Parabéns Alice Zeniter. O romance “A Arte de Perder” é uma excelente história da História cruzada desses dois países tão próximos e de relacionamento tão complexo.
O que hoje se chama Argélia foi desenhado pela França. Existiam culturas anteriores à colonização francesa, mas nunca tinham estado ligadas. Tizzi Ouzu tinha muito pouco, ou nada, em comum com Tlemcen, nenhuma delas com Tamanrasset, idem entre as anteriores e Argel e poderíamos ainda acrescentar algumas mais, sempre com o mesmo resultado. Todas essas cidades e regiões não se identificavam como pertencentes a uma identidade partilhada. Existia uma religião comum, quase hegemónica, e uma língua dominante, mas esse critério dá uma fronteira mais larga e até ignora a fortíssima identidade dos berberes da montanha com a sua língua e alfabeto próprios.
Passando ao lado do balanço e do detalhe dos benefícios e malefícios da colonização, a Argélia é filha, legítima ou ilegítima, da França e há ali uma coisa freudiana mal resolvida. Uma mãe que desconsidera o filho tresmalhado, mas sem o renegar completamente e um filho revoltado, repudiando o progenitor, mas sem deixar de lhe ter afeto.
No meio ficaram os harkis. Aqueles que por ignorância, interesse, amor ou desprezo escolheram o lado errado da guerra. São os locais (não gosto de lhes chamar árabes) que lutaram ou simplesmente colaboraram com o colonizador. No final quando este entregou o país aos vencedores, os harkis ficaram condenados. Ou a serem executados e das formais mais atrozes e imaginativas possível, incluindo serem cozidos vivos num caldeirão, ou a virem em conta-gotas e a contragosto para França, para estacionarem em campos como refugiados. Sessenta anos depois a Argélia ainda não os tolera, nem sequer aos seus descendentes.
No romance de Alice Zeniter, três gerações erram ao longo desses caminhos cruzados e desacertados. Da perspetiva histórica apenas senti a falta da referência às zonas cinza do terrorismo na década negra. Disse-me a autora que isso representaria outro romance, mas não me convenceu completamente. Bastavam dois ou três parágrafos sobre o assunto. A menos de um fecho um pouco atalhado, é uma história que dá gosto ler e uma viagem bem feita por uma História emaranhada que baste.
(Sei que não estou a fechar bem o texto, mas há temas difíceis de fechar…)
O que hoje se chama Argélia foi desenhado pela França. Existiam culturas anteriores à colonização francesa, mas nunca tinham estado ligadas. Tizzi Ouzu tinha muito pouco, ou nada, em comum com Tlemcen, nenhuma delas com Tamanrasset, idem entre as anteriores e Argel e poderíamos ainda acrescentar algumas mais, sempre com o mesmo resultado. Todas essas cidades e regiões não se identificavam como pertencentes a uma identidade partilhada. Existia uma religião comum, quase hegemónica, e uma língua dominante, mas esse critério dá uma fronteira mais larga e até ignora a fortíssima identidade dos berberes da montanha com a sua língua e alfabeto próprios.
Passando ao lado do balanço e do detalhe dos benefícios e malefícios da colonização, a Argélia é filha, legítima ou ilegítima, da França e há ali uma coisa freudiana mal resolvida. Uma mãe que desconsidera o filho tresmalhado, mas sem o renegar completamente e um filho revoltado, repudiando o progenitor, mas sem deixar de lhe ter afeto.
No meio ficaram os harkis. Aqueles que por ignorância, interesse, amor ou desprezo escolheram o lado errado da guerra. São os locais (não gosto de lhes chamar árabes) que lutaram ou simplesmente colaboraram com o colonizador. No final quando este entregou o país aos vencedores, os harkis ficaram condenados. Ou a serem executados e das formais mais atrozes e imaginativas possível, incluindo serem cozidos vivos num caldeirão, ou a virem em conta-gotas e a contragosto para França, para estacionarem em campos como refugiados. Sessenta anos depois a Argélia ainda não os tolera, nem sequer aos seus descendentes.
No romance de Alice Zeniter, três gerações erram ao longo desses caminhos cruzados e desacertados. Da perspetiva histórica apenas senti a falta da referência às zonas cinza do terrorismo na década negra. Disse-me a autora que isso representaria outro romance, mas não me convenceu completamente. Bastavam dois ou três parágrafos sobre o assunto. A menos de um fecho um pouco atalhado, é uma história que dá gosto ler e uma viagem bem feita por uma História emaranhada que baste.
(Sei que não estou a fechar bem o texto, mas há temas difíceis de fechar…)
2 comentários:
Olá. Você sabe se livro L'Art de perdre, d'Alice Zeniter, já foi traduzido para o português?
Você mencionou apenas o original, mas como usa o título em português, fiquei na dúvida.
Obrigada.
Olá.
Desconheço se há tradução em português. Apenas possuo e li o original em francês.
Efetivamente, traduzi o título, por "liberdade"... :)
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