31 dezembro 2007

2008 - Ligue-se!


É tradição desejar um Bom Ano Novo. Um pouco naquela linha do "oxalá corra bem".
Acho isso passivo demais. Em vez de desejar, prefiro pedir:
Que cada qual e todos ajam de forma a que o 2008 possa ser um excelente ano!
Vamos lá ligar os interruptores que estão aí à mão para trazer luz e energia ao mundo!

29 dezembro 2007

Folhetim BCP – Histórias Laterais

Os últimos episódios do folhetim BCP proporcionam umas boas reflexões paralelas.
O CV de Santos Ferreira é o de um gestor claradamente “político” e não parece à medida de um BCP. Se os accionistas privados do banco o aceitam com tanta unanimidade será por desespero e necessidade absoluta de credibilidade ou pelos méritos intrínsecos do mesmo?
Se a nomeação de Armando Vara para a CGD já pareceu um pouquito forçada, como se entende agora o seu lugar no BCP? Será mesmo pelo mérito? Afinal os critérios das nomeações para as administrações das empresas públicas não são fundamentalmente partidários?? Que grande confusão!!!

O que vale e ajudou a esclarecer foi Filipe Menezes ter vindo ingenuamente dizer alto aquilo que é habitual ser dito baixinho. Exigir que para a Caixa entrasse alguém do PSD. E a resposta pública à verdade subterrânea foi tesa, estava mesmo a ver-se! Quem o mandou ser inocente?

A seguir, tivemos ainda direito ao regresso do famoso “cromo” Rui Gomes da Silva. Para começar, a anedota: Ao zurzir em Silva Pereira teve a inspiração brilhante de invocar que ele era “tão afoito a recolher dinheiro para que o senhor primeiro-ministro possa passar férias no estrangeiro que blá, blá, blá...” Um verdadeiro diamante de retórica à espera de ser talhado para ser entendido!

Menos anedótico e mais grave é invocar uma “tradição nacional” segundo a qual a presidência da CGD ou do Banco de Portugal deveria ser do PS com o PSD no governo e vice-versa. Não entendi completamente o mecanismo mas percebi claramente uma coisa: quem não for “próximo” do PS ou do PSD nunca pode ser presidente da Caixa nem do BdP nem de muitas outras coisas. Obrigado Dr Filipe Menezes por ter ajudado a tornar pública e clarificada esta bela tradição.

25 dezembro 2007

Postal de Natal

Olha, olha, e se fosse verdade ? Se ele tivesse nascido realmente em Belém, num estábulo. Olha, e se fosse verdade? Se os reis magos tivessem realmente vindo de longe, de muito longe, para lhe trazer o ouro, a mirra e o incenso?



Olha, e se fosse verdade? Se fosse verdade tudo o que escreveu Lucas, Mateus e os outros dois? Olha, e se fosse verdade? Se fosse verdade a história das bodas de Canã e a história de Lázaro?


Olha, e se fosse verdade? E se fosse verdade o que eles contam às crianças à noite antes de dormirem, quando eles dizem Pai Nosso, quando eles dizem Nossa Senhora? Se fosse verdade tudo isso? Eu diria sim, seguramente eu diria sim, porque é tão belo tudo isso quando se acredita que é verdadeiro.

Jacques Brel, “Dites, si c’était vrai” em tradução livre. Transpira das palavras que ele próprio não sabe se acredita, um certo distanciamento racional, mas rendendo-se à beleza da história, mesmo em ficção. Dá vontade de dizer: é pena os desvios da instituição que a herdou, a opulência, a arrogância e as outras coisas más que a mancharam ao longo dos séculos. Porque, realmente, é uma bela história!

23 dezembro 2007

História de Natal, ricos e pobres

Há cerca de 25 anos atrás, no âmbito de uma actividade de “militância cultural de raiz tradicional” (grande expressão esta, não é?), organizávamos uma grande festa de Natal. Poucos do grupo eram frequentadores de missas e nenhum de sacristias, mas achávamos que valia pena celebrar o Natal colectivamente para as crianças da freguesia. Uma particularidade assinalável era o evento ter orçamento zero:
  • As escolas primárias da freguesia eram convidadas para seleccionar um ou dois dos números das suas festinhas para a festa grande;
  • Três do grupo com jeito ensaiavam um número de palhaços na cave da casa dos meus pais;
  • Outro com jeito fazia umas imitações (O "Estebes" que quando não sabia o que dizer, se atirava com a cadeira para o chão...);
  • Alguém com jeito tocava viola e cantava umas cantigas;
  • Outro com jeito desenhava e pintava o cenário;
  • O homem a quem alugávamos a aparelhagem de som para os espectáculos grandes, dava um jeito e colocava gratuitamente à nossa disposição, naquela dia, uns micros, uma mesa e uma colunas;
  • O estaleiro da Cerci e do Piaget emprestava-nos um pavilhão por acabar mais as tábuas, cavaletes e tijolos que serviam para construirmos o palco e os banquinhos;
  • Para a prenda aos participantes um merceeiro oferecia uns quilos de rebuçados. Outra mercearia oferecia uns balões de encher e emprestava a máquina de fechar sacos. Num fim de semana anterior eram cheios saquinhos plásticos transparentes com uma meia dúzia de rebuçados e três balões.
  • Depois de uma noite sem dormir nos preparativos, porque a compatibilização da nossa festa com missas e cataqueses (assunto sensível) a tinha atirado para um sábado de manhã, lá começavam a convergir para o local os “rebanhos” de participantes/assistentes, previamente agrupados nas suas escolas primárias. Uma grande percentagem participava activamente e, se não eram eles próprios que subiam ao palco, eram os seus colegas. A festa decorria com uma dinâmica e um entusiasmo impressionantes. Era um sucesso!

    No final, depois de distribuirmos os pobres saquinhos por uma mole de miúdos eufóricos, comentávamos entre nós que seguramente seria muito melhor se houvesse algum apoio financeiro...
    Uns anos mais tarde fui com os meus filhos a uma festa de Natal organizado e patrocinada pela Junta de Freguesia “como deve ser”. Contrataram um pequeno circo que apresentou um espectáculo honesto. Ficámos sentados a assistir passivamente do princípio ao fim. No final os meus filhos receberam uma prenda bastante melhor do que o famoso saquinho plástico. Tudo “como deve ser”, mas com a certeza de que os que tinham assistido/participado na festa de orçamento zero a acharam seguramente muito mais rica.

    20 dezembro 2007

    1914 – 2007

    O que é cumprir a vida?

    Numa perspectiva interior?
    • Ter vivido com dignidade e proporcionando dignidade aos próximos;
    • Ter feito todo o possível para, à saída, deixar o mundo melhor do que estava quando chegamos.

    Ou, numa perspectiva externa, complementar da anterior e mais exigente:

    • Que os outros que ficam, nos identifiquem, reconheçam e que consigámos continuar a dar algum contributo para esse mundo melhor, mesmo depois de...

    15 dezembro 2007

    A leste das vespas e suas picadas (II)

    Continua de

    Naquele dia tudo se conjugava para ser um dia bravo, cheio de vespas assanhadas. Afonso, Cláudio e Xavier olhavam esse caminho em silêncio. Logicamente foi Xavier o primeiro a partir. Era por ali que devia ir e tinha que ser. Afonso questionou-o sobre as razões dessa necessidade mas Xavier não respondeu. Ou não quis dizer ou, às tantas, era só mesmo o desafio de querer querer o que é difícil fazer. Partiu.

    Afonso teve um ataque de nostalgia do perdido. Recordou-se de todo o caminho inócuo que tinha feito na vida e no que com isso tinha ignorado. Nunca ter sido picado era uma prova de pobreza. De repente odiou-se e insultou-se revoltado. Em vez de, mais uma vez, partir contornando o perigo, fechou o rosto e partiu directamente no caminho do vespeiro. Cláudio lamentou-se e foi atrás. Ia ser mau mas tinha que ser. Era a sina dele.

    E foi mau, foi mesmo mau.

    Cláudio regressou em primeiro lugar e jurou que nunca mais se meteria em tais andanças. Sabia de sobra sobre o assunto para poder avançar daí para a frente evitando todo o risco de vespeiros. Passou a chamar-se António.

    Afonso regressou transfigurado. Revoltado, zangado e fascinado pela dor. Nunca mais se afastou do vespeiro. A sua pele virgem rapidamente passou a martirizada. Ele cada vez gostava menos de si e passou a chamar-se Cristiano.

    E Xavier não voltou, nunca mais foi visto. Para António Cláudio era absolutamente indiferente. Cristiano Afonso dizia, triste por si próprio, tê-lo ouvido dizer que seguia, que seguia. Que seguiria para onde teria que ir e que esse lugar estava a leste daquilo tudo. A leste dos Afonsos, Cláudios e das suas metamorfoses e m......

    13 dezembro 2007

    A leste das vespas e suas picadas (I)

    Afonso tinha-se por sábio e bem informado. Conseguia prever com grande segurança onde estavam os riscos e contorná-los. Ao longo de todo o seu caminho nunca uma vespa o tinha apoquentado. Comprazia-se em ver a sua pele virgem de picadas, prova da sua clarividência. É certo que muitos desvios tinha feito no seu rumo, mas a satisfação de se saber sem sofrimento desnecessário, justificava bem esse pequeno esforço adicional.

    Cláudio não tinha rumo nem prudência. Limitava-se a divagar e a parar onde calhasse. Evidentemente que se passavam mais coisas nos sítios com vespas do que nos outros. E tornou-se um visitante regular. As marcas das picadas que o pejavam eram a sua certidão de alguma coisa vivida. As assinaturas das vespas atestavam a sua carga de sofrimento e alimentavam a sua autocomiseração. Cláudio tinha motivos claros para ser infeliz e isso dava-lhe consistência. Pouco faltava para agradecer inconscientemente às vespas pelos sofrimentos que, nalguma coisa, o realizavam.

    Xavier tinha-se por determinado e decido. Conseguia planear bem o seu caminho e realizá-lo. Desvios medrosos não faziam parte do seu dicionário. Evidentemente que algumas vespas já o tinham mordido. Comprazia-se em pensar que nem mesmo as vespas o demoviam. As cicatrizes que carregava com orgulho eram prova e tributo da sua robustez. Muitas delas tinha doído a bom doer, mas a satisfação de saber que o seu caminho tinha sido mantido superava de longe o sofrimento.

    Continua para

    10 dezembro 2007

    A segunda descolonização ?

    N. Sarkosy visitou recentemente a Argélia e o tema quente nos meios de comunicação social locais foi uma espécie de exigência: a França deveria apresentar um pedido de desculpas pelo seu passado colonial e pelos crimes cometidos nesse período. O presidende Francês ousou considerar publicamente o processo colonial injusto mas não apresentou desculpas. Em seguida, Khadafi diz em Lisboa que os colonizadores devem pagar pelo mal que fizeram. (Já não bastavam os pedidos de pedido de desculpa pela escravatura...)

    Poder-se-ia procurar fazer um balanço do que a colonização trouxe de positivo e de negativo e da evolução pós-independência, mas acho que não é esse o objectivo. Uma boa parte dos actuais líderes africanos afirmou-se na luta contra os colonizadores. Aliás, muitos deles empoleiraram-se nessa altura e ainda não desceram. Hoje o que se constata, passados 30 ou 40 anos, é a falência do seu projecto e a sua incapacidade para tornarem os seus países minimamente justos e equilibrados. A maioria das belas promessas associadas à autodeterminação estão por cumprir e não se vê jeito de para lá caminhar.

    Por curiosa coincidência, o disparar do preço do petróleo e de outros recursos naturais que abundam em África, tornou financeiramente ricos muitos desses países e esses já não podem argumentar que é a pobreza material que trava o desenvolvimento. Qual a resposta? Recuperar o capital histórico da campanha da autodeterminação e voltar a facturar aos colonizadores a origem de todos os males. Se quando a história se repete da segunda vez é uma farsa, este será seguramente um desses casos.

    As novas gerações esclarecidas nesses países estão muito menos preocupadas com as desculpas do que se passou antes de eles terem nascido do que em exigir aos seus governantes que transformem os seus países em lugares bons para viver, o que é mais difícil do que ficar parado no tempo a olhar para trás e a solicitar pedidos de desculpa.

    07 dezembro 2007

    Reflexões monoteístas

    Após um pouco de leitura e análise, deu-me vontade de alinhar umas notas sobre o processo de expansão das três principais religiões monoteístas:

    Os judeus: Não existe registo de alguma vez terem pegado em armas para converter “infiéis” à sua fé. Apesar de a sua história política não ter mais de 60 anos e da forte carga confessional que presidiu à criação do estado de Israel, este não pode ser considerado uma teocracia em que o líder político se confunde com o líder espiritual e em que o direito civil deriva do religioso. Os territórios ocupados em 67, foram-no numa perspectiva militar e não de expansão religiosa.

    Os cristãos: Nascem e afirmam-se sem nenhuma atracção ou proximidade com o poder temporal. Numa primeira fase são as ideias e os princípios que convertem. Uns séculos mais tarde o poder político abraça a instituição religiosa e temos as cruzadas e a evangelização forçada. Hoje praticamente todo o mundo de raiz “cristã” conseguiu separar o político e o jurídico do religioso.

    Os muçulmanos: Quando visitei o museu do Palácio de Topkape em Istambul fiquei surpreendido com a exibição das armas de Maomé e dos seus companheiros. Agora confirmei que mesmo a expansão inicial pela Península Arábica foi feita com a força e com a conquista simultânea do poder. Desde a primeira hora, desde o próprio Maomé, que os líderes religiosos acumulam essa liderança com a militar e a política. As sucessões foram frequentemente violentas e as cisões geradas por disputa de poder e não por divergências conceptuais ou de interpretação dos princípios da religião.

    03 dezembro 2007

    Casa onde não há pão

    Diz-se que é difícil gerir uma casa onde não há pão porque todos berram e ninguém tem razão. Eu não estou de acordo. Acho que é muito mais difícil gerir bem e com rigor uma casa onde nada falta.

    Falta de pão é sinónimo de sobrevivência ameaçada. E, existindo um mínimo de nível cultural e de coesão, esse ameaça obriga a cerrar fileiras e a concentrar naquilo que é verdadeiramente relevante e essencial. É mais fácil alinhar e mobilizar uma organização que tenha fundamentos sãos nessa situação do que quando todos têm o pão de hoje e dos próximos meses garantido. É mais fácil fazer emergir e confirmar uma liderança forte nessas circunstâncias porque não há alternativas sustentáveis à meritocracia.

    Uma organização rica tem indivíduos preocupados com a sua sobrevivência dentro da organização que está estável e segura. A organização é secundária face ao seu interesse pessoal. Numa organização frágil, ninguém se pode permitir essa luxo. A comunidade rejeitará um comportamento egoísta e individualista.

    Em ambiente de abundância a liderança pode ser definida por decreto e consegue sobreviver deficiente sem ser submetida realmente à prova. Obviamente que a prazo, a abundância transforma-se em escassez porque a consequência de não criar é empobrecer.

    É por isto que muitas empresas familiares não resistem à terceira geração. É por isso que num país é mais fácil implementar medidas de fundo em situação de crise aguda globalmente reconhecida. Churchill conseguiu ser um líder forte durante a guerra e caiu logo a seguir em tempo de paz. E, já agora, podemos ainda acrescentar aquela coisa de que é “difícil a um rico entrar no reino dos céus”?

    Tem seguramente mérito conseguir uma boa liderança e fazer grande obra em situação de crise, mas acho que é muito mais difícil ter uma acção optimizada e eficaz em tempo de prosperidade.... E, assim, temos uma riqueza que mata ou, no limite, provoca uma evolução em ió-ió... Só quando as sirenes de alarme tocam é que o pessoal se mobiliza e trabalha a sério.