03 fevereiro 2011

O nascimento da democracia?

Talvez me tenha enganado há umas semanas atrás quando vaticinava um simples sucessor para Ben Ali na Tunísia. Afinal os tunisinos rejeitam todos os que tiverem ligações com o passado. Para um passado de 23 anos, que começaram por ser a continuação dos 30 anos anteriores de Bourguiba, quem poderá sobrar imaculado e com “capacidade” mínima de governar? Não é evidente. Há aqui um grande buraco à espera para ser ocupado, não se sabe por quem.
Para aqueles que excitados falam da grande novidade do fim das ditaduras e do nascer das democracias no mundo árabe, convém recordar que estes movimentos não são sim tão inéditos e que os seus antecessores não tiverem fim feliz. A história não se repete mas convém não ser esquecida.
Exemplo 1. Argélia, final dos anos 80. Grande contestação e tumultos nas ruas, partido único no poder desde a independência, há mais de 25 anos, é fortemente questionado. O presidente da altura, Bendjedid, depois cognominado “Branca de Neve” pelos cabelos brancos e pela ingenuidade, decide organizar eleições livres e multipartidárias em 1991. O partido islamista (FIS) iria ganhá-las, os militares não gostam, destituem o presidente e suspendem o processo eleitoral. Os radicais pegam em armas para tentarem obter pela força o que lhes tinha sido negado pelos votos. O país mergulha numa década de terror. Hoje, passados 20 anos, talvez 200 000 mortos e uma boa parte da elite intelectual dizimada, ainda não está completamente sanado. Talvez esta experiência traumatizante seja a “vacina” que acalmou, para já, os protestos, que arrancaram em simultâneo com os da Tunísia.
Exemplo 2. Irão 1979 – Um regime autoritário e pro-ocidental cai, empurrado pela “rua árabe”. O que hoje é o Irão passados 30 anos já toda a gente sabe. Pode o Egipto não ser chiita, mas…
Com os todo-poderosos e omnipresentes “aparelhos” desacreditados quem pode aparecer com a imagem pura e limpa e com crédito perante a dita “rua árabe”? O FIS argelino designava “Frente Islâmica de Salvação”. Conforme dizia um Tunisino recentemente essa gente respeita a democracia apenas enquanto é oposição. Ou conforme se receava durante o processo argelino: “um homem, um voto, uma vez”.

Sem comentários: