21 setembro 2016

Zé Povinho? Não, obrigado!

Acho triste que o povo português se identifique e acarinhe tanto a figura do Zé Povinho. Obviamente, não está aqui em causa nenhuma crítica ao genial Rafael Bordalo Pinheiro, mas sim à aceitação da figura por ele criada.

Contava-me em tempos um transmontano que quando se mudou para a grande cidade, estes pensavam que ele, por ser pobre, era burro. Mas ele não era burro. Aliás, pobre já seria desgraça suficiente, donde que ser pobre e burro era desgraça a mais. “Pobre não pode ser burro”, dizia ele alto e bom som, para quem o quisesse ouvir.

O Zé Povinho é pobre, mal vestido, mas não é burro e isso induz em erro os doutores da cidade. É este o seu charme. Mas, se por um lado, é resmungão e até insolente, ao mesmo tempo é também manso e submisso. O Zé Povinho será desconcertante para a elite, a sua franqueza desmascara e desarma, é certo, mas permanecer passivamente resignado e ostensivamente desaprumado tem um mérito muito duvidoso.

Não seria expectável que o povo português se identificasse com um Fradique Mendes queirosiano, mas poderia ser uma figura um pouco mais consequente e não apenas num “ ’tás a enganar-me, pensas que não noto, mas vejo tudo; podes continuar enganar-me, eu rio-me, mando umas bojardas e assim ficamos”.

É para isto que queres a esperteza ò Zé? Assim, quem se fica mesmo a rir, e com boas razões para isso, são os trapaceiros aprumados.

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