16 dezembro 2025

Obrigados a jogar na Bolsa?


É bem conhecido o problema da sustentabilidade e do futuro do sistema de pensões e daí ouvirmos apelos à constituição de planos de poupança individuais, já que no futuro pode não haver dinheiro que chegue para cumprir as expetativas.

Uma primeira reflexão sobre constitucionalidade. Quando na dureza da troika se procurou tocar no estatuto dos funcionários públicos, o TC chumbou a proposta, invocando, entre outros argumentos, “direitos constituídos” e o famoso “Princípio da Confiança”. Diz este que o Estado, sendo de Direito, não pode trocar as voltas aos cidadãos à sua bela mercê, traindo expetativas legitimas existentes.

Nesta base, a alguém que trabalhou e contribuiu durante 40 anos com a expetativa de usufruir de certas condições de reforma, dizer-lhe na última hora, que afinal não vai ser assim, não se enquadrará no mesmo contexto? Ou os funcionários de Estado são uma casta à parte?

Portugal não é a Suíça. Todos aqueles para quem é tão duro chegar ao fim do mês, irão criar poupanças com vista a melhorarem a sua reforma daqui a umas boas décadas? Não será prioritário. Assim, parece que Bruxelas se prepara para tornar essa poupança obrigatória. Esses fundos serão aplicados, com riscos é claro e geridos por quem? Por gente competente, não nomeada por favores e pouco comprometida com os Ricardos Salgados deste mundo…? Jogo na Bolsa se quiser, não por obrigação.

Penso que o mais lógico e justo por parte do Estado e das obrigatoriedades legais será sempre um espírito de redistribuição síncrona. Quem trabalha desconta para quem já não o faz, eventualmente ajustando a data de transição conforme necessário, o que parcialmente já é feito. Se há algo que o Estado possa fazer aqui é proporcionar oportunidades de contribuição para quem ainda tem idade para criar valor e dificuldade em encontrar uma oportunidade no mercado de trabalho atual. 

15 dezembro 2025

Quanto o T perde o I

 

Iot significa “Internet of Things” e a designação aplica-se às coisas que se ligam à internet. Já aqui atrás falei de alguns casos em que coisas se ligam algures, mesmo sem os seus utilizadores saberem, podendo se tratar de automóveis, autocarros, pneus e outras que nem se imagina...

Outro campo é dos “gadgets” (propositadamente deixado em inglês) tecnológicos cuja conexão, controlo, atualização e respetiva app são apresentados como uma mais-valia apreciada pelos utilizadores. Podemos falar de bicicletas, sistemas de iluminação, de rega ou segurança, sensores e de todo o tipo de eletrodomésticos, como, por exemplo, aspiradores…

Recentemente a americana Roomba, criadora do popular aspirador IRobot entrou em processo de falência, submergido pela concorrência chinesa. Parece que vai ser salva pela empresa que lhe fabricava os aparelhos, a Picea Robotics, chinesa…

O drama potencial nestes processos surge quando o aparelho é tão dependente da app e dos serviços da empresa, que em caso de falência técnica e ou económica do fabricante fica órfão e inútil.

VanMoof é uma marca de bicicletas conectadas extremamente particulares, com design exclusivo e muitas particularidades tecnológicas. Chamavam-lhe a “Tesla das bicicletas”. A empresa faliu em 2023, entretanto foi retomada, mas no seu período de agonia foi um calvário para os proprietários dos brinquedos caros. As especificidades mecânicas e eletrônicas implicavam que os problemas apenas podiam ser respondidos pelo fabricante e este não conseguia dar resposta.

Em conclusão, para lá de todas as questões de privacidade e de se ter uma coisa com olhos e ouvidos em casa ou no bolso, procurem garantir que o fabricante irá sobreviver ao tempo de vida esperado do dispositivo. Se não for o caso, convém que este consiga resistir decentemente às exéquias do seu fundador.


14 dezembro 2025

Vice-Rei do Norte


Especialmente nesta altura em que ficou na moda desenvolver novas narrativas sobre o que foi e o que não foi o 25 de novembro, nada melhor do que ler quem o viveu e dele foi protagonista, melhor do que escutar o “disse que disse” de quem repete o que ouviu dizer, na parte que encaixa na sua narrativa preferida.

Esta autobiografia de Pires Veloso, onde obviamente o 25 de novembro de 1975 tem uma quota importante é obrigatória para quem se quiser informar.

O cognome de Vice-Rei do Norte, não é especialmente do meu agrado. Depende de como for pronunciado, com alguma simpatia e respeito ou com sobranceria e algum toque de desdém. Para começar não estamos em contesto monárquico, depois Pires Veloso não foi vice de ninguém. Em Lisboa é que existiam uns candidatos a vice czares. Um vice-rei presume existir algures um rei e aquele ser um personagem que com alguma autonomia governa um território distante.

E em 1975 o Norte e a cidade de Porto foram diferentes de Lisboa, mas não na perspetiva de uma terra longínqua e destacada. Pires Veloso teve sempre um olhar sobre o Portugal inteiro. Este Norte e a cidade do Porto, hostis às forças extremistas (daí catalogados de reacionários e fascistas) é o mesmo que em 1832, durante a guerra civil foi um bastião firme na defesa do liberalismo contra o absolutismo. Os genes são os mesmos. Podem contra-argumentar que esquerda-direita; revolução- contrarrevolução não estão no mesmo alinhamento, mas sim… A bandeira hasteada no Porto nas duas situações foi a mesma: Li-ber-da-de !

Pires Veloso acabou por pagar a sua coragem e integridade, mas penso que a fazer de novo, igual faria, sem se condicionar pelos golpes baixos que a corte, reestabelecida e legitimada graças a, entre outras, à sua contribuição, não hesitou em lhe aplicar posteriormente.

Sobre o conteúdo específico do seu testemunho, uma surpresa para mim foi o lugar de Ramalho Eanes. Tendo pouco ou nada intervindo no dia 25 é espetacular e oportunisticamente catapultado à primeira linha, numa encenação programada e realizada pelo grande maestro Melo Antunes.

Agora vou especular. Aviso colocado, concretizo… O Prec estava exausto, Vasco Gonçalves encostado e as reações populares, a começar no Norte, apontavam a um beco sem saída para aquele caminho; o golpe PCP do 25/11 é travado pela conjugação das forças de Pires Veloso, Jaime Neves e Força Aérea, sob o arbitragem de Costa Gomes e aí… Melo Antunes, conhecido por moderado, mas não necessariamente um democrata pluralista vai colocar a coroa de louros em Eanes que, do mal o menos, permitirá a continuação da influência comunista dentro do que era possível. O mui democrático Conselho da Revolução aguentou-se até 1982.

Dá para entender a alergia que alguns democratas de gema desenvolveram por Ramalho Eanes, especialmente Sá Carneio e em certa medida também Mário Soares.

Se houvesse uma biografia completa e detalhada de Melo Antunes, certamente muita coisa se aprenderia e melhor se entenderia o que aconteceu no país nesta época.

12 dezembro 2025

Gaia Sul


Vilar do Paraíso saltou para as notícias a propósito da localização alternativa da futura estação de TGV de Gaia. Nos anos em que vivia em Arcozelo e estudava no Porto, passei lá diariamente em transportes públicos, ao longo da velhinha estrada N1-15. Recentemente refiz o percurso por curiosidade e constatei uma paisagem deprimente. Para lá das antigas construções, algumas degradas, tudo está urbanizado de forma caótica, sem um mínimo de planeamento nem harmonia. Gaia que não é beira-rio nem beira-mar, sem pés na água, é um triste deserto quanto a planificação e qualidade urbana, pontualmente rasgado por novas autoestradas brutais, completamente desintegradas e desfigurando os locais que atravessam.

Voltando ao TGV, considerando que a estação em causa não vai servir apenas o centro da cidade de Gaia, que até tem Campanhã logo em frente, mas em boa parte o seu Sul, para estes utilizadores será muitíssimo mais fácil vir até Vilar do Paraíso do que entrar no inferno caótico de Santo Ovídio.

Abismal é que depois de tantos anos de estudos, concurso lançado, propostas apresentadas e contratos fechados, se venha discutir alterações desta magnitude, com este impacto, sobretudo considerando a densa ocupação destas zonas. Não terá sido por falta de tempo…. Planear, bem pensar antes de fazer não parece ser o forte cá do nacional burgo e os resultados estão à vista um pouco por todo o lado.

Quanto ao empreiteiro que depois de assinar o contrato, vem sugerir alterações significativas, pode não ser bom sinal. Não era possível tê-lo sugerido em alternativa ainda na fase de concurso?

10 dezembro 2025

Até onde se liga


O alarme disparou na Noruega, quando descobriram que os seus autocarros de transportes públicos de um fabricante chinês estavam “conectados” sem eles saberem… A marca em causa, Yutong, tentou tranquilizar os ânimos dizendo que os dados recolhidos não iam para a China, ficavam armazenados na Alemanha. Grande consolo!

O problema não será apenas com autocarros, nem com China, nem apenas com veículos. Cada vez mais usamos equipamentos que por facilidade de manutenção e não só, de alguma forma conversam com um mestre algures. Até os pneus Pirelli estão sob escrutínio por existirem versões conectadas e terem parte do capital em mãos chinesas… penus !!!

Há diferente dimensões. Os códigos e políticas de uma empresa estatal chinesa são diferentes (quando conhecidos) dos de um fabricante ocidental, eventualmente cotado em bolsa. Considerando que essa ligação pode servir para recolher informação, como também para passar ordens, esta última opção à mercê de uma grande potencia mundial é um risco brutal. Se eles se zangarem com um país podem-lhes parar os autocarros, metros, veículos particulares e sabe-se lá que mais… Neste momento uma situação destas é bastante improvável, até porque seria comercialmente suicida, mas isto ser possível não é nada confortável.

Quando falamos apenas na recolha de informação, de recordar que esta é hoje um ativo enorme. A fantástica IA vive de sofisticados algoritmos que correm em poderosos equipamentos informáticos, mas o seu combustível é informação/dados. Sem isso seria inútil. A recolha de dados valiosos sem o consentimento/conhecimento de quem os gera é uma espécie de roubo… que aliás já acontece cada vez que abrimos uma página na internet.

Há ainda outra preocupação sobre o acesso a esses dados. Podem as entidades que os recolhem terem todos os protocolos e procedimentos para a sua proteção, mas há sempre alguém que pode furar e lá chegar e, às vezes, nem precisa de ser um grande hacker. Um amigo meu cuja mulher trabalhava no seu banco, contava-me que por vezes ela lhe ligava depois de ele pagar à saída de uma loja, dizendo-lhe: “já que estás aí, compra-me isto”.

Em resumo, entre o espiar, e eventualmente controlar, a frota de transportes públicos de uma grande cidade e ver os movimentos bancários do marido, a diferença é enorme, mas o mundo é o mesmo.

09 dezembro 2025

Sim, é antissemitismo

 

Dois livros acima, muito distintos, mas sobre o mesmo tema. O Estado de Israel.

Sim, já estou a imaginar as reações de repulsa e de “lá vem este branquear os genocidas”. Sim, Israel tem ações condenáveis, não tenho grande simpatia por Netanyahu e muitíssimo menos pelos seus parceiros de geringonça Ben-Gvir e Smotrich. Isso, no entanto, não justifica o “interesse” especial que certas forças têm em criticar e condenar Israel de forma desproporcional. Al Assad e Putin bombardearam civis em Aleppo e não só, recorrendo inclusive a armas químicas para combater o Estado Islâmico, com um balanço final de meio milhão de mortos… enfim, vá lá. Saddam Hussein terá morto cerca de um milhão de pessoas? A islamização do Sudão conta 2 milhões mortos? Enfim… coisas que acontecem, não vale a pena protestar muito, nada adianta e mais exemplos se poderiam acrescentar. Nesta guerra em Gaza acredita-se piamente no “Ministério da Saúde do Hamas”, clamando por cada morto civil, numa guerra em que aparentemente nunca há baixas militares palestinianas.

Israel tem um padrão de reação desproporcional. Deste-me um golpe, levas dois; pensa bem para a próxima. Esta aproximação é apreciada e utilizada vantajosamente por Hamas e companhia, gente para quem quantos mais mortes, mais mártires, melhor!

Apesar de tudo o que se pode e deve criticar a Israel, este país, a sua fundação, crescimento e consolidação é um exemplo de tenacidade, de perseverança, de ultrapassar obstáculos, descobrir soluções, gerar de conhecimento e… podíamos muito aprender com eles…

A tensão na região começa com a diplomacia de guerra da Inglaterra na I Grande Guerra, que promete tudo a todos. Um lar para os judeus a troco da sua influência nos EUA para estes entrarem na guerra, uma Grande Síria aos árabes haxemitas para os motivarem a rebelar-se e combaterem os Otomanos (Lawrence da Arábia é o embaixador da causa) e, ao mesmo tempo, combinam com a França a posterior repartição da região entre os dois países. Terminada a guerra, as expetativas de todos são incompatíveis e a tensão dispara. O então Secretário Colonial, Wiston Churchil inventou dois países para os haxemitas, Iraque e Transjordânia (atual Jordania) e deixou a Palestina indefinida. De repente, em vez de se discutir a repartição do bolo inteiro, todo o Médio Oriente, passou a ser disputada apenas a última fatia, a Palestina.

Ao longo das décadas de existência do estado judeu algumas coisas óbvias podem ser apontadas e recordadas:

- Desde a primeira hora todas as guerras foram despoletadas por árabes e fações árabes, que não aceitam menos do que a sua hegemonia na região. Israel reage, defendendo-se… e contra-atacando, mas nunca deu o primeiro passo.

- Em 1948 havia 851 mil judeus nos países árabes, em 2018 estavam reduzidos a pouco mais de 3 mil. Os que saíram e seus descendentes não estão a viver em campos, financiados por uma agência especifica da ONU. Refugiado é temporário. Quando não regressam ou não se integram é por que não querem ou não os deixam e será uma forma de deixar a ferida viva. Os próprios judeus expulsos não o desejariam, mas alguém está a ver os países árabes a receber e dar cidadania plena a todos os seus descendentes?

- Desde o fim da guerra do Yom Kippur de 1973 que tem havido tentativas de estabelecer a paz entre Israel e seus vizinhos, com avanços notórios. O sucesso das mesmas é, no entanto, posteriormente dinamitado por alguém que relança as hostilidades. Hoje é o Hamas, apoiado pelos seus padrinhos Irão e Qatar.

- Institucionalmente Israel está em paz com cada vez mais vizinhos e com processos de colaboração que chegam ao domínio da defesa, concretizado aquando dos últimos ataques do Irão.

. O apoio financeiro e logístico do Qatar (Irmandade Muçulmana) ao Hamas é talvez o maior cancro atual na região. Todos que quiserem saber, sabem que daquele movimento nada de bom se pode esperar, nem sequer para os próprios palestinianos que eles reclamam defender. Qual o objetivo do Qatar em alimentar e promover estes bárbaros?!

- Mesmo que se possa discordar e criticar o que se passou em 1948, Israel é hoje um país consolidado e a História é mesmo assim. Não há marcha atrás a partir de certa fase, A reivindicação do “From the river to the sea…” é uma cantilena irrealista. Alguns até desconhecem o significado concreto da mesma, mas acham giro. Quem a canta está redondamente enganado e de forma nenhuma do lado da solução.

- A ocupação da Cisjordânia e respetivos colonatos são um entrave importante. No entanto, não são irresolúveis no âmbito de um acordo de paz, tal como foram desmantelados os existentes em Gaza, quando Israel abandonou o território.

- Uma certa opinião pública ocidental adora os lenços palestinianos, como no passado gostava das camisas à Mao, das boinas à Che Guevara e de símbolos de outras causas. O fundo da motivação tem muito em comum. O ser contra o “seu mundo”. Da mesma forma como os contestatários passados nunca iriam viver na China maoista, também os ativistas atuais nunca se instalarão no Irão (LGBTs nem se fala). Convinha ganharem a consciência de que não estão a ajudar os palestinianos, mas apenas a branquear manipuladores que os usam para causas e modelos de sociedade que certamente não querem mesmo ver implantados na sua própria casa.

Por hoje, é tudo e espero não estar a pregar no deserto (se bem que no passado alguns tiveram sucesso nesse enquadramento 😊 )


06 dezembro 2025

Não sabia, mesmo?


O nome de Afonso Camões pode não ser conhecido de todos, mas quem acompanhou a novela socrática lembra-se dele. Joker (pau para toda a colher) e general prussiano que nunca se amotina (caninamente fiel ao chefe), características especialmente relevantes quando se pede “arranjem-me um emprego”. Para quem na altura nada ouviu, os motores de busca rapidamente podem levar-lhe os detalhes dos fatos em questão.

Quando o nome de Gouveia e Melo se perspectivou como um fácil ganhador das presidenciais, não faltaram “moscas” a aproximarem-se, atraídas pelo aliciante perfume do poder. Faz parte da natureza humana.

Seria função do candidato e/ou de quem o assessoria fazer a filtragem entre os apoios que trazem currículo e os que trazem cadastro (mesmo sem condenação e transito em julgado…). Não parece ter sido muito seletivo. Logo na plateia da sua apresentação se via gente com algum cadastro.

O apoio recentemente anunciado por José Sócrates era dos que inequivocamente traziam “cadastro”. Foi repudiado pelo candidato, mas lançou algum interesse sobre as eventuais presenças de “tralha socrática” naquele navio.  E, surpresa! Entre outros nomes vem essa figura de Afonso Camões, mandatário em Castelo Branco.

Instalada a polémica, o fiel socrático recua, publicando um comunicado, prontamente copiado, “a pedido”, na página oficial do almirante. Imagem acima e disponível aqui. Além de elegâncias linguísticas como referir a “dor de corno” de quem o ataca, o pobre Camões alega estar a ser perseguido por causa de uma escuta ilegal (lá está, foi verdade, mas como não serve para condenar, ele permanece inocente) e de uma ligação de juventude ao antigo primeiro-ministro, E sei que podemo-nos sentir “forever young”, mas, nas minhas contas ele teria mais de 50 anos quando foi apanhado nessa escuta e nessas manobras…

Falta de filtragem inicial, foi distração ou pior, terem feito o favor de copiar um comunicado deste teor na página oficial é amadorismo …. ou pior

05 dezembro 2025

O candidato do partido invisível


Em 2014, quando A.J. Seguro estava prestes a ser corrido da liderança do partido por investida de A. Costa e companhia, alertou para a existência de um partido invisível na sociedade portuguesa e de haver uma parte do PS associada aos negócios e interesses. Isto da parte do ainda líder de um partido com a dimensão e importância do PS é mais do que preocupante, é potencialmente muito grave.

A ser mentira seria expetável uma reação do tipo “quem não se sente, não é filho de boa gente”, eventualmente até uma queixa por difamação, mas o assunto foi ignorado e arquivado, como se fosse apenas um episódio de uma disputa acalorada. No entanto, o fundo da questão não se deveria esgotar com o fecho daquelas primárias pela liderança do partido.

É óbvio que o partido invisível não o esqueceu, nem perdoou e agora votarem Seguro não é como os comunistas a porem a cruzinha em Soares na segunda volta das presidenciais de 1986… mas pior!

Vemos assim esgares de muita gente a repudiarem AJ Seguro porque sim ou por argumentos estapafúrdios e assumida ou sub-repticiamente a migrarem para candidaturas menos alérgicas.

O eventual cenário de termos uma segunda volta entre um candidato do partido invisível e A. Ventura é dos piores pesadelos que posso imaginar.

 

04 dezembro 2025

Mas as crianças, senhor…

 

Em poucas palavras, já que quando os fatos são claros e facilmente escrutináveis, não é necessário elaborar muitos considerandos.

Dentro das barbaridades cometidas na Ucrânia, inclui-se o rapto de crianças ucranianas e envio das mesmas para a Rússia, alegadamente algumas mesmo para a Coreia do Norte. Mesmo sem conhecer todo o quadro legal relativo aos crimes de guerra, é fácil de entender que isto não pode acontecer e é de uma crueldade enorme para as famílias e uma violência brutal para os inocentes.

A UN votou uma resolução, a A/ES-11/L.16/Rev.1, exigindo o retorno imediato das crianças. No quadro anexo, está o resultado. Sabemos que as resoluções da ONU valem o que valem, muitas vezes pouco, mas 12 criminosos votos contra e 57 covardes abstenções, incluindo China, Brasil e países do Golfo… é demais para a minha confiança na sanidade da Humanidade!


Atualizado a 7/12 com inclusão da publicação no Público



02 dezembro 2025

A exclusividade está nos resultados


A Fórmula 1 é um desporto de alta emoção (para quem gosta, claro) e as preferências relativamente aos pilotos frequentemente têm uma componente subjetiva e emotiva, que vai para lá dos frios resultados objetivos. Não é por acaso que Gilles Villeneuve com apenas 4 temporadas e meia disputadas e 6 vitórias registadas, continua a ser recordado, 43 anos após a sua morte. Muitos acham (aqui o escriba incluído) que as suas características de pilotagem, combatividade e além disso humanas não foram igualadas. Não me peçam para ser racional a suportar esta consideração.

Dentro dos campeões mais recentes nem Hamilton nem Verstappen me entusiasmam, nem suscitam empatia. Acho mesmo que a imagem cultivada por Hamilton de “amigo do ambiente”, com dieta vegan, redução do uso de plásticos, veículos elétricos, etc, é algo incompatível com a sua profissão, para não dizer que entra claramente no campo da hipocrisia. Como é possível conciliar isso com ser piloto de F1, automóveis que bebem combustível como ogres, gastam pneus a um ritmo alucinante, enormes quantidades de peças de desgaste de vida curta, sem falar em recorrentes acidentes que muito material enviam para a sucata…. acrescentando ainda o périplo geográfico mundial de equipas e demais staff. Podem tentar melhorar algo, mas para contabilizar isto como atividade amiga do ambiente é necessária muita, muita boa vontade.

Com grande impacto mediático foi anunciado no início da época de 2024 que para 2025 ele integraria a Ferrari. Esta antecipação é estranha. Por muito profissionais que sejam as equipas e os pilotos, passar a época inteira a saber que no final tudo muda é algo desconcertante para quem sai e para quem entra.

Para lá da estranheza do “timing”, parecia também pouco garantido o impacto e resultados desportivos que ele aportaria, apesar de toda a experiência e palmarés.  Não parecia possível a repetição do milagre “Schumacher” na equipa italiana dos anos 2000. Não me parecia a mim, fã dos carros vermelhos, nem a gente bastante sabedora e com muitos kms de F1, como Bernie Ecclestone e Eddie Jordan. Eles questionavam se o interesse da Ferrari seria desportivo… ou de marketing (capas de revista...) e que desportivamente a Ferrari muito mais bem servida continuando com Carlos Sainz Jr.

Numa entrevista à Time, foto acima (sim, o modelo catita é um piloto de F1), Hamilton contra-argumentou que não tinha que dar ouvidos a velhos, ainda por cima brancos. Que era o primeiro e único negro campeão de F1, que era diferente, a idade para ela corria de outra forma, etc. Enfim, eu julgava que a não discriminação racial era um caminho com dois sentidos. Acrescentava ainda que receava encontrar na Ferrari um ambiente menos diverso e inclusivo do aquele a que estava habituado na Mercedes. Uma entrevista muito à la moda.

O início da temporada de 2025 foi decepcionante. O carro não esteve brilhante, mas o seu colega de equipa foi sistematicamente superior. Falta de habituação ao carro, diziam. Quando já em agosto, na Hungria, Leclerc faz a pole-position e Hamilton fica pelo 12º lugar da grelha, este classifica-se como um “inútil”. Estão a ver Villeneuve assim resignado, ele que desde que o motor trabalhasse e o carro tivesse no mínimo duas rodas nunca baixava os braços? Ou Senna?

O final da época já cai no domínio da humilhação. No Qatar parte 17º; vá lá que melhorou e terminou em 12º, Sainz, a quem ele tomou o lugar e passou a uma equipa teoricamente inferior, acabou no pódio.

Hamilton não é um Schumacher nem um Lauda. Os grandes pilotos são os que desenvolvem e melhoram as equipas por onde passam, não os que caiem em choradinhos. Como aparecerá trajado física e mentalmente na próxima capa de revista?

01 dezembro 2025

Porto, Porto, Porto


Ir ao Porto, tirar umas fotografias. Certo, não faltarão na Invicta temas para dar o gosto ao dedo, mas…

Tantos turistas, não é? E como fotografar a cidade sem aparecer a ponte D Luís, a torre dos Clérigos ou serra do Pilar? E como colocar esta santíssima trindade iconográfica da cidade em fotos que não sejam iguais aos milhares de milhões já realizadas…?  

Parti com duas ideias alternativas e complementares. Procurar um registo a evidenciar a “overdose” turística e, antes ou depois, entrar pelos becos e quelhos supostamente menos expostos às incursões e longe do tal trio omnipresente.

Só que isto de fotografar é como caçar, ou talvez seja, dado que nunca saí a caçar. Vai-se por aí fora e logo se vê o que salta à nossa frente, a pedir o disparo.

E, pronto, lá saíram as fotos, das quais uma seleção está aqui. Se a santíssima trindade do bom Porto lá aparece, será por mero acaso.

29 novembro 2025

Ainda sobre as vitórias no 25 de novembro

Não resisto em voltar ao tema…

Sabendo que assim como não há maior cego do que aquele que não quer ver, também é difícil desenganar os que aos enganos estão predispostos, mas tento…

Em primeiro lugar quem perdeu foi a esquerda comunista. Aqueles que achavam ser o PREC um bom caminho para um bom destino, perderam e ainda bem. Como se costuma dizer, é possível ser comunista num regime livre, mas é impossível ser livre num regime comunista. E podem agradecer o PCP não ter sido ilegalizado, já que se o desfecho fosse outro, a sorte seria provavelmente diferente para os seus opositores.

Esta data não resolveu tudo, mas fui a última tentativa de intentona e a consolidação da legitimidade democrática, que não é pouca coisa. Na baralhação que se faz agora, até nem se sabe bem quem precipitou os acontecimentos. Umas dúzias de paras descontrolados que deram a desculpa para a direita reagir em força?! Mário Soares seria então na altura de direita? Quero acreditar que se o sucesso tivesse ficado no outro lado, não haveria esta narrativa da orfandade de liderança e saberíamos muito bem quem mandava em quem.

Visitando o que se passava no país nessa altura, era óbvio que alguma coisa teria que acontecer e as relações de poder serem clarificadas. Aqui, no desfecho da clarificação, há a assinalar uma outra importante vitória, que é do bom-senso e razoabilidade que evitaram um banho de sangue. Com toda a tensão existente, armas em circulação e posições extremadas, não faltava nada para se despoletar uma violenta guerra civil. Esta não aconteceu e a sensatez que prevaleceu de todos os lados, foi uma grande vitória da sensatez do povo português, que muitas vidas poupou. Parabéns!

26 novembro 2025

De Miguel para Miguel

Já tinha aqui evocado este Senhor Miguel Unamuno e como o seu nome próprio, comum e associado ao do Cervantes, inspirou o pseudónimo literário do nosso Torga.

Este livro é uma leitura que Unamuno faz ao famoso romance e à personagem imortal e universal de Cervantes, escrevendo como se D. Quixote tivesse sido uma figura real e o outro Miguel o seu biógrafo. Ele lê-nos o livro, interpela o Cavaleiro da Triste Figura e, ao mesmo tempo, interpela-nos a nós e ao seu mundo contemporâneo que, não sendo propriamente idêntico ao de hoje, comporta questões de fundo que nunca perderão uma atualidade gritante. É um livro para ler devagar, por vezes tive mesmo de reler certas passagens para bens as digerir.

O texto que foi acrescentado como introdução, “O Sepulcro de D. Quixote” é das coisas mais fantásticas e bem escritas que já li.

Unamuno escreve muito bem e, para lá disso, mostra-se um fino conhecedor da natureza humana, especialmente naqueles aspetos onde não há séculos que a possam transformar. Um livro verdadeiramente magistral, que jamais se esquece.

A universalidade e a amplitude da leitura de Unamuno são especialmente curiosas pelas pontes que estabelece com várias figuras religiosas, das quais a não menos relevante é o assinalar as semelhanças entre as campanhas de D. Quixote e a vida de Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus. Entre outros paralelos, ambos tudo abandonarem em busca da sua estrela, da sua visão de glória e do seu ideal. De passagem, sobre a universalidade da temática quixotesca, aproveitem para visitar a fantástica interpretação de “La Quete” (A busca) por Jacques Brel, exemplo aqui, e mastiguem bem as palavras.

D. Quixote não é apenas de la Mancha, nem de Espanha, nem do século XVII. É de todos os tempos, de todos os lugares, de todas as gentes que acreditam e não desistem, que são loucas sim, mas pela grandeza das causas e pelo valor da vida.

Deixo duas passagens:

Numa obra de enganos e embustes se condensou, o fruto do nosso heroísmo; numa obra de enganos e embustes se eternizou a passageira grandeza da nossa Espanha; numa obra de enganos e embustes se condensa e compendia a nossa filosofia espanhola, a única verdadeira e autêntica; com uma obra de enganos e embustes chegou a alma do nosso povo, encarnada em homem, até aos mistérios do abismo da vida. E essa obra de enganos e embustes é a história mais triste que jamais se escreveu; a mais triste, sim, mas também a mais consoladora para quantos sabem saborear nas lágrimas do riso a redenção da miserável sensatez a que a escravidão da vida presente nos condena.

 

Mas isso é absurdo, dizeis? E quem é capaz de dizer o que é o absurdo? E ainda que o fosse! Só o que ensaia o absurdo é capaz de conquistar o impossível. Não há outra forma de acertar uma vez no cravo que vibrar cem marteladas na ferradura. E sobretudo, há apenas uma maneira de triunfar verdadeiramente: é arrostar com o ridículo. […]. Sim, o nosso mal está todo na cobardia moral, na falta de coragem para cada um afirmar a sua verdade, a sua fé, e para defendê-la. A mentira envolve e estrangula as almas que habitam nesta casa de borregos amodorrados, estúpidos por obstrução de sensatez.

 

25 novembro 2025

Polémica com o 25 de novembro

Confesso que não estava a planear abordar este tema hoje, até tinha outro texto preparado, mas umas declarações que ontem ouvi a João Ferreira fizeram-me sair do sério. Segundo ele, no 25 de novembro saiam vitoriosas forças não democráticas… e que a data foi um revés para o processo “democrático”. A sério?

Portanto, Conselho da Revolução, pactos MFA-partidos que condicionavam os partidos democraticamente sufragados, cercos à Assembleia Constituinte, mandatos de captura em branco e outros tropelias lideradas por quem nas eleições tinha tido (PCP+MDP+ resto) menos de 20%, isso sim era respeitar a democracia! Ou, para os comunistas, democratas com direitos plenos são apenas aqueles que votam em nós? Os restantes são reacionários. fascistas, lacaios de imperialistas, neoliberais e extrema-direita, todos gente a desqualificar e obstáculos no caminho para a “verdadeira democracia, a nossa”?

Se dúvidas houvesse, nas eleições presidenciais seguintes de 1976 os vencedores (não democratas?) do 25 de novembro (Ramalho Eanes + Pinheiro de Azevedo) tiveram 75% dos votos.

Que os comunistas e a esquerda radical não tenham digerido, nem nunca conseguirão digerir o fim do PREC, entende-se. Que uma parte significativa do PS alinhe nestas histórias deve fazer Mário Soares, e outros socialistas da época, dar umas voltas no túmulo. A origem desta revisão está naturalmente na geringonça Costista, que para alcançar o poder, inventou uma frente de esquerda que de coesão, pelo menos em 1976, tinha muito pouca. Se hoje tem, duvido, pelo menos a nível do eleitorado de base do PS. Que se faça polémica e que tente reescrever a história quem nisso está interessado é um pouco natural. Que não haja uma larga reação a dizer “deixem-se de tretas” e de estórias pseudo-democráticas, isso é que me surpreende.

24 novembro 2025

Debates presidenciais

Se nada me falhou, acima está a lista de debates (duelos?) previstos para as próximas eleições presidenciais, aparentemente 28. Julgo que a partir da dúzia, no máximo, ninguém mais trará nada de novo, para lá, naturalmente, de alimentar os comentários e as sentenças na comunicação social e nas redes sobre quem venceu quem e porquê.

Para lá desta overdose, parece-me que há outro problema. Do que vi e li até agora, fico com dúvidas de que muitos candidatos não saibam ou não queiram saber o que é a função presidencial. A confusão é especialmente proporcionada por André Ventura, que fala como se estivesse a concorrer a primeiro-ministro, pelo menos fala da mesma maneira como falou quando a esse lugar concorria. Não é o único com veleidades legislativas, mas é o mais evidente, até pela sua presença direta nas duas eleições.

O Presidente não governa. Se quisermos uma analogia futebolística, o Presidente é uma espécie de árbitro, que vela para que as regras do jogo sejam cumpridas. Apresentará os amarelos e os vermelhos quando necessário, mas não opina sobre se a tática deve ser 4-3-3 ou 4-1-4-1 ou se o Manuel deve jogar à esquerda ou à direita. O jogo legislativo nasce e é decidido no Parlamento, objeto de outro ato eleitoral.

Estamos a escolher uma pessoa, não um programa. É importante conhecer o que ele pensa, a sua bagagem, a sua resiliência face a situações de tensão, enfim a sua personalidade, integridade e capacidade para cumprir a função a que se candidata. Não o queremos ouvir propor como se poderá resolver os problemas da saúde, da justiça ou da habitação, já que não será sufragado para isso, nem para isso terá poderes. Não me interessa ouvir a repetição fácil dessas cassetes de boas intenções, que pouco acrescentam. Preferiria saber algo sobre pessoa, que livros leu, que filmes prefere e como percepcionou e interpreta acontecimentos históricos relevantes, enfim, a sua cultura, mas o caminho raramente entra por aí e para esse objetivo talvez se dispensassem os 28 duelos.


Atualizado a 29/11 incluindo cópia da publicação no Público.




23 novembro 2025

Rali Lancia e Citroen


Na imagem acima podemos ver um Lancia e um Citroen de rally, respetivamente de meados dos anos 70 e da atualidade. Como é visível entre um DS e um Stratos as diferenças em peso, potencia, conceito, dimensões, etc…são tão abismais que até admira como poderiam partilhar as mesmas provas.  

Uma particularidade a assinalar, o DS estava a terminar a sua carreira e o Stratos a começar. A marca francesa desapareceu deste mapa e a representação do seu grupo ficou entregue à Peugeot com o revolucionário e mítico 205 T16, depois de uma breve passagem, com sucesso, pelas cores da Talbot.

A Lancia, depois de uma cedência temporária do palco à Fiat, viria a brindar-nos posteriormente com outras máquinas de sonho como o 037 e os Deltas, que, quem os viu, não esqueceu. Daí que o anúncio do retorno da marca italiana aos ralis muitos sorrisos gerou.

Passamos à linha de baixo na imagem, há um ponto em comum com a de cima. O Citroen também está de saída e o Lancia está a chegar. A diferença, no entanto, é de que não se trata de dois veículos com muitas diferenças, nem conceptualmente, nem de componentes. O motor até será, grosso modo, o mesmo nestas duas máquinas do grupo Stellantis. O regresso da Lancia é mais o resultado de uma estratégia do grupo que precisa de gerir e promover 14 marcas, do que um projeto nascido algures com plena individualidade. Certamente que o marketing irá “italianizar” a imagem do novo carro e colori-lo de forma a parecer… um Lancia!

Aguardemos para ver qual o sucesso desportivo e até que ponto ele conseguirá capitalizar todo o carisma dos seus antecessores (de nome). Pelo menos, para mim, para já, não deixa de ser Lancia!

21 novembro 2025

Traz-traz, pum ! (vers 3.0)


Num passado em que havia válvulas encaixadas nos circuitos eletrónicos, uma forma de resolver pequenos problemas era dar duas pancadas simultâneas nas laterais, seguidas de uma pantufada no topo.

Com a passagem ao estado sólido, os maus contactos passaram a ser a nível lógico e aí o remédio generalista era desligar, esperar alguns segundos para descarregarem os condensadores e a seguir ligar de novo. Esta receita vers 2.0 tem uma taxa de sucesso assinalável!

Tenho em casa duas colunas da marca Audipro, que se emparelham por wifi. Recentemente o televisor de 16 anos entregou a alma ao criador (japonês), substituído por um sul-coreano e, ao mesmo tempo, também mudei de fornecedor de internet e de router, o que foi stress a mais para o sistema. As colunas ligam-se, emparelham-se, mas a reprodução na secundária é aleatória e fica muda frequentemente.

Contactei o fabricante, indicando nrs de série, esperando que a solução fosse uma atualização de software. Em primeiro lugar, não me queriam responder, por eu não ter guardado os talões de compra, mas mudaram de opinião quando pedi para registarem a minha reclamação no seu sistema de qualidade (costuma funcionar).

Depois de trocadas algumas banalidades, recebi as instruções seguintes:

Tente acionar o interruptor na parte traseira de ambas as colunas durante um período prolongado, desligando e ligando, desligando e ligando, várias vezes.

Se algo ficou "preso", o problema será resolvido após este processo.

Confesso que fiquei muito surpreendido. Ignorava que isto se tratava como um entupimento de canalizações em que se tenta várias vezes, insistindo até a coisa fluir! 😊

19 novembro 2025

Com o senhor Sousa


Pelas práticas habituais na abreviação dos nomes, o senhor devia ser conhecido por José de Sousa, mas, assim como Albuquerque vale mais do que Silva, Sócrates, mesmo em nome próprio, supera de longe o Sousa. Sim, estou a falar de um ex-primeiro ministro que anda há vários anos a destratar e a humilhar a justiça portuguesa, pondo em causa o Estado de direito.

Evoca-se que o nosso código penal é demasiado generoso nas garantias asseguradas aos acusados e que estes com fundos e bons advogados conseguem fazer longas gincanas processuais, fragilizando e destruindo os processos no fundo e nos prazos. Sabemos que um código não se muda num dia, mas quais as iniciativas tomadas, entretanto, para evitar futuras gincanas socráticas? Acha-se que está mal, mas não se avança para corrigir. Falta de capacidade, coragem ou de vontade?

Até que ponto o aparelho judicial faz sempre tudo o necessário para ser eficaz e justo, mesmo com o generoso código existente? Sobre a delirante decisão instrutória de Ivo Rosa nesta operação Marquês, que motivou tanta bondade?

Quando lemos os detalhes da operação Lex e, ainda por cima, vemos um juiz do supremo a ser investigado por um procurador, o tal em tempos nomeado para procurador europeu com um CV adulterado, não ficamos muito tranquilos.

Tudo parece, e o parecer pode ser o que é ou não, existir uma elite que se defende mutuamente à sombra de cartões partidários ou de outra filiação eventualmente mais discreta. Quando este nível não se consegue regenerar e inspirar confiança à população, não sei se virá um ou três sucedâneos de Salazar, mas a prazo uma rutura torna-se inevitável e não será bonito.

17 novembro 2025

Um ativo em 2ª mão


Imaginem que alguém trespassa um stand de venda de automóveis em 2ª mão e diz ao comprador. Têm aí 50 automóveis, que valorizamos a 100 mil euros, mas não sabemos bem o seu estado. Vamos contabilizar a venda a 100 mil euros e se depois os vender por menos, assumimos e pagamos a diferença.

Neste contexto estão a ver o novo proprietário motivado a tentar vender os automóveis pelo melhor preço e obter os 100 mil euros? Claro que não, está pouco preocupado com isso, porque a receita está garantida. Aqui ainda estamos num domínio minimamente honesto.

Se passarmos à desonestidade, então o senhor esperto irá vendê-los a um amigalhaço, ou a si próprio indiretamente, por 20 mil, para depois revender por 80 ou 100, ficando com algum “lucro” no negócio, à custa do inocente que montou este negócio, com todo o risco do lado dele.

Imaginamos agora que não é um simples stand com um stock de automóveis, mas uma instituição financeira com um stock de créditos e de imóveis? Os mesmos riscos estão lá, apenas a escala é diferente. Acrescentemos que o vendedor, o tal que compensa a diferença, é o Estado Português, todos nós?

Será um pouco escandaloso, não? Foi e está a ser o caso da privatização do Novobanco. Estava-se mesmo a ver que isto ia acabar como estamos a ver nas notícias, não?


Atualizado a 30/11/2025 com cópia da publicação no "Público"


15 novembro 2025

Podia ter sido diferente


Por estes dias escutei num dos podcasts do Observador a espantosa vida de Jorge Jardim. Dava um filme de fazer inveja a James Bond, ainda por cima tratando-se de realidade e não de ficção. O homem tinha iniciativa, coragem, habilidade, uma capacidade enorme de viajar, sobrevoar e superar desafios, perigos e dificuldades e, se calhar, alguma falta de “bom-senso”. Ter sobrevivido a tantas peripécias foi questão não só de sorte, mas também.

Uma grande curiosidade é a sua proximidade com Salazar, quando ideologias à parte, a distância de carácter devia ser enorme entre quem corria as quatro partidas do mundo, de todas as formas e feitios, e quem voou uma única vez entre Lisboa e Porto em 1966, dois anos antes de cair da cadeira, não gostou, não repetiu e ir além de Badajoz não estaria ao nível de transpor o Adamastor, mas quase.

Já nos anos 70, Jardim, homem do regime radicado em Moçambique, entende que a guerra colonial não é solução e começa a negociar por contra própria em Lusaca um acordo de independência para a colónia, equilibrado, procurando lugar para todos. Quando Lisboa soube, estupidamente não aprovou…

Veio o 25 de Abril e o novo poder entregou à Frelimo tudo de mão beijada sem condições, nem obrigações e deu no que deu, outro erro de Lisboa. Um padrão infelizmente frequente nas descolonizações, quando os movimentos de libertação são reconhecidos como legítimos e únicos representantes do “povo”, sem pedir opinião ao povo, nem nesse momento, nem depois.

Este ano comemoraram-se 50 anos dessas independências e, mais uma vez, lá vieram os discursos sobre a responsabilidade da herança colonial nas “dificuldades” atuais. Se seguirem a escola do Brasil, daqui a 50 anos Portugal ainda continuará a arcar com a culpa pela miséria e subdesenvolvimento. Há uns tempos Lula da Silva referia que o facto de a primeira universidade brasileira ter sido criada apenas em 1920 (facto contestável) era uma consequência da colonização portuguesa. Considerando que o seu país ficou independente em 1822, esta influência nefasta projetada por 100 anos, parece coisa de feitiço ou magia-negra, que desconhecia ser assim tão poderosa nestas latitudes.

Voltando às nossas colónias africanas, seja em 1973, seja em 1975, as ações e o resultado podia ter sido diferente.

Podemos certamente criticar o racismo e as desigualdades sociais no tempo das colónias. Devemos também reconhecer que o resultado das independências está muito longe de ter constituído uma melhoria das condições de vida para as populações. Voltando ao Eng Jardim e a Moçambique, ver imagens do estado atual do seu Grande Hotel da Beira, é representativo da evolução do país nestes últimos 50 anos.

13 novembro 2025

Também tu BBC ?


Dois altos dirigentes desta empresa pública com imagem e histórico de excelência, num país onde as responsabilidades são assumidas com seriedade, demitiram-se na sequência de uma manipulação na edição de um discurso de Donald Trump. Este, no fundo, agradece o favor que lhe fizeram. Infelizmente não é caso isolado, já que muitos jornalistas decidiram ser cavaleiros de nobres causas, em vez de profissionais de informação. Quem é pago para produzir informação deve produzir informação, em vez de ser ativista pelas suas convicções. Quem compra informação, espera receber informação e não doutrinamento.

Para além de descredibilizarem estes órgãos de informação que, nestes tempos de desinformação fácil e abundante, são mais do que nunca necessários para a sanidade e objetividade na opinião pública, estas cruzadas ideológicas têm um efeito absolutamente oposto pela assimetria evidente e descarada no tratamento dos temas.

Por exemplo, num caso de polícia envolvendo uma “minoria”, esses detalhes factuais são omitidos, para não provocar generalizações abusivas. Noutros casos é promovida a notícia a simples “suspeita de ligações à extrema-direita”.

Por cá as atitudes sobranceiras nas entrevistas a André Ventura não o diminuem, pelo contrário. Acabam por ser uma bênção para o seu projeto de poder. Muitos jornalistas precisam de voltar à escola (não à madraça).


Atualizado em 14/11/2025 com a publicação no "Público".


10 novembro 2025

A angústia da página em branco


A angústia da página em branco é provocada pelo fato de se pegar numa página (ou abrir um documento) precisamente em branco…. O problema é mesmo esse.

É inútil abrir uma página em branco antes de ter algo já alinhavado internamente, com mais ou menos detalhe, mas com força suficiente para encontrar o fio condutor e a ponta por onde pegar e fazer desfilar as palavras (ou o que for) para a página.

Pode depois até ser um pouco como as cerejas… umas puxam as outras.

Ficar a olhar para o branco esperando pela inspiração não adianta muito (pelo menos na minha perspetiva). Olhar para o branco reflete vazio. É como ficar parado no meio de um entroncamento esperando que a espera resolva a questão.

Se é necessário esperar e dar tempo a que coisa amadureça, tem que ser antes,  sem forçar, sem pressa e sem ficar parado no meio da estrada, em frente à página branca.

05 novembro 2025

O que segura Ana Paula Martins?


Pessoas são em muitas circunstâncias a variável fundamental que faz a eficácia e o sucesso das organizações. Especialmente na saúde a dimensão humana é, e em muito, o que faz a diferença, entre o resultado de profissionais competentes, dedicados e humanos e os outros…

Certamente que não é fácil organizar um sistema público de saúde pela sua dimensão e natureza, mas da base ao topo, do operacional à gestão de topo, a chave está nas pessoas, sua atitude e competências… e se fossemos decapitar estruturas por cada erro cometido, não teríamos substituições todas as semanas, mas quase…

Vem tudo isto a propósito da atual ministra da saúde, Ana Paula Martins. Sabemos que os problemas do SNS não se resolvem num mês ou dois e sabemos também que não será mudando de ministro todos os meses que teremos solução, mas… o facto é que do que se vê das suas ações é mudar pessoas, ainda agora mais uma no INEM, que até muda de nome para ANEM.

Não se esperariam milagres da ação da ministra, mas, no mínimo, humildade e alguma solidariedade institucional para com as estruturas de que é responsável. Do que se vê é que, aparentemente, os problemas nunca são da sua responsabilidade direta. Já só falta dizer que a culpa é das pessoas que adoecem quando não devem e das grávidas que vão ao hospital quando não é oportuno. O seu discurso chega a tocar a sobranceria e arrogância, atitude inaceitável para quem é o máximo responsável por um serviço fundamental que o Estado deve prestar à população e que está a falhar demasiadas vezes.

Ana Paula Martins avança não entre os pingos da chuva, mas no meio de uma borrasca sem se molhar e sem se preocupar demasiado com o escrutínio do seu desempenho. Aparentemente terá um sólido guarda-chuva que a protege! Qual será o segredo dessa proteção? Não sei e aqui também não é local para avançar palpites.


Atualizado em 7/11 com publicação no Público, curiosamente suprimindo o parágrafo final, com o detalhe da questão colocada... curioso.



04 novembro 2025

O terceiro trambolhão do projeto comunista


Certamente que existem boas pessoas e muito respeitáveis que acreditam na bondade do sistema comunista. Certamente que haverá outras que, mais do que ser “por”, serão basicamente “contra” o “sistema” estabelecido. Certo também que século e meio depois de Marx ter formulados os seus fundamentos e de diversas aplicações práticas em distintas latitudes, longitudes, meios e culturas, não há um único exemplo de sucesso em termos de prosperidade sustentada e de liberdade das populações. Não vale a pela aqui detalhar e especular relações de causa-efeito entre comunismo e totalitarismo e repressão… o facto é que nunca funcionou.

Portugal pós 25 de Abril foi um alvo para a implantação desse sistema e felizmente a tentativa fracassou. A primeiro escolho foi o resultado das eleições constituintes de 1976 onde, com 91% de participação, o PCP mais o seu satélite MDP/CDE ficaram nos 16%, abrindo caminho à primazia da legitimidade democrática face à chamada legitimidade revolucionária, obviamente não democrática. A vontade livremente expressa do povo apontou a um caminho diferente do que alguns “revolucionários” defendiam.

Em seguida veio o 25 de novembro onde os comunistas entenderam e registaram que aquela tentativa de golpe, falhada, tinha sido a última e que não havia condições para outras iniciativas de tentar “popularmente” deitar a mão ao poder, pela força.

O livro acima representado, muito objetivo e bem fundamentado acaba por evidenciar um terceiro fracasso do comunismo. De assinalar que o período analisado no livro é anterior à passagem do autor pelo ministério da agricultura onde teve intervenção decisiva no encerrar do processo.

Muito interessante no livro é o detalhe das táticas de tomada de poder dos comunistas nesses tempos de transição. Depois, apesar da aparente dicotomia entre malditos latifundiários e desgraçados camponeses, é a importância que largas franjas do sector agrícola nacional, mesmo dos pequenos, teve na contestação às expropriações e coletivização em curso.

Finalmente há a falência do sistema, que definha e vai colapsando à medida que os generosos e indiscriminados apoios públicos desaparecem. Passa a ser necessário produzir mesmo o suficiente para pagar o fim do mês, dificuldade acrescida quando há “trabalhadores” impostos porque o sindicato decidiu. É o terceiro marco da falência do comunismo, o económico. Sobre o resultado possível caso o país não tivesse encontrado energia e determinação para se libertar desse destino, temos o exemplo soviético do Holomodor e da grande fome. Ver aqui

Para acabar e baralhar as conclusões, creio que o único exemplo de coletivização bem-sucedida são … os Kibutizim israelitas.. mas, ok, são gente diferente e, ainda por cima, pouco apreciada pelos atuais defensores dessas teorias.

02 novembro 2025

Temos guerra ?


Ali pelas dunas e beira-mar entre a Apúlia e A Ver-o-mar não faltam sinais destes, que algo me frustram, ao ver os caminhantes a disfrutar de belas vistas e eu resignado a pedalar pelo empedrado da estrada.

Certo que estes passadiços são estreitos, é efetivamente impossível serem partilhados entre caminhantes e "pedalantes" e, em geral, esse convívio nem sempre é pacifico, mesmo quando a largura é maior. Pela minha parte nessas situações a interpelação é mais “com licença”, seguida de “obrigado” do que cheguem para lá e deixem-me passar que vou a abrir. Talvez estes últimos se queiram vingar das tangentes ou dos “ganchos” que os automóveis lhes fazem na estrada, mostrando que naquela "selva" são eles os alfa ….

Seja por lazer, exercício ou para casa-trabalho a bicicleta é uma excelente opção em muitos contextos e agora com a banalização das elétricas os horizontes alargam. Não sei se falta regulamentação ou apenas informação sobre a mesma, mas que estes convívios podiam ser melhorados e mais civilizados, podiam. E, às vezes, nem são necessárias muitas leis e respetiva polícia quando o bom-senso e o respeito tomam o lugar devido.

01 novembro 2025

PS inseguro, positivo para Seguro


Assim como as criancinhas que são obrigadas a comer a sopa toda antes de poderem sair da mesa, a cúpula do PS também se viu obrigada a engolir a candidatura de AJ Seguro antes de poder avançar com a sua vida. Há algumas caretas e JL Carneiro até decretou tolerância de voto para quem se sentir especialmente agoniado com a ementa.

Não penso, no entanto, que tais hesitações no palácio do Rato sejam uma desvantagem para o candidato presidencial. No histórico PS haverá muita gente disponível para votar Seguro e que teria alguma rejeição se o visse apoiado entusiasta e convictamente por Augusto Santos Silva e outros mais dessa cepa. Ver essa fação a fazer caretas é fator positivo e credibilizador.

As autárquicas de Lisboa em que 2 + 2 deram 3 em vez de 5 ou sequer 4, provaram que a “Frente de esquerda” juntando PS e extrema-esquerda pré-eleitoralmente não tem coerência nem recolhe entusiasmos numa grande franja do eleitorado. Não é aí que o PS pode ir buscar "a força". Frentismo é uma especialidade dos comunistas, mas mais na base de domesticar e anular “aliados” do que alargar a base popular de apoio.

Em resumo, a candidatura de Seguro e o resultado que daí virá poderá provocar uma redefinição de forças e proporcionar uma regeneração do partido, já que internamente a partir da cúpula não parece viável. A democracia e o regime democrático agradeceriam. A ver vamos…

Atualizado a 5/11 com inclusão de recorte da publicação no Público.


30 outubro 2025

Sobre o Estado Novo


O Estado Novo foi um longo período da nossa história recente e de cujo balanço não teremos muitos motivos para orgulho. Como convém que certas histórias não se repitam, não basta pronunciar um “vade retro Satanás” sem procurar ir a algum detalhe. Aliás, um dos grandes defeitos na “narrativa” oficial sobre a sua origem é desvalorizar a enorme responsabilidade da I República, cuja prática e “ética” (?!) estendeu o tapete vermelho para a chegada e aceitação de um regime autoritário.

O livro acima representado é uma excelente viagem por esses tempos, onde ano a ano se faz um resumo da conjuntura histórica, uma seleção de excertos de discursos e outros textos e uma nota de contextualização dos mesmos. Muito interessante e revelador de alguns matizes nos pensamentos e ações dos vários atores deste período histórico.

Confesso que para lá dos bem conhecidos males do regime, autoritarismo, repressão, política africana irrealista, há algo que me parece relevante assinalar. É a falta de real ambição para o país. O promover o “pequenino”, baixar expectativas, sucessos houve muitos, no passado. Tão gloriosos foram que nos contentamos por ter um presente cuja glória, pequena como convém a um regime que defende a frugalidade a todos os níveis, fica na memória desse passado. O importante é não estragar nada, o fundamental é manter a ordem e respeitar… o passado. Grandes e novos desafios para o futuro não parecem ser prioridade.

Certo que se pode referir as obras públicas que ficaram, um importante crescimento económico na sua fase final, mas o tom geral é o de um regime bolorento e tacanho na sua visão do país, não se frutando a meios para garantir essa “estabilidade”.

Curiosida uma citação de Humberto Delgado em 1933. “Que tristeza! Eu julgava o Parlamento uma assembleia de homens e fui deparar com uma súcia de garotos dizendo piadas de sol uns aos outros, num barulho indecente próprio de praça de touros ou de taberna.”.  Tão modernos estes antigos ou tão envelhecidos os atuais modernos… talvez que em 1933 a missão de “estabilização” das instituições ainda não estivesse suficientemente avançada.

24 outubro 2025

A rua da burca


Portugal legislou algo que implica a proibição da utilização da burca em espaços públicos e “naturalmente” é tema para muita discussão, opinião e polémica. Cruzaram-se várias dimensões. A primeira será a sua “estranheza” face à nossa realidade. Para viver numa dada sociedade é necessário respeitar um certo número de “códigos” e práticas, que fazem a harmonia social e com o qual essa sociedade se identifica.  Não é xenofobia! Cuspir para o chão, arrotar em público, atirar piropos a mulheres que passam na rua, andar em tronco nu ou atravessar a rua fora da passadeira são pequenas coisas naturais e aceites em certos contextos e proibidas ou no mínimo mal vistas noutros. A visão de uma mulher “embrulhada” na rua não pertence certamente à nossa paisagem social.

A outra dimensão é a confessional e eventual conflito com as crenças de cada um. Aqui o Parlamento pode estar a colocar a foice em seara alheia, mas, no fundo, a burca não é uma “necessidade” da prática religiosa. Na origem o Corão impõe a necessidade de a mulher se apresentar publicamente com recato, sendo que a definição de recato evoluiu. Ainda há poucas décadas, por estes lados, uma mulher não devia sair à rua sem cobrir o cabelo… isso evoluiu.

Em resumo, era do interesse do Islão e dos muçulmanos procurar alguma atualização e contextualização dos seus princípios para poderem viver em harmonia nas sociedades ocidentais atuais. A burca é um anacronismo que devia ser banido. Se devem ser os Parlamentos a promover essa evolução é outra questão, mas que está mais do que na hora de fazer algo, está!

21 outubro 2025

Não foi politico !?

 

Diz o Engenheiro ( ?) Carlos Moedas que o acidente no elevador da Glória se deveu a causas técnicas e não políticas. Fiquei baralhado. Efetivamente o cabo e os freios são componentes técnicos (ainda bem que não são políticos…).

Fui ler o relatório do GPIAAF (aqui). Efetivamente do que se sabe, para já, não se pode indicar que por trás da desgraça tenha estado uma ação ou diretiva política direta, do tipo extinguir/reestruturar um serviço ou redução de orçamento. As não conformidades que de uma forma ou outra ajudaram/proporcionaram este desfecho são mais do domínio passivo do que ativo.

Falhas nos procedimentos internos, ausência de supervisão por entidades externas e muita ligeireza. Fazia-se como sempre se fez, sem se pensar muito em avaliar se é preciso fazer diferente.

Mais do que o erro “administrativo” na aquisição do cabo e na não detecção do erro, chocaram outras coisas.

Toda a gente que quisesse saber sabia que os travões não travavam suficientemente para serem redundantes a uma rotura do cabo e… tenhamos esperança de que este nunca rompa. Ninguém sabia/sabe ao certo o peso real das cabinas! Cito: “Há também indícios de que o peso das cabinas aumentou de forma não negligenciável desde o momento da eletrificação, existindo indicações díspares quanto ao peso atual, consoante os documentos: 14, 18 e 19 toneladas, cujo valor exacto é desconhecido da CCFL”. Lê-se e não se acredita. Outros pequenos/grandes exemplos de irresponsabilidade e de vazios nos procedimentos não faltam.

Mesmo o mantra dos sindicatos, apontando de imediato como causa a externalização dos serviços de manutenção não cola. A empresa externa disponibilizava recursos básicos que eram supervisionados muito proximamente pelos experientes técnicos da casa.

 As responsabilidades políticas e de gestão estarão mais no que não fizeram do que no que eventualmente fizeram. Os responsáveis têm também a missão de questionar e promover as mudanças necessárias. Esta situação de passividade otimista… é da responsabilidade de alguém.


20 outubro 2025

O PS desgeringonçou… ?


Dois fatos recentes poderão eventualmente prenunciar que o PS poderá estar em fase de desgeringonçar…

O primeiro é o resultado das autárquicas em Lisboa. A frente da chamada esquerda somou menos do que a soma das partes. De facto, para as eleições autárquicas não há geringonças pós-eleitorais. Têm que ser assumido antes e a ficção de um alinhamento largo de “esquerda” entre o PS e os radicais à sua esquerda provou, para muitos eleitores, ser isso mesmo, uma ficção. Resta uma curiosidade: se em 2015 a geringonça fosse anunciada antes das eleições, os resultados seriam idênticos?

O segundo facto é o apoio manifestado à candidatura presidencial de António José Seguro. Uma decisão naturalmente lógica, mas o tempo que demorou, as posições de certos cortesões do Rato e a ambiguidade da “flexibilidade” no apoio tolerado deixam muita expetativa. Foi um apoio decidido assim como quem arranca um dente e a ver vamos como o PS no seu fundo vai digerir este dilema. Quem se vai impor? O “partido invisível” dentro do PS que abomina Seguro ou um outro PS mais popular (perto do povo) e genuíno?

A bem do nosso regime democrático e do papel que o PS aí pode e deve desempenar é relevante o resultado. Eu cá tenho a minha preferência…

17 outubro 2025

Paz? Talvez…


O processo atualmente em curso na Palestina merece ser saudado e parabenizados todos os que o proporcionaram. Não sabemos, naturalmente, se se a paz será duradoura, mas a libertação dos reféns, pelo menos dos vivos, esvazia os argumentos de Israel para continuar a massacrar a população de Gaza e abre numa nova fase.

Enquanto houver um grupo com vontade de se afirmar aos tiros e alguém que lhe dê as armas, a guerra continuará. Em Gaza não faltará gente com vontade de fazer falar as armas, independentemente se estão enquadrados numa estrutura Hamas, Hamas-bis ou mesmo sem estrutura.

No entanto, aquele território, por si, não tem condições para se armar sozinho. Haver ou não guerra depende mais do que vão fazer os apoiantes e financiadores externos da “causa”. Não sei até que ponto eles foram envolvidos e comprometidos no atual processo, mas o futuro e a paz em Gaza não serão decididos em Gaza.


Atualizado em 19/10 com publicação no Público


14 outubro 2025

O terceiro partido


Das 308 câmaras municipais, PS + PSD ganharam 264, cerca de 85%. Afinal o “bipartidarismo” não morreu? É diferente a dinâmica das autárquicas e mais complexa do que nas legislativas. Não há um candidato a líder de governo, há 308 candidatos a presidente de Câmara (sem falar aqui nas freguesias) e a eventual confiança ou rejeição que o líder de Lisboa provoca pode ser bem diferente da que o candidato local gera.

Duas curiosidades. Ricardo Leão em Loures foi quase um proscrito pela corte instalada no largo do Rato e limpou as eleições em Loures. Eduardo Teixeira, várias vezes candidato pelo PSD à câmara de Viana do Castelo e derrotado, não foi por aparecer em cartazes com André Ventura ao lado que convenceu mais os eleitores.

O que me parece também ser de assinalar é que a terceira força foram os “outros”, os independentes, apesar de não haver surpresas espetaculares ao nível de Rui Moreira quando ganhou pela primeira vez o Porto. Parece-me que uma grande parte destes “outros” são gente com carreira nos partidos que resolveram fazerem-se ao largo por conta própria. Não há verdadeiramente muita gente nova vinda da “sociedade civil” que se apresenta diretamente por conta e risco na política local. São os partidos a perderem a mão nas suas “tropas”, por boas ou más razões.

Os partidos estabelecidos há mais tempo têm um acervo de autarcas com notoriedade e provas dadas (melhores ou piores) que lhes dá mais resiliência e resistência à mudança, mas as lideranças partidárias tinham interesse em entender as causas profundas destas deserções e corrigir o que houver a corrigir enquanto houver tempo.