19 julho 2005

Divórcios e protecção de menores


Há quem se prepare cuidadosamente para o casamento. É uma acção voluntária, deixada ao critério de cada um, e determinada pela importância da mudança de vida implicada. Os divórcios são cada vez mais frequentes, por razões que não cabe aqui analisar, e a mudança de vida brutal para os filhos menores, quando existem, mereceria, essa sim, uma preparação e um acompanhamento obrigatório.

Os acordos de regulamentação de poder paternal definem uns dias e uns euros. Nada mais. A forma como os progenitores separados gerirão a futura relação com os filhos fica ao critério e ao bom-senso de cada um. Não existe em lado nenhum uma definição do enquadramento desse relacionamento. Algo que diga que os ambos os progenitores deverão ter presente em todas as suas acções:

Que é o do interesse dos filhos, e direito deles, usufruírem de um contacto são e desdramatizado com ambos os pais; que os filhos não têm que optar entre a mãe e o pai, mas sim conciliar a sua convivência com ambos; que o cumprimento do acordado não deve incluir, para os filhos, o ónus de terem que escolher e decidir qual dos progenitores devem privilegiar; que se deverão abster de solicitar aos filhos solidariedade para consigo, pedindo que eles julguem, e condenem, o outro progenitor; que deverão aplicar o maior rigor e isenção ao referirem-lhes, quando absolutamente necessário, algum aspecto relacionado com a sua vida passada em comum e separação; que eventuais diferendos ou motivos de queixa pessoais deverão ser mantidos exclusivamente entre si e sem envolvimento dos filhos; que a estabilidade e a felicidade presente e futuras dos filhos devem ser colocadas acima de reflexos de rancor e de sentimentos de vingança; que, apesar dos pais estarem separados, continuam a existir regras básicas a cumprir e que ambos os pais têm sobre eles exercício de autoridade; que a ascendência do outro progenitor não deve ser espezinhada, nem a autoridade paternal diminuída; que aspectos fundamentais da vida dos filhos deverão ser discutidos em conjunto e não ser objecto de decisão unilateral; que ambos se divorciaram e que o seu casamento é assunto definitivamente do passado.
Tudo isto são pontos fundamentais para minimizar o impacto da separação dos pais nos filhos e, em maior ou menor escala, é muito frequente um ou ambos os progenitores não resistirem à tentação de envolverem os filhos no seu “ajuste de contas”. Não é necessário ter grande formação teórica para imaginar os efeitos provocados nos menores por uma perda de referências adicional, desnecessária e estúpida.

Não é possível deixar um assunto desta gravidade ao simples “bom-senso” e a um aconselhamento de ocasião, num momento em que, muito frequentemente, a estabilidade emocional não é a melhor e não ajuda a ver claramente os limites desse bom-senso.

O tribunal de família não se deveria limitar a verificar os “euros e os dias”. Deveria avaliar o potencial de risco de cada caso e, em função disso, “receitar” acompanhamento social para balizar o comportamento dos pais e proporcionar aos filhos uma referência isenta que lhes atenue as dúvidas do que é ou não “normal” na nova fase da sua vida.

Esse acompanhamento deveria ter um enquadramento legal e obrigatório e durar o tempo que fosse necessário enquanto os menores dele necessitassem. Merecer, merecem-no sempre.

6 comentários:

Titá disse...

Excelente!
Gostei muito deste espaço, parabéns. Vou voltar!

Anónimo disse...

Parece tão simples, não é?
Bastava apenas um bocadinho de maturidade, sensibilidade e bom senso. Mas não.

E, em defesa do superior interesse das crianças é quase inacreditável as atrocidades que se cometem com o aval de Tribunais e, especialmente, de Comissões de Protecção de Crianças.

Anónimo disse...

Acho que não fui suficientemente clara.

Quero eu dizer que lamento que pais responsáveis, adultos e que se dizem imbuidos de bom senso considerem pertinente que o Tribunal os substitua na sua função de pais. Se o que diz fosse verdade, não seria necessário que o Tribunal determinasse euros e dias. Seriam os pais a determiná-lo e a informar o Tribunal como mero procedimento legal e administrativo. O restante decorreria na normalidade, sem que as crianças fossem penalizadas pelas opções de vida dos pais.

Não me imagino, na minha infância, a ser obrigada por um Tribunal a passar toda a tarde de 4a feira com ele, ou a dormir em casa do pai quando me apetecia dormir na minha cama habitual, ou a não poder estar com o meu pai à segunda porque o Tribunal estabeleceu a 4a feira. Ou a passar noites e noites a jantar em Mac Donald's e Telepizzas porque não sei o quê o Tribunal e o raio... POUPEM AS CRIANÇAS!

Carlos Sampaio disse...

Talvez eu não tenha sido claro no texto.
Parto do princípio de que, por comum acordo ou por determinação do tribunal, os Euros e os dias são "facilmente" esclarecidos.

O "problema" é que há muitas outras coisas necessárias na protecção dos menores e que podem ser muito graves e traumatizantes e para as quais não existe mecanismo de acompanhamento.

Os euros e os dias não são tudo.

Anónimo disse...

Acrescento só mais uma coisa:

Se uma criança for educada em circunstâncias domésticas complicadas passará a manejar a mentira naturalidade e dirá, involuntariamente, sempre aquilo que corresponde ao seu próprio interesse. O sentido da verdade, a repugnância ante a mentira em si, ser-lhe-ão, mais tarde, completamente estranhos e inacessíveis, e, portanto, ela mentirá com toda a naturalidade.

EM NOME DOS SEUS FILHOS, faça um esforço para se entender com a mulher que um dia considerou como a mulher ideal para ser a mãe dos seus filhos. E não entregue os destinos dos SEUS filhos a tribunais e os juizes que são seres humanos como você e a sua mulher [e sabe lá a vida deles em casa!].

Carlos Sampaio disse...

Boa tarde

Penso que o contexto não foi compreendido mas também entendo que aqui não é o lugar para dar mais pormenores.