07 agosto 2021

A maldição da bazuca?


Fala-se em “maldição do petróleo” para descrever situações concretas de países que, supostamente abençoados por largos e fastos recursos naturais, acabam por comprometer o seu desenvolvimento a prazo e a criação de riqueza e conhecimento de forma sustentada, soçobrando no fácil vem/fácil vai (a ausência de dificuldades não aguça o engenho) e com todo um rol de más práticas e de irresponsabilidade, eventualmente criminais, na gestão da riqueza que chega sem esforço.

Felizmente Portugal não tem recursos naturais próprios, mas talvez desde a pimenta da India e do ouro do Brasil que criamos um pouco o hábito de gastar sem ter que nos esforçar muito em criar. A questão neste momento não é, no entanto, atirar as culpas a D. João II. A questão é que a famosa bazuca europeia, que se já pode começar a ir buscar ao banco, mesmo sem kalachnikov, é mais um dinheiro fácil que corre sérios riscos de partir de forma fácil.

Independentemente de alguma utilização racional, séria e geradora de riqueza sustentável, quase apetece dizer… deixemo-nos de viver de donativos e passemos a fazer pela vida com as nossas próprias mãos e cabeça. O histórico da procurada e falhada convergência europeia sugere que a receita não funcionou como se esperava. Fazer o mesmo, esperando resultado diferente, não é inteligente.

06 agosto 2021

Talibans e o resto


 Em 2001, os EUA entraram no Afeganistão para controlar o país que albergava os terroristas do 11/9. Hoje, 20 anos depois, deitam a toalha ao chão e retiram. Os ditos talibans, que já antes tinham dado água pelas longas barbas à URSS, avançam rapidamente, retomando o controlo de grandes partes do país, deixando em maus lençóis todos os que de uma forma ou de outra colaboram com os EUA e acreditaram numa sociedade mais aberta. Muito especial e dramaticamente as mulheres.

Por muito profundas que sejam as raízes tribais desse movimento, a sua eficácia e subsistência não depende apenas dos calhaus da montanha. Ao que parece é/foi o Paquistão, ali ao lado, que de uma forma mais ou menos assumida lhes serviu de apoio. Um bocadinho acima do mesmo lado, está a zona problemática da China, dos uigures, onde existem movimentos terroristas, ETIM e outros, que parecem gozar de algumas facilidades no Paquistão e nas zonas controladas pelos Talibans.

A China tem interesse no Paquistão, o corredor até ao Índico da sua BRI atravessa todo o país. Os terroristas uigures atacam aqui interesses chineses e estes puxam as orelhas aos paquistaneses.

Um destes dias uma comitiva taliban foi recebida oficialmente em Tianjin (foto) e um dos objetivos, teoricamente alcançado, foi de obter um compromisso da parte dos novos futuros líderes afegãos em como deixariam de apoiar os separatistas uigures. Quem conhece o terreno, o histórico e as culturas tem dúvidas de que a prática corresponda.

Entretanto, há gente no Afeganistão a voltar às trevas.

Sem querer particularizar excessivamente nos atores concretos desta realpolitik, é uma vergonha para a humanidade assistirmos a estes retrocessos brutais nos direitos humanos, caucionados por países e regimes representados nas instituições internacionais e supostamente comprometidos com os princípios básicos de respeito por esses direitos humanos. Seria mais útil e mais interessante que a opinião pública se interessasse por isto e deixasse o Vasco da Gama em paz.

17 julho 2021

Mau ambiente


Escassas semanas após o atropelamento mortal de um trabalhador numa autoestrada pela viatura de um ministro, em circunstâncias ainda objeto de inquérito (que demora a ver se esquece?), mas onde a velocidade parece ter sido tudo menos razoável…

Escassas semanas depois, outro ministro é apanhado a circular alegremente a 160 km/h em estrada nacional e a 200 km/h em autoestrada.

Inquirido sobre o fato, o ministro afirma não ter “qualquer memória de os factos relatados terem sucedido”. É preciso ter muita insensibilidade/amnésia para não se aperceber/recordar de circular a 160 km/h numa estrada nacional. E, se isso aconteceu, não lhe ocorreu ir inquirir o motorista? Não lhe ocorreu esclarecer se havia motivos válidos para a pressa? Não lhe ocorreu que em termos de impacto ambiental, o seu pelouro, não é bom exemplo?  Apenas lhe ocorreu dizer que vai “estar mais atento”. Nós continuamos calmos e serenos e eles continuam a queixarem-se do crescimento dos populismos.

14 julho 2021

A Cresap, escolher ou não escolher


No que seria digno da mais bananeira das repúblicas, leio que numa enorme maioria dos processos de seleção para cargos superiores na função pública é escolhido o previamente escolhido, que ocupava já o lugar provisoriamente, em regime de substituição, sem concurso, sendo que a experiência acumulada nesse período é determinante para ficar em primeiro lugar na avaliação. A sério, não há um mínimo de vergonha nem de decência?

Tenho uma sugestão. Porque não impedir a candidatura a quem ocupou o cargo interinamente, por nomeação, sem escrutínio nem avaliação aberta? Parece-me uma eficaz forma de cortar o mal pela raiz. Haja vontade! Há vontade? O crescimento dos populismos é um problema?

13 julho 2021

Florentino Ariza


Quis o azar ou a sorte que um destes dias me tenha passado à frente dos olhos uma versão cinematográfica do “Amor nos tempos de cólera” do imortal Garcia Marquez, um dos destaques da minha biblioteca, um daqueles autores que cabe nos dedos de uma mão do topo das minhas preferências.

O filme, entendo que bem feito e agradável de ver, não transmite a intensidade, a exuberância e o génio narrativo de Gabo, mas isso seria provavelmente missão impossível. O enredo está lá e no final reencontramos algo de único e de todos na figura de Florentino Ariza, que espera determinado mais de 50 anos para atingir o seu sonho, neste caso o amor de Fermina.

Acho que um bom livro se pode ler de trás para a frente e também, por vezes, para o lado. E esta determinação em atingir algo, custe o que custar, demore o que tive que demorar é um desígnio que pode não ser exclusivo do amor. Recordo-me, por exemplo, do Quixotesco “sonhar o sonho impossível” de Jacques Brel, não desconsiderando obviamente o original cavaleiro da triste figura.

Será patético e absurdo passar a vida na esperança de um improvável que apenas parece viável ao próprio? Será um desperdício? Talvez sim, talvez não. A ânsia e a busca da beleza, da verdade, da perfeição são uma excelente melodia para o despertador matinal.

Se para a persistência resultar e se atingir o supremo desígnio, é necessário declarar uma situação de cólera e colocar um pequeno mundo em quarentena é outra questão. Há doenças e doenças.

11 julho 2021

Que grande surpresa, quem diria!?


O futebol profissional, tendo como base uma modalidade desportiva, é hoje um espetáculo que faz mover muitos milhões de fundos de forma pouco transparente, para lá do deprimente nível dos debates que proporciona. Para quem estiver minimamente atento, não faltam indícios de falta de higiene no meio, em diversas latitudes e várias cores de camisola.

Dificilmente os problemas de Luis Filipe Vieira com a justiça podem ser uma grande surpresa, atendendo ao meio em geral e ao personagem em particular. Até um marciano com escassas semanas de permanência no planeta não se espantaria. Infelizmente a tentação de aparecer na tribuna deste circo, qual imperador romano, parece levar o discernimento de alguns políticos abaixo do de um marciano recém-chegado.

Algo de novo neste processo é confirmar-se que o Novo Banco não foi assim tão novo de espírito, herdando muitos defeitos do seu progenitor, para mal da nossa saúde económica.

Para quem sabe quando a vida custa, estes milhões tresmalhados escandalizam e revoltam. Não se sai daqui com um “bola para a frente”, será necessário antes um “bola fora”. Fiscalizem eficazmente as origens e os circuitos desses milhões e depois talvez volte a haver desporto.

08 julho 2021

Essa coisa da transição energética e da energia limpa


A chamada transição energética está eleita como um grande desígnio estratégico para a sustentabilidade do planeta, entrou em inúmeras agendas e ganhou foro de título de ministério. De forma indiscutível, do lado errado da imagem está a produção de energia elétrica a partir de combustíveis fosseis, geradores de CO2, não renováveis e do lado correto estão as energias renováveis: hídricas, eólicas, solares e algo mais…

Na transposição deste contexto para Portugal, produzimos cerca de 2/3 do lado bom e 1/3 do lado mau. Será necessário reduzir de 1/3 o consumo total ou aumentar em 50% o lado bom.

Para a Europa, há uma diferença importante. Em grandes números, o lado bom é 1/3; o lado mau outro 1/3 e o 1/3 que falta … é a energia nuclear. Sendo certo que o nuclear não produz CO2, não é certamente renovável e é preciso bastante boa vontade para a considerar uma energia limpa. Haverá um cenário em que o nuclear é bom, equivalente ao português 2/3 bom – 1/3 mau e outro em que o nuclear é mau e deve sair. Neste caso a Europa está a muitas milhas (KWh) de fazer uma transição energética para energias limpas, mesmo limpas.

Curiosamente não vejo claramente assumido qual o cenário oficial em vigor, mas se pensarmos que, por exemplo, em França, o nuclear representa 70% da produção de eletricidade, está bom de ver de que lado ele vai cair…

Entretanto, conta-se ao pessoal que para salvar os ursos polares, basta comprar um SUV de potencia, peso e consumo acima do “necessário para as necessidades”, independentemente da fonte de energia que o faz mover e da forma como é utilizado. Obviamente que a sustentabilidade do planeta passa por outra atitude. 

06 julho 2021

Entre peão, cavalo e rei


Os problemas que Joe Berardo está a encontrar com a justiça, fazem suspirar um “mais vale tarde do que nunca”. Poucos terão simpatia pelo senhor, especialmente depois da arrogância que ele demonstrou.

Ele está a ser questionado, se bem entendo, pelas formas “ardilosas” com que se esquivou a responder pelos empréstimos recebidos. Aqui estará a questão penal. No entanto, esta história, desde a sua génese, é uma crónica de uns calotes anunciados, dentro de um jogo de xadrez onde ele não foi simples peão, também não foi o rei, eventualmente cavalo.

Não vale a pena reenumerar a falta de razoabilidade económica e o risco inaceitável destes empréstimos da CGD, feitos a ele e a outros cavalos, para controlo do BCP. Um empréstimo normal assenta em garantias sólidas e tem subjacente uma rentabilidade que permita o reembolso com juros. É absurdo imaginar as ações do BCP na altura a cumprirem as duas condições.

O que é certo é que este jogo de xadrez custou milhares de milhões de euros ao contribuinte, estupidamente assim queimados, em vez de terem contribuído para financiar criação de riqueza.

Este jogo de xadrez teve um rei, José Sócrates, que não resistiu politicamente ao descalabro; penalmente ainda estamos para ver. De resto, os seus bispos e torres ainda por cá andam em funções e sobre estes desmandos e desastres nada fizeram, nada viram.

Se hoje já podemos ir ao banco, seria bom que o resultado fosse diferente.

04 julho 2021

Diferenças culturais


Em março de 2017 esta imagem corria mundo, onde um deputado inglês tenta com as suas próprias mãos salvar a vida de um polícia apunhalado num atentado, num cenário não isento de perigo. Toda a gente achou muito bem.

Em junho de 2021, noutro país, noutra cultura, um ministro está envolvido num acidente mortal, com eventual responsabilidade indireta mesma, caso a velocidade tenha sido determinante e tenha sido ele a solicitá-la. Esconde-se, pede ao staff para enviar as suas condolências à família e atira a culpa para a vítima. Duas semanas depois recusa-se a precisar a velocidade a que circulava. Toda a gente achou mal?... Alto! Antes demais depende da coincidência da cor política do senhor com a de quem avalia. 

Diferenças culturais, que naturalmente se refletem noutras diferenças de desenvolvimento

02 julho 2021

Uma certa (falta de) cultura


A forma como quem nos governa está a tratar a questão do atropelamento mortal de um trabalhador na A6 pelo veículo onde seguia o ministro da Administração Interna é sintomático da falta de cultura de responsabilização que por aqui grassa.

Trata-se de uma viatura do Estado e em deslocação oficial. O mais elementar respeito pelos cidadãos em geral e pela vítima em particular obrigaria a uma imediata e completa clarificação. A que velocidade circulava, porquê eventualmente acima dos limites legais, havia ou não sinalização. Nunca deveríamos estar ainda hoje a especular sobre o que se passou, a partir de uma primeira reação telegráfica e desresponsabilizadora de que não havia sinalização de trabalhos e a culpa seria do trabalhador que se colocou à frente do carro.

Não é coisa rara ver passar uns veículos importantes, de pirilampo excitado. Os senhores VIP não conseguem organizar as suas agendas e deslocarem-se dentro dos limites legais e de segurança, como um normal cidadão é obrigado a fazer?  Precisam de circular como se fossem socorrer uma vítima urgente … ou provocá-la?

E enquanto acharmos que a avaliação de uma situação destas entra dentro de uma lógica tribal, dependendo da cor do ministro e não de Responsabilidade Cívica e Política… continuaremos subdesenvolvidos e eles continuarão a rir, independentemente da cor em causa.

24 junho 2021

O camarada Vasco


Com o centenário do nascimento de Vasco Gonçalves, vejo algo surpreso o branquear da cor do Primeiro-Ministro do Verão quente, colocando em evidência os avanços sociais ocorridos nesse período, tais como o estabelecimento do salário mínimo, dos subsídios de férias e desemprego e da licença de parto.

Sendo isso verdade, pode-se questionar se ocorreu graças a ele em particular ou se teria acontecido dentro da dinâmica da época, independentemente do PM em funções. Pode-se também olhar para outras coisas que se passaram nessa altura, como as suas posições quanto à não liberdade sindical a as pressões sobre a comunicação social desalinhada.

Um bom exemplo, foi o jornal República fundado em 1911 por um distinto republicano, António José de Almeida. Foi oposição e sobreviveu ao Estado Novo, mas soçobrou naquele Verão quente de 1975. Não vou desenvolver aqui os detalhes do que se passou, eles estão facilmente acessíveis a quem quiser saber, apenas o significado.

O PCP, através dos seus ativistas, com a cobertura do governo Gonçalvista, calou um órgão de comunicação social incómodo. Não foi um ato isolado, a Renascença sofreu as mesmas pressões, o DN teve uma série de jornalistas saneados pelo futuro Nobel e muitos outros periódicos viram areia cair nas suas engrenagens.

O caso República levou à saída do PS do governo e teve repercussões internacionais, forçando mesmo outros PCs europeus a demarcarem-se do seu homólogo português. Tudo isto no tempo do camarada Vasco, que não era democrata, nem defendia os valores de Abril partilhados pela larga maioria do povo português.

10 junho 2021

Verdes são os campos


Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.

Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,

De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.

Gado que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis,

Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.

 

Para sempre grande Luiz Vaz, de quem pouco se sabe do acessório, mas que excelsas no fundamental.

09 junho 2021

Bolhas e pegadas


Ainda não sabemos ao certo todas as consequências da famosa final da “Champions” no Porto em termos diretos Covid e de imagem do país. Obviamente que se o objetivo era mesmo que os adeptos viessem em bolha, alguma proatividade teria sido necessária e não simplesmente esperar que eles se encapsulassem todos voluntariamente.

Para lá desta questão do âmbito da má gestão sanitária, vamos supor que era para ser e teria sido mesmo assim. 14000 espetadores, principalmente adeptos ingleses, em bolha, vindos para ver o jogo e a regressarem a casa no próprio dia. Nestes tempos em que, por razão ou religião, o ambiente é um tema quente, se mede a pegada de carbono de tudo e mais alguma coisa, quando até um tribunal nos Países Baixos condena a Shell a reduzir as suas emissões, qual o sentido de termos uns 100 aviões a virem da Inglaterra a Portugal para os passageiros simplesmente assistirem a uma partida de futebol e nada mais?

Obviamente que é um disparate completo. Quantos daqueles adeptos até defenderão a utilização de veículos elétricos, supostamente para proteção do ambiente, independentemente da origem da energia que lhes carrega as baterias? Um tema desta relevância deveria ser mais bom-senso, razão e coerência e menos radicalismo, religião e oportunismo.

Adicional em 13/06/2021 com a versão impressa (parcial).



06 junho 2021

Essa coisa da guerra


Num 6 de junho de há 77 anos atrás, as forças aliadas desembarcavam na Normandia, um pouco mais de 4 anos após a evacuação dramática de Dunquerque e 2 anos após a tentativa falhada de Dieppe. Desta vez foi a boa e apesar do muito sangue e tripas que se seguiram, marcou irreversivelmente a evolução da guerra na Europa Ocidental.

Vimos este dia mais longo em inúmeros olhares Hollywoodescos. Ainda em 1988 alguém como Spielberg narrava a odisseia de salvar o soldado Ryan, último de uma fraternidade ainda em vida. Quase 80 anos é, felizmente, muito tempo e cada vez mais a visão e a memória que fica é a dos dramas e das ações heroicas… encenadas.

Passar nos locais, em corpo ou em espírito, é um exercício necessário. Se pensarmos que esta chacina, com a particularidade de ter sido especialmente violenta contra as populações civis, muito pela novidade do papel da aviação, ocorreu 20 apenas após a chacina anterior, 80 anos já é bastante bom tempo. O suficiente para nos convencermos que não será possível voltarmos a viver tempos assim (a Ucrânia não fica assim tão longe), pelo menos de forma tão generalizada.

Os cemitérios militares são um local onde devemos passar e parar. Não são coisa de filmes. Onde devemos homenagear a memória de vítimas, algumas que nem se sabe quem foram, mas que foram.

Imagem do cemitério militar americano de Omaha Beach.

03 junho 2021

Do paternalismo ao autoritarismo


A definição de Direitos Humanos abarca questões fundamentais pouco sujeitas a revisões ou atualizações de contexto. Novos contextos podem obrigar a novas regulamentações, apenas. Daí que a recentemente publicada famosa “Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital”, me pareça logo excessiva em termos de título.

Quanto ao conteúdo há algumas curiosidades. Uma é o tom paternalista como o Estado promete tratar de tudo e proteger os cidadãos “vulneráveis”. Nesse sentido vem o famoso artigo 6 –“Direito à proteção conta a desinformação”, definindo-se esta como “toda a narrativa comprovadamente falsa ou enganadora criada […] para enganar deliberadamente o público, e que seja suscetível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, […]”. Os “spins doctors” tanto do agrado dos políticos, chamados para criar e gerir narrativas simpáticas, evitando que o público se aperceba da verdadeira dimensão dos erros cometidos, estão tramados. Se isso não é uma ameaça aos processos políticos democráticos…

Há apenas duas dimensões limitadoras da liberdade de expressão e não específicas da chamada era digital. Uma é a penal, para a qual existem leis e tribunais; outra, especialmente importante para quem tem responsabilidades públicas, é a ética – é feio mentir, mesmo não sendo crime.

O Estado vigiar a desinformação e apoiar a criação de estruturas de verificação de fatos, será talvez uma forma de controlar o estrume, sendo este o resultado de um processo de decomposição e um excelente fertilizante, fazendo medrar verdades a partir de podridões.

A fronteira entre o paternalismo e o autoritarismo pode ser atravessada com muito facilidade e o nome correspondente é muito feio.