07 fevereiro 2014

As fronteiras da Justiça

Um juiz espanhol lançou um mandato de captura internacional contra uma série de altos dirigentes chineses do início da década de 90, incluindo o presidente e o primeiro-ministro da época, pelos acontecimentos no Tibete. A China não gostou, certamente, e, por coincidência ou não, o Parlamento espanhol vai a correr votar uma lei que limitará a jurisdição internacional do seu sistema de justiça.

Isto faz lembrar um pouco a história recente de Portugal-Angola, com a investigação a alguns altos dirigentes africanos. Foi um pouco diferente por os supostos crimes terem ocorrido mesmo em Portugal e não haver polémica sobre a tal abrangência internacional. Diferente também foi termos visto um ministro a comunicar e a antecipar publicamente as conclusões do processo e a decisão judicial estar plena de considerações políticas e diplomáticas…

Recordo ainda o caso da venda de equipamento militar do Reino Unido à Arábia Saudita em que uma investigação em curso teve que ser abandonada, dado os potenciais danos que a ira dos árabes poderia provocar. As razões invocadas foram “interesse público” e “segurança nacional”.

O que há de comum nestes três casos, é termos um país com um sistema de justiça supostamente independente que investiga algo relacionado com poderosos de um país terceiro, que este não aceita e em que as ameaças de retaliação fazem a justiça supostamente independente encontrar um caminho de recuo.

Pragmaticamente sempre foi assim, e provavelmente sempre assim será. Será que faz sentido ir até ao fim com estes processos, isolando um mundo da justiça cega para todos de outro mundo de valores relativizados. E o mundo da justiça cega, certamente empobrecido, conseguirá sobreviver ou acabará, de um forma ou de outra, comprado? Vale a pena pensar na expressão “pobres mas honrados”?

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