24 fevereiro 2013

Questão de respeito

Sou contra todo o tipo de falta de respeito e uma falta de respeito não justifica outra. No entanto, quando o Primeiro-Ministro vem publica e oficialmente manifestar repúdio contra a acção da qual foi vítima Miguel Relvas, esquece uma coisa: o facto de este ser e continuar a ser ministro é uma grave falta de respeito para com os portugueses. Num país em que houvesse um pingo de respeito pelos cidadãos, há muito que, por um décimo dos factos em causa, esse individuo teria desaparecido do Governo. E, Sr. Primeiro-Ministro, a primeira coisa a fazer antes de pedir respeito é respeitar.

19 fevereiro 2013

Felizmente há o ADN

A história da carne de cavalo por vaca surpreende-me imenso. E não principalmente pela aldrabice em si e pela falha dos sistemas de controlo e de rastreabilidade num produto alimentar de grande consumo, o que já não é pouco. Surpreende-me muitíssimo a cadeia de fornecimento da carne. A empresa que recebeu a encomenda para produzir as lasanhas encomendou a carne a um fornecedor de carne. E este, em vez de a comprar de uma forma clara a um produtor, passa por um intermediário no Chipre, que fala com outro na Holanda e que por sua vez compra (arranja…) a carne na Roménia.

Num produto de grande consumo para a grande distribuição, onde supostamente as margens estão esmagadas e as cadeias de fornecimento claras e optimizadas, como pode haver espaço para tantos intermediários? Qual o valor acrescentado de cada um? Numa época de compras em plataformas electrónicas, em que não há problemas de acesso a informação e em que a grande distribuição até faz acordos directos com produtores, o simples facto de haver tanta gente no meio cheira-me a estragado. Isto parece um negócio de oportunidade de alguém que conhece alguém que arranja qualquer coisa que apareceu e que não está disponível ou visível no mercado regular. Esta acessibilidade tortuosa ao produto não pressagia nada de bom. Seja coisa de cavalo, de burro, ou de chico esperto, o mais certo é andarem a impingir-nos umas porcarias quaisquer. Felizmente, para este caso, valeu-nos o ADN.

14 fevereiro 2013

O princípio, o sistema e o sorriso

Este texto é bastante especulativo, mas como se trata do Vaticano, que não prima pela transparência, acho que tenho desculpa. Quando o Cardeal Ratzinger foi nomeado Papa, para mim, e para muitos, o sentimento foi de desilusão. Representava uma continuidade da linha de João Paulo II que, arreigado a fundamentos formais, não deixava a instituição Igreja Católica alcançar o lugar que podia e devia ter na sociedade. Escrevi na altura:

Dentro dos nomes potenciais para o novo papa, havia um, para mim, que se destacava claramente pela negativa. Joseph Ratzinger. A sua acção recente tinha sido redutora e autoritária. Mais “correctora” do que “inspiradora”; mais defensora da cidadela ameaçada do que impulsionadora do seu desenvolvimento. Mais preocupada com o impor a toda a sociedade os seus princípios, do que com a promoção e adopção natural dos mesmos; mais centrada na disciplina do rebanho do que no desenvolvimento espiritual do homem.

Agora leio a corajosa resignação de um homem de princípios e nos comentários da imprensa, não aquela paroquiana que comenta os tugas que viram e conviveram com o Papa e outros seus potenciais sucessores, leio que a sua resignação é uma vitória dos conservadores. Espera aí, mas este Papa não era conservador? Sim, mas será conservador mesmo pelo princípio, tendo existido alguma incompatibilidade entre o princípio e o sistema? E, aumentando o grau de especulação, será este um sistema em que os princípios interessam apenas enquanto meios… de poder? Quando vejo a referência a uma organização poderosa chamada “Legionários de Cristo” e mesmo esquecendo a vergonhosa história de vida do seu fundador, Marcial Maciel, claramente assumida e até condenada, fico a tentar imaginar o que diria Cristo sobre esta coisa de no (seu) Vaticano existir uma coisa chamada “Legionário de qualquer coisa”!

Em resumo, e se é para termos esperança, esperemos então que possa aparecer um homem que sorri como este descrito aqui e reproduzido na imagem acima, e que sobreviva ao sorriso. Mas creio que não, não deverá ser de sorriso e nem sequer de princípios. O sistema está bem protegido 
pelos seus legionários nominais e/ou funcionais contra os princípios, e, por maioria de razão, contra os sorrisos!

06 fevereiro 2013

Mais um Parlamento perdido

No âmbito da discussão da legalização do casamento homossexual em França, o respectivo Parlamento encontrou um problema muito bicudo de resolver: qual o critério para o nome da família da criança adoptada. Para quem não sabe, nome de família em França só pode ser um e é o do pai – sim, é assim por lei e em França, não é na Arábia Saudita nem num desses países esquisitos de direitos, liberdades e igualdade entre géneros. Só se o pai for um pé rapado e a mão tiver alto pedigree, é que pode haver uma excepção para a criança receber o nome da mãe. Eu próprio o comprovei quando ao registar o meu filho nascido na Bélgica, com legislação idêntica, em que precisei de à pressa declarar nomes de família como nomes próprios para o rapaz pode ficar com mais do que um único nome de família. Voltando às famílias homossexuais, é bastante óbvio que a solução simples é ficar com os dois nomes de família. Só que, igualdade por igualdade, isso também teria que ser aplicado a toda a gente, destruindo então essa pedra basilar da identidade francesa. Como ilustração dos problemas que isso traz, foi referido o caso português dos nomes de família que nunca mais acabam. Lá chamam-lhes “nomes mala”, em português será talvez um “comboio de nomes”. Mas, se para evitar nomes comboio é necessário estabelecer por legislação uma coisa tão desigual e retrógrada, é estranho. Por outro lado, é incrível como parece ser mais fácil discutir a família homossexual do que simplesmente anular essa regra arcaica e machista. Para que conste: os adultos têm o direito de viverem como entenderem na sua esfera privada e por isso acho bem que possa aplicar-se-lhes a instituição/contrato casamento. Como uma criança não é um animal de estimação eu acho mal que tenham pai-pai ou mãe-mãe. Mas esta é a minha parte retrógrada.

03 fevereiro 2013

Eu acho que não está bem

Esta coisa do Parlamento recomendar à RTP a retoma do TV Rural não está bem. E não está bem porque é claramente anticonstitucional.

São incontáveis os portugueses com outros ofícios, não agricultores nem pescadores, mas com os mesmos direitos constitucionais, excluídos desta iniciativa parlamentar. Não seria importante haver, por exemplo, um TV Pastel de Nata? É necessário solicitar com urgência uma fiscalização do Tribunal Constitucional sobre o assunto e, enquanto não houver decisão, suspender preventivamente essa coisa que não sendo lei, também não sei bem o que é nem como seria aplicada. Ao mesmo tempo, é fundamental prever no processo de privatização/concessão da RTP os impactos desta questão. Senão, iremos ter certamente uma fiscalização da constitucionalidade da grelha de programas e sei lá onde isso pode acabar e, com um operador privado, quanto pode custar!

Com esta carga enorme de tantas discussões e votações é natural que o Parlamento não tenha tempo para tudo e é perfeitamente compreensível haver leis que saiam mal definidas ou incoerentes. Por exemplo, saber se a limitação de mandatos dos autarcas é aplicável à função ou ao território, é um detalhe que não ficou claro na lei e, pelos vistos, nem sequer parece possível vê-lo esclarecido em tempo útil!