23 julho 2024

A Inapa


Esta empresa, prestes a fechar as portas, para muitos será uma empresa como outra qualquer, a sofrer da lei natural das coisas, para mim é um pouco mais do que isso.

Nos finais da década dos 80, a Inapa, contratou-nos um projeto pioneiro, um dos mais arrojados da nossa equipa na altura. Uma empresa que acreditou na capacidade da engenharia nacional, em domínios por nós nunca dantes navegados. Nos finais dos 90, uma atualização desse projeto foi dos maiores geradores de insónias que já experimentei.

Podemos questionar o racional estratégico de abandonar a componente industrial e de se centrarem na simples distribuição, quando o papel de impressão e escrita está já há muitos anos em declive descendente, sem perspetivas de inversão. Também não acompanhei a evolução da situação acionista e aprendi agora que o Estado, via Parapública, é o principal acionista.

Não parece ser difícil concordar que neste momento os milhões que faltam não serão uma ponte para um futuro risonho, mas antes um adiar do problema e quanto mais tarde, mais caro.

Agora, o que se pode questionar é o sentido de o Estado direta ou indiretamente ser acionista de referência de este tipo de empresa. Por este “tipo” refiro-me a empresas que não funcionam em meios protegidos e estáveis. Refiro-me a empresa que precisam de lutar e de se reinventar. Parece lógico que um acionista “normal”, dono e responsável pelos seus fundos, teria forçado algo com tempo, quanto mais não fosse a alienação da empresa antes de chegar a estes pontos. Assim, é um pouco o “não faz, nem deixa fazer” (há uma expressão menos polida para esta imagem…).

Se dúvidas houvesse, é mais um exemplo que isto não são missões para o Estado.

09 julho 2024

De vitória em vitória até…


Uma larga frente, dita democrática e republicana, provocou e festejou em França a derrota da extrema-direita nas eleições deste passado domingo. Para começar, o RN tem muitos defeitos, mas nunca o vi questionar o regime republicano nem eleições e respetivo resultado. Começar por essa (não) caraterização é desde já estar a avaliar mal a questão.

Houve uma larga conjugação de forças sim, para derrotar RN, numa amplitude que em Portugal equivaleria a ir do CDS até ao PC e BE. A questão é que esta vitória não consolida nada. Em muitos círculos, mesmo assim, o RN perdeu por 40 e muitos por cento.

Tem razão Marine Le Pen quando diz que se não foi desta, será a seguir, é apenas uma questão de tempo. O vento sopra nessa direção e, continuando assim, isto é coisa de vitória em vitória até à derrota final.

Será dramático para a França e para o projeto Europeu uma vitória de um extremismo, sendo que os de esquerda também não são inócuos. Há aqui um exercício difícil entre compreender e atender às expetativas dos eleitores e fazê-los compreender os efeitos negativos a prazo das propostas populistas e extremistas. É necessário ter inteligência, seriedade e autoridade moral reconhecida, coisas que não abundam no panorama político atual. Independentemente da complicação de governação que se seguirá, este resultado é positivo, mas celebrá-lo não chega.

07 julho 2024

A Memória dos Dias

 

Correste a dizer que o dia vinha às portas da saudade

E cobriste de mil flores as varandas da cidade

Ao cantar enrouqueceste mil canções feitas à toa

Dançaste todas as ruas embriagadas de Lisboa

Leste os clássicos do tempo como toda a novidade

E a sonhar adormeceste no prazer da liberdade

Inventando mil amigos

Esquecendo velhos perigos


Não foi ontem que Fausto nos deixou fisicamente, mas as suas canções ficarão para sempre nas nossas memórias e nos nossos dias. Vi-o 3 ou 4 vezes em concertos, o último dos quais o “Três Cantos”, mas, mais do que ver, há ouvir e continuaremos a ouvi-lo.

Bastam uns poucos primeiros compassos para identificar o cantante autor em cada canção. Se “Por este rio acima” é a obra completa, não faz esquecer a magia do “Despertar dos Alquimistas” ou a delicadeza do “Para além das cordilheiras”.

 Pela beleza das melodias, pela doçura da voz, pelo brilho das orquestrações, pela riqueza das palavras, Fausto ficará na nossa memória para todos os dias e no património cultural de Portugal para sempre.

Vêm do fundo da paz da terra os sonhadores…

06 julho 2024

Acho que… será que…?

O exercício de “achar que”, assim tipo palpite, sem conhecimento profundo do contexto é caminho perigoso… frequentemente a realidade não corresponde com o que a ignorância imagina… De forma que eu achar algo relativamente ao futebol é perigoso e será prudente passar para a forma interrogativa.

Será que tenho razão ao achar que uma grande parte dos jogos do Euro2024 têm sido chatos e enfadonhos?

Será que no passado havia/era dado mais espaço a jogadores virtuosos que fintavam em série e emocionavam o público?

Será que excessos de individualismo e desenvolvimento de táticas e estratégias, com prioridade com circulação ao primeiro toque mudaram o paradigma?

Terá sido principalmente a partir do Barcelona de Guardiola que passou a ser mais importante o jogar em equipa, dando mais relevo ao papel do treinador e conseguindo resultados razoáveis, mesmo para equipas sem vedetas?

Será que as táticas de defesa evoluíram e aquela coisa de fazer um carrocel à frente da área, esperando provocar uma desconcentração e uma falha no adversário já não funciona?

Será que sem iniciativas virtuosas, este esperar por uma falha que não aparece é o que torna os jogos enfadonhos, em que se prefere a segurança de trocar a bola sem avançar, a correr o risco de um contra-ataque?

Pois, não sei, mas a França chegar às meias-finais com 3 golos marcados, 2 de autogolo do adversário e um de penalti, sem um único golo marcado em jogo corrido deve ser algo inédito.

 

Quitte ou double

Enquanto se achar que a razão do crescimento da extrema direita está na extrema direita...

01 julho 2024

Quitou, não dobrou


A estratégia ultra-arriscada de Macron de provocar eleições antecipadas em França foi um tiro de bazuca que saiu pela culatra. Sendo óbvio que a extrema-direita iria repetir o sucesso das europeias, qual era a ideia?

As contas do presidente devem ter tido em consideração o fato de se tratar de umas eleições a duas voltas e, sendo fácil gerar uma larga frente contra esses vencedores inoportunos, haveria grandes hipóteses de os segundos saírem reforçados e acabarem por ficar à frente na segunda volta.

O que baralhou as contas foi a criação de uma larga geringonça francesa onde o líder não parece ser o tradicional PS, mas sim o “insubmisso” Jean Luc Mélenchon, que advoga a saída da França da Nato, eventualmente da EU, tiques de antissemitismo, além de outras particularidades e excentricidades, muitas delas comuns às da cartilha de Le Pen. Acontece que foi essa geringonça quem ficou em segundo e serão os seus candidatos a receberem o voto útil contra a extrema-direita.

Portanto, o partido do presidente vai mingar e os pobres franceses terão de optar entre Le Pen e Mélenchon. Não lhes invejo o dilema!! Se a primeira opção constitui um perigo para a França e para a Europa, a segunda também tem riscos que baste …

Acho curiosas as eloquentes declarações de opção de desistência dos terceiros, para ajudar a combater a extrema-direita. Numas eleições a duas voltas, os terceiros têm direito a opção!?