31 julho 2007

Coincidências


Há anos que se arrastava na Líbia o caso das enfermeiras búlgaras e do médico palestino acusados de terem infectado mais de 400 crianças por utilização de sangue contaminado com o vírus da Sida. O processo começou em 1999 e foram inicialmente condenados à morte em 2004. Tudo parecia uma brincadeira, mas uma brincadeira de mau gosto envolvendo vidas humanas. Um daquelas causas que chocam e mobilizam meio mundo.

Este mês elas foram repatriados pela Líbia para a Bulgária e libertadas, graças à conjugação de muitas influências, incluindo a intervenção pessoal da primeira dama francesa. Grande festa, muita gente ficou contente e, discretamente, também os líbios.

É que, logo a seguir, vem a notícia de que a Areva francesa está muito bem colocada para conseguir um contrato de construção de uma central nuclear e para explorar as reservas de urânio do país de Khadafi. A Líbia que ainda muito recentemente era um país amigo dos terroristas, que tem largas reservas de petróleo para uma população reduzida “precisa” de uma central nuclear!?

Enquanto o mundo inteiro tenta resolver o quebra cabeças dos desenvolvimentos nucleares no Irão e na Coreia do Norte, a França vai “oferecer o direito de ter” à Líbia, recém saída do “eixo do mal”. Oferecer, apenas o direito, claro, porque será naturalmente bem cobrada e um bom negócio para a Areva ou para quem a fornecer. Aquelas cinco enfermeiras e o seu processo fantoche valeram ouro!

29 julho 2007

Harry Potter and the Deathly Hallows – A aura continua?



Acabou a saga. Apetece perguntar quem pegará no testemunho e, daqui para a frente, poderá conseguir a proeza de pôr tantos adolescentes a ler assim. Será que o efeito Harry Potter vai deixar nos seus admiradores o gosto pela leitura de outras coisas ? E lerão apenas “mais do mesmo” ou evoluirão para outros estilos, para lá deste fantástico?

Será que alguém poderá repetir a façanha de, com apenas "meia dúzia de livros em menos de uma dúzia de anos", entrar na lista dos milinários da Forbes como a 891ª pessoa mais rica do mundo? O perfil desta milionária é único. Ninguém em tão pouco tempo terá conseguido ficar assim rico começando apenas a escrever livros.

Em tempos, curioso por um entusiasmo próximo, li o primeiro volume. Achei a história sem grande profundidade e com personagens muito superficiais. Seguramente que o apelo para os mais novos viria do universo paralelo, de regras diferentes e de coisas racionalmente impossíveis, mas que ali aconteciam, numa comunidade eleita, restrita e “acima do banal”. O apelo da fantasia e do fantástico.

Para completar a minha breve impressão sobre primeiro, pedi uma opinião sobre último a quem o leu de um fôlêgo nas 48 horas seguintes ao lançamento:

Em termos de escrita, não notei grande diferença da do livro anterior (não posso referir mais nenhum pois dos anteriores só li a versão portuguesa), mas isso mostra que a escritora já chegou a uma fase em que tem um estilo de escrita bem definido com pouco ou nada a melhorar e combina magnificamente com a história relatada que, essa sim, melhorou imenso desde o primeiro livro... Compreende-se que o público do primeiro seria um público mais jovem e os livros foram aumentando em complexidade de história à medida que os seus leitores foram crescendo, o que faz que este seja o culminar de tudo o que tem vindo a acontecer...
Simplesmente um último volume perfeito em que todos os pequenos elementos do puzzle que tinha vindo a aumentar, por fim encontraram o seu devido lugar, para criar a "imagem total" daquilo que é a história que temos vindo a apreciar, desde que o 1º volume foi traduzido para português.
É óbvio que nem toda a gente pensará o mesmo, mas, para mim, foi mesmo fantástico, sem dúvida o melhor livro da série, sem as partes de Hogwarts que nos anteriores tinham sempre mais do que era necessário, mas neste tem tudo o que é necessário para a história e nada mais que isso. Como o seu antecessor, este tem acontecimentos mais surpreendentes e tocantes, em grande parte devido às mortes que já vinha a prever que iriam acontecer, mas, mesmo sabendo isso, continuam a conseguir tocar os leitores que tinham vindo a adorar as personagens...
Em relação ao final, simplesmente magnífico, transmite a fabulosa sensação da história ter acabado e que por fim todas as personagens tiveram o seu merecido "final feliz".

Por Nisa Sampaio

27 julho 2007

E depois, não querem ser gozados!


Yves Leterme, indigitado para formar o próximo governo belga e quase certamente o futuro primeiro ministro, democrata cristão flamengo, teve um admirável desempenho no dia da festa nacional do seu país.

Para lá de achar aceitável atender o telemóvel durante o “Te Deum”, demonstrou desconhecer o que se celebrava no dia e, quando lhe foi provocadoramente perguntado se conhecia a versão francesa do hino nacional Belga, não hesitou e atacou: “Allons enfants de la patrie, le jour de gloire est arrivé" !!!

E não foi ironia, foi mesmo engano ! Argumentou que, como trabalhava muito, no bom estilo de formiguinha flamenga de cabeça baixa que só a consegue levantar quando escondida ou quando o adversário está de costas, não tinha tido tempo para aprender todas as versões do hino. Em flamengo sim, conhecia-o bem! Onde quer que esteja, J. Brel estará repetindo, “les larmes aux yeux: ik ben van Luxemburg”, envergonhado por tamanhos espécimes que gerou a sua Flandres.

Há mesmo países e países! Haverá alguém com um mínimo de responsabilidade em Portugal que desconheça o significado do 10 de Junho ou os primeiros versos da “Portuguesa”? Evidentemente que nem sequer coloco a questão de a confundirem com a “Marcha Real” Espanhola! E até acho que mesmo o Deco deve conhecer pelo menos o princípio do hino do seu novo país!

E depois acham que são perseguidos pelos fazedores de anedotas.
Foto extraída do site do "Le Monde"

24 julho 2007

Tartaristão

Já ouviram falar na república russa do Tartaristão? Eu, até há bem pouco tempo, nem sequer tinha a mínima ideia de que isso podia ser nome de terra. Ouvi-o numa curta conversa, mas não o consegui fixar na altura. É a terra donde vinham os olhos brilhantes, curiosos e muito jovens da Elsa. Só lá cheguei porque no último momento o referiu como país de origem dos “camiões do Dakar” e fui daí para trás até encontrar o nome. Animava temporariamente rebanhos de turistas na Turquia, a vários milhares quilómetros de casa. Experiência e desafio. Daquelas coisas de que se têm muitas dúvidas de como irá acabar.

E lembrei-me de há quase dois anos, algures no meio do Paraná, num jantar de recepção de um congresso, da Bianca. Tinha apenas 19 anos mas cantava como gente grande. Interpretou o “Como os nossos pais” da Elis Regina de forma verdadeiramente magistral. Terminado o jantar, ficaram todas as mesas vazias, excepto a minha em que sozinho tive direito a uma espécie de discos pedidos de Música Popular Brasileira. No final conversámos um pouco, quis saber de Portugal, se era fácil fazer carreira, tinha amigas que para lá tinham ido e não sabia mais nada delas...(?!) Tinha capacidade e ambição mas parecia asfixiada no Sul do Brasil, onde tentar ser artista não é bem visto. O país do samba não rima todo por igual.

Ignoro se a Bianca saiu do Paraná ou se a Elsa regressará ao Tartaristão. Isto de subir a um palco no grande palco do mundo não é fácil.

19 julho 2007

E mais pessoas

Primeira fase: triagem inicial.

- CV’s em anexo de emails .... que não trazem anexos;
- CV’s no corpo da mensagem várias vezes reencaminhada, deslocada várias vezes para a direita e com correspondentes barras verticais na margem esquerda;
- Erros ortográficos logo no assunto: “condidature” em vez de “candidature”; Professores que são “anseingnts” em vez de “enseignents”;
- CV’s deixados em sites, sendo enviado só o link de acesso... que não funciona;
- Anexados vários chamados “Novo Document MS Word”, “Novo Document MS Word(2)”, “Novo Document MS Word(3)” e “Novo Document MS Word(4)”;
- Formas diversificadas, muito livres e até, no limite, em duas linhas: "Tenho X anos, um curso Y, moro em Z e.... digam lá quanto estão a pagar”;
- CV’s em ficheiros com protecção de leitura e... claro que não adivinhei a senha.

e....mais tocante:

- Um CV onde o nome do ficheiro era “CVpapa.doc”

Depois a triagem. O primeiro processo dava cerca de 2 minutos por candidato. Para o pacote inicial de 1800, seriam necessárias 60 horas: incompatível. Novo processo que diminui para 30 segundos. Excluindo o tempo de abrir o ficheiro e no final o classificar, ficavam uns 15 a 20 segundos para olhar e:

- Deitar fora
- Deixar na segunda escolha
- Colocar na primeira linha

Selecção feita muito mais na base da experiência demonstrada do que no potencial que poderiam demonstrar. Ficou sério e deixou de ter “piada”.... E o “CV do papá” não ficou muito bem colocado...

17 julho 2007

E as pessoas

Uma vez, numa entrevista daquelas esquisitas, perguntaram-me qual o momento da minha carreira profissional que me tinha dado maior satisfação. Num primeiro momento, lembrei-me daquelas coisas complicadas que deram muita e muita luta, noites agitadas, situações muito tensas e que, por fim, lá ficaram a funcionar. Mas, rapidamente, acabei por encontrar algo muito, muito mais importante do que todos os sucesso técnicos: as pessoas.

As pessoas em que acreditámos, a quem demos uma oportunidade, que responsabilizámos, de quem exigimos e que, assumem, agarram a oportunidade e é vê-las cresceram e desabrocharem, afirmarem-se e mudarem de dimensão. E não tive a mínima dúvida em dizer que esses momentos tinham sido aqueles que maior satisfação me tinham dado. De uma forma geral acho, e cada vez mais, que tudo está nas pessoas.

Tive a oportunidade de, em diferentes fases, participar em processos de recrutamento e, entre o embaraço e a anedota, é terreno fértil para muitas histórias e expectativas. Quando aqui lançámos um anúncio que teve mais de 2000 respostas, já estava mesmo a ver que muitas histórias iriam chegar ....

15 julho 2007

Queridas pombas

Os parapeitos das janelas pequenas do meu apartamento aqui em Argel, são muito queridos pelas pombas. Há quem diga que elas, principalmente quando brancas, são mensageiras da paz. Estas, no entanto, que eu veja, só me trazem excrementos nojentos e irritantes arrulhares. Por isso, costumo dar pancadas nos vidros à mínima suspeita, para lhes demonstrar que se trata de um local pouco acolhedor. E lá partem elas num restolhoar de penas.

Quando regresso de uma ausência, a actividade tem que ser reforçada porque as bandidas aproveitam o período calmo para se instalarem. Um destes dias vi por trás de um vidro fosco uma mancha cinzenta e prontamente lhe dei umas boas e sonoras pancadas. Mas a coisa não mexeu! Insisti ... e nada!

Abro a janela e encontro ... isto:


Ora bolas!!!
E não é que me apiedei destes queridos produtores de caquinha ??
Bom... a piedade não durou muito tempo, porque logo entendi serem eles os responsáveis por uns agudos piares e que nunca se calam. Espero que ganhem rapidamente capacidade de voar para as minhas pancadas no vidro se tornarem eficazes.

13 julho 2007

Indignação

Vi na televisão uns funcionários públicos, mais especificamente professores, manifestarem-se indignados por um colega, entretanto falecido, que foi obrigado a continuar trabalhar mesmo quando não tinha condições de saúde para o fazer.

Não conheço os detalhes, mas, de acordo com o que se diz na comunicação social, têm toda a razão e todos devemos estar indignados.

Terão razão completa quando se indignarem também contra as reformas e baixas fraudulentas e injustificadas, cuja generalização leva a que, por vezes, “pague o justo pelo pecador”. Veremos?

11 julho 2007

O voto popular

Já dizia “o outro” que a democracia é o pior de todos os sistemas...
E, de facto, o voto popular nem sempre é sinónimo de clarividência. Pondo de lado os casos políticos populistas, sempre sensíveis e polémicos, vejamos as votações a brincar. A escolha do maior português foi o que se viu e agora temos o exemplo das 7 novas maravilhas do mundo. Cabe na cabeça de alguém que lá esteja o Cristo Redentor do Rio de Janeiro e não o Alhambra de Granada? Ou que a Catedral de Milão nem sequer aos finalistas tenha chegado?

Voltando ao sério, ter o direito de poder escolher é também ter a obrigação de avaliar com honestidade e isenção. Quem não se preocupa com a seriedade da avaliação deve poder usufruir do direito de avaliar?

E aqueles que, por incapacidade intrínseca, falta de formação ou outras coisas do género, são mesmo incapazes de avaliar, deveriam ser impedidos de votar? Conversa perigosa!

Bom, sorte mesmo foi, na lista dos finalistas das 7 maravilhas de Portugal, não ter constado o Estádio do Dragão nem o da Luz!

10 julho 2007

Ver para crer e ....

Não é muito frequente, mas a falta de jantar para aquecer no frigorífico, associada à preguiça ou desoras para cozinhar, às vezes faz-me comprar um frango assado no caminho.

- É bom? Olhe que só cá volto se for bom!
- É bom, sim senhor! Claro!!!

Estavam dois exemplares já tirados do espeto a que eu torci o nariz, achei que não estariam quentes...

- Estão quentes! Veja lá!!!

E o meu dedo aproximou-se a poucos milímetros e, realmente, senti algum calor. Mas o vendedor não me viu convencido e marcou um dos bichos com o seu polegar.

- Está a ver? Está quente!!
- Ok, ok! Eu levo um!
- Qual deles prefere?

Obviamente, escolhi o exemplar que não tinha sido “carimbado”, mais limpinho.

E, o vendedor, trás! Agarrou no meu bicho com a manápula nua e calejada e espetou-o no papel de estanho.

Ver para crer, nem sempre chega, às vezes é necessário tocar.

E estava bem saboroso !

06 julho 2007

Magia



Já referi aí para trás, e penso que mais do que uma vez, a admiração que tenho pelos Pink Floyd, particularmente da fase dos anos 70. Agora, há dados novos.

Um destes dias, numa Fnac, estava a ser projectado num grande monitor o DVD do espectáculo “In the Flesh” do Roger Waters. Confesso que, exceptuando o Peter Gabriel, não costumo prestar muita atenção às carreiras a solo de ex-membros de grupos legendários porque raramente superam a banda original e fica aquela sabor a coisa ressequida. Acontece que estava a passar o “Comfortably Numb”... e .... fiquei enfeitiçado a ouvir até ao fim e já só saí de lá com o DVD na mão.... É que, para lá da qualidade intrínseca dos temas, acho que o álbum está mesmo muito bem interpretado e gravado.

A parte curiosa é que depois em casa, ou pela qualidade ou pela insistência, lá tive dois adolescentes também especados a seguir o espectáculo mais do que uma vez e, no final, a trautearem o “Is there anybody in there...”. Ficou comprovada a intemporalidade da banda.

Mais controverso foi quando lhes contei que o “Another brick in the wall” tinha sido na época uma espécie de hino. Atentos à letra, entenderam que não era nada edificante como hino: “We don’t need no education” ?!?!!?. Enfim, lá perdemos uns pontitos na nossa credibilidade como geração responsável...

04 julho 2007

De todas as vezes



De todas as vezes ao desembarcar, quando se volta a tocar o chão, há um estremecimento de chegar e o corpo parece querer rodar.

Lançados numa terra nova, aonde se chega ou à qual se regressa, há sempre que reaprender a andar. E, nesta súbita quebra de tensão não medida, é violento o momento de a bagagem aterrar.

Dentro em breve vou ter que desembarcar, talvez à chuva ou nevoeiro ou noutra hora incerta. E, enquanto o primeiro pé, do degrau para a terra voar, vou tentar não olhar, vou-me esquecer de hesitar.

E deixando um bocadinho de mim para trás, seguindo a viagem sem desembarcar, encontrarei sempre uma razão para voltar a embarcar.

E tantos destes bocadinhos, em tantas estradas, comboios e aviões; saturado da falta de razões para não cair ao parar.

02 julho 2007

Querelas

Foi bonito ouvir Marques Mendes dizer que a Presidência Europeia Portuguesa era uma questão de estado e que o governo teria todo o apoio do PSD, sendo este um assunto que devia não ser contaminado com "querelas partidárias" (cito de memória).

Ficamos à espera que a erradicação do espiríto de "querela" se alargue a outros temas.... e, já agora, se não for pedir muito, que o governo aumente a sua capacidade de encaixe ao sentido de humor alheio.