06 abril 2020

Depois da Primavera


A Primavera parecia vir adiantada. As amendoeiras floridas até coincidiram com o Carnaval. À data havia 80 mil casos a nível mundial, mas apenas 34 mortos fora da China e 7 na Europa (6 em Itália e 1 em França), dados da OMS. E foram as deslocações nas férias de Carnaval as principais responsáveis pelo grande espalhar do bicho na Europa.

Era antes do tempo, mas era uma Primavera pujante, confiante e festiva. Estavam longe as nuvens e acreditávamos que as condições e o sistema sanitário na Europa não eram iguais os da Ásia. Afinal, de falsos alarmes já estávamos cheios. O próprio Presidente da República vai a Podence para um banho de multidão. Imagens com pouco mais de um mês, mas que hoje parecem de há um século.


Na data oficial, a Primavera não chegou, foi suspensa. Podem ainda lá estar flores, mas não as vemos. Já não podemos atravessar rios nem cruzar cordilheiras. Não há pessoas em quem tocar. Desconfiamos do calor humano, fugimos, damos distancia. Os olhares cruzam-se receosos e apreensivos, sorrisos são apagados. Desaparecem os lugares onde se possa rir ou chorar, ou partir ou chegar, ou cantar ou amar.

A Primavera está suspensa, sim, mas um dia chegará. Como depois de um fogo devastador, de rescaldo delicado, sairemos de novo à rua e haverá cinzas. O bicho terá queimado vidas, sonhos, ganha pães, projetos e alentos. As cinzas serão varridas para dar lugar a um novo campo deserto, ou por lá ficarão fecundando o que irá renascer. Ou, quem sabe, nalguns lugares estarão intactos frutos sobreviventes, resistentes. Entre o que muda e o que fica, não sabemos como ficará, mas a Primavera chegará.



2 comentários:

jorge neves disse...

Façamos votos que para este ano, o que aí vem não seja um duro e longo inverno.

Carlos Sampaio disse...

Pois, façamos votos... a ver vamos e tentemos dar uma ajudinha :)