08 fevereiro 2018

Memórias do muro


Esta semana cumpriu-se uma data curiosa relativamente ao muro de Berlim. Igualou-se o tempo que esteve construído com o tempo decorrido após a sua demolição. Quem diria…

Olhando hoje para essa memória, apetece-me evocar duas coisas. Em primeiro lugar a sua natureza direcional. O seu objetivo não era evitar a entrada de pessoas (ou de latas de coca cola). Era evitar as saídas. Em segundo lugar, a indiscutível melhoria das condições de vida, pelo menos, para não complicar, na ex Alemanha de Leste, decentemente governada. É possível hoje, racionalmente, defender a bondade desses regimes que, conforme disse Camus, tinham tanto de socialista como a Inquisição de cristã? Racionalmente, obviamente que não.

Há, no entanto, e haverá, nostálgicos desses tempos, enquadrados em dois tipos. Uns são os religiosos. Aqueles que acreditam dogmaticamente num modelo, apesar de após cem anos e ensaios em vários continentes e culturas, ter sido sistematicamente incapaz de proporcionar bem-estar material e intelectual de forma sustentável aos seus povos. Face as estas evidências, continuar a crer, é coisa do domínio religioso.

Outros são os que valorizam um certo paternalismo tranquilo do regime. Não é assim tão raro nos pós-ditaduras. Também por cá temos nostálgicos dos tempos respeitosos da “outra senhora”. Como se face a ter um caminho livre a descobrir, a arriscar, haja quem prefira ser levado pela mão. Pensa-se menos…

E, por favor, não me evoquem a pretensa superioridade moral, da solidariedade, da defesa dos desfavorecidos e etc. Na prática, a prática passou por uma oligarquia de privilegiados, muito pouco escrutinados, que, apesar das argumentações bonitas, foram incapazes de proporcionar vidas decentes aos seus povos.

Enquanto não lermos seriamente o passado, corremos sempre o risco de um futuro sombrio.


Foto de um Trabant no Memento Park, em Budapeste, onde arrumaram estátuas e outros monumentos "socialistas", anteriormente distribuídos pela cidade.

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