23 dezembro 2007

História de Natal, ricos e pobres

Há cerca de 25 anos atrás, no âmbito de uma actividade de “militância cultural de raiz tradicional” (grande expressão esta, não é?), organizávamos uma grande festa de Natal. Poucos do grupo eram frequentadores de missas e nenhum de sacristias, mas achávamos que valia pena celebrar o Natal colectivamente para as crianças da freguesia. Uma particularidade assinalável era o evento ter orçamento zero:
  • As escolas primárias da freguesia eram convidadas para seleccionar um ou dois dos números das suas festinhas para a festa grande;
  • Três do grupo com jeito ensaiavam um número de palhaços na cave da casa dos meus pais;
  • Outro com jeito fazia umas imitações (O "Estebes" que quando não sabia o que dizer, se atirava com a cadeira para o chão...);
  • Alguém com jeito tocava viola e cantava umas cantigas;
  • Outro com jeito desenhava e pintava o cenário;
  • O homem a quem alugávamos a aparelhagem de som para os espectáculos grandes, dava um jeito e colocava gratuitamente à nossa disposição, naquela dia, uns micros, uma mesa e uma colunas;
  • O estaleiro da Cerci e do Piaget emprestava-nos um pavilhão por acabar mais as tábuas, cavaletes e tijolos que serviam para construirmos o palco e os banquinhos;
  • Para a prenda aos participantes um merceeiro oferecia uns quilos de rebuçados. Outra mercearia oferecia uns balões de encher e emprestava a máquina de fechar sacos. Num fim de semana anterior eram cheios saquinhos plásticos transparentes com uma meia dúzia de rebuçados e três balões.
  • Depois de uma noite sem dormir nos preparativos, porque a compatibilização da nossa festa com missas e cataqueses (assunto sensível) a tinha atirado para um sábado de manhã, lá começavam a convergir para o local os “rebanhos” de participantes/assistentes, previamente agrupados nas suas escolas primárias. Uma grande percentagem participava activamente e, se não eram eles próprios que subiam ao palco, eram os seus colegas. A festa decorria com uma dinâmica e um entusiasmo impressionantes. Era um sucesso!

    No final, depois de distribuirmos os pobres saquinhos por uma mole de miúdos eufóricos, comentávamos entre nós que seguramente seria muito melhor se houvesse algum apoio financeiro...
    Uns anos mais tarde fui com os meus filhos a uma festa de Natal organizado e patrocinada pela Junta de Freguesia “como deve ser”. Contrataram um pequeno circo que apresentou um espectáculo honesto. Ficámos sentados a assistir passivamente do princípio ao fim. No final os meus filhos receberam uma prenda bastante melhor do que o famoso saquinho plástico. Tudo “como deve ser”, mas com a certeza de que os que tinham assistido/participado na festa de orçamento zero a acharam seguramente muito mais rica.

    2 comentários:

    david santos disse...

    Um feliz Natal e um bom Ano Novo.

    Cerejinha disse...

    Ai, o que se faz na vida com empenho e arte, o valor que tem!
    Sem dúvida muito mais do que a obrigação de o fazer...

    Boas Festas