14 setembro 2016

Entre a paz e o Islão

Quando em 622 Maomé e os seus companheiros fugiram de Meca para Medina, seguiu-se uma guerra aberta entre as duas cidades, liderado do lado de Medina por Maomé. Em 627 foi julgada e condenada uma família judaica de Medina, os Qurayza, por se ter recusado a participar na batalha de Kandaq ao lado dos muçulmanos. Os homens foram executados, as mulheres e crianças escravizadas. A afirmação recorrente de que a violência não tem nada a ver com o islão necessita, portanto, no mínimo, de alguma contextualização. No entanto, a tensão entre a (uma parte da) comunidade muçulmana e o resto do mundo não se limita aos casos de violência extrema.

O Islão é uma religião de um Deus único, omnisciente, omnipotente, criador do Céu e da Terra e senhor do juízo final. Inclui episódios como a expulsão do Paraíso de Adão e Eva, o diluvio e a arca de Noé, a destruição de Sodoma e Gomorra e a travessia do Mar Vermelho. Cita figuras como Abrão, Isaque, Jacó, José do Egito e Moisés. Parece familiar? Sim, a sua base é a mesma das outras duas religiões do livro. Até Cristo é referido no Corão, embora de forma superficial. O “Quem nunca pecou que atire a primeira pedra” não é citado.

Nos primeiros tempos de Meca, Maomé divide os homens em três grupos. Os muçulmanos que observam e cumprem os preceitos da religião, tendo no fim o Paraíso à sua espera; os ateus e pagãos que não escaparão ao Inferno e, finalmente, os cristãos e judeus. Para estes a mensagem é: vocês estão certos, estão no bom caminho, adorando o Deus de Abrão e Moisés; apenas vos falta reconhecerem-me a mim como o seu último profeta (atualizem-se…!).

Para muitos muçulmanos o cristianismo e o judaísmo não são religiões completas, de pleno direito, mas apenas versões deturpadas e imperfeitas da “única”. Daí o seu enorme esforço proselitista (se a palavra pode ser usada) nas comunidades judaico-cristãs e uma completa falta de sentido de reciprocidade. Protesta-se contra o facto de a Suíça proibir minaretes (nem são indispensáveis para a plena função de uma mesquita) ao mesmo tempo que se proíbe linearmente outras religiões no “outro lado” (ou são tão regulamentadas que a diferença prática é pequena).

Esta postura do direito à primazia e de muitos muçulmanos não se verem a partilhar um espaço e uma sociedade em equidade com outras crenças e descrenças, provoca tensões e frustrações, sendo as frustrações, em geral, muito más conselheiras. Enquanto houver pregadores muçulmanos a insistirem no objetivo hegemónico da sua religião, dificilmente haverá paz de espírito e a outra pode ser uma consequência.

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