8) Chega o salafismo
Quando os otomanos perceberam que estavam a entrar em decadência, nomeadamente face a uma Europa “Iluminada”, eles vão tentar adotar as modas e as técnicas que os poderão ajudar a não ficar para trás. São ricos, compram os frutos, mas não plantam as árvores. Nas causas, múltiplas, da decadência do império otomano, creio existir fundamentalmente um défice na geração de conhecimento e, também, um esquema de enriquecimento piramidal. Novas conquistas para alimentar as anteriores. Quando o ciclo para…
Nas cinzas da derrota, Mustafa Kamel Atartuk cria um novo Estado,
Turquia, muçulmano é certo, mas onde a religião não entra em escola, tribunal ou
parlamento…
Do lado oposto da barricada, há quem pense de outra forma.
No passado, éramos poderosos e bem-sucedidos; quando nos afastamos dessa pureza
original e tentamos copiar os infiéis, pioramos. A solução passa por “ò tempo
volta para trás” … voltar a viver como o profeta Maomé vivia… isto é o
salafismo, voltar às origens.
Dentro desta movida, vai ser, e é hoje ainda, muito
relevante a Irmandade Muçulmana. Criada em 1928 no Egito por Hassan Al Banna. Ela
vai desenvolver e concretizar essa doutrina de… O Islão é a solução; é preciso
islamizar o individuo e a sociedade, é preciso lutar por isso, se a lutar tiver
que ser violenta, que seja, se se morrer nessa luta, está certo.
Al Banna acreditava na pureza do rigor religioso, com uma
profunda rejeição da cultura ocidental. No mundo árabe, eles serão durante um
século também uma força política de oposição aos regimes pós-coloniais, não
suficientemente islâmicos no seu ponto de vista. Essa ameaça leva-os a serem
perseguidos e Nasser, no seu Egipto natal, não hesita em condenar e executar
Qutb, um dos principais teóricos e ativista do movimento.
Um século depois, é curioso fazer um ponto de situação e dos
seus aderentes, presentes.
Sudão - o criminoso Omar Al Bashid de toda a barbaridade no
Darfur
Marrocos - o partido PJD, grande vencedor das eleições de
2011 após as “primaveras”
Tunísia – Ennahda no governo após eleições pós “primaveras”
Egito – Mohamed Morsi, eleito presidente após “primaveras”
Turquia – Erdogan, partido AKP ? (não confirmo nem desminto)
Arábia Saudita e Qatar --- tem dias
Palestina - Hamas
França – Muçulmanos de França (ex UOIF)
Se bem que depois das “Primaveras” o movimento tenha tido
bastante sucesso democrático, a prática ficou longe das expetativas e a seguir
viram o seu poder institucional diminuir.
Sobre a Europa, de notar que as comunidades muçulmanas emigradas
tendem a ficar agrupadas (e agarradas) à origem … os marroquinos de um lado, os
argelinos de outro, depois os turcos, etc.
Tarik Ramadan, neto do fundador Hassan al Banna, foi uma
figura muito popular deste movimento em França por apresentar um discurso
diferente, especialmente dirigido aos jovens. Vocês são franceses e,
simultaneamente, muçulmanos e devem poder viver plenamente a vossa religião no
vosso país. Esta mensagem tem duas leituras. Por um lado, uma mensagem de
integração, por outro lado, as instituições francesas devem-se adaptar para vos
permitir viver a vossa religião sem limitações. Em todas as polémicas sobre o uso/proibição
do véu, presença de presépios de Natal em espaço público, burkinis nas
piscinas, etc, há a assinatura e uma intervenção muito ativa deste movimento.
De há uns anos para cá, Tarik Ramadan caiu em desgraça e risco judicial, devido
a umas relações extraconjugais não consentidas…
Sendo a cartilha fundadora da Irmandade fortemente
salafista, mesmo sem descartar a violência, os discursos externos atuais são
bastante mais macios, mas há testemunhos de dissidentes que apontam para importantes
discrepâncias entre as convicções internas e as mensagens públicas. O tema é tão
potencialmente sensível que o ministério do Interior francês se deu ao trabalho
de realizar um estudo específico sobre as formas dissimulados como os
islamistas tentam subverter valores fundamentais da república. Ver aqui.
Uma curiosidade. Em 2003, N. Sarkosy cria o CFCM (Conselho
Francês do Culto Muçulmano), uma associação supostamente representativa do
Islão no país, com a qual o poder político pudesse reunir, discutir e tomar
decisões relativamente à tal adaptação da sociedade e das instituições à
religião. As disputas internas pelo poder foram mais fortes do que as ações
concretas desenvolvidas, nunca conseguiu grande peso e hoje existe, mas em
estado vegetativo.
Começou aqui
Continua para aqui
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