13 abril 2021

O perigo e a perceção

Quando há cerca de 15 anos me instalei na Argélia, ainda por lá corria alguma atividade terrorista, embora em escala muito inferior à da década anterior. Ao tentar avaliar objetivamente o perigo em causa, podiam-se fazer as contas seguintes. Os terroristas matavam 2 a 3 pessoas por mês, principalmente militares ou policias e em zonas remotas; na estrada morriam em média 10 a 12  por dia e por todo o lado. Um risco realmente muito mais elevado.

Na mesma altura em Portugal, em 2006, morreram 850 pessoas em acidentes de viação (Pordata) durante o ano. Ou seja, o número de mortos na estrada em Portugal era mais ou menos equivalente ao das vítimas de terrorismo na Argélia, sendo que lá até era mais fácil evitar os locais de risco. A grande diferença, não quantitativa, estava na natureza do risco. O da estrada era-nos conhecido e familiar; o outro era novo e isso desestabiliza.

Isto vem a propósito do folhetim com os riscos da vacina da AstraZeneca. Talvez um dia venhamos a saber até que ponto o Brexit e a empresa ser um novo jogador no mercado das vacinas contou para tanto ruído. A questão é que ninguém olha (ou pouco) para as contraindicações e possíveis efeitos secundários de uma medicação, quando a tem que tomar. Entende-se frequentemente que há um risco, mas pode/deve ser corrido.

O Covid-19 assusta, é novidade e tudo o que a ele diz respeito desestabiliza-nos. Mas, das duas uma, ou corremos o risco da doença ou o da vacina. Não é possível esperar risco nulo e a razoabilidade é validada por procedimentos que não foram feitos ontem e por entidades supostamente informadas e competentes. As decisões políticas de põe e tira, tira e põe, quando objetivamente não há novos elementos relevantes, são uma fonte de desestabilização muito dispensável.


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