13 abril 2007

Aproximando a desgraça



Há algo de patológico na forma como se costuma avaliar a probabilidade de um próximo estar envolvido numa tragédia. Um pouco como se tendo eu um amigo na Índia, e sabendo que lá ocorreu um acidente de comboio, presumir que existe uma enorme probabilidade de ele ter sido afectado. Evidentemente que essa probabilidade é maior para ele do que para aquele outro que está sentado à minha frente. Como também será verdade que esse outro tem maior probabilidade de ter um simples acidente de viação ao regressar a casa do que o primeiro estar entre as vítimas do comboio.

Nunca percebi este mecanismo pouco racional, quase mórbido de atracção e vontade de proximidade com a desgraça. Será o mesmo que faz o pessoal parar e ir ver de perto os mortos e feridos de um acidente de viação, para poder bem contar como foi? Não sei. O que sei é que parece haver algum “valor” em contar que se esteve perto, mais perto do que ninguém. E aquelas pessoas que quando começam a falar de acidentes e desgraças não são capazes de parar de desfilar as suas experiências pessoais moendo e remoendo o que aconteceu e o que poderia ter acontecido? Será exorcizar?

Não sei. O que eu sei é que presumir que o “amigo na Índia” tem grande probabilidade de ter sido apanhado no acidente de comboio sem sequer saber onde o desastre ocorreu não é racional.

2 comentários:

Anónimo disse...

...e pronto...e mais não digo!!!

Maria Manuel disse...

Patológico parece-me forte, mas sem dúvida que não é racional, como o não são muitas das reacções que pontuam as relações pessoais. É geralmente a ausência e a distância que criam essas angústias, por vezes a falta de comunicação também, impedindo de raciocinar com clareza. Mas é fenómeno que distingo desse outro de que falas de curiosidade mórbida, esse sim de muito difícil compreensão…!