10 junho 2023

Má fortuna?


 

Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que pera mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa [a] que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse, que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

                        Luís de Camões

No Cabo de Guardafui
Vou aguardando bons ventos
Tiro a pena da mochila
E assento meus pensamentos

Às voltas com seu fadário
Um simples soldado raso
Tomai lá meu secretário
E guardai bem este meu caso

Só me deu p'ra dizer não
Em tempo de dizer sim
Também na mesma moeda
O mundo me paga a mim

Como este Cabo tão triste
Pedregoso e sem verdura
Assim minha vida existe
Marcada p'la desventura

Pergunto à musa porquê
Pergunto aos deuses nos céus
Todos me dizem que é só
Má fortuna e erros meus

Se baixo o amor à taberna
E depois o subo em soneto
Ele arde em mim com dois lumes
Um é branco e outro é preto

Assim ando estrada fora
Como um bardo vagabundo
Desisti de ver a hora
De ficar de bem com o mundo

No Cabo de Guardafui
Guardei os meus pensamentos
Ponho a mochila às costas
Pois já sopram melhores ventos

Como esse Cabo que existe
À tristeza condenado
Também a má fortuna insiste
Em andar sempre a meu lado

Pergunto à musa porquê
Pergunto a vós que me ouvis
Também achais que um poeta
Só é bom quando infeliz
Carlos Tê/Rui Veloso

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