Eu ainda sou do tempo em que havia dois partidos do chamado
arco da governabilidade que, apesar de algumas diferenças nos seus programas,
tinham uma visão consensual sobre o modelo de sociedade e do papel do Estado.
As opções eram feitas, mais pela competência das equipas e respetivos líderes do
que por opções ideológicas.
Os extremos e seus modelos não entravam nas equações de
poder. Do lado esquerdo, haveria ainda no PS memória de 1975 e era patente o
“não arrependimento” de quem tinha tentado boicotar a liberdade e a democracia;
do lado direito a extrema-direita ideológica pura e dura, à la Mário Machado
não tinha e continua a não ter expressão.
Isto mudou com uma nova geração no PS, que não viveu 1975, e
que descobriu afinidades com quem é contra a Nato, contra o Euro e o projeto europeu
e com simpatias por regimes brutais e iliberais. Esta familiaridade, aliada ao
oportunismo de A. Costa, em 2015 fez nascer o conceito de uma tal esquerda em “bloco”,
como se houvesse enormes afinidades entre um PS europeu social-democrata e
apoiantes de Rússias, Venezuelas, Coreias do Norte, etc.
A incompetência em governar e incapacidade de entender como
o eleitorado não aceitava alegremente a impunidade dos casos e casinhos, fez nascer
e crescer outro “bloco” – o da contestação pura e dura. Se bem que ao catalogar
o Chega, ele fica naturalmente do lado direito, o milhão de pessoas que por
eles votou não são potenciais camisas negras, prestes a marchar atrás de uma
suástica ou sair à rua para espancar estrangeiros em esquinas sombrias.
É claro que dá jeito associá-lo à extrema-direita tóxica,
como forma de o desclassificar, mas a toxicidade do partido não é ideológica. É “pratica”,
ou, mais concretamente, num populismo irresponsável e inconsequente, se bem
que, infelizmente, não são os únicos irresponsáveis no campeonato. Insistir que
a origem e o problema, e sucesso, do Chega está na ideologia da
extrema-direita, na xenofobia, racismo e afins, é continuar a não entender
nada!
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