Páginas

19 agosto 2007

Portugal, Torga



E pronto! De repente, Torga salta para as primeiras páginas. E, como não podia deixar de ser, na sufocante dimensão paroquial nacional do “disse que disse”, “esteve que não esteve”, o prato forte é a polémica e, em particular, a ausência do governo nas cerimónias recentemente realizadas.

Por Torga, deixemos de lado as cerimónias oficiais e a tinta fútil. Se Portugal tem uma identidade bem definida, e eu acredito que tem, ninguém como Torga a encarna. Torga é a solidez do granito e a resistência da erva da montanha. Torga troca tudo por um verso e por nada troca a clareza e a frontalidade.

A homenagem maior a Torga é simplesmente lê-lo, tal como eram simples as suas singelas edições de autor, desprovidas de artifícios e de tudo o mais que não fossem as suas palavras. E para sugestão, para começar, um livro de referência com tanto de lúcido quanto de apaixonado sobre “esta nesga de terra, debruada de mar”: “Portugal”.

2 comentários:

  1. Anónimo20/8/07

    S. LEONARDO DE GALAFURA

    À proa dum navio de penedos,
    A navegar num doce mar de mosto,
    Capitão no seu posto
    De comando.
    S.Leonardo vai sulcando
    As ondas
    Da eternidade,
    Sem pressa de chegar ao seu destino.
    Ancorado e feliz no cais humano,
    É num antecipado desengano
    Que ruma em direcção ao cais divino.

    Lá não terá vinhedos
    Nem socalcos
    Na menina dos olhos
    Deslumbrados.
    Doiros desaguados
    Serão charcos de luz
    Envelhecida;
    Rasos, todos os montes
    Deixarão prolongar os horizontes
    Até onde se extinga a cor da vida.

    Por isso, é devagar que se aproxima
    Da bem-aventurança.
    É lentamente que o rabelo avança
    Debaixo dos seus pés de marinheiro.
    E cada hora a mais que gasta no caminho
    É um sorvo a mais de cheiro
    A terra e a rosmaninho.

    MIGUEL TORGA in Diário IX

    river

    ResponderEliminar
  2. Certo. A melhor homenagem que podemos fazer a um escritor, é lê-lo.

    Ainda assim, há quem o tenha lido, e vá continuar a ler, e, como tu, não queira deixar passar o especial momento de lembrança sem exprimir o que essa lhe faz sentir.

    Foi assim com António Lobo Antunes, de entre outros. Não sei se porque gosto sempre de o ler, se porque, para além disso, ainda gostei especialmente de o ler, não resisti a mostrá-lo, lá no meu cantinho.

    Um abraço.

    ResponderEliminar