17 agosto 2020

Isto de cativar…

 

É necessário denunciar Luis de Camões. Então, não é que em vez de condenar a escravatura, resolveu escrever poemas sobra uma bela (?) cativa que supostamente o tinha cativo – rica ironia! Um mau exemplo que perdurou. Mesmo no século XX, reputados esclavagistas como Zeca Afonso e Sérgio Godinho ainda tiveram o desplante de musicar e cantar a “bela cativa”. Obviamente, não podemos nem devemos olvidar que o poeta, despudorado esclavagista, manteve até à sua morte um escravo, Jau, trazido do Oriente. 

Os Lusíadas são pouco mais do que o exaltar de uma campanha miserável que levou a escravatura aos quatro cantos do mundo. Algo que nos deveríamos envergonhar profundamente. “Shame on you!”; queimem os livros; estátuas abaixo e toponímia corrigida! 

E não nos acusem de violência. Num passado não muito longínquo, jovens burgueses revoltados contra o seu próprio meio sociocultural, chegaram a despoletar bombas em estações de caminho de ferro. Aqui não se mata ninguém, apenas uma cultura podre, que indiscutivelmente é podre e nefasta. 

Não, ainda não chegaram ao ponto de derrubar estátuas de Camões e mudar nome de ruas e praças, mas a lógica subjacente está lá, se pensarmos, por exemplo, no Padre António Vieira. 

Sim, está em causa destruir uma cultura, a própria. Sim, é esse o objetivo destas excitações. Com todos os defeitos e virtudes, crimes e maravilhas que balizaram o seu caminho é a nossa história e raiz. O mínimo dos mínimos é construir o futuro lendo justamente o passado. As políticas de terra queimada nunca trouxeram nada de bom, especialmente no domínio cultural. Isto de cativar julgamentos e aprisionar pensamentos é muito mau sinal.


2 comentários:

Júlio Resende disse...

Muito bom. Parabéns.

Carlos Sampaio disse...

Obrigado, Júlio.