30 novembro 2011

O alvo da Indignação

O movimento dos “indignados” provoca leituras muito díspares. Em primeiro lugar acho a palavra bastante espanhola. Mais adequado seria “desiludidos”, mas como começou num país algo orgulhoso, dos que mais fulgurantemente subiu e onde a regressão será mais sentida, “indignado” é mais altivo e assertivo do que “desiludido”.

As tentativas de comparação deste movimento “ocidental” com a chamada primavera árabe são de um absurdo que só pode vir de quem desconhece o mudo em que vive. Internet e facebook podem ser meios comuns mas isso não implica comunhão de motivações e de objectivos. Por exemplo, a dinamite é um meio que serve a fins muito variados. Sem entrar em detalhes sobre o abismo de diferença ente os contextos sociais e culturais, a rua árabe queixa-se de não sair da cepa torta enquanto o ocidente queixa-se de a cepa estar a entortar.

No entanto, e fundamentalmente, acho que estes “desiludidos” se enganaram no alvo. Os “mercados financeiros” não deveriam governar um mundo são e bem organizado. Se o fazem é por duas razões. A primeira é porque na sua ingénua crença na globalização insuficientemente regulada, os políticos de serviço não pensarem que ao ligarem em vasos comunicantes dois mundos de níveis muito diferentes, há um que desce. O ocidente está a descer e a inviabilização de uma enorme parte da indústria transformadora é socialmente fatal. Assim, os recursos financeiros que por cá sobram, em vez de serem usados para construir fábricas e proporcionar empregos sustentáveis, estão a ser usados … nos “mercados financeiros”. A segunda razão é que esses mesmos governantes entenderam que a solução seria gastar o que não têm nem geram, pedindo emprestado… aos mercados financeiros.

Não sei qual é a solução, mas entre uma classe política imberbe de vistas curtas, um eleitorado mal informado e uma comunicação social que não questiona consequentemente o poder nem forma seriamente o eleitorado... estamos de vitória em vitória até à derrota final.

PS: Ouço criticar, que com a crise, nalguns países os “políticos” estão a ser substituídos por técnicos… Pode-se chamar políticos a estes seres nascidos e criados nas incubadoras dos aparelhos partidários e cuja principal motivação e habilidade é conquistar e manter o poder dentro do dito cujo aparelho?

23 novembro 2011

Reflexo de S. Martinho



A caminho de casa em dia de S. Martinho, vejo uma aldeia ali ao lado em festa, de igreja e ruas bem iluminadas. Depois do jantar pego na máquina fotográfica e vou ver de perto. Nas traseiras da igreja um enorme fogareiro assa quilos de castanhas. Pergunto quanto custa uma mão cheia e respondem-me que são oferecidas pela comissão de festas, assim como o copo do vinho que estão a distribuir lá atrás.

Trinco as castanhas regadas com o vinho novo e sinto algo estranho. Não paguei e, ainda mais estranho, não estou a ser objecto de nenhuma taxa ou imposto directo sobre este acto. Claro que no fundo não há castanhas grátis. Estas foram pagas pela vontade dos habitantes que contribuíram generosamente ao longo do ano e pelo trabalho voluntário da comissão de festas. E, sinceramente, espero não estar a dar ideias para o ano aparecer por lá um delegado das finanças a cobrar 20 cêntimos de taxa de S. Martinho por cada castanha oferecida, assim como confio que não se lembrem de o fazer retroactivamente como quando se lembraram agora que há mais de 2 anos eu paguei um IUC com mês e meio de atraso.

Enquanto circulava procurando captar a beleza das imagens do local, pensei que uma das vantagens que podemos ter nesses tempos de crise e de restrições é precisamente o valorizar e apreciar o que não tem preço nem factura e não me refiro naturalmente à economia paralela que foge ao IVA. Refiro-me a tudo o que de belo pode ser feito na terra, apenas pela vontade dos homens de boa vontade.

15 novembro 2011

As preocupações dos juízes

Li que uma associação de juízes se pronunciou sobre a suposta não constitucionalidade da supressão dos subsídios de férias e Natal aos funcionários públicos. Se calhar formalmente têm razão mas, até hoje, nunca vi preocupação em igualar o estatuto (e a segurança) da função pública com a dos “privilegiados” que aparentemente não perderão os ditos subsídios, sendo de realçar que muitos deles perderão é os salários todos e por inteiro. Se na origem do nosso actual drama está o excessivo gasto público, ele não estará apenas no custo dos funcionários públicos, mas também. Uma empresa “normal” se têm que reduzir 20% da massa salarial, reduz 20% do pessoal, não reduz 20% do vencimento a todos os funcionários, nem vai ao vizinho pedir uma contribuição adicional. É mesmo esta igualdade de tratamento que os funcionários públicos querem?

Ainda sobre os juízes, gostaria muito, mas mesmo muito, de os ver publicamente preocupados com o facto de, por exemplo, Isaltino Morais continuar condenado e solto esperando alegremente pela prescrição de crimes provados e cuja natureza até está bastante relacionada com a situação a que chegamos e que levou à anunciada confiscação dos seus subsídios.

04 novembro 2011

Venha mais um recurso!


Dizem as notícias do dia que o Tribunal Constitucional rejeitou o último recurso apresentado por Isaltino Morais e, como tal, a sentença transita em julgado (é assim que se diz?) e o senhor devidamente julgado e condenado deve “ir dentro”.

Ele acha que não… que ainda há mais recursos pendentes de decisão. Eu, se não entendo que raio tem o Tribunal Constitucional a ver com isto, entendo que a tática é, até à prescrição, que até parece já não estar longe, o senhor continuar a recorrer e a recorrer… até chegar ao supremo tribunal da Via Láctea… que se não existe, devia existir, pelo menos para estes casos…!

Que nojo !!!

03 novembro 2011

Mais um Outono do nosso descontentamento

Acto 1 – Outono de 2008. Por irresponsabilidade na gestão corrente da sua actividade, uma grande parte da banca europeia e ocidental ameaça entrar em colapso. Os governos saem em socorro com empréstimos, garantias e até mesmo nacionalizações.

Acto 2 – Outono 2009 – A crise bancária/financeira contamina toda a actividade económica. Os governos, fortes do sucesso da sua missão anterior de salvamento, acham que a solução passa por eles, chamando investir a tudo o que seja gastar e, pior, gastando o que não têm.

Acto 3 – Outono de 2010. Na ressaca da overdose de “investimento” e com o alarme disparado por uma Grécia especialmente indisciplinada e de contas assaz opacas, os governos descobrem que há limites para o endividamento. É a famosa crise da dívida soberana.

Acto 4 – Outono de 2011 – Para resolver o problema desta crise os governos vão recapitalizar os bancos…! Perdão, mas a origem do drama não foi precisamente terem gasto o que não tinham, uns mais do que outros, é certo? Se a história se repete, da segunda vez é certamente uma farsa. Há bancos e bancos, países e países, dívidas e dívidas. O “apoio” à Grécia não é pela Grécia, é claro. É pela exposição que os bancos dos países “A” têm nessa dívida. Em vez da chatice de ter que aturar e controlar os Gregos, perdoa-se uma parte da dívida e dá-se a massa directamente aos bancos credores. E os Gregos que não chateiem mais, que paguem os 50% que ainda devem e se não pagarem que se lixem porque já não doerá tanto aos nossos bancos. Os Gregos duros de roer e imprevisíveis anunciam um referendo, indiscutivelmente democrático, cujas consequências mais do que prováveis serão não receberão mais nada nem reembolsarão nada mais. Provavelmente sairão do Euro e seguramente sofrerão bastante. Não sei se será o fim do Euro mas certamente será o fim da “Europa”. Ficam mal os Gregos pela irresponsabilidade e ligeireza na gestão das suas finanças públicas “Europeias”, ficam mal as instituições europeias que carecas de saberem que as contas gregas estavam aldrabadas assobiaram para o lado durante anos e fica mal a Europa e a sua liderança cuja visão para a solução é reguadas nas palmas das mãos dos infractores e cuja acção na prática é correr atrás do prejuízo.