28 janeiro 2024

Brincar com a justiça


Sou certamente parte de um largo número de portugueses que assistiu atónito às decisões e justificações do juiz Ivo Rosa em abril de 2021, quanto ao que fazer com o processo e julgamento de José Sócrates, especialmente pelos critérios para a contagem da prescrição, (des)valorização seletiva de testemunhas e mais outras bizarrices.

Certo que a aplicação das leis tem detalhes e procedimentos que só os iniciados no tema dominam. No entanto, o resultado terá de ser lógico e entendível pelo cidadão comum, sob o risco de passarmos para o domínio da (in)justiça.

Estes dias, soubemos que a Relação anulou e reverteu uma boa parte das decisões desse abril de 2021. Certo, ficamos com a sensação de mais justiça, mas… quase 3 anos perdidos!? Como é possível que umas simples decisões de um simples juiz, possam ter atrasado um processo desta importância por quase 3 anos. É injusto.

Já vimos que José Sócrates não quer ser julgado, mas não devia ser assim tão simples brincar com a justiça portuguesa. Discursos sobre a necessidade de mudar não faltam, mas uma coisa são discursos, outra são ações. Há mesmo vontade de mudar algo?

25 janeiro 2024

O que se pode fazer pelo país?

Na pré-campanha em curso para as próximas eleições legislativas de março, parece que todos os discursos, estratégias e propostas andam em torno do “quem dá mais?”.

Como se o eleitorado fosse uma trupe infantil e infantilizada, que irá escolher um patrono em função do valor da mesada prometida. Este estado de coisas, e a natureza das exigências que o eleitorado privilegia, faz-me recordar a frase de JF Kennedy, umas décadas atrás, “não perguntem o que o que o vosso país pode fazer por vós; perguntem o que podem fazer pelo vosso país”.

Nos tempos atuais, uma boa parte dos eleitores e nomeadamente os pensionistas, devem entender que já fizeram o que podiam pelo país e que agora o jogo será mais quanto à retribuição potencial. Também os funcionários públicos poderão assumir que, na ausência de uma real meritocracia nas suas carreiras, fazer mais ou melhor não muda nada.

No entanto, e isto é uma sugestão, pensem um pouco menos egoisticamente, pensem no país que vai ficar aí para quem cá fica. Pensem nos vossos filhos que penam em conseguir independência financeira e local próprio para viverem; pensem nos vossos netos que deixaram de ver porque optaram por uma vida mais desafogada a uns milhares de quilómetros de distância. Conseguir melhores condições para eles, não se resolve com leilões de mesadas. Consegue-se com maior criação de riqueza. Era isso que devia estar a ser discutido prioritariamente


21 janeiro 2024

Voos turbulentos


Ao que parece, a turbulência com a gestão e a tutela pública da TAP ainda não terminou. Depois de uma longa, penosa e por vezes caricata comissão parlamentar de inquérito, que supostamente tudo analisou e esclareceu, a defesa apresentada pela própria TAP ao processo que a ex CEO lhe colocou, veio trazer mais alguns fatos e argumentos curiosos…

Em primeiro lugar, ao contrário do que sempre afirmou a tutela, a senhora não seria uma grande gestora e a recuperação da empresa foi mais pelo contexto do que pelo mérito da equipa de gestão. Depois, a CEO ocupava outros cargos incompatíveis com o estatuto a que estava obrigada. Isto constitui motivo para despedimento com justa causa, mesmo tendo sido “descoberto” pela TAP, depois de a ter despedido… aqui não se pode falar de protelamento de decisões, foi agir até antes de conhecer.  Do outro lado, diz-se que essa situação teria sido previamente exposta e autorizada.

Não sei como isto vai acabar, mas uma coisa é certa. Quando o Estado Português quiser contratar um Profissional de primeira água, vai ser muito difícil convencer alguém sério e competente a trilhar caminhos que podem conduzir a estes imbróglios.

Entretanto, enquanto ouvimos loas à fantástica recuperação e rentabilidade da empresa, esta recebe mais 343 milhões de euros do Estado, para aumento do capital social. Estava previsto, aparentemente ainda haverá outro para o próximo ano, mas se as coisas estão a correr tão bem à empresa, o fluxo financeiro não deveria ser no outro sentido?!

19 janeiro 2024

O 25 de Abril no (FC)Porto


 Já tive oportunidade de dizer aí para trás que não me entusiasmo sobremaneira com as quezílias tribais do futebol, que o meu “clube” foi uma herança familiar e que minha vida apenas vi na ao vivo meia partida por eles jogada, há umas boas décadas.

Também já referi que não identifico o espírito e valores da cidade do Porto com os do FCP e, por tudo isso, não tenho muito interesse pela disputa à sucessão de Pinto da Costa.

No entanto…. No discurso de apresentação do candidato André Villas-Boas há uma frase que é má demais a ser verdade: “cortar com o ‘status quo’ existente, onde impera o medo e não se pode exprimir livremente o que se pensa sem ser ameaçado ou censurado”. Isto, a ser verdade, e aparentemente as ameaças de que tem sido alvo o simples candidato vão nesse sentido, não são coisa deste nosso mundo…

50 anos depois, a liberdade do 25 de abril vai chegar ao principal clube da liberal cidade do Porto? Mais vale tarde do que nunca…

18 janeiro 2024

Obrigado, Mr Trump


Quem já passou pelo Irão ou teve algum contacto com Persas, sabe que ali existe uma cultura com um nível muito superior ao que as notícias sobre as suas lideranças e respetivas políticas sugerem. Sabe que há uma grande parte da sua sociedade com vontade de viver em liberdade, com respeito completo pelos direitos humanos, como no mundo ocidental.

Quando foi celebrado o acordo nuclear em 2015, muitos persas e muitas persas rejubilaram pelo que podia ser uma aproximação e um prenuncio de integração do país num mundo mais livre. Posteriormente em 2018, Mr Trump decidiu abandonar esse acordo, por razões de fundo que ignoro, simpatia pelos sauditas…?

O certo é que, apesar dos defeitos e falhas do acordo, este, apesar de tudo, integrava e condicionava minimamente o país. Depois o Irão voltou a ser pária. Hoje o Irão ajuda a Rússia a massacrar a Ucrânia; hoje o Irão xiita apoia ativamente o Hamas, sunita, histórica e financeiramente patrocinado por outros atores. Os seus procuradores Hezbollah e Houthis, estão mais fortes e ativos do que nunca, com estes últimos a porem causa grandes rotas marítimas internacionais e a escalarem o conflito. Não, não há caso para agradecer ao Mr Trump, apenas desejar que este mundo avance noutra direção, mas talvez seja apenas ingenuidade minha.

15 janeiro 2024

O silêncio e o respeito


De há uns anos para cá a fase final da supertaça espanhola é disputada na Arábia Saudita, vá-se lá saber porquê…

No passado dia 10 jogou-se uma das meias-finais entre o Real Madrid e o Atlético de Madrid. Antes do início da partida estava programado um minuto de silencio, em homenagem ao grande futebolista alemão, Franz Beckenbauer, recentemente falecido.

Na prática não foi de todo um minuto de silêncio, dado que as bancadas resolveram assobiá-lo do princípio ao fim. Li, depois, tratar-se de uma questão cultural. Dizem que o silencio pelos mortos não é tradição na região. Pode não ser, mas…

Será tradição pelo menos dos convidados que estavam no relvado e, mesmo não o sendo dos “anfitriões”, o respeito pelas tradições dos outros, especialmente pelo luto alheio, é daquelas coisas que não devia ser necessário muito esforço para respeitar.

Há uns anos estive em Londres em novembro, durante as celebrações do armistício da I Grande Guerra. Com tantos milhares de pessoas na rua, assistir ao silencio absoluto daqueles dois minutos foi uma experiência impressionante. Certamente mesmo para quem não tenha vivido e sentido a guerra, para quem não tivesse o hábito de momento semelhante, não havia alternativa senão ficar imóvel e em… silêncio.

Diferenças culturais… eles compram tudo e não parecem aprender nada.

12 janeiro 2024

Quem chamou a Troika ?


 A esta distância a questão pode parecer irrelevante, mas esta polémica marca um antes e um depois na nossa vida política e (i)maturidade democrática. A polémica nasce na campanha para as legislativas de 2015, onde num debate com Passos Coelho, António Costa tenta colar ao PSD a responsabilidade pela vinda da troika para Portugal e o sofrimento experimentado por muitos portugueses nesse período.

Sabemos que os políticos gostam de criar “narrativas”, mas aquela era tão evidentemente desonesta e claramente não sustentada que parecia apenas fazer cair no ridículo quem a avançava. Tinha sido o próprio PS de A. Costa a levar o país à bancarrota, o programa fora negociado pelo PS e teria sido aplicado por quem quer que seja que estivesse no governo na altura. Quem está nas mãos de credores para as suas necessidades básicas não tem muitas alternativas, nem as pernas dos banqueiros tremem como as dos meninos de coro.

Infelizmente a mensagem pegou. Ainda hoje se associa esses tempos da troika a uma maldade da “direita” e o alívio posterior a um mérito da “esquerda”. Aquilo que poderia ter constituído um crescimento na maturidade política e cívica do país, acabou por ser um retrocesso. Em vez de ter aumentado a consciência de que o importante é permitir a criação de riqueza e o contributo e responsabilização de todos, ficamos com a imagem de que a solução é um partido virtuoso que põe o Estado a resolver de tudo, nacionalizando TAPs, Ctt, grupos de média, salvando tudo o que for mal gerido, já sem falar na animosidade contra o contributo da iniciativa privada em domínios relevantes e carenciados como a educação e a saúde.

Esta suposta virtuosidade é ainda complementada com a demonização da oposição, plena de más intenções, reais ou potenciais. Esta é a herança destes últimos anos. Andamos para trás. Precisamos de cidadãos responsáveis e responsabilizados e não infantilizados, passivamente beneficiando da generosidade de um “Estado” caridoso. A prazo empobrecemos.