendo o cristianismo e o judaísmo ambos alicerçados no judaísmo, embora dando origem a construções muito diferentes, o local foi sempre necessariamente referenciado pelas três religiões. A escassos metros daí Cristo iniciou a sua via dolorosa e um pouco mais à frente está o Gólgota onde foi crucificado. Antes da fuga de Maomé para Medina, a “Meca” do Islão era Jerusalém e era nessa direção os muçulmanos rezavam. Diz o Corão que um dia Maomé foi teletransportado para o rochedo e daí subiu ao céu. Deste episódio nasce a importância adicional do monte para os muçulmanos, com a posterior construção da mesquita de Al Aqsa e a Cúpula do Rochedo, cujo dourado é visível em tantas imagens da cidade.

Hoje, em Jerusalém, qualquer um pode tocar as pedras do Muro das Lamentações, parede ocidental do antigo templo, no limite do monte, o local mais importante do judaísmo. Qualquer um pode tocar a pedra onde o corpo morto de Jesus foi supostamente depositado, no Santo Sepulcro. A Pedra Fundamental de Abrão não. Está reservada a muçulmanos. Mesmo a circulação de judeus por ali, na também chamada esplanada das mesquitas, é considerada provocatória, necessitando de proteção musculada e dando potencialmente origem a incidentes violentos. Uma das justificações para as recentes ações terroristas do Hamas foi esta “dessacralização” de Al Aqsa. A pedra de Abrão não poderia estar acessível a todas as religiões de Abrão?

Jerusalém, especialmente a velha cidade, é um local único no mundo de significado e inspirador de reflexão. Num futuro e num mundo saudável deveria ser um local aberto e não sequestrado por fundamentalismos de qualquer natureza.





08 outubro 2023

Israel


Há cerca de 3 semanas almoçávamos com um amigo israelita num belo cenário,  frente ao Mediterrâneo, em Tel-Avi. Após um périplo por Israel, incluindo a bíblica Galileia, o exótico Mar Morto e o umbigo deste nosso mundo, que se chama Jerusalém, Tel Aviv não era uma cidade especialmente interessante em registo histórico e monumental, mas de uma pujança e vitalidade admirável.

Dizia ele que, no entanto, de um momento para o outro, algo podia estourar. Desde alguns anos que as novas construções obrigavam a um abrigo “blindado” em cada apartamento. Gaza ficava apenas a cerca de 70 km. Efetivamente, as crises podem ser úteis para os políticos de ambos os lados.

Estourou este sábado, de uma forma diferente das previsões. Ninguém imaginava o Hamas sair assim, e com este sucesso imediato, para território israelita. Para lá da surpresa pela incapacidade de previsão e antecipação dos serviços de informação, surpreende-me como um território tão pequeno e vigiado, pode reunir meios para uma ação deste calibre. Donde vieram os fundos? Não há muito tempo, dizia-se ser do Qatar, aquele país que procura um lugar na primeira fila da plateia mundial, pagando o que for necessário, como um campeonato do mundo de futebol? Ainda será, ou basta o Irão ?

Independentemente dos excessos e abusos que o estado de Israel tem realizado, especialmente nos colonatos, nada justifica este tipo de ações do Hamas (e as manifestações de regozijo pelas mesmas que vemos na Europa, são para tomar a sério). Não é o Hamas em Gaza apenas quem está a fazer isto…

04 outubro 2023

Larguem os ossos


Penso que qualquer potencial notável nacional, seja pela pena, pelas armas, pelas chuteiras, pelas guitarras, pela retórica e até mesmo, quem sabe, pela influência nas redes sociais, tem interesse em deixar expresso onde pretende que os seus ossos tranquilamente repousem.

Nunca se sabe se os chamados eleitos da nação não irão um dia requisitar os seus restos para ornamentar um qualquer supostamente prestigioso depósito de sepulturas. Alguém imagina, por exemplo, Miguel Torga, satisfeito com a ideia de sair do seu S. Martinho de Anta, atravessar o Marão e ir para Lisboa, ele, para quem “a nação não morre de amores pela capital e esta paga-lhe na mesma moeda”?

Para lá desta falta de gosto e de decência de remexer em velhos jazigos, para lá da abrangência curta ou excessiva do nosso Panteão, homenagear os que “da lei da morte se libertaram”, não passa por andar em macabras bolandas com os seus restos. Passa sim por promover e divulgar a sua obra. O mais importante não é onde ficam os ossos, é o que resta da vida. Mais importante do que o material morto é o imaterial vivo.

Este folhetim atual com a transladação dos restos mortais de Eça de Queiroz dava uma excelente novela queirosiana. Haja quem a escreva com a fineza e elegância do grande mestre, independentemente do local onde os seus ossos repousarão um dia.

29 setembro 2023

Fiat 600


Quem nunca teve em nome próprio ou em família um Fiat 600, 127, Uno ou Punto… não atire a primeira pedra, mas pode passar à frente e deixar de ler.

Durante muitas décadas estes pequenos Fiats económicos e joviais foram a base de mobilidade de muitas famílias e eu próprio não escapo. Desde o longínquo 600 do meu pai, o semi herdado 127 e ao primeiro registo em meu nome próprio de um magnifico e exuberante Uno 45S.

Agora foi lançado um novo 600. Coisa de moda, está bem, mas começar o preço em 36 mil Euros… chamem-lhe o que quiserem, mas não evoquem o 600 em vão.

28 setembro 2023

Prateleiras vazias


Já todos vimos imagens de supermercados onde os produtos básicos têm preços tablados e acessíveis, mas as prateleiras estão sistematicamente vazias. Isto acontece em países onde, na incapacidade de permitir uma normal criação de riqueza e uma atividade económica sã, os governos centralizadores, incompetentes e hiper-legisladores, entendem que decretando preços baixos e outras limitações, o problema se resolve.

O resultado dessas abordagens são as prateleiras vazias. Encontro algumas semelhanças com o que se passa atualmente no mercado da habitação. Há falta de casas, para vender, especialmente para arrendar e as soluções governativas passam por travar rendas e outras diretivas restritivas. Se estas “prateleiras” já não estavam muito recheadas, não é assim que se vão compor, pelo contrário. É difícil de entender?

31 agosto 2023

Bricando


Os BRIC(S) posicionaram-se desde o início como uma alternativa ao mundo chamado ocidental. Aqueles que, seja no hemisfério norte ou no ul, julgam que a esfera ocidentalizada é maligna e a causa de muita desgraça no mundo, acham naturalmente salutar ser estruturado este contrapeso.

Dentro dos pesos e contrapesos dos membros atuais, e atendendo à quebra material e moral recente da Rússia, há obviamente a China e os outros. Recentemente o grupo foi enriquecido com seis novos membros a saber: Argentina, Egito, Etiópia, Irão, Arábia Saudita e Emirados Árabes. Há aqui alguma riqueza, de petrodólares (perdão petrobrics!), mas que trazem eles de riqueza básica, em termos de coisas e exemplos que possam ensinar ao resto do mundo?

Mesmo dando de barato e ignorando a barbaridade assassina promovida pela Rússia, que contributos positivos para a humanidade traz esta companhia com estes sócios? Em quantos deles existe liberdade de expressão, tolerância religiosa, democracia a sério, proteção social, direito generalizado à educação, proteção e valorização da mulher e a lista não acaba.

Ok, ok, os maus da fita para muitos são e serão sempres os ianques imperialistas e respetivos lacaios, mas poucos devem ser os que aceitariam deixar o seu atual inferno e irem viver para a maioria destes países.

25 agosto 2023

Habitação é construção

Para muita boa gente está difícil arrendar casa, os preços estão excessivamente elevados. Pelas regras básicas do mercado o motivo será haver mais procura do que oferta. Para corrigir é necessário aumentar a oferta, quer por novas construções quer por colocação no mercado de arrendamento das que existem. Quem pode fazer isso com dimensão que se veja, são promotores/proprietários que sintam segurança para investir e ter retorno.  

Ao Estado compete-lhe criar condições que motivem e deem confiança aos investidores. Não parece, no entanto, ser esse o caminho escolhido. Atacar o alojamento local e os proprietários de edifícios devolutos é atuar e assustar mexendo em trocos existente em vez de proporcionar a promoção do muito que falta. Das tentativas de regulamentação administrativa deste tipo de mercado como limitações ao valor e atualização das rendas também já conhecemos os resultados…

Não são decretos coercivos que potenciam o investimento, pelo contrário, assustam-no.

 

24 agosto 2023

E agora, sem líder?


Considerando que na Rússia as certezas são sempre relativas, mas considerando que Prigozhin morreu mesmo na queda do avião, isso constitui uma mui tradicional putinesca consequência do desafio que ele fez com a insurreição de há uns meses e, ainda pior, depois disso, com passear-se pela Rússia tranquilamente.

O que virá a seguir a esta decapitação do grupo Wagner?

Para lá de todas as barbaridades das quais o homem foi responsável, Prigozhin era um líder com carisma e eficácia sem paralelo nas estruturas das forças armadas russas. Globalmente, sem Wagner, a Rússia perde capacidade militar.

Mais importante, que irão fazer todos os mercenários agora desenquadrados? Tem o grupo estrutura que possa manter um mínimo de operacionalidade e de fluxos financeiros que os conserve ocupados e satisfeitos? Irão migrar para o exército regular? Irão, pelo menos alguns, ter espírito de corpo e solidariedade com o líder desaparecido e passarem a lutar contra a Rússia? Irão simplesmente “fazer pela vida” por conta própria com as armas que têm nas mãos?

Certo que para um mercenário, o que conta é ser pago, mas não é óbvio que todos aqueles homens armados sejam simples frios profissionais da guerra sem emoções nem lealdades.

Não sei o que esta gente toda irá fazer, mas não gostaria de os ter como vizinhos!

23 agosto 2023

Pequenas lagostas


Os 139 mil euros dos chamados almoços de trabalho realizados pelo presidente e ajudantes da Câmara de Oeiras durante alguns anos são pouco mais de que uma gota de água no orçamento anual de 245 milhões de euros da autarquia. Não é por aí certamente que vem o grande défice e a falência.

No entanto, há na atitude um défice enorme. A que propósito um “almoço de trabalho” de eleitos e quadros da câmara pode integrar lagostas, champanhe e outros afins, ainda por cima com a frequência apresentada? Que falta de respeito pelos fundos públicos, que cultura e princípios de cidadania são estas de quem se presume merecedor de iguarias “públicas” sem limite? Cada um desses euros não lhes pertence, para serem gastos como lhes der na gana. O seu propósito é serem utilizados em benefício público.

Quem acha merecer todo o marisco ao almoço, que critérios terá nas restantes despesas e adjudicações? Pode Isaltino Morais garantir que está “tudo certo”, as faturas terão eventualmente o número fiscal correto e o IVA bem calculado, mas moralmente são absolutamente inaceitáveis. Quem não entende isso, não merece gerir coisa pública.

21 agosto 2023

Boa vontade e escrutínio

É indiscutível o enorme esforço e dedicação que abnegada e voluntariamente muitos bombeiros dedicam a causas humanitárias e solidárias. Merecem, sem dúvida, o nosso respeito, reconhecimento e agradecimento.

No entanto, os bombeiros e respetivas associações não são certamente um corpo único e homogéneo. Como em todos os setores haverá pessoas com diferentes valores e princípios. Os elementos e corporações sãos terão todo o interesse em ver separado o trigo do eventual joio. Por isso custa a entender as reações generalizadoras de “virgem ofendida”, cada vez que é evocado algo que potencialmente pode não estar correto no meio.

O seu mérito não invalida o poder/dever questionar a forma como são financiados e como gerem os seus fundos. O fato de serem dedicados e voluntários não deve constituir blindagem ao escrutínio.

O problema recorrente que temos com os incêndios florestais, deve fazer questionarmos se estamos a fazer tudo corretamente em termos de formação, utilização de meios, estratégias de prevenção, etc

Quem não deve, não teme; quem tem espírito aberto ouve e aprende… e de virgens ofendidas está o inferno cheio.

     

16 agosto 2023

O Estado paga?


Dentro das polémicas e contestações que se desenvolveram em torno das JMJ e da intervenção do Estado nas mesmas, existe questionamento sobre se este deve pagar infraestruturas ou serviços associados a um evento que não é dirigido a toda a população.

É uma discussão que teria bastante sentido se este evento fosse algo de recorrente e onde, ainda por cima, os seus participantes tivessem predisposição a criar confusão e a precisar de dispositivos de segurança reforçados. Não sendo o caso, nem pela frequência do evento, nem pela atitude dos participantes, parece-me algo despropositado inventar mais uma polémica com o caso.

Isto evoca-me, no entanto, uma outra situação, esta sim recorrente e com muitos participantes de comportamento pouco civilizado. Falo, naturalmente, do futebol profissional, um negócio pouco transparente. que de desporto já tem pouco e cujo contributo para a construção de uma cidadania responsável está próximo de nulo, para não dizer negativo.

Os dispositivos de segurança necessários para conter as hordas de vândalos que semana após semana buscam semear confusão por onde passam deveriam ser pagos por eles e por quem os fomenta, não pelo inocente contribuinte, certo?

Carlos JF Sampaio

Esposende

13 agosto 2023

Não há pachorra..

 

Tiago Oliveira, reconhecido como técnico competente e não comissário político, presidente da AGIF (Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais) disse no Parlamento que “os corpos de bombeiros receberem em função da área ardida”, constituiu um “objetivo perverso”.

É verdade ou não? Se for mentira ele deve retratar-se. Sendo verdade, é evidente que há algo de perverso no esquema, sem isso significar que os bombeiros deixem arder para faturar.

É óbvio que os incentivos e os investimentos devem estar na prevenção, em gerar dinâmicas económicas “positivas” e não pagar os estragos ao metro.

A reação da Liga dos Bombeiros Portugueses de virgem ofendida a exigir a demissão de Tiago Oliveira por estarem “ofendidos e chocados” é muito típica e já que não corro o risco de ser demitido por isto:

- Há necessariamente uma enorme dedicação e boa vontade solidária em milhares de bombeiros voluntários por este país fora

- Esse mérito não invalida o poder/dever questionar a forma como são financiados e como gerem os seus fundos. O fato de serem dedicados e voluntários não deve constituir blindagem ao escrutínio.

- Em termos de prevenção o que fazem neste momento os bombeiros? Divulguem e explicam, porque ouvir não se ouve muito falar

Sejam objetivos e concretizem. De virgens ofendidas está o inferno cheio


11 agosto 2023

Hiroxima, o dia depois (II)


Continua de

Depois do cogumelo subir nos ares de Hiroxima ficou claro que as guerras não voltariam a ser como antes.

Dizem que a II Guerra foi a continuação da primeira, e esta talvez tivesse sido um ajuste de contas pela de 1870 e por aí fora. Dizia-se que a “guerra era a continuação da política por outros meios”.

Qualquer coisinha, ganância ou birra, dava direito a cruzar armas, de forma mais ou menos localizada, tendo nós tido a sorte de ser apanhados nessas “políticas” apenas uma vez, a da ambição napoleónica, que muito mudou isto por cá… e pelo Brasil.

No nosso retângulo nunca tivemos a mesma dinâmica e rotina bélica do centro da Europa. Lutamos contra os muçulmanos na construção do país, lutamos contra os castelhanos /espanhóis nos séculos XIV e XVII na reafirmação do mesmo; lutamos entre nós no parto do liberalismo, mas nunca tivemos guerras permanentes de 30 ou 100 anos como para lá dos Pirenéus.

No século XX as guerras globalizam-se deixaram de ser pontuais conflitos bilaterais. A primeira vai ter a barbaridade das trincheiras e da inacreditável facilidade com que se enviava inutilmente carne para canhão ao tentar furar a linha. Para a segunda a mecanização dá maior mobilidade e a novidade são os “desmoralizadores” bombardeamentos de civis.

Hiroshima é um passo gigantesco na história bélica. A guerra já não é extensão da política onde uma vez ganham uns, outra vez ganham outros. É a potencial destruição do planeta onde todos perdem.

Há a divisão entre países que têm a bomba e a os que não a têm. Nasce o equilíbrio do terror, entre os possuidores da dita, gente supostamente, apesar de tudo, responsável, como a crise dos misseis de Cuba de 1962 demonstrou.

Não voltamos a ver guerras mundiais, apenas vivemos no receio do que uma falsa manobra ou um erro de comunicação possa originar. O genial filme Dr Strange Love de Stanley Kubrick que ilustra esta publicação é um monumento eloquente a esse absurdo.

E a bomba trouxe alguma paz… quem diria.

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10 agosto 2023

Porque não aprecio muito o FCP


Nota introdutória: a todos os familiares e amigos, dragões ligeiros ou fervorosos, isto não é uma questão pessoal 😊. É uma reflexão

O nosso clube depende de fatores hereditários ou geográficos. Pela geografia eu devia ter simpatia pelo FCP, mas não tenho…

A culpa começa no Gabriel. Era um colega do 1º ano do ciclo (atual 5ª) que era dragão (? na altura talvez ainda não houvesse a correspondência …) ferrenho e para quem os resultados tinham duas leituras. Ou o Porto ganhara por ser o maior, ou perdera por ter sido roubado. Humildade para reconhecer que cometeu erros ou os outros tinham jogado melhor não havia. Não seria o único nem o único clube, mas era-o muito marcadamente.

Ontem, por acaso, vi 3/4 do jogo e claramente o Benfica (que também não está nas minhas predileções) jogou melhor, ganhou e mereceu ganhar. Ponto. Quando é assim, felicita-se o vitorioso. Não se inventam ombros que chegam ao cotovelo, não se aplaudem jogadores que agridem, nem se felicitam treinadores que se recusam a respeitar as regras vigentes.

Se o desporto é suposto ser uma escola, estes professores são maus exemplos e desculpá-los não é bonito.

Nota final: a todos os familiares e amigos, dragões ligeiros ou fervorosos, isto não é uma questão pessoal. Pensem um pouco, de novo.

07 agosto 2023

Hiroxima, missão assassina? (I)


Por estes dias, concretamente a 6 e 9 de agosto, registam-se os aniversários dos bombardeamentos atómicos sobre o Japão de 1945, acontecimentos que mudaram para sempre este mundo e as suas guerras.

Uma primeira discussão será de até que ponto isto poderia ter sido evitado e a bomba atómica não ter sido de todo inventada. Parece impossível. A própria Alemanha estava na corrida, imagine-se se tivessem chegado primeiro, e mais tarde ou mais cedo a bomba seria uma realidade. A perseguição aos judeus, incluindo aos físicos que fugiram e atravessaram o Atlântico, foi afinal um "feliz" tiro no pé dos nazis.

A segunda questão é se havia necessidade de a ter utilizado e se este massacre de civis constituiu um ato criminoso. Se bem que com meios diferentes, bombardear cidades para forçar rendições, aconteceu neste final da guerra, mas também logo no início. Quando em maio de 1940, a Alemanha resolveu atacar e França, atravessando o Benelux para contornar a famosa linha Maginot, a Holanda resistiu inicialmente, mas rendeu-se após um brutal bombardeamento que arrasou Roterdão. A Bélgica, na perspetiva de sofrer algo idêntico também não resistiu e estas capitulações relâmpago dos seus vizinhos do Norte, foram muito criticadas pela França, que a isso atribui a sua derrota… relâmpago.

Seguiu-se o massacre de Londres e a “very british” reação de “Keep calm and carry on”. Mais tarde seria a resposta aliada na Alemanha, como, por exemplo, Dresden, Colónia, Hamburgo e Berlin.

Quando Truman decide largar a bomba em Hiroxima, para forçar a capitulação do Japão, não era também a primeira vez que uma cidade nipónica sofria um bombardeamento. O tipo de bomba, escala e efeitos foram diferentes, mas o princípio não foi diferente do que tinha sido corrente naquela guerra.

O segundo bombardeamento de Nagasaki, apenas 3 dias depois, sem ter dado tempo ao Japão de assimilar e reagir ao de Hiroxima, é bastante mais questionável. O fato de a primeira bomba ser de uranio e a segunda de plutónio, faz especular sobre se o interesse “científico” em testar os dois tipos de bomba não se terá sobreposto aos objetivos puramente militares e humanos…

Enfim, com a ligeireza e tranquilidade de quem hoje está a olhar para isto sentado num sofá, a toda esta distância, parece-me que Hiroxima tem desculpa, mas Nagasaki talvez não.

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