05 agosto 2023

Deixai-os celebrar


Uma coisa são os venenosos e hipócritas frequentadores de sacristias; outra coisa são as instituições cristãs genuinamente solidárias e humanas.

Uma coisa foram os Torquemadas, outra coisa foi a criação artística e intelectual que a religião promoveu.

Uma coisa foi a mafiosa gestão financeira no Vaticano, outra coisa é o apoio social que em tantos cantos perdidos a igreja proporciona.

Uma coisa é um regime intolerante que impõe uma religião única, a mesma coisa são os que a tentam proibir a sua prática.

A lista pode continuar, mas com tantos duns e doutros, é certamente uma grande ligeireza ficarmos divididos e ter que optar entre os que incensam cada cruz que lhes apareça à frente e os que “pavolvianamente” rosnam a qualquer sotaina que se aproxime.

Passando por uma declaração de interesse, anunciando-me como agnóstico de matriz cultural cristã, não posso deixar de reconhecer que os princípios fundamentais do cristianismo são mais pela tolerância do que pela proibição, mais por promover o coletivo do que destacar o individual, mais pela dignificação do ser humano do que pelo seu aviltamento, mais pela inclusão do que pela exclusão, mais pela primazia da paz do que pela afirmação pela guerra.

Sim, houve, há e haverá desvios, como em tudo, como sempre.

Por isto tudo, sendo as jornadas mundiais de juventude uma festa bonita, se não gostam, não olhem, não ouçam, mas deixem-nos festejar. O fato de não gostarem não devia implicar raiva e menosprezo por quem lá está. Tolerância, senhores!

Por maiores que sejam as crenças em materialismos, racionalismos e outros ismos, a religião não vai desaparecer da face da terra nem do horizonte espiritual de muitos. E mais vale promover festas assim do que outras coisas…

Acrescentada a 6/8 a versão impressa.



5 comentários:

jorge neves disse...

A azia incomoda muito,principalmente aos que têm maus fígados.

Carlos Sampaio disse...

Há uns iluminados que se julgam possuidores de uma luz tão absoluta e certa que devem apagar todas as outras. A igreja já foi assim, mas evoluiu... tenhamos esperança.

Isto recorda-me uma figura muito interessante, Pierre Claverie, bispo de Orão, assassinado por fundamentalistas que dizia "precisar da verdade dos outros".

Mais detalhe aqui
https://glosa-crua.blogspot.com/2018/07/sobre-verdade-dos-outros.html

Anónimo disse...

O teu comentário fez-me lembrar a frase atribuída a Voltaire:
“Deus não existe; mas não digam isso ao meu criado, não vá ele matar-me durante a noite.”

Júlio Resende disse...

O teu comentário fez-me lembrar a frase atribuída a Voltaire:
“Deus não existe; mas não digam isso ao meu criado, não vá ele matar-me durante a noite.”

Carlos Sampaio disse...

Júlio, não creio que a heresia nesse contexto fosse assim tão arriscada, mas nos tempos que correm, noutros contextos, a apostasia ainda é crime para pena de morte...