18 abril 2018

Duplamente açoriano


Quando sai uma notícia sobre um alegado abuso dos nossos caros políticos, é habitual seguir-se imediatamente larga condenação pública, mesmo por quem apenas leu as letras gordas. Acontece pelo histórico a que estamos habituados, pouco dignificante para os mesmos e parecer óbvio ser “mais uma…”.

Não deveria ser assim. Deveríamos tentar entender o fundo e as razões, até porque, a malhar, convém ser com rigor, senão temos logo uma legião de virgens ofendidas apregoando injustiças.

Neste caso das viagens dos deputados insulares, duplamente participadas, não sei avaliar o enquadramento legal, mas posso analisar o principio. Um dos principais visados, Carlos César, argumenta que recebe uma comparticipação por ser deputado, como todos os deputados, e outra como açoriano, como todos os açorianos e por ser uma coisa não deixa de ser a outra, com todos os direitos inerentes.

Discordo. Quando se recebe algo, nunca é simplesmente pelo direito de receber, sem mais. Há sempre uma contrapartida subjacente e a avaliação do certo ou errado tem que olhar para aí, muito especialmente se a origem dos fundos for o erário público.

Imaginemos um aluno que tem direito a uma bolsa de estudo para comprar livros escolares, oferecida pela autarquia. Faz sentido beneficiar de outra bolsa para o mesmo fim, oferecida por exemplo, pela entidade patronal do encarregado de educação? Faz sentido receber a dobrar para a mesma coisa? Penso que não e nem coloco o cenário de ele receber o dinheiro e nem sequer comprar os livros.

Por outro lado, o subsídio atribuído aos deputados insulares já é positivamente diferenciado face aos do continente. Portanto a ser confirmada a situação, Carlos César e os demais, são duplamente beneficiados por serem açorianos, para o mesmo fim. E ele só é açoriano uma vez.

Quanto ao argumento do está bem porque “sempre foi assim”, nem vale a pena comentar.


Foto João Porfírio/Observador

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