16 março 2017

Que me desculpem

Que me desculpem Miguel Torga, Fernando Namora e tantos outros, que mesmo não sendo escritores nem tendo deixado um registo literário eloquente da vida que viveram e de tantas que viram viver e morrer, conseguiram manter-se no nível dos comuns mortais que humanamente trataram.

Não foi há muito e pouco importa o local público onde ocorreu, por acaso um restaurante, em que ouvi alguém falar de forma tão enfática, com tanta auto presunção, que pensei imediatamente: este cagão é médico. Uma certa forma de presumidamente se colocar a um nível superior dos outros desgraçados, que desgraçadamente necessitam de se colocar nas suas sábias mãos e têm a vida e o bem-estar dependentes do seu conhecimento. A continuação do discurso, demasiado próximo para não o poder ignorar, confirmou-me o palpite: era, claro estava, médico.

Há uma tira da Mafalda, do Quino, em que o pai dela conversa com alguém na praia, até o interlocutor se declarar …. Médico! Aí, imediatamente, nasce da areia uma coluna pedestal que eleva o senhor doutor dois metros acima do pobre…Perdão, de calções somos (quase) todos iguais.

A assunção de superioridade que uma parte da classe ostenta é a mesma de um rico face a um pobre, a de uma bonita face a uma feia. Só que não está em causa a riqueza material nem os favores da natureza; está em causa o poder sobre a vida. Independentemente do mérito subjacente ao estatuto e à função, a falta de humildade e a sobranceria são algo que me choca. Neste contexto muitíssimo mais!

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