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29 março 2025

Salafismo no BE


Quando os canhões da I Grande Guerra se calaram, o mundo muçulmano sunita entrou num período de crise e de choque. O Império Otomano, seu bastião, tinha lutado do lado dos vencidos e a outrora poderosa força que dominara todo o Médio Oriente e grande parte do Norte de África, já enfraquecida antes do conflito, desmorona-se e desaparece.

Na sua sede e origem, a atual Turquia, Kemal Atartuk vai criar um novo Estado, muçulmano certo, que o digam os ortodoxos gregos e arménios que por lá andavam, mas laico, com a religião nas mesquitas e fora de escolas, tribunais e parlamento.

Ao mesmo tempo é extinto o califado, desaparecendo o Califa, o líder religioso global e reconhecido sucessor de Maomé. Imaginem que, se na unificação da Itália, em vez de o Papa passar a administrar apenas um bairro de Roma, tivesse desaparecido de vez a função. Um grande choque seria, não?

Neste processo de desagregação do mundo muçulmano, surgem reflexões do tipo: Se no passado, na origem, eramos poderosos e depois enfraquecemos, a solução passa por regressar à “pureza original”. A isto se chamará salafismo, palavra relacionada com origem e raiz, sendo o movimento mais impactante, ainda hoje, a Irmandade Muçulmana, nascida no Egito.

Como é óbvio estas visões retrogradas e anacrónicas não trouxeram muito brilhantismo e sucesso ao Islão.

Contextos e dimensões à parte, a opção do Bloco de Esquerda em ir chamar os seus “fundadores”, parece ser um reflexo com a mesma inspiração. Quanto ao resultado, logo se verá, mas as estratégias de “ó tempo volta para trás”, nunca trouxeram grande progresso.

18 maio 2024

Os turcos devem estar a rir


Obviamente que André Ventura disse uma grande “patacoada” quando, relativamente aos prazos para a construção do novo aeroporto de Lisboa, resolveu fazer uma comparação com os turcos “que não são propriamente conhecidos por ser o povo mais trabalhador do mundo”. Obviamente que deve ignorar a dinâmica económica e empreendedora daquele país que, podendo não ser o mais dinâmico do mundo, tem uma capacidade de realização e de resiliência capaz de fazer inveja a muitos.

Fazer dessa patacoada uma questão de Estado, capaz de mobilizar a primeira página dos media, é realmente um sinónimo de que não devemos ter grandes problemas em curso neste nosso jardim à beira-mar plantado.

Sim, é uma patacoada infeliz, desnecessária e desenquadrada. Não é de aplaudir, claro, mas basta classificar uma vez. Se bem conheço os turcos, estou a imaginá-los mais a ironizar sobre tais despropósitos do que a sentirem-se vítimas de racismo ou outro crime qualquer…

16 abril 2024

OLAG - Organização de Libertação da Anatólia Grega


 

Não há, mas podia ter havido.

Na sequência da queda dos impérios, especialmente no final da Grande Guerra, estes desmembraram-se em vários estados nação, que buscaram identidade e estabilidade pela homogeneidade étnica e religiosa. Dentro desse processo a vida não foi fácil para os arménios e gregos no novo país Turquia. E para muitos até nem foi longa…

Além dos que foram mortos, tema ainda hoje sensível, dezenas de milhares de gregos ortodoxos atravessaram o mar Egeu e instalaram-se na atual Grécia. Agora, vamos supor…

Foram colocados em campos de refugiados e três gerações depois ainda aí continuam, ostentando a chave da casa abandonada pelos avós e vivendo em condições degradadas, na dependência de uma agência da ONU.

Foi criado um movimento OLAG – Organização de Libertação da Anatólia Grega (em grego talvez fosse OEAA - Oργάνωση Ελληνική Απελευθέρωση της Ανατολίας), apoiada e financiada pela Rússia e outros países ortodoxos, que realiza ações terroristas contra interesses turcos, chegando mesmo a sequestrar e assassinar uma delegação de atletas turcos nuns jogos olímpicos. Lança ataques terroristas contra território turco e, em retaliação, a Turquia ameaçada invade a Grécia e anexa uma parte dela.

Nas escolas ortodoxas gregas é ensinado desde a primeira hora que um turco é um inimigo que merece castigo e ódios ilimitados. Os turcos vêm os gregos como gente que os odeia e um perigo permanente.

Quando décadas depois a OLAG se normaliza um pouco e assina um acordo de paz com a Turquia, nasce um novo movimento, Os Ortodoxos Radicais, que relançam as hostilidades.

Quando a Turquia está progressivamente a sair da Grécia ocupada e a permitir a autonomia aos ortodoxos gregos, estes aproveitam essa liberdade para organizar e lançar novo ataque terrorista brutal na Turquia.

A ferida continuaria aberta, e por aí fora seguimos…

Esta história não se passou assim, apesar de gregos e turcos não serem grandes amigos como a situação em Chipre o atesta, mas um pouco mais a sul, noutra zona do ex-império Otomano, por aí seguimos. Descubra as diferenças….

30 outubro 2018

Khashoggi e o resto


Há um sítio argelino de “falsas notícias” muito interessante, o www.el-manchar.com, sendo que, naturalmente, para entender muitas delas é necessário conhecer o contexto do país. Sobre o desaparecimento do jornalista saudita no consulado do seu país em Istambul produziram uma série de provocações primorosamente oportunas e irónicas. Cito alguns exemplos.

“Daesh denúncia um crime bárbaro e acusa a Arábia Saudita de ser a vergonha do terrorismo internacional”

“Morte de Khashoggi: A Arábia Saudita apresenta as suas desculpas e promete a partir de agora apenas matar iemenitas”

“Said Bouteflika: Graças a Deus, Mohamed Tamalt não tinha amigalhaços no Washington Post” O primeiro citado é o todo-poderoso irmão do Presidente da República e o segundo um blogger que morreu na sequência de maltratos numa prisão argelina.

E certamente salutar esta indignação mundial com a sorte de Khashoggi e fazer chegar a quem de direito (torto) a mensagem que não vale tudo. A obstinação da Turquia em encostar o príncipe saudita às cordas não é, obviamente, motivada por questões de princípio. É aproveitar o acontecimento para marcar posição e procurar alterar a relação de forças no xadrez do poder regional.

A indignação, sendo positiva, não chega. É pouco se não for acrescentada a situação de tantos outros crimes por “delito de opinião” de quem não tem amigos nos jornais ocidentais ou nalguma confraria influente. É pouco para parar a desgraça que dura há mais de três anos no Iémen, já suficientemente pobre mesmo sem guerra. Como militarmente não está a ser um sucesso, apesar de todo os milhões gastos em equipamento comprado ao ocidente, a tática da coligação liderada pelos sauditas passou a ser atacar as infraestruturas, mercados, barcos de pesca, cortar a alimentação e vencer pela fome. De recordar que alguma vista grossa face ao crime de Istambul é pragmaticamente justificada pela manutenção dos contratos de fornecimento de armas em curso.

Estima-se existirem no Iémen 400 000 crianças sofrendo de subnutrição severa (como na foto acima da AFP), três em cada quatro pessoas necessitam de ajuda alimentar, mas tudo estará “relativamente” bem, desde que morram apenas iemenitas sem amigos influentes.

26 junho 2018

Local de sabedoria


Quiseram a sorte e o azar de uma desprogramação de última hora que eu pudesse visitar longamente a basílica de Santa Sofia em Istambul. Na prática não foi bem visitar, foi tentar vivê-la.

Já lá tinha passado há uns anos, mas apenas entrando num pé e saindo no outro. Agora foi diferente. Atravessei-a lentamente, explorando todos os cantos e esquinas acessíveis, com a sensação e a emoção de estar a pisar um lugar histórico único. Em mais de quatorze séculos por ali passaram imperadores romanos, papas, patriarcas ortodoxos, sultões e califas. Num local ímpar da bacia deste mar nosso a quem batizaram de centro da Terra. Ali, no promontório do “Serralho”, condensam-se e cruzam-se tantos caminhos, guerras, impérios, riquezas, artes, saberes e desgraças, que é impossível não sentir um peso enorme nos ombros, por maior que seja a leveza com que se procura colocar os pés naquelas pedras desgastadas pelos séculos.

A basílica é maciça, maciça no aspeto exterior, maciça no espaço interior e na sua história de sobrevivência. Os quatro minaretes que em tempos a mesquitizaram, fazem uma espécie de cerco, circunscrevendo-lhe o espaço e, se é certo que ela não cresce para lá daquele perímetro, em nada perde de dimensão e pujança. Gostaria apenas que lhe retirassem os escudos verdes arabizantes descaracterizadores, da mesma forma como apreciaria que a antiga mesquita de Córdova fosse libertada dos adicionais cristãos lá colocados.

As figuras, temporariamente escondidas durante os séculos em que foi local de culto do Islão, resistiram mais ou menos e vamos vendo-as assim, enquanto pudermos, já que não faltam tentações e intenções de fazer o edifício retomar essas funções.

Sofia significa sabedoria, certo…? Oxalá!

21 junho 2018

Impreciso


Imagem imprecisa. Depois de voltas e reviravoltas, eis-me de novo visitante regular das margens do Marmara. Um momento preciso, num intervalo estreito. Entre o fim do Ramadão, celebração secular, cujo cumprimento estrito pode levantar algumas questões de interpretação no mundo atual, e as próximas eleições, dentro de dias, as primeiras num novo modelo, com desfecho inesperado.

Haverá continuação do modelo recente, bem-visto pragmaticamente por alguns, ao menos sabe-se o que é, insustentável para outros, pelos fundamentos do sistema social ou pela questionabilidade económica? Haverá mudança e sabe-se lá para quê? Seguir-se-á um impasse?

Mantenho a foto, imprecisa do mar de Marmara, ao fundo as suas ilhas, refúgio histórico das minorias. Destaco a imprecisa pequena chama, numa mesa de esplanada de um terraço, no lado asiático da cidade. Istambul asiático, cada vez mais pujante e cosmopolita e em oposição ao “outro lado”, o europeu, mais estático e conservador. Irónico?

Perto de concluir um século sobre a sua (re)fundação, o país está suspenso e inquieto. Uma coisa, no entanto, sente-se e marca: a enorme vitalidade e energia encerradas nas suas vontades. A ver vamos. Boa sorte turcos e turcas de boa vontade.

29 maio 2018

Não perfeito, mas indispensável

Sim, muito do que se passa atualmente no Médio Oriente e vizinhanças é ainda efeito da queda do império Otomano e da extinção do último Califado. Sim, para entender o mundo de hoje é importante conhecer este declínio e desfecho. Sim, é um tema complexo que não se esgota em dois chavões nem num simples ponto de vista.

A obra de Bernard Lewis “What Went Wrong”, não sendo perfeita, é um excelente contributo para esta questão. Alguns apontarão umas passagens imprecisas ou fatos mal interpretados, outros invocarão a ausência de referência a algumas questões relevantes. Não será perfeita, não há livros sagrados neste campeonato, mas é, na minha modesta opinião, obrigatória.


B. Lewis faleceu no passado dia 19 de maio.

01 março 2018

Os “Irmãos”


Se houvesse um programa obrigatório para quem pretendesse falar publicamente sobre a questão do Islão político e do que ele arrasta, este livro deveria constar do mesmo. Um registo claro, objetivo e elucidativo, apesar dum toque de emoção excessiva no tratamento dos tempos mais recentes do Egito, pós 2011, as tais primaveras que toda a gente imagina conhecer com mais ou menos lirismo, com mais ou menos “conspiracionismo”. O problema está em que nestas e em muitas coisas raramente a realidade coincide com aquilo que a ignorância imagina.

É de uma simplificação enorme resumir as tensões no último século no Médio Oriente a uma história entre árabes, supostamente culturalmente homogéneos e alinhados, como Nasser gostaria, e intervencionismo desestabilizador localmente instalado, Israel, ou de braço longo, o ocidente colonizador que nunca desiste de interferir. Ao longo de todo este percurso, de alianças feitas e desfeitas, assumidas ou dissimuladas, eles estão lá, sempre à espreita, sempre ativos, sem desarmarem nunca: a Irmandade Muçulmana.

Nascida no trauma pós queda do império Otomano, advogando um regresso à “pureza original”, o salafismo, invocando um modelo de organização de sociedade fechado e anacrónico, negando toda e qualquer evolução, já está tudo escrito no livro, a Irmandade é um projeto sem futuro racional. A realização da Oumma, a grande comunidade muçulmana, o califado, de governo único, sem países, é também tão viável quanto a terra vir a ser plana. No entanto, cem anos depois, estão vivos e ativos, adaptando-se continuamento ao contexto. Se os petrodólares apoiaram, se as desilusões pós-independências ajudaram, há mais do que isso. Há uma mensagem que encontra aderência nas populações, década após década.

A herança não é bonita. O discurso hegemónico e intolerante fez muitos estragos, desde os simples crimes contra a comunidade copta no Egito, à inspiração dos movimentos jihadistas, até à preocupante reversão do sistema politico nalguns países, incluindo a Turquia. Sim, o Sr. Erdogan é da “família”.

Curiosamente se a religião é fácil e frequentemente manipulada como ferramenta de acesso e consolidação do poder, esta missão dos “irmãos” viveu e sobreviveu décadas sem atingir esse objetivo, excluindo os casos “especiais” do Sudão e da faixa de Gaza. As suas experiências de poder democrático, pós primaveras, foram tudo menos consolidadas, especialmente nos casos mais emblemáticos da Tunísia e do Egito. Por falta de jeito, de quadros, ou deficiência de princípios e sistema, não souberam governar, mesmo. O que acontecerá a seguir na Turquia é hoje a grande questão.

29 dezembro 2017

Quando acaba o terrorismo islâmico?


Ao contrário do que alguns ingénuos e outros mal-intencionados possam pensar, o fim do terrorismo Islâmico não depende do Ocidente. Não depende de este assumir a sua história, de integrar melhor os migrantes, de terminar com a tal política intervencionista no Médio Oriente, nem da eficácia da sua polícia. Alguns destes pontos ajudarão a mudar a escala e a dinâmica do problema, mas nunca o erradicarão, porque não é daqui que ele nasce. Mesmo a derrota do autodesignado “Estado Islâmico” na Síria e Iraque é apenas o destruir de uma metástase. Facilmente outra nascerá, ali ou mais ao lado.

O terrorismo islâmico acabará, assim como a instabilidade social provocada pelo salafismo disfarçado ou assumido, quando quem de direito entender e assumir conclusões sobre a decadência e posterior queda do Império Otomano.

Nos séculos XVI e XVII o califado dominava completamente o Mediterrâneo Oriental, estava implantado no norte de África, inclusive na costa atlântica depois de Alcácer Quibir e ameaçava Viena e a Europa Central. No século XX aparece moribundo e cai de podre no fim da Grande Guerra de 14-18. Porquê? É uma grande questão, mas se foi claramente ultrapassado pela Europa das Luzes, não parece que um retorno às origens, a visão salafista, resolva grande coisa, pelo contrário.

Enquanto o “mundo muçulmano” não entender que perdeu por ter ficado para trás, nada resolverá buscando recuar ainda mais. É como beber uns uísques para esquecer uma dor de fígado. Um século depois dessa derrota, insistir em semear o ódio ao vencedor e em amaldiçoar os valores que permitiram esse desfecho, é continuar a afundar-se e a agravar as frustrações, donde nascem as radicalizações. Sem complexos para cima e para baixo, para a esquerda ou para direita, é absolutamente inquestionável que o mundo hoje, cultural, social e cientificamente está moldado pela fantástica evolução acontecida no chamado Ocidente, nos últimos séculos. Em cada pequena coisa que utilizamos, em cada minuto, está um saber nascido nesta civilização. Em nenhuma outra fase da história terá havido uma tamanha predominância global. É de realçar que este domínio não é fundamentalmente “hard”, pela força, apesar de esta existir nalguns cenários. O poder é fruto do conhecimento desenvolvido, do modelo de sociedade criado e da qualidade de vida proporcionada.

Existem imperfeições, certo, mas é indiscutível que o respeito pela liberdade, pela diversidade, a condição da mulher, a aceitação do espírito crítico, a abertura aos novos saberes, a separação entre igreja e estado e outras coisas para nós tão “naturais”, fizerem, fazem e farão a diferença. Se os líderes de lá não querem avançar, não nos peçam para regredir; se a larga maioria da sua população quer viver como no Ocidente, não os enganem quanto ao caminho a seguir. Enquanto a frustração pela derrota continuar na diabolização dos vencedores… é o chamado tiro no pé.

Como esta consciencialização poderá demorar algum tempo, há uma alternativa mais imediata: é a de os pregadores do ódio serem coerentes e declararem proibido e haram (pecaminoso) o recurso a todo o equipamento e tecnologia desenvolvida pelos kuffars (infiéis). Nem era preciso ser mesmo tudo, bastava armamento, meios de comunicação e de transporte. Já faria uma grande diferença!

10 agosto 2017

Laicidade e laicofobia


Voltando à questão dos abusos, que começou aqui e depois divergiu para um “podemos não estar de acordo” aqui, achei por bem, eventualmente sendo de novo abusivo, transcrever um texto, algo provocador, de Amine Zaoui, jornalista argelino e muçulmano, publicado recentemente no jornal argelino “Liberté”. Certamente não faltará quem o insulte de várias formas e feitios. Não vou dizer que estou de acordo e tudo subscrevo, mas é assunto que vale a pena questionar e um ponto de vista que merece ser analisado/discutido.

O muçulmano, todo o muçulmano em qualquer parte do mundo, é alérgico ao conceito de "laicidade". A palavra "laicidade" assusta-os! Magoa. Angustia. Aos seus olhos, "laico" é equivalente a comunista. Semelhante a "ateu". Igual a "irreligioso". Sinónimo de imoral. Ou ainda, um laico é um judeu. Um judeu é um laico. Um laico é um cristão. Um cristão é um laico. Qualquer laico é um não-muçulmano. E todo muçulmano é um não-laico, um laicofóbico. Um muçulmano não pode imaginar outro muçulmano laico. Na ausência da laicidade como um estilo de vida social, como uma forma de pensar, como cultura política, o mundo muçulmano tornou-se um mundo islâmico. Consumido pelo fundamentalismo. Mesma a laicidade na Turquia é ameaçada pelo islamismo fanático apoiado pelo projeto político da Irmandade Muçulmana. A "laicidade" assusta os muçulmanos desde Meca até Nouakchott, assusta o político muçulmano tanto de direita como de esquerda, assusta os "doutores" das universidades e assusta o cidadão normal.

A laicidade é um monstro! Mas porquê essa "laicofobia" no muçulmano? A escola é a fonte fundamental dessa doença chamada laicofobia. A escola, qualquer escola no Magrebe e no mundo árabe-muçulmano, do jardim de infância à faculdade, ensina aos seus alunos que a laicidade é um perigo para a religião islâmica. Que "laicidade" é o inimigo número um do Islão. Ela é uma armadilha armada pelos judeus aos muçulmanos! Ela é o isco do anzol colonial. Depois, porque o cidadão se afoga num grande vazio intelectual, onde a história das ideias filosóficas universais é banida. Os muçulmanos vivem fora, sem História e fora da História. Ou fazem a História à sua maneira, para se vangloriarem! Porque não existe nenhum pensamento crítico. Porque o fanatismo se impõe nas escolas e nas universidades, o muçulmano é apanhado pela laicofobia. Porque o religioso é um destino comunitário imposto. Porque não há nenhum debate intelectual livre e racional, o muçulmano tem medo de laicidade. Porque não existem partidos políticos reais com programas da sociedade, todos eles são de criados ou alimentados por correntes nacionalistas de tempero islâmico ou pelas ideias da Irmandade Muçulmana.

A fobia islâmica face à laicidade criou uma cultura de ódio em toda a sociedade muçulmana. Esta fobia islâmica generalizada em direção à laicidade reforçou a mentalidade de rebanho, impediu o muçulmano de poder cultivar uma liberdade individual. Esta laicofobia criou um sentimento de medo do outro, de recusa de viver com os outros. Esta laicofobia ergueu barreiras face àquele que não é semelhante, na religião ou na forma de pensar. Esta doença que é a laicofoboa é a consequência de tudo o que o povo do Magrebe e do mundo árabe-muçulmano viveram em deceção política, social e cultural, e isto dura desde as independências desses países. Se um muçulmano não se liberta desta doença psico-intelectual que é laicofobia, ele permanecerá condenado a viver no medo, ódio e violência, contra si mesmo e contra o outro.

Nunca se explicou ao crente muçulmano simples, com clareza e coragem intelectual e política, o significado da laicidade. Nunca se ensinou às crianças das escolas muçulmanas que a laicidade é o único caminho que garante o respeito pelas religiões, por todas as religiões. Que só a laicidade garante o respeito do ser humano, com as suas convicções religiosas, filosóficas e políticas. Que o caminho da laicidade é o garante da possibilidade de convivência, entre o muçulmano e outras pessoas pertencentes a outras religiões ou outras não-religiões. Que a laicidade permitirá o florescimento em todo o respeito das diferentes culturas e línguas que vivem no Magreb ou neste mundo árabe-muçulmano. Todas as guerras declaradas no mundo muçulmano, ou noutro lugar, em nome do Islão contra outras religiões, contra outras culturas, outras línguas são resultado desta laicofobia, desta doença que corrói o muçulmano, onde quer que ele se encontre.

Sem respeito pela laicidade como cultura, pensamento e como modo de vida social e político, a própria existência do Islão permanecerá ameaçada no mundo. E a laicofobia gera a islamofobia.

02 agosto 2017

Um gosto

Já contei aí para trás como conheci a escrita de Amin Maalouf e o prazer que ela me dá. Desta vez foi o “Rochedo de Tanios”, que estava numa lista de espera com mais dois do mesmo autor.

De novo no Levante (Mashrek), apenas com um pequeno desvio por Chipre, não é um livro de grandes viagens como “O Leão Africano” e muitos outros do escritor. Situado na primeira metade do século XIX, está focado na terra de Maalouf, nas montanhas do Líbano, disputado entre Otomanos e Egípcios, com as potencias europeias numa “espreita” ativa. E com homens e mulheres, ricos de fraquezas, perdidos nas suas grandezas e suficientemente imprevisíveis para serem humanos.

Uma terra, ontem e sempre, charneira entre o Norte e o Sul do Médio Oriente, demasiado fraca para se impor e demasiado forte para sucumbir.

Por estes lados, ao olhar por binóculos para lá, é comum generalizar aqueles outros como árabes e muçulmanos, mas a realidade é muito mais rica. Os livros de Amin Mallouf ajudam bastante a entender essa riqueza, para lá da religião e dessa suposta monto-etnia derivada da pretensa superioridade e obrigatoriedade de se ser descendente do profeta.

Cá para mim, acho que um dia tenho que ir ao Líbano. Não que por lá exista um rochedo de Tanios, de onde se possa ver uma apelativa nesga de mar, mas porque ir conhecendo uma nesga da cultura daquele Levante, é apelo que chegue e:

“O destino passa e repassa por nós, como a agulha do sapateiro passa através do couro que ele trabalha”.

Derivando um pouco: há sempre (temos que ter sempre) lugares especiais onde se “decanta a alma”. Os rochedos (penedos) prestam-se bem a essa função. Por acaso, há umas dúzias anos que “tenho” um, nas montanhas, o da Lapa.

07 julho 2017

Europa à vista



Doze anos depois regressei a Istambul, a grande metrópole daqueles lados. Uma das cidades que nunca dorme.

Comecei com uma pequena escala no lado europeu, onde a visão do restaurante/bar “Reina” fechado após o ataque terrorista da última passagem de ano e de onde guardava/guardo memórias simpáticas me quereria dizer que a coisa estava diferente.

Em seguida, estive apenas baseado no lado asiático. Aquilo que eu imaginava como uma zona residencial de segunda, tipo a margem sul lá do sítio, é uma enorme e pujante metrópole, plena de novas construções, espaços comerciais, sede de empresas, etc. Apesar de sofrer também de alguma asfixia na circulação, é mais nova e diferente da “típica e histórica” zona europeia. A rua de Bagad, abstraindo-nos das matrículas dos carros e dos letreiros das lojas e restaurantes e olhado para as pessoas que circulam, que nem são turistas, podia ser perfeitamente… na Europa.

Senti como se o centro de gravidade da metrópole tivesse atravessado o Bósforo, deixando para trás a antiga Europa e projetando-se para uma mais pujante Ásia. Na linha do horizonte, vista do mar de Marmara, os seis minaretes da Mesquita Azul, agora com uma émula recente no lado asiático, e a basílica de Santa Sofia, cercada por quatro minaretes e onde ainda não desistiram de a transformar em mesquita. Alguma tendência hegemónica intratável?

A cidade já assimilou pragmaticamente o que aconteceu depois do golpe de julho passado. Deu-me a ideia de que há um limite que (ainda?) não foi passado e que, pragmaticamente, enquanto não o for, dá para viver. Ainda não foi desta que fiquei a entender quem é Gulen e quem realmente está por trás dele (a CIA, dizem…?).

Num longo jantar com vista sobre o mar, um agnóstico de matriz cultural cristã e outro de origem muçulmana discutiram o futuro da humanidade. Concordamos em praticamente tudo e garanto que a influência do raki foi bastante limitada!

21 março 2017

Ainda a Holanda e as pontes queimadas

Disse aqui atrás que os resultados das eleições na Holanda, apesar da não vitória dos populistas, não terão sido algo assim tão digno de festejos. Não há recuo do populismo, mas sim avanço, apenas não tão rápido quanto se receava.

No entanto, nestes tempos ocorreu algo mais claramente negativo e veremos se reversível, que é a relação da Turquia com a Europa e a “integração” dos seus imigrantes. A Holanda proibiu os ministros turcos de fazerem campanha no seu território e, independentemente das suas razões ou da falta delas, o que se seguiu tem um certo perfume de pontes queimadas. Erdogan chamou-lhes nazis em vez de se ter queixado de uma forma mais equilibrada e racional (já sem lembrar a sua ordem de prisão par milhares de pessoas no dia seguinte ao golpe falhado). Houve quem lembrasse que na Holanda, o número de imigrantes turcos é superior ao dos efetivos militares. Recomendam-lhes ainda que façam 5 filhos (bastante relevante dado o caráter democrático da Europa; se fosse nazi seria inconsequente).

Alguns imigrantes turcos certamente se terão desolidarizado, mas … os outros que saíram à rua com facas nas laranjas, como querem ser vistos a partir de agora pelos originais do seu país de acolhimento…?

20 dezembro 2016

Quero ir a um mercado de Natal

Onde estava e onde soube dos acontecimentos de ontem não há mercados de Natal, mas, se os houvesse, garanto que iria a um. Ainda não sei quando, nem onde, mas hei-de sair à rua de novo, no âmbito da quadra natalícia. E voltarei a sair as vezes que me apetecer no Porto, em Braga, em Paris ou em Berlim. Ponto final, parágrafo.

O embaixador russo foi assassinado em Ancara por um individuo que teve tempo para ficar exposto no local, umas largas dezenas de segundos a explicar ao que vinha e a dar alguns tiros esporádicos. Desta vez não era curdo; tivesse sido abatido de imediato e ainda se podia ter colocado essa hipótese tradicional.

Alepo tornou-se um símbolo do horror da guerra e há motivos para isso. No entanto não será mais martirizada do que Áden. Para quem não sabe, fica no Iémen, país que está a ser bombardeado e dilacerado há mais de ano e meio. Porque é que agora Alepo é um símbolo? Devido à intervenção musculada da Rússia, às alterações potenciais dos equilíbrios geoestratégicos e, também, às paixões positivas e negativas que o tema arrasta.

Que me perdoem os habitantes de Alepo que sofrem e morrem, mas o seu mediatismo recente é excessivo face ao esquecimento a que estão votados os seus irmãos iemitas e outros que apenas têm o azar adicional de não serem bombardeados por alguém suficientemente exposto à opinião pública ocidental.

24 julho 2016

O que correu mal?


Há um século atrás o império Otomano estava em decadência irreversível e viria a cair menos de uma década depois. Muita tinta se gastou com “O que correu mal?” e muitas razões se apontaram e especularam, desde religião a menos a religião a religião a mais, das mais simples às mais rebuscadas. Se ninguém discute a influência da religião na queda do império romano, é forçoso reconhecer que o princípio de que tudo está escrito e encerrado, nada pode ser acrescentado ou alterado, não constitui certamente um bom fermento para o desenvolvimento do conhecimento.

Claramente as novas rotas comerciais com a Asia, estabelecidas após os descobrimentos portugueses, contribuíram, mas outras sugestões não faltaram. Será que a exclusão do contributo da mulher foi um handicap significativo? Ou a consanguinidade permitida naquelas sociedades levou a uma degradação genética? Certamente não terá existido uma causa única. Há ciclos que se encerram naturalmente e muitas vezes é a própria riqueza do sucesso que conduz à decadência.

Posteriormente, foi constituída a nova república turca, fortemente laica. Era um bom exemplo de ser possível um país de larga maioria muçulmana funcionar com a religião apenas nas mesquitas e fora de ministérios, tribunais e escolas. Mais tarde veio a democracia e um partido islâmico chegou ao poder. A Turquia era um bom exemplo de ser possível um país de maioria muçulmana ser efetivamente democrático e um partido islâmico jogar o jogo.

Gradualmente a Turquia foi ficando menos democrática, menos secular e o contragolpe de Julho 2016 tornou-a um Estado de não direito. É muito provável que daqui a uns anos se comece a gastar tinta com o “O que correu mal na Turquia?”, que, significativamente, até nunca foi colonizada.

Talvez nessa altura futura se escreva sobre um bom exemplo de um país qualquer na bacia mediterrânica, de maioria muçulmana, que vive em democracia plena, onde o partido no governo, confessional ou laico, entende o exercício do poder como um mandato com regras e limitações e não uma apropriação. Ou talvez não…


Foto pickada no Economist

18 julho 2016

Onde parará o comboio?


Por algumas horas questionamo-nos se a Turquia estaria a seguir um caminho “egípcio”, com os militares a travarem um poder islâmico democraticamente eleito. Erdogan tem a legitimidade democrática das urnas, mas não é um democrata. Uma vez disse em público, desconheço o que poderá acrescentar em privado, que a democracia é um comboio de onde se sai quando se chega ao destino e um poder que ataca jornalistas e juízes não é certamente democrático.

Independentemente das especulações sobre a real natureza e a origem da iniciativa do golpe, Erdogan chamou-lhe uma dádiva divina que permitirá limpar o exército. A suspensão imediata de 2745 juízes, mostra que a limpeza não se limita ao exército e coloca muitas dúvidas sobre a real razão desses afastamentos.

Mas há fraquezas de Erdogan que permanecem. A gestão da questão síria, com prioridade na oposição ao regime de Al Assad, consequente falta de eficácia no controlo da fronteira e a hostilidade contra os curdos, trouxe-lhe uma instabilidade para dentro de portas, que talvez pudesse ter sido evitada. A fraqueza maior pode estar ainda na forma como Erdogan está a gerir o pós-golpe, em força e com recorrentes mensagens islâmicas “eles têm os tanques, nós temos a fé”. Poderá dar-lhe impunidade formal e um reforço de popularidade junto dos seus eleitores fiéis. No entanto, duvido que reforce a base eleitoral do seu partido que, recordamos, “apenas” conseguiu 50% dos votos e em eleições repetidas, na “primeira volta” ficara pelos 41%.

Se o comboio conseguir circular e aguentar até às próximas eleições, parece-me provável que os turcos consigam limpar democraticamente este ditador. Até lá, irão sofrer.


Foto de prisioneiros extraída da CNN

10 junho 2016

Evitar o nevoeiro


Ksar = Castelo;

Al (ou El) Ksar = O Castelo; em transposição direta: Alcazar, Alcácer;

Kebir = Grande;

Ksar el Kebir = O Castelo Grande.

Alcácer Quibir é a transposição para português do nome desta cidade marroquina. Houve uma batalha por estes lados em 1578, a que demos esse nome. O nosso D. Sebastião ficou ali. Morto ou vivo, não regressou. Também ali morreu o seu aliado marroquino Abu Abdellah Mohamed, anterior rei deposto. E também ali morreu o rei/sultão vitorioso Abd Al Malik. A batalha é conhecida em Marrocos por “A batalha dos 3 reis”.

O campo de batalha também não foi nas proximidades imediatas desta cidade. Foi junto à foz do rio Mekhazen no Loukos, uns 25 kms a noroeste. Para lá de um certo despropósito e do comportamento irresponsável de D. Sebastião, estava em causa mais do que um episódio das velhas guerras locais entre o cristão e o mouro. Havia também o turco, aliado de Abd Al Malik, e discutia-se o seu acesso à costa atlântica.

Sete anos antes, em 1571, os otomanos tinham tido uma derrota na batalha naval de Lepanto, simbólica. Simbólica pelos estragos materiais terem sido recuperados com alguma facilidade e simbólica também por alguns pretendem ver ali um sinal de que, pelo menos no mar, Istambul ficava para trás. Algo começava a correr mal.

A batalha de Alcácer Quibir correu-nos muito mal. Porquê? Por várias razões, como as crónicas e os historiadores documentam. Mas pior, pior mesmo, é assumir resignadamente que uma solução chegará por magia numa manhã de nevoeiro.

18 fevereiro 2016

Todos contra o EI

Sem sombra de dúvidas! Todos estão contra o chamado Estado Islâmico, nem um único interveniente na questão Síria se declara a favor. No entanto… o Golfo e a Turquia estão fundamentalmente contra Assad (e a Turquia encarnecidamente contra os Curdos); o Irão é principalmente a favor de Assad. Supostamente todos combatem o Estado Islâmico. No entanto o cerne da questão não está aí, mas sim na subsistência ou não do regime de Assad.

A intervenção Russa veio desequilibrar as forças. Ao atacar o EI e os “bons rebeldes”, abriu caminho ao reforço da posição de Assad e dos Curdos. O Golfo e a Turquia clamam por intervenção terrestre para reequilibrar. A Turquia fica em pânico com a perspetiva da consolidação de uma grande presença curda na sua fronteira (muito mais do que com a do próprio EI). Daí bombardear mais esses curdos do que o EI.

Explodem bombas em território turco. Em teoria poderiam ter origem curda ou do EI. Os responsáveis turcos apontam prontamente serem curdas. De facto, o EI não teria grande motivação para atacar a Turquia neste momento mas, também, aparentemente os curdos não ficam a ganhar com este acicatar do seu inimigo. Deverão ter mais interesse em consolidar as suas posições na Síria e no Iraque e não em dar argumentos para uma intervenção mais musculada da Turquia…Ficou claro, ou começo de novo…?

Uma coisa é certa. Se a Turquia e o Golfo invadirem militarmente Síria; a Rússia e o Irão corresponderão à escalada. Sendo a Turquia membro efetivo da Nato, se atacada terá direito a ser defendida por toda a Aliança! Vamos ver contingentes europeus a partirem para o Médio Oriente? Teoricamente assim seria…


Foto da Reuters

03 setembro 2015

Foto desfocada

Meio mundo ficou chocado com a imagem da criança síria que deu à costa numa praia da Turquia. Certamente Ayral merece a nossa compaixão e, ao mesmo tempo, ele evoca todas as outras crianças mortas afogadas no Mediterrâneo. No entanto, não devia o mundo ter ficado assim tão chocado. Há mais de um ano que na Síria milhares de Ayral são mortos pelos bombardeamentos, vêm os seus pais serem barbaramente assassinados, as suas mães violadas e as suas irmãs vendidas para escravas sexuais. Isto, nesta dimensão e duração, choca (deveria) muito mais do que um simples corpo, com todo o respeito pelo mesmo e pela sua família, que somos todos nós.

O que se passa na Síria não é consequência de um terramoto, marmoto ou outro fenómeno de origem natural. É uma guerra provocada por disputas territoriais entre as potências regionais. O abjeto “Estado Islâmico” não existe apenas por simples loucura de um bando de fanáticos. A zona que eles dominam é completamente insuficiente em quase tudo, inclusive em produção de equipamento militar. Como conseguem eles manter um exército operacional durante tanto tempo? Quem são os cúmplices desta abjeção? Pela lógica diria serem algumas dessas potências regionais…

Mesmo com toda a carga emotiva associada, o pequeno Ayral é uma questão menor. Não deveria monopolizar as primeiras páginas. Mais depressa elas deveriam ser ocupadas pelos milhares de Ayral que sofrem na Síria, lado a lado com as caras sorridentes dos negócios por aqueles lados fechados. Escrevo isto para reforçar que não me sinto culpado.

22 julho 2015

Longe demais?

Quando a designado Estado Islâmico (EI) divulgou o vídeo da bárbara execução de James Foley, criando uma enorme onda de repulsa e de condenação, forçando os EUA e o Ocidente a serem mais ativos contra essa organização, muitos consideraram essa ação como um erro. De fato, se eles tivessem continuado com o seu trabalho sujo matando apenas azeris, curdos, xiitas e quem mais entendessem daqueles lados, o nosso mundo não assistiria com tanta atenção e as opiniões públicas não pressionariam da mesma forma, por muitos milhares que fossem mortos (e que foram).

Para os poderes regionais sunitas, a queda de Al Assad, aliado do Irão, é um “must”. Daí não olharem com muita atenção para as barbaridades do EI e de outros afins. Sem entrar no campo do apoio mais ou menos direto, que é atribuído aos países do golfo, a Turquia parecia fazer vista grossa a muita coisa. Quanto mais não seja, o contrabando de petróleo cujas receitas alimentam o EI, passa certamente por lá e não parece ser tarefa demasiado complicada controlá-lo.

O atentado desta semana em Suruc, na Turquia, matando 32 pessoas, pode ter sido um outro passo a mais, errado, do EI. Isto porque a opinião pública turca reage, naturalmente, e exige do seu governo uma atitude mais firme e mais eficaz de controlo da dita fronteira…. Esperamos que resulte nalguma mudança efetiva.

Não gosto muito de evocar aquela imagem do “não morder na mão que dá a comida”, mas pode ser que depois disto todos entendam: há certos animais que nunca se devem alimentar…


Foto: The Telegraph