19 maio 2013

As duas Europas


Neste processo em curso de clivagem entre a Europa do norte, pretensamente rica, e a do Sul, perdulária e falida, já se chegou ao ponto de identificar a linha de separação com a fronteira religiosa: de um lado o austero calvinista, do outro o católico faustoso. Nesta lógica confirma-se que a ortodoxa Grécia, ortodoxa apenas no significado religioso da palavra, é certamente um caso à parte e que a França, neste como em muitos outros campos, será uma coisa central indecisa e imprecisa. Seria interessante analisar até que ponto é a influência religiosa que determina o comportamento ou se existe algo de outra natureza que se reflecte na religião dominante; por outras palavras, qual a causa e qual o efeito.

Devo acrescentar ainda que tenho algumas dúvidas sobre essa suposta superioridade moral do norte. O sistema é menos tolerante e um sancionador mais severo, mas não me parece que ter um “ADN” moral assim tão distinto. Alemães e italianos a fazerem negócios por esse mundo fora (sejam submarinos ou sejam helicópteros) não são muito diferentes.

Para lá dessa questão espiritual e/ou moral, o que é certo e certíssimo que é há duas Europas gastronómicas: a que cozinha com azeite e bebe vinho e a outra que cozinha com manteiga e bebe cerveja. E, quem fala em gastronomia, fala em saber viver. Há uns anos quando sob um céu de chumbo eu atravessava o deprimente vale do Ruhr, com aquelas escórias das minas e tenebrosos restos de indústria pesada, eu dizia a mim próprio que preferia atravessar o Alto Douro de Fiat, do que estar ali, nem que fosse de Mercedes. Desculpando a referência explícita às marcas, o problema é por cá termos trocado os Fiats por Mercedes e não os conseguirmos pagar. Resumindo e tentando concluir com um pouquinho de exagero: deixemo-los lá então com as suas cervejas e carros de luxo em ambientes deprimentes e reaprendamos a viver conforme podemos pagar, mas com o saber que temos, e veremos no fim quem é o invejoso.

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